A marcação CE dos isolantes térmicos. Reflexos na qualidade dos produtos e na qualidade das obras

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Transcrição:

A marcação CE dos isolantes térmicos Reflexos na qualidade dos produtos e na qualidade das obras Doutor Eng.º Carlos Pina Santos, Investigador Principal do LNEC Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) Av. do Brasil, 101 1700-066 LISBOA Tel.: 21 844 3278 FAX: 21 844 3027 E-mail: pina.santos@lnec.pt 1- A harmonização técnica na construção A Directiva dos Produtos da Construção (DPC) [1] pretende contribuir para a remoção das barreiras técnicas existentes no espaço comunitário. Nesse sentido um dos seus objectivos é promover a harmonização técnica no domínio da construção, através da progressiva substituição das inúmeras normas, sistemas de aprovação, de conformidade ou de certificação existentes a nível nacional, os quais (ainda) constituem uma dificuldade à livre (e fácil) circulação dos produtos abrangidos. Por outro lado, e como é natural, a DPC define requisitos essenciais obrigatórios (directamente aplicáveis às obras e não aos produtos) destinados a assegurar um nível elevado de protecção do interesse público no domínio em questão, nomeadamente nos aspectos relacionados com a saúde, a segurança, a defesa dos consumidores e a protecção do ambiente. No contexto da implementação da Directiva dos Produtos da Construção foi preparado pelo CEN, com ampla participação de representantes da indústria, um conjunto homogéneo de normas europeias harmonizadas de especificação das características relevantes dos produtos prefabricados de isolamento térmico de utilização mais corrente em edifícios (Quadro 1). Paralelamente, e em apoio à uniformização de métodos e critérios, foi elaborado e publicado um conjunto de normas europeias de ensaio aplicáveis à determinação das características especificadas para os isolantes térmicos. Os trabalhos em curso no CEN abrangem, ainda, a preparação de normas europeias relativas a produtos de isolamento térmico, quer conformados in situ (nomeadamente, espumas de poliuretano injectado, grânulos de argila, de 1

vermiculite e de perlite expandidas, fibras minerais e celulósicas soltas ou aglutinadas), quer destinados a equipamentos de edifícios e a instalações industriais. Naturalmente que devido à especificidade deste tipo de produtos os correspondentes trabalhos de normalização têm-se revelado mais demorados (1). A uniformização a nível europeu das normas de ensaio e do formato das normas de especificação de características representa um grande passo em termos da caracterização e da comparação de diferentes produtos destinados ao mesmo fim, com óbvias vantagens, quer para os fabricantes quer para os utilizadores. QUADRO 1 Normas europeias harmonizadas de especificação de características de produtos prefabricados (placas, mantas ou rolos) de isolamento térmico para edifícios Norma Europeia EN 13162 Denominação mineral wool (MW) Specifications NP EN 13163 Produtos de isolamento térmico para aplicação em edifícios. Produtos manufacturados de poliestireno expandido (EPS) Especificação EN 13164 EN 13165 EN 13166 EN 13167 EN 13168 EN 13169 extruded polystyrene foam (XPS) Specifications rigid polyurethane foam (PUR) Specifications phenolic foam (PF) Specifications cellular glass (CG) Specifications wood wool (WW) Specifications expanded perlite (EPB) Specifications NP EN 13170 Produtos de isolamento térmico para aplicação em edifícios. Produtos manufacturados de cortiça expandida (ICB) Especificação EN 13171 wood fibre (WF) Specifications 1 - Estão já publicadas as normas europeias de especificação de características de grânulos de argila expandida e de perlite expandida. 2

