LIGANTES ACTIVADOS ALCALINAMENTE. REACTIVIDADE DE LAMAS RESIDUAIS DE MINAS APÓS CALCINAÇÃO.

Documentos relacionados
Tratamento Térmico das Lamas Residuais das Minas da Panasqueira: Influência do Tempo e da Temperatura de Calcinação.

INFLUÊNCIA DA ADIÇÃO DE CARBONATO DE SÓDIO NA REACTIVIDADE TÉRMICA DE LAMAS RESIDUAIS DE MINAS DE TUNGSTÉNIO

Investigação sobre a evolução da resistência em argamassas geopoliméricas à base de lamas residuais das Minas da Panasqueira

Estudos Sobre a Composição de Argamassas Obtidas Através da Activação Alcalina de Lamas Residuais de Minas

Estudos Sobre a Composição de Argamassas Obtidas Através da Activação Alcalina de Lamas Residuais de Minas

Contributos para o Estudo da Composição de Ligantes Obtidos por Activação Alcalina de Lamas Residuais das Minas da Panasqueira

F.PachecoTorgal, J.P. de Castro Gomes, Said Jalali

Produtos de hidratação de ligantes obtidos por activação alcalina de lamas residuais das Minas da Panasqueira. Fernando Pacheco Torgal 1,

Argamassas Obtidas Através da Activação Alcalina de Lamas Residuais de Minas. Eficiência Técnico-Económica na Reparação de Elementos de Betão.

Utilização de argamassas geopolíméricas em alternativa às resinas epoxídicas na reabilitação de betão com CFRP. Fernando Pacheco Torgal 3,

Ligantes obtidos por activação alcalina de lamas residuais das Minas da Panasqueira. Resistência ao desgaste e ao ataque de soluções ácidas

MÉTODOS DE DETERMINAÇÃO DA REACTIVIDADE DE UMA POZOLANA

Utilização de Ligantes obtidos por Activação Alcalina de Lamas de Minas para Reparação de Estruturas de Betão

ADIÇÕES OU SUBSTITUTOS PARCIAIS DO CIMENTO PORTLAND

ARGAMASSAS E CONCRETOS ADIÇÕES

SÍNTESE DE MATERIAIS GEOPOLIMÉRICOS USANDO COMO ATIVADOR ALCALINO KOH

Tema: Geopolímeros à base de ativadores com desempenho ambiental melhorado

PRINCIPAIS COMPONENTES DO CRÚ E DO CLÍNQUER PORTLAND

LIGANTES OBTIDOS POR ACTIVAÇÃO ALCALINA DE LAMAS RESIDUAIS DAS MINAS DA PANASQUEIRA. PARTE ΙΙ. DURABILIDADE E POSSIBILIDADE DE CONTAMINAÇÃO AMBIENTAL

Agradecimentos... i - iv. Índice Geral... v - x. Índice de Figuras... xi - xvi. Índice de Quadros...xvii xx. Bibliografia...

Efeito do Processo de Calcinação na Atividade Pozolânica da Argila Calcinada

Introdução. Palavras-Chave: Reaproveitamento. Resíduos. Potencial. Natureza. 1 Graduando Eng. Civil:

DESENVOLVIMENTO DE LIGANTES HIDRÁULICOS A PARTIR DE RESÍDUOS SÓLIDOS INDUSTRIAIS

A INFLUÊNCIA DO METACAULINO NO CONTROLO DA REACÇÃO ALCALI-SÍLICA

04/02/16 UTILIZAÇÃO DA TÉCNICA DE ATIVAÇÃO ALCALINA DE RESÍDUOS NA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO. Objetivo

INFLUÊNCIA DA CONCENTRAÇÃO DE HIDRÓXIDO DE SÓDIO NA SÍNTESE DE GEOPOLÍMERO USANDO A ESCÓRIA COMO PRECURSOR

ESTUDO DO EFEITO POZOLÂNICO DA CINZA VOLANTE NA PRODUÇÃO DE ARGAMASSAS MISTAS: CAL HIDRATADA, REJEITO DE CONSTRUÇÃO CIVIL E CIMENTO PORTLAND

