RISCO DE INCÊNDIOS FLORESTAIS NO PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGAOS João Flávio Costa dos Santos 1 ; Sidney Geraldo Silveira Velloso 1 ; Bruno Araújo Furtado de Mendonça 2 ( 1 Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Engenharia Florestal, Viçosa-MG, joao.flavio@ufv.br; 2 Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Instituto de Florestas, Departamento de Silvicultura, Seropédica-RJ.) RESUMO Os incêndios florestais são um grande desafio à conservação da biodiversidade em Unidades de Conservação. Neste trabalho, a acurácia da Fórmula de Monte Alegre (FMA) para predição de incêndios no Parque Nacional da Serra dos Órgãos (PARNASO) foi avaliada. Nosso objetivo foi verificar se a FMA é um bom índice de riso de incêndios (IRI) para ser adotado pela administração do Parque. Avaliamos registros de ocorrência de incêndios no período de 2007 a 2014 e utilizamos dados meteorológicos da Estação Teresópolis. Os resultados obtidos indicam um bom desempenho da FMA. Os incêndios ocorrem principalmente entre julho e outubro, período da estiagem e maiores valores de FMA. A maioria das ocorrências de incêndios foi registrada em locais ao entorno do parque, sugerindo forte influência antrópica. Palavras-chave: Fórmula de Monte Alegre, monitoramento de incêndios florestais, proteção florestal. INTRODUÇÃO Um dos grandes desafios na gestão de Unidades de Conservação (UC) da Mata Atlântica é a prevenção de incêndios florestais. A ocorrência de incêndios florestais tem impacto direto sobre a biodiversidade, põe em risco a conservação dos recursos naturais e traz várias consequências de ordem econômica e para a saúde pública (Medeiros & Fiedler, 2004; Vadrevu et al. 2010). O Parque Nacional da Serra dos Órgãos (PARNASO) protege, desde 1939, um importante remanescente de floresta ombrófila densa (20.030 ha) no estado do Rio de Janeiro, e abriga 120 espécies de animais ameaçadas de extinção. Apesar da importância, os incêndios florestais têm sido recorrentes nessa UC (ICMBIO 2015). Para prevenir os incêndios florestais algumas ferramentas podem ser utilizadas. Os índices de risco de incêndio (IRI) são bons exemplos de ferramentas de fácil implementação em UCs e que oferecem resultados satisfatórios. A Fórmula de Monte Alegre (FMA) (Soares, 1972) foi o primeiro IRI desenvolvido no Brasil. A FMA foi elaborada com dados meteorológicos e de ocorrência de incêndios florestais na região central do Estado do Paraná. Atualmente, tem sido aplicada por várias empresas e instituições florestais para estimar o risco de incêndios. Apesar de também estarem associadas a causas naturais (como a incidência de raios), as ações antrópicas são as maiores responsáveis pela ocorrência dos incêndios florestais. Há um grande destaque para o manejo de pastagens com uso de fogo, que frequentemente extrapola os limites das propriedades e a frente de fogo avança sobre áreas de cobertura florestal (Medeiros & Fiedler 2004; Aximoff & Rodrigues 2011). Dessa forma, uma das possibilidades do uso dos IRI, é a proibição das queimadas em dias de risco elevado. O objetivo deste trabalho foi avaliar o desempenho do índice de risco de incêndios calculado através da Fórmula de Monte Alegre no Parque Nacional da Serra dos Órgãos. MATERIAL E MÉTODOS Nosso estudo abrangeu a área do PARNASO bem como as áreas no entorno dessa UC (Figura 1). Foram levantados os Registros de Ocorrência de Incêndios (ROIs) no período de 2007 a 2014 junto a administração do Parque. Os dados meteorológicos utilizados neste estudo foram obtidos da Estação Teresópolis do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) localizada dentro do PARNASO (22 26 56 S, 42 59 13, 991 m de altitude). 195