Desde Março de 2002 que os fabricantes de isolantes térmicos prefabricados sob a forma de placas, mantas ou rolos podem proceder à marcação CE (vd. 2) dos produtos que colocam no mercado. Por outro lado, desde Maio de 2003 que as normas nacionais em conflito com as normas europeias indicadas no quadro 1 (ou as normas nacionais de ensaio) foram obrigatoriamente anuladas, passando desde então a usar-se, quase em exclusivo, normas europeias em todo o espaço comunitário. Neste momento a única excepção diz respeito às normas de ensaio e de classificação da reacção a fogo dos produtos de construção, incluindo os isolantes térmicos, uma vez que na generalidade dos países ainda decorre o denominado período de transição entre os sistemas nacional e europeu. Todavia, como se referirá a seguir, no âmbito da marcação CE é obrigatória a declaração da classificação europeia de reacção ao fogo. De momento (devido à falta de adaptação da regulamentação de segurança contra incêndio) a classificação nacional de reacção ao fogo poderá ser indicada em separado (fora da etiqueta que contém os dados da marcação CE). 2 - A marcação CE e a declaração de conformidade A generalidade das normas europeias referidas no quadro 1 inclui uma vasta gama de requisitos (alguns deles com vários níveis ou classes) para igual número de propriedades (térmicas, mecânicas, de estabilidade dimensional, de desempenho face à acção da água e do fogo, entre outras) Todavia o fabricante só é obrigado a declarar a classe europeia (Euroclasse) de reacção ao fogo (2), a resistência térmica e a espessura do produto, propriedades fundamentais tendo em vista a segurança e a utilização final dos produtos considerados. Contudo, se o fabricante assim o pretender, nada o impede de declarar várias outras características com interesse para o tipo de aplicações visadas. A título de exemplo um fabricante de placas de poliestireno expandido extrudido (XPS) poderá colocar o produto no mercado em que na respectiva marcação CE declara apenas, de acordo com a norma do produto (EN 13164) : 2 - Podendo declarar a classe F se o produto não se destina a aplicações sujeitas a exigências de segurança contra incêndio ou, eventualmente, se o produto não apresenta um desempenho a fogo que permita satisfazer às exigências aplicáveis à classe E. 3

Reacção ao fogo: Classe E Espessura nominal: 50 mm Resistência térmica: 1,45 m 2. C/W Código de designação: XPS EN 13164 T1 [classe de tolerância da espessura] e um outro fabricante (ou o mesmo para outro produto) presta informação adicional relevante para o tipo ou tipos de aplicações visadas, ao declarar um conjunto de outras características, como, por exemplo, a tensão de compressão a 10% de deformação [CS(10)], a absorção de água por difusão de vapor em percentagem volúmica [WD(V)] e o comportamento à acção do gelo-degelo [FT] : Reacção ao fogo: Classe E Espessura nominal: 50 mm Resistência térmica: 1,45 m 2. C/W Código de designação: XPS EN 13164 T1 CS(10) 300 WD(V) 5 FT 2 Através da marcação CE os fabricantes assumem a responsabilidade pela conformidade do produto que colocam no mercado com as características que declaram e, ainda, que o produto foi submetido a procedimentos de avaliação e de controlo de qualidade adequados, de acordo com o estabelecido na norma do produto e na norma europeia NP EN 13172 Produtos de isolamento térmico Avaliação da conformidade [2] A definição dos procedimentos de avaliação da conformidade apropriados é feita tendo em conta, nomeadamente, o tipo de risco relacionado com os produtos. Em certas circunstâncias os referidos procedimentos exigem a intervenção de organismos de avaliação da conformidade independentes e reconhecidos a nível comunitário, designados Organismos Notificados, nomeadamente Organismos de Certificação e de Inspecção e Laboratórios de Ensaios. Apesar da intervenção no processo de entidades terceiras (organismos notificados) - que podem ser responsáveis por actividades de inspecção e de ensaio e emitir 4

