O fator nutrição no sistema imune dos ovinos e os resultados nas condições sanitárias do rebanho

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1 O fator nutrição no sistema imune dos ovinos e os resultados nas condições sanitárias do rebanho Nutrition impact on sheep immunity and good results in herd-health conditions Alessandro Francisco Talamini do Amarante 1 1 Instituto de Biociências (IBB/UNESP) Botucatu SP Introdução As infecções por nematódeos gastrintestinais se constitui em um dos principais problemas sanitários que acometem ovinos. Os animais podem ser parasitados simultaneamente por várias espécies de helmintos gastrintestinais, porém, no Brasil, as principais espécies são Haemonchus contortus, parasita do abomaso; Trichostrongylus colubriformis, parasita do intestino delgado e Oesophagostomum columbianum, parasita do intestino grosso (AMARANTE et al., 2004; RAMOS et al., 2004; SOUZA et al., 2013). A redução na produtividade e/ou a ocorrência de problemas clínicos, tais como anemia e diarreia, resultam da interação entre a quantidade de larvas infectantes ingeridas diariamente (desafio) x número de parasitas estabelecidos no trato gastrintestinal x eficiência da resposta imunológica do hospedeiro. A verminose pode acometer qualquer animal, no entanto, o problema é mais grave em animais jovens e em fêmeas no período do periparto. A qualidade da nutrição tem grande influência na eficiência da resposta imunológica contra os parasitas e desempenha papel central na epidemiologia da verminose. Influência da nutrição na eficiência da resposta imunológica A eficiência da resposta imunológica é influenciada por vários fatores que incluem a espécie do parasita, a taxa de infecção e o tempo de exposição. Quando animais bem 87

2 nutridos são expostos continuamente às infecções, ou seja, diariamente ingerem larvas infectantes em pequena quantidade, pode se estabelecer imunidade protetora. Nessa situação, a ocorrência de casos clínicos não é comum e apenas os animais com predisposição genética à susceptibilidade é que adoecerão. Assim, pode-se afirmar que ocorre equilíbrio na relação parasita-hospedeiro. Exemplo de desenvolvimento eficiente da resposta imunológica pode ser observado na Figura 1. Nesse estudo, cordeiros Santa Inês e Ile de France foram mantidos juntos em uma pastagem contaminada, sem receberem tratamentos com anti-helmíntico. Como era de se esperar, os animais se infectaram com nematódeos gastrintestinais. No caso dos animais Santa Inês, o ápice na eliminação de ovos ocorreu 42 dias após o início das observações, seguido de declínio progressivo das médias de ovos por grama de fezes (OPG) devido ao desenvolvimento de imunidade. As médias dos animais Ile de France foram mais altas, porém também com tendência de queda a partir do dia 56. Os cordeiros Ile de France e os Santa Inês apresentaram ganho de peso médio diário respectivamente de 200 g e 154 g e foram sacrificados com 6 7 meses de idade com médias de peso corporal respectivamente de 40,6 kg e 27,9 kg. Vale ressaltar que nesse estudo os animais foram mantidos em plano nutricional elevado, com acesso a ração comercial com 18% de proteína bruta (PB) em quantidade equivalente a 3% do peso corporal dos animais (SILVA et al., 2012). 88

3 OPG Santa Inês Ile de France Dias em pastagem contaminada Figura 1 Contagem média de ovos de nematódeos gastrintestinais por grama de fezes (OPG) de cordeiros das raças Santa Inês e Ile de France mantidos em pastagem e suplementados com concentrado. Animais mantidos sem tratamentos com antihelmíntico. Fonte: Silva et al. (2012). Ao estudar a interação entre nutrição e parasitismo, Coop; Kyriazakis (2001) formularam a hipótese de que ocorre competição entre as várias funções corporais pela alocação de nutrientes, especialmente quando eles são escassos. A princípio, a fim de assegurar a sobrevivência, o combate contra os parasitas e a recuperação dos tecidos lesados tem prioridade em relação às demais funções corporais nos animais infectados. Porém, em algumas circunstâncias, não é isso o que se observa: o crescimento, a prenhez e a lactação tem prioridade em detrimento da expressão da imunidade. Isso explicaria, em parte, a grande susceptibilidade à infecção dos animais nessas fases. À medida que melhora a qualidade da nutrição, aumenta a capacidade do animal de tolerar o parasitismo. Além disso, é importante frisar que animais de raças com alto potencial de crescimento apresentam menor expressão de imunidade adquirida em comparação com raças com menor potencial, quando comparadas nas mesmas condições de nutrição. Por exemplo, quando cordeiros ou ovelhas no periparto das raças Ile de France e Santa Inês foram infectados artificialmente com H. contortus, a carga parasitária dos Santa Inês foi menor, demonstrando maior resistência desta raça (BRICARELLO et al., 2005; ROCHA et al., 2011). Porém, com o atendimento adequado das necessidades nutricionais, os Ile de France (raça mais susceptível) mostraram-se tolerantes, ou seja, os cordeiros cresceram normalmente e as ovelhas produziram quantidade adequada de 89