Figura 1. Localização do Parque Nacional da Serra dos Órgãos (PARNASO). O índice de risco foi calculado de acordo com a Fórmula de Monte Alegre (FMA) de Soares (1972) (Equação 1). em que: FMA-Fórmula de Monte Alegre; n- número de dias sem chuva; e H i umidade relativa do ar [%] medida às 13 horas local. A FMA é um índice cumulativo sujeito a restrições impostas em função da quantidade de chuva diária (Tabela 1). Tabela 1. Restrições para a Fórmula de Monte Alegre -FMA (SOARES, 1972). Chuva diária [mm] Alteração da FMA 2,4 Nenhuma 2,5 a 4,9 Subtrair 30% na FMA calculada na véspera e somar (100/H) do dia. 5,0 a 9,9 Subtrair 60% na FMA calculada na véspera e somar (100/H) do dia. 10,0 a 12,9 Subtrair 80% na FMA calculada na véspera e somar (100/H) do dia. 12,9 Igualar FMA a zero e recomeçar a somatória do dia seguinte A interpretação do resultado obtido com o cálculo da FMA é relacionada a uma escala de cinco categorias: Nulo (FMA=1.0); Pequeno (1,1 FMA 3,0); Médio (3,1 FMA 8,0); Alto (8,1 FMA 20,0); e Muito Alto (FMA > 20,0). O índice de risco calculado pela FMA tem a vantagem da simplicidade de cálculo e exigência de dados de fácil aquisição. Para Unidades de Conservação que contam com estações meteorológicas, como é o caso do PARNASO, esse é um índice de fácil implementação. Através de planilhas eletrônicas, a FMA pode ser atualizada diariamente e indicar o índice de perigo de fogo para aquela data. A etapa seguinte consistiu na comparação entre os ROIs e a interpretação da FMA para cada dia do período avaliado. (1) 196
RESULTADOS E DISCUSSÃO O período de avaliação abrangeu 2.819 dias em função da disponibilidade de dados de umidade relativa e chuva na Estação Teresópolis. A distribuição dos dias em classes de risco pela classificação da FMA é apresentada na tabela 2. Os meses que apresentaram maior quantidade de dias com risco Alto ou Muito Alto foram junho, julho, agosto e setembro, os quais são os meses mais secos do ano. Tabela 2. Distribuição dos dias avaliados (2007 a 2014) em classes de risco de incêndio conforme a Fómula de Monte Alegre. Risco de Incêndio Dias Dias (%) Muito Alto 218 7,73 Alto 572 20,29 Médio 751 26,64 Pequeno 746 26,46 Nulo 532 18,87 2819 100 Foram avaliados 133 ROIs entre 2007 e 2014. Desse quantitativo, 72% dos focos foram registrados na zona de amortecimento e entorno da UC. Esse resultado indica que a maioria das ocorrências de incêndios no PARNASO estão relacionadas a causas antrópicas, com isso há necessidade de intensificar o trabalho de conscientização da comunidade ao entorno da UC. Ao confrontar os ROIs com a classificação da FMA percebe-se que a maioria dos registros (72%) ocorreram em dias de risco Alto e Muito Alto (Figura 2). Na classe de risco Médio foram contabilizados 28 ROIs, oito na classe de risco Pequeno e apenas um ROI foi observado em um dia risco Nulo. Figura 2. Número de Registros de Ocorrência de Incêndios (ROIs) distribuídos em classes de Risco de Incêndio de acordo com a Fórmula de Monte Alegre. Os resultados obtidos indicam um ajuste satisfatório da FMA para o PARNASO. Destaca-se que dentre as 28 ocorrências em dias de risco Médio (3,1 FMA 8,0), 20 deles têm valor de FMA superior a cinco. Dessa forma, recomenda-se que as ações preventivas sejam itensificadas em dias de FMA 5. O ano de 2010 foi o mais crítico para o Parque: 45 ROI (34%) foram contabilizados. Nesse ano foi registrada a menor taxa anual de chuva para o período avaliado (2.328 mm) em 197