Certificados de Conformidade (Sistema 1), ou apenas realizarem Ensaios Iniciais de Tipo (ITT) sobre amostras recolhidas pelo fabricante (Sistema 3) - convém relembrar que a Declaração de Conformidade do produto é emitida pelo fabricante, o qual assume a responsabilidade pela sua veracidade e actualização. O sistema de comprovação de conformidade aplicável a todas as características declaradas, exceptuando a classe de reacção ao fogo, é o Sistema 3. No que diz respeito à classe declarada de reacção ao fogo, o sistema de comprovação da conformidade adequado a cada caso particular é definido num Anexo das especificações harmonizadas dos produtos, como se indica no quadro 2. QUADRO 2 - Sistemas de comprovação de conformidade dos produtos de isolamento térmico prefabricados, para aplicações sujeitas a regulamentação de reacção ao fogo (aplicável à classe de reacção ao fogo) Utilização prevista Euroclasses de reacção ao fogo Sistema de comprovação da conformidade Produtos de isolamento térmico prefabricados (placas, mantas, rolos) Utilizações sujeitas a exigências regulamentares relativas à reacção ao fogo (A1, A2, B, C)* 1 (A1, A2, B, C)**, D, 3 E 1(A1 a E)***, F 4 * Produtos/materiais para os quais uma fase claramente identificada no processo de fabrico origina uma melhoria da classificação de reacção ao fogo (e.g. adição de retardadores de fogo ou limitação do teor de materiais orgânicos) ** Produtos/materiais não cobertos pela situação anterior *** Produtos/materiais que não necessitam de ensaio de reacção ao fogo (e.g. produtos/materiais da classe A1 sem necessidade de ensaio de acordo com a Decisão 96/603/CE da Comissão, e posterior alteração, ou, eventualmente, produtos/materiais que venham a ser incluídos em listas de classificação sem ensaio) A verificação da constância da qualidade do produto (isolante térmico) colocado no mercado é imposta ao fabricante, o qual tem a responsabilidade de implementar um sistema de controlo interno permanente da produção. Este sistema - gerido pelo fabricante ou, sob a sua responsabilidade, por um seu representante - deve obedecer aos requisitos definidos nas normas do produto (vd. Quadro 1) e de avaliação da conformidade [2], os quais são sintetizados no quadro 3. 5

QUADRO 3 Principais requisitos do controlo da produção na fábrica [2] Requisitos do controlo da produção na fábrica ORGANIZAÇÃO INSPECÇÃO E ENSAIOS ACÇÕES NO CASO DE NÃO- -CONFORMIDADE DOS PRODUTOS MANUSEAMENTO, ARMAZENAGEM, EMBALAGEM E MARCAÇÃO DOS PRODUTOS RASTREABILIDADE DOS PRODUTOS FORMAÇÃO DO PESSOAL Sistema de controlo de produção documentado num Manual de Qualidade Meios, equipamentos e pessoal necessários às acções de inspecção e de ensaios (eventualmente recurso a subcontratação) Inspecção e/ou ensaio das matérias primas, durante a produção e do produto acabado Acções correctivas imediatas Notificação de clientes ou marcação do produto numa classe inferior Novos ensaios de verificação Procedimentos de manuseamento e de armazenagem que não danifiquem o produto Controlo das operações de manuseamento, de armazenagem e de marcação dos produtos Os produtos devem ser devidamente identificados e rastreáveis à respectiva produção (data, matéria-prima, linha de produção) Procedimentos de identificação das necessidades de formação e realização de acções de formação de todo pessoal envolvido em actividades afectas ao controlo da qualidade Pessoal com formação e experiência adequadas às actividades que realizam Registo das acções de formação Para garantir a constância da qualidade do produto colocado no mercado o fabricante é obrigado a realizar ensaios regulares de controlo da produção na fábrica (ou a subcontratar a sua realização a um laboratório exterior), cujo âmbito e periodicidade estão claramente definidos na respectiva norma de produto. Estes ensaios regulares incidem obrigatoriamente sobre as características declaradas e 6