4 leite, embora estivessem parasitados (BRICARELLO et al., 2005; ROCHA et al., 2011). O estado nutricional tem influência direta na capacidade do animal de desenvolver resposta imunológica contra as infecções e suportar os efeitos deletérios das doenças. Os tecidos responsáveis pela formação de células de defesa, anticorpos e outras substâncias envolvidas na defesa do organismo, apresentam grande demanda por nutrientes. Por exemplo, os nódulos linfáticos mesentéricos, envolvidos na resposta imunológica contra patógenos intestinais, praticamente dobram de tamanho quando os cordeiros são expostos a infecções com T. colubriformis (CARDIA et al., 2011). Como a demanda por nutrientes necessários para a defesa do organismo é elevada, o desempenho (crescimento, produção de leite, etc.) dos animais que estão respondendo ao desafio por patógenos usualmente é pior do que o apresentado por animais livres de infecção. Ou seja, os custos e as consequências decorrentes do desenvolvimento da resposta imunológica, bem como as alterações patológicas causadas pelo parasitismo podem comprometer a produtividade (GREER, 2008; CARDIA et al., 2011). A subnutrição torna o rebanho mais susceptível não só à verminose, mas também a outras enfermidades, sendo este um dos maiores problemas a ser suplantado nas condições brasileiras de criação de ovinos. Apenas para exemplificar, um cordeiro pode ganhar 250 g/dia após a desmama, desde que tenha à disposição uma dieta adequada que contenha aproximadamente 18% de proteína bruta (PB) (AFRC, 1993). Em regiões com clima temperado, onde predominam pastagens formadas com azévem (gramínea) e trevo (leguminosa), esse valor é facilmente atendido. No entanto, no Brasil, predominam outras espécies forrageiras, tais como Brachiaria spp., Panicum spp., Cynodon spp., Andropogon spp., que usualmente apresentam teor de PB que varia de 6 a 10% (BOTREL et al., 2002). Quando os cordeiros são alimentados exclusivamente com essas forrageiras, eles não têm as suas necessidades nutricionais alcançadas, ou seja, o seu ganho de peso fica comprometido, bem como a expressão adequada da resposta imunológica. A situação é ainda pior quando os animais são mantidos em altas lotações, alimentando-se exclusivamente de pastagens pobres. Neste caso, ocorre aumento da contaminação ambiental com fezes e, por consequência, aumento da contaminação com larvas infectantes de nematódeos. O quadro pode ser agravado quando, nestas condições, decide-se criar animais com potencial produtivo elevado, geralmente de raças importadas de regiões com clima temperado (por exemplo, Suffolk, Hampshire, Ile de France e Dorper), adaptadas a condições climáticas e alimentares completamente distintas das existentes no Brasil. A associação entre subnutrição e 90

5 contaminação elevada da pastagem pode ter efeito desastroso, com elevada mortalidade de animais. Em ovelhas, a manutenção de nível nutricional elevado durante o início da gestação pode aumentar a expressão da imunidade contra nematódeos gastrintestinais por ocasião do parto. Ovelhas que receberam dieta rica em nutrientes energéticos no início da gestação apresentaram aumento nas reservas de gordura corporal e foram capazes de apresentar maior resistência contra H. contortus em comparação com ovelhas que apresentaram reservas menores (VALDERRÁBANO et al., 2006). Vários experimentos têm também demonstrado benefícios da suplementação protéica na resistência às infecções artificiais por Teladorsagia (Ostertagia) circumcincta em ovelhas no periparto (HOUDIJK et al., 2000). Além disso, os efeitos são mais pronunciados em ovelhas com gêmeos do que em ovelhas com um único cordeiro (HOUDIJK et al., 2001). Considerações finais Em conclusão, o fator mais importante na profilaxia da verminose é a nutrição de qualidade. Animais bem nutridos apresentam maior capacidade para suportarem o parasitismo e para desenvolverem resposta imunológica contra as infecções por nematódeos gastrintestinais. 91