1. Introdução. 2. Objetivos

AVALIAÇÃO DA RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO E DA MORFOLOGIA DE CINZAS VOLANTES ÁLCALI-ATIVADAS A PARTIR DE SOLUÇÃO COMBINADA DE NAOH E CA(OH)2

INFLUÊNCIA DA CONCENTRAÇÃO MOLAR DA SOLUÇÃO ATIVADORA E DA RAZÃO ATIVADOR/PRECURSOR NA RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO DE ARGAMASSAS GEOPOLIMÉRICAS*

ESTUDO DE 27 Al RMN-MAS E DE 29 Si RMN-MAS DE CINZAS VOLANTES ÁLCALI- ATIVADAS À BASE DE SOLUÇÃO COMBINADA DE NaOH E Ca(OH)2

2.A economia do carbono

Avaliação da resistência mecânica em geopolímeros a base de cinza pesada mediante otimização de cura térmica

LIGANTES OBTIDOS POR ACTIVAÇÃO ALCALINA DE LAMAS RESIDUAIS DAS MINAS DA PANASQUEIRA. PARTE Ι. PROPRIEDADES FISICAS E MECÂNICAS

CIMENTOS ESPECIAIS. Cimento Supersulfatado. Constituição. Finura: m 2 /kg. Deteriora-se rapidamente em ambientes humidos.

Engenharia e Vida N.37 julho/agosto

DESENVOLVIMENTO DE GEOPOLÍMEROS A PARTIR DE CINZAS PESADAS POR ATIVAÇÃO ALCALINA

AGLOMERANTE LIVRE DE CIMENTO ATIVADO POR DIÓXIDO DE CARBONO: POTENCIAL E DESAFIOS

Sílica Ativa e Cinza Volante. Matheus Hornung de Souza Pedro Mozzer

ESTUDO DAS PROPRIEDADES DE ARGAMASSAS DE CAL E POZOLANA: INFLUÊNCIA DO TIPO DE METACAULIM

INFLUÊNCIA DA CALCINAÇÃO COMPLETA DO METACAULIM NA RESISTÊNCIA MECÂNICA DE ARGAMASSAS GEOPOLIMÉRICAS*

Argamassas de cal aérea e cinza de casca de arroz. Influência da finura da cinza na reactividade pozolânica

AVALIAÇÃO MECÂNICA E DIFRAÇÃO DE RAIO-X DE ARGAMASSAS ÁLCALI-ATIVADAS CONTENDO AREIA DE FUNDIÇÃO

LIGANTES HIDRÓFILOS. Hidráulicos. Aplicações argamassas e betões. resistem à água. - cal hidráulica - cimento. aéreos. não resistem à água

ESTUDO DA INFLUÊNCIA DA TEMPERATURA NA OBTENÇÃO DE HIDROXIAPATITA PARA FINS BIOMÉDICOS

Gina Matias, Isabel Torres, Paulina Faria

CAL AÉREA E CAL HIDRÁULICA

CONSIDERAÇÕES ACERCA DA PRÉ-FABRICAÇÃO COM BETÕES À BASE DE LIGANTES GEOPOLIMÉRICOS

ATIVAÇÃO ALCALINA DE CINZAS VOLANTES UTILIZANDO SOLUÇÃO COMBINADA DE NaOH E Ca(OH) 2

Programa de Pós-Graduação em Engenharia Urbana. Universidade Estadual de Maringá Centro de Tecnologia Departamento de Engenharia Civil.

Formulação de Argamassas Ativadas Alcalinamente

HIDRATAÇÃO. Hidratação e microestrutura

LIGANTES E CALDAS BETÃO

ARGAMASSAS E CONCRETOS RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO

Materiais de Construção Civil. Aula 06. Aglomerantes e Cal

Argamassas geopoliméricas à base de cinzas volantes álcali-ativadas contendo areia de fundição

GEOPOLÍMEROS A BASE DE METACAULIM E NAOH EM DIFERENTES CONCENTRAÇÕES COM VARIAÇÃO NA PROPORÇÃO DE NAOH/NA2SIO3

Resíduos reciclados como componentes de argamassas.