permitem ao fabricante actuar da forma mais adequada em caso de detecção de não-conformidades. 3 A marcação CE dos isolantes térmicos em Portugal Face à nova realidade introduzida pela marcação CE o primeiro balanço que se pode efectuar é positivo. Em Portugal um número significativo de fabricantes de produtos de isolamento térmico tomaram consciência das novas obrigações e responsabilidades impostas pela marcação CE. Se para as grandes empresas o controlo da qualidade na produção era já uma prática corrente, para a generalidade das empresas nacionais constituiu um desafio e uma dificuldade a ultrapassar. Todavia, dois aspectos contribuíram para sensibilizar os fabricantes para a importância da marcação CE e para a necessidade de actuação. Por um lado a concorrência nos mercados nacional e, para alguns fabricantes, europeu, com fabricantes de isolantes térmicos que desde a fase inicial se distinguiram perante os consumidores por, voluntariamente, aderirem à marcação CE. Por outro lado, a percepção de que a marcação CE e as medidas de fiscalização do mercado que têm de ser asseguradas pelos Estados-membos irão introduzir um factor positivo de mudança, promovendo a concorrência leal entre fabricantes. De facto, um mercado em que, em geral, o custo se sobrepõe à qualidade (parâmetro com frequência ignorado) fomentou a existência de produtos de isolamento térmico sem qualquer relação (por ignorância ou má-fé) com as características para eles reclamadas e, mesmo, em alguns casos, sem uma qualidade minimamente satisfatória para a utilização visada. Assim constata-se que já são comercializados com marcação CE isolantes térmicos fabricados em Portugal, nomeadamente, placas de poliestireno expandido extrudido (XPS) e moldado (EPS), placas de aglomerado de cortiça expandida (ICB) e placas e mantas de lã de rocha (MW). Nesta fase inicial os fabricantes adoptaram, de um modo geral, a declaração de um número reduzido de características e, em alguns casos, da classe europeia de reacção ao fogo F (desempenho não determinado). Denota-se também uma preocupação, mais ou menos consistente, com o cumprimento das exigências 7

estipuladas para o controlo da produção na fábrica, nomeadamente a implementação de um sistema de qualidade e a realização dos ensaios regulares prescritos na correspondente norma do produto. Neste último os fabricantes utilizam meios laboratoriais próprios ou recorrem à subcontratação ao LNEC para a realização dos ensaios de controlo regular. De referir que o LNEC tem participado e apoiado a indústria na marcação CE, quer através da realização de numerosos ensaios prévios que permitiram a alguns fabricantes caracterizarem e declararem os seus produtos, quer, como Laboratório de Ensaios Notificado, procedendo à realização dos Ensaios Iniciais de Tipo (ITT) de produtos abrangidos pelo Sistema 3 (vd. Quadro 2). Com a recente instalação do novo Laboratório de Ensaios de Reacção ao Fogo prevê-se que, no futuro, o LNEC possa vir a solicitar a notificação quer como Laboratório de Ensaios (reacção ao fogo) quer como Organismo de Certificação (Sistema 1), alargando deste modo o âmbito da sua intervenção neste domínio. 4 - A qualidade dos produtos e a qualidade das obras Um aspecto essencial para a credibilidade da marcação CE e para a confiança na qualidade dos produtos é a obrigação dos Estados-membos implementarem as necessárias medidas de fiscalização e de vigilância que assegurem que os produtos não-conformes sejam retirados do mercado, de modo a que os consumidores não sejam lesados e que os fabricantes disponham de condições equitativas em todo o mercado interno (nacional e europeu). Todavia, face à actual situação de inexistência de uma efectiva vigilância e fiscalização do mercado, após um primeiro balanço positivo algumas dúvidas surgem quanto aos esperados benefícios imediatos da marcação CE. Para além da possível existência de marcações sem garantia de controlo efectivo da produção na fábrica, podem detectar-se alguns casos de marcação incorrecta ou mesmo duvidosa, não exclusivamente de produtos fabricados em Portugal Um outro aspecto importante e frequentemente ignorado é o facto de a marcação CE, cujo estatuto jurídico é definido na DPC, não ser uma marca de qualidade comercial nem representar uma certificação de produto. Como já se referiu deve ser encarada como uma declaração do fabricante, ou do seu representante 8