6 English Version Introduction Infections caused by gastrointestinal nematodes are the most common health problems in sheep. Sheep can be infected simultaneously by different helminths species. However, in Brazil, the main species are Haemonchus contortus (abomasums parasite); Trichostrongylus colubriformis (small intestine parasite), and Oesophagostomum columbianum (large intestine parasite). (Amarante et al., 2004; Ramos et al., 2004; Souza et al., 2013). A decrease in productivity and/or health problems occurrence, such as anemia or diarrhea, result from a set of three factors: amount of daily infecting larvae ingested x amount of parasite inside the gastrointestinal tract x efficiency of host s immunological response. Verminosis can affect every specie of animal; however, this is more serious in young animals and females during peripartum. The nutrition quality plays an important role in verminosis epidemic. Nutrition influence on immunological response efficiency The efficiency in immunological response is influenced by a set of factors, such as parasite specie, infection rate, and time of exposure. When well-nourished animals are frequently exposed to infections, digesting a small amount of infecting larvae, it is possible to get a good protective immunity. For these observers, health problems are not common, and only genetically-predisposed animals can get sick. Thus, it can be stated that there is a balance between parasite infection and the host s health. Some examples of efficiency in immunological response can be seen in Figure 1. In this experience, Santa Inês and Ile de France lambs were stocked in an infected pasture, with no anthelmintic treatments. As expected, all animals were infected by gastrointestinal nematodes. For Santa Inês lambs, the peak of fecal eggs count of gastrointestinal nematodes took 42 days, with a gradual decrease in parasite s eggs output (Eggs per gram EPG), due to the immunity development. The Ile de France specie s average was higher than Santa Inêses ones, but also tending to decrease at the 56 th day. Ile de France lambs had a daily weight gain about 200 g, while Santa Inês had 154 g. Both were slaughtered with 6-7 months old. Ile de France lambs were slaughter with an average body weight of 40.6 kg, while Santa Inês had 27.9 kg. It is important to note that animals had a high nutritional 92

7 EPG diet, being fed by concentrated market feed with 18% of crude protein, which corresponds to the amount of 3% of the animal s body weight. (Silva et al., 2012) Santa Inês Ile de France Days of infected pasture Figure 2 Eggs per gram of feces average counting (EPG) in Santa Inês and Ile de Feance lambs stocked in pasture and supplemented by concentrated feed. Animals stocked with no anthelmintic treatments. Silva et al. (2012). Regarding the interaction between nutrition and parasitic infection, Coop and Kyriazakis (1999), suggested that there is a competition among different body function by nutrient allocations, especially if they are scarce. In order to ensure the animal s survival, parasite control and recovery of skin damage took priority during the experiment, considering others infected animals body functions. However, in some circumstances, it was not applied: ewes growth, pregnancy and lactation period had more importance due to their specific immune conditions. It may explain in part why animals in these conditions were more susceptible to infection. As the nutrition quality gets better, the animal s parasite infection tolerance gets also more resistant. In addition, animals breed with high potential to grow are less immune than low potent ones in the same nutritional conditions. For instance, periparturient lambs or ewes that will lamb Ile de France and Santa Inês breeds were artificially infected by H. Contortus. The amount of parasite in Santa Inês hosts was lower than Ile de France, which proves more resistance of this breed. (Bricarello et al., 2005; Rocha et al., 2011). However, with high-nutrition consumption, Ile de France breed (the most susceptible to infection) seemed to be infection tolerant; the 93