Geopolimeros com base em cinzas volantes activadas com NaOH y Ca(OH) 2. : caracterização microestrutural por RMN-MAS 29 Si y 27 Al

Materiais constituintes do Concreto. Prof. M.Sc. Ricardo Ferreira

MCC I Cal na Construção Civil

ESTUDO DO TEOR DE ATIVADOR NO DESEMPENHO DE CIMENTOS ÁLCALI ATIVADOS FEITOS COM ESCÓRIAS ÁCIDAS EM IDADES INICIAIS.

1. Introdução. 2. Materiais e Método. Daniela L. Villanova a *, Carlos P. Bergmann a

INFLUÊNCIA DA CINZA DE CASCA DE ARROZ AMORFA E CRISTALINA E DA SILICA ATIVA NA REAÇÃO ÁLCALI AGREGADO.

Avaliação da reatividade do metacaulim reativo produzido a partir do resíduo do beneficiamento de caulim como aditivo na produção de argamassa

J.P. Castro Gomes (1991), Trabalhos de Geotecnia, Relatório de Estágio Curricular de Licenciatura, Universidade do Minho, Guimarães, Julho.

SUBSTITUIÇÃO DE CIMENTO POR FINOS CERÂMICOS EM ARGAMASSAS

Ciências da Arte e do Património

Considerações acerca da pré-fabricação com betões á base de ligantes geopoliméricos

AGLOMERANTES. Definição: 22/2/2011

8/2/2011 AGLOMERANTES. Definição: Exemplos: Aglomerantes. Nomenclatura. Relação Pega x Endurecimento. Propriedades. Argila Gesso Cal Cimento Betume

INCORPORAÇÃO DE LAMA VERMELHA IN NATURA E CALCINADA EM CERÂMICA VERMELHA

Avaliação da Reatividade do Carvão Vegetal, Carvão Mineral Nacional e Mistura Visando a Injeção em Altos- Fornos

SÍNTESE E CARCATERIZAÇÃO DE BETA FOSFATO TRICÁLCICO OBTIDO POR MISTURA A SECO EM MOINHO DE ALTA ENERGIA

Argamassas com Base em Cal Aérea e Cinzas de Casca de Arroz para Conservação do Património Construído

Análise microestrutural de geopolímero desenvolvido a partir de cinza de olaria, tijolo refratário dolomítico post-mortem e metacaulim

Estudo da influência de cargas leves nas propriedades de uma argamassa bastarda. Lisboa, 24 de Novembro 2005

PANORAMA DO COPROCESSAMENTO DE RESÍDUOS EM FORNOS DE CIMENTO NO BRASIL

Cimento Portland CIMENTO CLÍNQUER. Sumário CIMENTO PORTLAND

6º CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO EM PETRÓLEO E GÁS

MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO CAL

SÍNTESE DE BETA FOSFATO TRICÁLCICO, POR REAÇÃO DE ESTADO SÓLIDO, PARA USO BIOMÉDICO

AVALIAÇÃO DE PARÂMETROS FÍSICOS E QUÍMICOS PARA A PRODUÇÃO DE ARGAMASSAS UTILIZANDO CINZA VOLANTE E RESÍDUO DA CONSTRUÇÃO CIVIL

Hidratação do Cimento

OBJECTIVOS E ESTRUTURA DO TRABALHO

Nuno Amadeu Antunes Dias Geopolímeros: Contributos para a redução das eflorescências

Sumário. Conceitos. Conceitos Produção e consumo Tipos e aplicações Composição química Características dos compostos Leitura obrigatória

Sumário. Conceitos. Conceitos Produção e consumo Tipos e aplicações Composição química Características dos compostos Leitura obrigatória

21º CBECIMAT - Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais 09 a 13 de Novembro de 2014, Cuiabá, MT, Brasil

08:59 1. Ligantes de construção cimento, cal, gesso, betume, asfalto (hidrófobos)

Curso: Engenharia Civil

INTRODUÇÃO AOS PROCESSOS METALÚRGICOS. Prof. Carlos Falcão Jr.