comparação a taxa média de chuva (2.851 mm). Entre os dias 13 de junho e 07 de setembro do ano de 2010, foram registrados apenas 8,6 mm de chuva. Em consequência dessa intensa estiagem o índice FMA chegou ao valor extremo de 131 (Figura 3), sendo que a partir do valor 20 o índice já é considerado muito alto. Figura 3. Índice de Perigo de Incêndio calculado pela Fórmula de Monte Alegre (FMACalc) e distribuição dos Registros de Ocorrência de Incêndios (ROI) nos dias do ano de 2010. O caráter generalista do índice também chama atenção. Embora tenha sido desenvolvida em uma região específica do país (região central do Estado do Paraná), a FMA tem mostrado eficiência em regiões como o Pantanal Sul-Mato-Grossense (Soriano et al. 2015) e nas regiões Norte (N) e Noroeste (NW) da Amazônia Matogrossense (Souza et al. 2012). A partir do nível crítico (para o PARNASO recomenda-se o valor FMA 5) algumas medidas podem ser adotadas pela administração do parque, tais como, maior vigilância nas áreas de risco, restrição do acesso a esses locais, construção de aceiros preventivos e reorganização das práticas de manejo (corte, desbaste, limpeza etc.), construção de estradas de acesso rápido aos locais de risco e alocação dos recursos de combate em pontos estratégicos (Ferraz & Vettorazzi 1998). Além disso, intensificar o programa de educação ambiental e comunicação com a comunidade no entorno e visitantes é fundamental para redução dos ROIs. CONCLUSÃO O índice de risco de incêndio baseado na Fórmula de Monte Alegre (FMA) apresentou boa adequação à predição de ocorrência de incêndios no Parque Nacional da Serra dos Órgãos. A partir do índice FMA igual a cinco a administração do Parque intensifique as ações preventivas. Uma vez que os Registros de Ocorrência de Incêndios concentraram-se principalmente em áreas das comunidades ao entorno, é necessário intensificar relações de comunicação e educação ambiental com essas comunidades. AGRADECIMENTOS Agradecemos à administração do Parque Nacional da Serra dos Órgãos por disponibilizar os dados e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão da bolsa de estudos. 198
REFERÊNCIAS Aximoff I. & Rodrigues R. C. 2011. Histórico dos incêndios florestais no Parque Nacional do Itatiaia.Ciência Florestal, 21 (1): 83-92. Ferraz, S. F. D. B. & Vettorazzi, C. A. 1998. Mapeamento de risco de incêndios florestais por meio de sistema de informações geográficas (SIG). Scientia Forestalis, 53: 39-48. ICMBIO Parque Nacional da Serra dos Órgãos (PARNASO). 2015. Disponível em: http://www.icmbio.gov.br/parnaserradosorgaos. [Acesso em 30 de outubro 2015]. Medeiros M. B. & Fiedler N. C. 2004. Incêndios florestais no Parque Nacional da Serra da Canastra: desafios para a conservação da biodiversidade. Ciência Florestal, 14(2): 157-168. Soares, R. V. 1972. Determinação de um índice de perigo de incêndio para a região centro paranaense, Brasil. Tese de Mestrado. Centro Agronómico Tropical de Investigación y Enseñanza. Turrialba, Costa Rica. 72p. Soriano, B. M. A., Daniel, O. & Santos, S.A. 2015. Eficiência de índices de risco de incêndios para o Pantanal Sul-Mato- Grossense.Ciência Florestal, 25(4):809-816. Souza, A. P., Casavecchia, B. H. & Stangerlin, D. M. 2012. Avaliação dos riscos de ocorrência de incendiosflorestais nas regiões Norte e Noroest da Amazônia Matogrossense. Scientia Plena, 8(5): [059904]1-14. Vadrevu, K. P., Eaturu A. & Badarinath K. V. S. 2010. Fire risk evaluation using multicriteria analysis - a case study. Environmental Monitoring and Assessment, 166(1): 223-239. 199