autorizado, de que o produto está, obrigatoriamente, conforme com todas as disposições harmonizadas aplicáveis, referidas na norma relevante. Apesar de a distinção ser perfeitamente clara para as entidades oficiais, o mesmo não se passa com os utilizadores (projectistas, donos de obra e seus representantes, consumidores finais) que, embora comecem a reconhecer a marcação CE, desconhecem em muitos casos o seu significado exacto. Verifica-se, ainda, uma tendência, frequentemente intencional e duvidosa, para adicionar elementos estranhos à percepção da marcação CE que ultrapassam as intenções da DPC. Como já se referiu, o facto de um produto colocado actualmente no mercado ser acompanhado por uma etiqueta contendo os elementos da marcação CE não assegura, em alguns casos, a respectiva qualidade declarada. Por outro lado observa-se a difusão de um certa ideia de que a marcação CE representa um atestado de que o produto em questão está apto a ser utilizado em todas as aplicações possíveis... e impossíveis. Convém lembrar que no capítulo Objectivo de todas as normas de especificação de características acima referidas (vd. Quadro 1) é claramente expresso que a norma não especifica a classe ou o nível exigido a uma determinada propriedade do produto para demostrar a sua aptidão ao uso, numa determinada aplicação e refere ainda que os produtos... são igualmente utilizados em sistemas prefabricados de isolamento térmico e em painéis compósitos; o desempenho desses sistemas não está coberto pela...norma. Desde a publicação das normas europeias de ensaio e de especificação de características dos isolantes térmicos, os projectistas e os donos de obra dispõem de um referencial normativo comum que lhes permite a selecção e a verificação das características dos produtos mais adequados para as aplicações tradicionais correntes. Nestas aplicações (3) a definição de classes ou níveis mínimos de um conjunto restrito de características dos isolantes térmicos pode constituir a forma adequada de especificar ou de comprovar a sua aptidão para uma utilização particular considerada. Desde que aquelas características sejam declaradas na marcação CE, e os respectivos valores satisfaçam a exigências especificadas, o produto poderá ser considerado adequado para o uso visado. 3 - Como por exemplo o isolamento térmico de paredes duplas de alvenaria tradicional com placas rígidas de isolantes térmicos. 9

Em contrapartida, nas aplicações mais complexas e exigentes, em particular no caso de soluções e sistemas considerados não-tradicionais (ou inovadores) de isolamento térmico (nomeadamente, isolamento pelo exterior, coberturas invertidas, painéis compósitos, etc.) os aspectos de desempenho e de durabilidade não podem ser avaliados por simples referência a características declaradas para o isolante térmico, o qual é apenas um dos componentes do sistema. Aliás, tem-se assistido nos últimos anos à utilização de sistemas e soluções de isolamento térmico recorrendo a produtos totalmente inadequados, ou cujo desempenho e compatibilidade com os outros componentes não conduz a um desempenho global satisfatório (4). Em geral o resultado é a ocorrência a curto prazo de anomalias variadas que conduzem à degradação do sistema de isolamento térmico e afectam o desempenho global do elemento construtivo em que este se insere. Espera-se que neste domínio a utilização indevida da marcação CE não contribua para a manutenção ou o agravamento da situação referida. No caso dos sistemas não-tradicionais (ou inovadores) a via a adoptar continua a passar pelas respectivas apreciação técnica e adequação ao uso serem evidenciadas por documentos idóneos e independentes Documentos de Homologação (DH), Aprovações Técnicas Europeias (ETA) (5), em diversos casos elaborados com base em critérios europeus de avaliação reconhecidos ou harmonizados. Face ao reduzido número de homologações solicitas ao LNEC neste domínio não é de admirar a realidade referida no parágrafo anterior, com óbvios prejuízos para os vários intervenientes (aplicadores, donos de obra, utentes). A eficiência do desempenho térmico e energético real dos edifícios depende de todos os factores já referidos - produtos e sistemas com qualidade assegurada, aptidão ao uso e durabilidade adequadas mas não é possível esquecer a concepção das soluções e a respectiva qualidade de execução em obra. A concepção ou escolha das soluções de isolamento térmico e a sua compatibilidade com os restantes elementos e componentes do edifício deverá ser uma responsabilidade e uma exigência dos projectistas. Bons conhecimentos técnicos, para que as opções a tomar não seja facilmente influenciadas por 4 - Incluindo aspectos que ultrapassam o desempenho térmico do elemento construtivo, nomeadamente a estanquidade à água ou a segurança dos utentes (em caso de incêndio ou de desprendimento e queda de elementos,...) 5 - Uma ETA é uma especificação técnica que permite a marcação CE do sistema por ela coberto. 10