CARACTERIZAÇÃO MECÂNICA EM FLEXÃO DE BETÕES DE RESINA

ELEMENTOS CONSTITUINTES DO CONCRETO

ESCOPO DA ACREDITAÇÃO ABNT NBR ISO/IEC ENSAIO

JULIANO PEDRO SCANDOLARA

Ligantes obtidos por activação alcalina. Parte 1 - Durabilidade. Fernando Pacheco Torgal 1,, Said Jalali 2

ROCHA ARTIFICIAL PRODUZIDA COM PÓ DE ROCHA E AGLOMERANTE POLIMÉRICO AGUIAR, M. C., SILVA. A. G. P., GADIOLI, M. C. B

Fornos tradicionais do Alentejo: processo de fabrico da cal. Maria Goreti Margalha

Sistemas de fácil utilização

Transcrição:

LIGANTES ACTIVADOS ALCALINAMENTE. REACTIVIDADE DE LAMAS RESIDUAIS DE MINAS APÓS CALCINAÇÃO. Fernando Torgal J.P. Castro Gomes Said Jalali Assist. Engº Civil Prof. Engº Civil Prof. EngºCivil ESTCB UBI UM PORTUGAL PORTUGAL PORTUGAL SUMÁRIO No presente trabalho analisou-se a influência do tempo e da temperatura de calcinação em forno estático, na reactividade de lamas residuais de minas. Os resultados do processo de desidroxilação foram analisados através de ensaios de difracção de raio-x, da resistência á compressão em argamassas activadas alcalinamente e da análise da sua microestrutura. Os resultados evidenciam uma destruição parcial da estrutura cristalina, originando um material amorfo de características reactivas. ABSTRACT This work reports the influence of time and temperature calcination in a static furnace, over the reactivity of mine waste mud. Results of the dehydroxylation process are presented by x-ray diffraction, compressive strength of alkali-activated mortar specimens, imaging of polished samples in the SEM and also from x-ray microanalysis (EDS). Results show a partial destruction of the crystalline structure originating a high reactivity material.