8 lambs have grown normally and ewes have produced proper amount of milk, even being infected by parasites. (Bricarello et al., 2005; Rocha et al., 2011). Nutritional conditions have a direct influence on the animal s capacity to develop immunological response against infections, as well as, letting animals be able to stand harmful effects from diseases. The tissues responsible for cellular response, antibody and other substances related to the immune system, require special nutrition needs. As an example, mesenteric lymph nodes involved in immunological response against intestinal pathogens almost double their size when lambs are exposed in T. colubriformis parasites (Cardia et al., 2011). As the nutritional needs must be high in order to maintain the animals immune system, the infected animals performance (growth, milk production, etc.) had worse results than the non-infected animals. In other words, all pathologic changes caused by parasites, as well as, the consequences of the immunological response development, can compromise the final production. (Greer, 2008; Cardia et al., 2011). Malnutrition, one of the main problems in sheep farming in Brazil, turns the herd more susceptible not only to verminosis, but also to other diseases. As an example, a lamb can gain 250 g/d after weaning, as long as it is fed by an 18%-crude protein diet. (AFRC, 1993). In Temperate climate regions, where lolium perenne (ryegrass) and clover (legume) are the most prevalent pasture vegetation, it is easy to meet these nutritional requirements. However, other forage species are more prevalent in Brazil, such as Brachiaria spp., Panicum spp., Cynodon spp., Andropogon spp, which have a crude protein value about 6 to 10% (Botrel et al., 2002). When lambs are only fed by these forages, they don t reach their nutritional needs, compromising not only their weight gain, but also the immunological response. It can get worse if the stocking rate is high, which also compromises the pasture quality. In this case, there is an increase in larva infection through feces, especially nematodes larvae species. This can become even worse if animals with high potential of production are bred, specially those breeds from moderate temperate climate regions (Suffolk, Hampshire, Ile de France and Dorper), which are very adaptable to different food and climate conditions from Brazil. The relation between malnutrition and infected pasture can cause a dramatic effect, such as high animal mortality. The management of a high nutritional value in sheep at the beginning of the pregnancy can increase the immune conditions against gastrointestinal nematodes due to the parturition period. Sheep with high energy nutrition at the beginning of the 94

9 pregnancy had an increase in body fat, as well as, a more H. contortus resistance, comparing to those sheep with lower fat body gain. (Valderrábano et al., 2006). Other experiments have shown some protein supplementation benefits on artificial infection resistance by Teladorsagia (Ostertagia) circumcincta in sheep during peripartum. (Houdijk et al., 2000). In addition, these effects are more expressive in twin-pregnant sheep than in single-pregnant ones. Conclusions To conclude, the most important factor in prophylaxis of verminosis is the nutritional quality. Well-nourished animals show higher capacity to overcome parasite infection, as well as to develop immunological response against gastrointestinal nematodes infections. Referências (Bibliography) AFRC. Energy and protein requirements of ruminants. Wallingford, UK: CAB International, p. AMARANTE, A.F.T.; BRICARELLO, P.A.; ROCHA, R.A.; GENNARI, S.M. Resistance of Santa Ines, Suffolk and Ile de France sheep to naturally acquired gastrointestinal nematode infections. Veterinary Parasitology, v.120, n.1-2, p , BOTREL, M.A.; ALVIM, M.J.; FERREIRA, R.P.; XAVIER, D.F. Potencial forrageiro de gramíneas em condições de baixas temperaturas e altitude elevada. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.37, n.3, p , BRICARELLO, P.A.; AMARANTE, A.F.T.; ROCHA, R.A.; CABRAL FILHO, S.L.; HUNTLEY, J.F.; HOUDIJK, J.G.M.; ABDALLA, A.L.; GENNARI, S.M. Influence of dietary protein supply on resistance to experimental infections with Haemonchus contortus in Ile de France and Santa Ines lambs. Veterinary Parasitology, v.134, n.1-2, p , CARDIA, D.F.F.; ROCHA-OLIVEIRA, R.A.; TSUNEMI, M.H.; AMARANTE, A.F.T. Immune response and performance of growing Santa Ines lambs to artificial Trichostrongylus colubriformis infections. Veterinary Parasitology, v.182, n.2-4, p ,

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11 VALDERRÁBANO, J.; GOMEZ-RINCÓN, C.; URIARTE, J. Effect of nutricional status and fat reserves on the periparturient immune response to Haemonchus contortus infection in sheep. Veterinary Parasitology, v.141, n.1-2, p ,