documentação técnico-comercial nem sempre fiável, e preocupação com a pormenorização a nível de projecto (não deixando que os pontos singulares sejam resolvidos expeditamente em obra) são aspectos essenciais para uma desejável melhoria da prática corrente, com óbvios reflexos na qualidade final. Finalmente outro aspecto crítico condiciona o real desempenho das soluções de isolamento térmico: a qualidade da execução. Aqui também muito haverá a melhorar. No âmbito da actividade desenvolvida pelo LNEC, este depara-se com demasiada frequência com situações de deficiente qualidade de execução ou com anomalias, mais ou menos graves, devidas às incorrectas concepção ou execução de soluções de isolamento térmico. Podem citar-se como exemplos de má qualidade de execução as seguintes situações comuns na construção actual: - a aplicação de isolantes térmicos em paredes ou coberturas com juntas de dimensões apreciáveis entre placas (aumento significativo das perdas e ganhos térmicos); - o aproveitamento de pequenas secções irregulares de placas para isolar uma área, realizando um verdadeiro opus incertum (aumento muito significativo das perdas e ganhos térmicos); - a colocação no espaço de ar de paredes duplas de placas soltas (sem ligação ao suporte) ou incorrectamente fixadas ou, ainda, misturadas com detritos vários (aumento das perdas térmicas por convecção e transmissão; agravamento do risco de ocorrência de infiltrações de água); - o preenchimento incompleto do elemento (parede ou cobertura), com frequência pelo facto de as dimensões correntes das placas não se ajustarem às dimensões da área a isolar termicamente (pontes térmicas, aumento das perdas e ganhos térmicos). Nestas circunstâncias, mesmo utilizando bons produtos e sistemas de isolamento térmico, de qualidade assegurada por um controlo adequado da produção ou por uma apreciação técnica idónea, o resultado final é a parcial ou completa ineficiência da solução realizada em obra. Aqui, a formação dos operários e técnicos responsáveis, e a intervenção dos donos de obra e seus representantes, são essenciais para evitar que não se tire o proveito esperado do gasto efectuado com as soluções de isolamento térmico. 11

5 - Conclusões A marcação CE dos produtos prefabricados de isolamento térmico de utilização mais corrente em edifícios está a ser adoptada por um número significativo de fabricantes nacionais desses produtos. Os benefícios desta marcação, em termos de melhoria e de garantia da qualidade dos isolantes térmicos e de concorrência equitativa entre fabricantes, só poderão ser uma realidade se forem cumpridas as exigências impostas por essa marcação. Verifica-se que a falta de uma efectiva fiscalização e vigilância do mercado conduzem a situações de incumprimento e desrespeito pelas regras estabelecidas e, consequentemente, pela não correspondência entre a qualidade declarada e a qualidade efectiva de alguns produtos colocados no mercado, com óbvio prejuízo para os utilizadores e os fabricantes responsáveis. A qualidade das obras de isolamento térmico para além de depender a qualidade dos produtos depende, igualmente, da concepção e de execução das soluções. Em Portugal verifica-se que estes dois aspectos carecem, ainda, de uma verdadeira mudança de atitude no sentido de melhorar de forma significativa a qualidade e o desempenho das obras Bibliografia 1 Directiva do Conselho relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-membros no que respeita aos produtos de construção (Directiva 8/106/CEE, de 21 de Dezembro de 1988, alterada pela Directiva 89/68/CEE, de 22 de Julho de 1993). Jornal Oficial das Comunidades Europeias (JOCE), L40, 1989-02-11, p. 12-16; L220, 1993-08-30, p.1-22. 2 INSTITUTO PORTUGUÊS DA QUALIDADE (IPQ) Produtos de isolamento térmico. Avaliação da conformidade. Lisboa, IPQ, Maio de 2002. NP EN 13172 (2001). 12