1. Introdução O cimento Portland é em termos mundiais, o material mais utilizado na industria da construção, sendo simultaneamente responsável por um elevado nivel de emissões de CO 2 (1 ton of cimento gera 1 ton. de CO 2 ). O seu uso tende por isso a ser cada vez menos competitivo quando comparado com novos ligantes mais amigos do ambiente, como os ligantes obtidos pela activação alcalina de sub-produtos industriais (cinzas volantes e as escórias), que representam uma alternativa ecologicamente mais sustentável, devido ao facto de serem responsáveis por um nível de emissões CO 2 muito inferior [1-4]. Em Portugal a produção de escórias e de cinzas volantes é em termos globais de 0,4 milhões de ton. (Mt) por ano, o que representa somente 4% da produção global de cimento Portland [5]. Contudo o volume de produção de residuos industrias de minas e pedreiras é de aproximadamente 16 Mt/ano [6] significando isso que é viável desenvolver ligantes amigos do ambiente obtidos por activação alcalina de alumino-silicatos, provenientes dos resíduos de minas e pedreiras. Algumas investigações sobre a activação alcalina de diferentes minerais, sugerem a possibilidade da utilização de um vasto leque de minerais aluminosilicatados poderem ser usados como precursores [7]. No entanto, importa ter em conta que esses estudos foram levados a cabo com espécies minerais com um elevado grau de pureza misturadas com metacaulino, um material muito reactivo, pelo que não razoável esperar que resíduos minerais analisados sem qualquer tipo de mistura, apresentem o mesmo nível de comportamento físico. O objectivo do presente trabalho é o de investigar o aumento da reactividade lamas residuais de minas por tratamento térmico, em termos da sua activação com soluções alcalinas. 2. Investigação experimental 2.1 Composição mineralógica e quimica A composição mineralógica deduzida a partir do estudo dos espectros de difracção de raio-x (XRD) usando um difractómetro do tipo Rigaku GeigerFlex, consiste em muscovite e quartzo, identificados pelos seus espectros caracteristicos: muscovite (cartão 46-1409 e quartzo (cartão 46-1405). A composição química das lamas residuais foi obtida pelo recurso a um espectómetro de absorção atómica. Os valores da Tabela 1 mostram que as lamas residuais de minas analisadas neste trabalho, consistem essencialmente em silica e alumina, contaminadas por sulfuretos e arsénio e com elevados teores de ferro e de potássio, o qual de acordo com Xu et al.[7] é um dos elementos que contribui de forma significativa para a resistência à compressão dos ligantes do tipo geopolimérico. Aquele autor a partir do facto de se saber que o óxido de ferro contribui para a resistência do CPN, suscita também a hipótese do óxido de ferro dos materiais de partida poder contribuir para a resistência dos ligantes activados alcalinamente, contudo Fernandez-Jimenez & Palomo [8] acham que o óxido de ferro não contribui para a resistência, de ligantes activados alcalinamente à base cinzas por não fazerem parte dos produtos de reacção principais. Contudo tal pode ficar a dever-se ao facto daqueles autores de terem utilizado um activador simples à base de hidróxido de sódio, enquanto que para outros autores [9]é o silicato de sódio que tem a capacidade de formar compostos insolúveis com o óxido de ferro. Tabela 1- Composição quimica das lamas SiO 2 Al 2 O 3 Fe 2 O 3 K 2 O Na 2 O Mg O S O 4 Ti O 2 As Outros óxidos 52,04 19,1 11,37 8,02 0,30 1,44 2,93 1,28 0,63 2,89

A razão atómica SiO 2 /Al 2 O 3 é de 5,5, maior que aquela sugerida por Davidovits de 2 para a execução de cimento e betão geopolimérico, contudo Teixeira-Pinto [10] usando misturas de metacaulino e hidróxido de cálcio activadas alcalinamente concluiu que a utilização de razões atómicas SiO 2 /Al 2 O 3 = 5,1 conduziram a melhores resultados á compressão. 2.2 Tratamento térmico As lamas residuais foram alvo de tratamento térmico, com vista a obter um aumento da sua reactividade por via da sua desidroxilação estrutural. O tratamento térmico teve lugar num forno estático previamente aquecido até á temperatura de calcinação. Foram usadas amostras com uma massa de 2,5 Kg colocadas num recipiente de aço inox por forma a que a sua altura não excedesse 5cm. As transformações estruturais foram analisadas através de XRD, das lamas calcinadas após arrefecimento brusco para evitar a cristalização do material. Na Tabela 2 apresentam-se os resultados da influência da temperatura de calcinação nos espectros de difracção de raio-x. Os espectros de XRD indicam que não teve lugar uma destruição total da estrutura da muscovite. Pode constatar-se também que o tratamento térmico provocou um aumento do bakground global (BG) que traduz o aumento da fase amorfa visível nos espectros de XRD e consequentemente do aumento da reactividade das lamas, ocorrendo na sua maioria no intervalo de temperatura 850 e 950ºC, sendo este comportamento térmico semelhante ao de outros minerais argilosos da família dos filosilicatos [11]. O principal pico de muscovite (2θ=8,8º) continua a existir mesmo apósnuma temperatura de calcinação de 950º C, embora tenha diminuído consideravelmente de intensidade. Medidas sobre a área dos picos indicam que cerca de 12% da estrutura da muscovite conseguiu resistir á temperatura de 950º C. Para este nível de temperatura alguns investigadores concluem que o processo de desidroxilação em amostras de muscovite se encontra concluído [12]. Outros autores referem no entanto a ocorrência da desidroxilação da muscovite para uma temperatura de 800ºC [13]. Este resultado deve no entanto ser analisado com as devidas reservas inerentes à diferença na composição química da muscovite utilizada por aqueles autores, que contém bastante mais alumina (34,5%) do que a das amostras utilizadas no presente trabalho (16,7%). Por outro lado lado Taboadela & Ferrandis [14] referem também que o teor de óxido férrico determina diferentes comportamentos durante a desidroxilação de argilas, pelo que os resultados relativos à temperatura de desidroxilação obtidos por Barlow & Manning [13], diferem dos obtidos no presente trabalho também devido ao teor de óxido férrico da muscovite utilizada por aqueles autores, (2,16%) contra (12,3%) no último caso. Tabela 2 Influência do tratamento térmico na difracção de raio-x XRD Temperatura de calcinação (ºC) 650 750 850 950 2θ 8,845 8,807 8,803 8,806 Área do principal pico 51 47,4 40,8 11,5 de muscovite (%) BG(%) 33,5 33,7 40,5 58,3

2.3 Resistência à compressão de argamassas A reactividade das lamas foi analisada também, através da resistência à compressão de argamassas activadas por intermédio de um activador alcalino. A composição do activador e da argamassa baseiam-se nos resultados de diversas amassaduras preliminares que não apresentaram qualquer resistência à compressão. Algumas delas que continham somente hidróxido de sódio como solução de activação, ou que não continham hidróxido de cálcio, não chegaram sequer a endurecer. Descrevem-se em seguida as condições utilizadas no fabrico das argamassas. A relação em massa da areia:lamas:activador foi de 1:1:1. Foi utilizado um activador á base de hidróxido de sódio na concentração 12M e silicato de sódio. A relação em massa entre hidróxido de sódio/silicato de sódio foi 1:2,5. Foi utilizada água destilada para dissolver as palhetas do hidróxido de sódio. Para a execução das argamassas foi utilizado hidróxido de cálcio na proporção de 1:5 para as lamas residuais. As amostras foram curadas à temperatura ambiente até serem ensaiadas à compressão respectivamente aos 7, 14 e 28 dias de cura, tendo a resistência á compressão sido obtida a partir do valor médio de 3 cubos de 50x50x50 mm 3 de acordo com a norma ASTM C 109. Os valores médios para lamas residuais não calcinadas foram 8,4-9,3-11,2 MPa, respectivamente para os 7,14 e 28 dias de cura. Estes valores são francamente baixos atendendo aos altos valores de resistência à compressão característicos dos ligantes activados alcalinamente. Alem disso aqueles resultados caracterizam um material endurecido, cujo rearranjo estrutural é pouco ineficaz, como se depreende da visualização dos provetes, que reagem facilmente com a humidade atmosférica gerando à superfície uma profusão de sais brancos, característicos da formação de carbonato de sódio por reacção do dióxido de carbono com o sódio que não hidratou. A resistência á compressão de argamassas activadas alcalinamente à base de lamas residuais de minas após o tratamento térmico para 28 dias de cura é apresentada na Figura 1. A calcinação abaixo dos 750º C em termos da resistência à compressão é quase idêntica à obtida sem tratamento térmico e não tem praticamente qualquer influência na resistência das argamassas activadas alcalinamente, o que significa que para este nível de temperatura não há qualquer aumento da reactividade das lamas. Aumentando a temperatura para 800º C nota-se alguma reactividade das lamas apenas no entanto para um tempo de exposição muito elevado. A calcinação entre 850º C e 900º C durante 300 minutos provoca resistências à compressão similares, mas inferiores à obtida para 950ºC durante 2 horas, onde se nota efectivamente uma alteração substancial na reactividade do material. O tratamento térmico das lamas residuais para uma temperatura de 950ºC durante 2 horas aumenta substancialmente a resistência à compressão de aproximadamente mais de 300% sobre as lamas não tratadas termicamente. Este fenómeno fica a dever-se á ocorrência de um processo de desidroxilação que confere á muscovite características reactivas pelo aumento do seu carácter amorfo. O aumento da temperatura acima dos 950ºC não conduz ao aumento da resistência das argamassas, devido ao facto de haver formação de fases cristalinas como a mulite. 2.4 Microstrutura e EDS As figuras 2 e 3 apresentam imagens da microestrutura obtida por electrões retroespalhados (SEM) em superfícies polidas das argamassas activadas alcalinamente. Foram analisadas amostras calcinadas para diferentes tempos e temperaturas de queima. A análise da sua composição química foi obtida por EDS e apresenta-se no Tabela 3.

45 40 Temperatura 750 ºC Resistência à compressão (MPa) 35 30 25 20 15 10 5 0 0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 Tempo de calcinação ( minutos) 800 ºC 850 ºC 900 ºC 950 ºC 1000 ºC 1050 ºC Não calcinada Figura 1 Resistência á compressão em argamassas com lamas calcinadas para vários tempos e temperaturas de queima 2.4 Microstrutura e EDS Na microestrutura da amostra designada por Fig 2a) apesar da existência de uma vasta área preenchida por resina é já contudo possível notar-se uma área uniforme que parece indicar a formação de material com algum grau de hidratação. As áreas identificadas por A e B e atendendo à sua composição podem ser consideradas silicatos de cálcio hidratados (CSH), apresentando contudo razões atómicas CaO / SiO 2 (C/S) muito diferentes. Na amostra designada da Fig 2b) que corresponde a condições de calcinação de 1000º C durante 300 minutos, notam-se também algumas zonas preenchidas por resina epoxi, indiciando baixas condições de hidratação que ficam a dever-se à possível formação de compostos cristalinos por fusão da alumina, fenómeno que se inicia acima de 850º C. As áreas identificadas por C e D podem também ser consideradas silicatos de cálcio hidratados, com razões C/S muito similares e típicas de ligantes obtidos por activação alcalina, obtidas por outros autores [15-18]. A Figura 3 apresenta imagens da microestrutura de argamassas activadas alcalinamente utlizando lamas calcinadas a 950º C durante 120 min.

C A a) b) B D Figura 2 Fotografias SEM em argamassas activadas alcalinamente utilizando lamas calcinadas para diferentes tempos e temperaturas de queima:a) 800º C durante 480 min.;b) 1000º C durante 300 min. Estas podem distinguir-se das anteriores pelo superior grau de uniformidade associado a uma maior reactividade das lamas calcinadas nestas condições e consequentemente de menos vazios com resina epóxi. As áreas identificadas por E e F podem ser consideradas silicatos de cálcio hidratados, e apresentam-se com razões C/S muito diferentes entre si, sendo a da zona F invulgarmente alta, pelo que podemos estar em presença de uma partícula de cálcio. As áreas G, H e I, consistem em sílica, alumina e sódio com vestígios de cálcio podendo ser consideradas compostos geopoliméricos. O que confirma resultados obtidos por outros autores, que confirmam ser possivel a formação simultânea de gel geopolimérico e gel de silicato de cálcio hidratado no mesmo ligante [19]. I E F H G Figura 3 Fotografia SEM em argamassas activadas alcalinamente utilizando lamas calcinadas a 950º C durante 120 min.

Tabela 3 Análise da composição obtida por EDS Amostras Razão atómica 800º C 480 min. 1000º C 480 min. 950º C 120 min. A B C D E F G H I Al 2 O 3 / SiO 2 - - - - 0,04 0,02 0,4 0,3 0,4 Al 2 O 3 / Na 2 O - - - - 0,2 0,3 2,8 1,5 2,3 Ca O / SiO 2 2,4 0,8 1,1 0,8 0,9 1,6 0,02 0,03 0,1 Na 2 Oeq / Ca O 0,04 0,1 0,2 0,2 0,2 0,1 8,4 6,3 1,6 Al 2 O 3 / Ca O - - - - 0,04 0,01 23,1 9,1 3,8 3. Conclusões As lamas residuais de minas ao serem activadas alcalinamente mostram possuir alguma reactividade, embora somente com recurso a sílica solúvel e à adição de hidróxido de cálcio. A alteração estrutural devida ás condições óptimas de calcinação é parcial permanecendo ainda parte da estrutura cristalina original. Elevadas temperaturas de calcinação provocam o aparecimento de fases cristalinas que diminuem substancialmente a reactividade das lamas. Este resultado é confirmado quer pela análise estrutural de espectroscopia de raio-x que confirma a existência de fases cristalina mesmo após a calcinação a 950º C /2 horas. A calcinação das lamas aumenta a sua reactividade em termos de activação alcalina em mais de 300% para o par temperatura /tempo de 950º C/2 horas, o que se fica a dever ao estado amorfo do material devido aos rearranjos estruturais provocados pela saída de hidróxilos OH e à diminuição da cristalinidade estrutural do material. 4. Agradecimentos Os autores agradecem a colaboração do Centro de Óptica da Universidade da Beira Interior, na realização das analise de microestrutura e de EDS. 5. Referências [1] UNFCCC - Kyoto Protocol to the United Nations framework convention on climate change,united Nations convention on climate change, FCC/CP/L.7/Add1, Kyoto [2] European Environmental Agency, Greenhouse gas emission trends and projections in Europe 2004. EEA Technical Report Nº 5/2004. [3] Torgal, F. Pacheco et al. - Ligantes geopoliméricos: Uma alternativa ambiental no contexto da economia do carbono", Revista Betão,Associação Portuguesa das Empresas de Betão. Lisboa 2005, pp. 37-46 [4] Roy, Della M., - Alkali activated cements, Opportunities and challenges. Cement and Concrete Research 29, 1999, 249-254. [5] Instituto Português de Resíduos - Produção de escórias e cinzas no ano 2002. 2004. [6] Instituto Português de Resíduos - Estudo de avaliação dos residuos industriais. Relatório final."2004. [7] Xu, Hua; Deventer, J. S. J. - The geopolymerisation of alumino-silicate mineral. International Journal of Mineral Processing 59, 2000, 247-266.

[8] Fernandez Jimenez, A.; Palomo, A. Characterisation of fly ashes. Potential reactivity as alkaline cements. Fuel 82 (2003) 2259-2265. [9] McDonald, Mike et al. Sodium Silicate a binder for the 21 st century. PQ Corporation. Industrial Chemical Division 2005. [10] Teixeira Pinto, A. - Activação alcalina de sistemas ligantes á base de metacaulino. Doutoramento, 2004, Universidade do Minho. [11] He, Changling et al. - Thermal stability and pozzolanic activity of raw and calcined illite. Applied Clay Science 9,1995, 337-354 [12] Kalinichenko, E. A et al. - The study of the kinetics and the mechanism of dehydroxylation in muscovite by ESR on Fe3+. Physics and Chemistry of Minerals 24 1997 520-527. [13] Taboadela, M.; Ferrandis, V. The differential thermal analysis investigation of clays. Ed. R. C. Mackenzie, 1957, 165-190 Mineralogical Society London [14] Barlow, S.; Manning, D. Influence of time and temperature on reactions and transformations of muscovite mica. British Ceramic Transactions 98 1999, 122-126 [15] Richardson, I. G.; Cabrera, J.G. The nature of CSH in model slag cements. Cement and Concrete Composites 22 2000, 259-266 [16] Hihua, Pan; Dongxu, Li; Jian, Yu; Nanry, Yang Hydration products of alkaliactivated slag red mud cementitious material. Cement and Concrete Research 32 (2002) 357-362. [17] Brough; A. R.; Atkinson, A. Sodium silicate-based alkali-activated slag mortars. Part I. Strength, hydration and microstructure. Cement and Concrete research 32 (2002) 865-879. [18] Puertas, F.; Fernandez-Jimenez, A. Mineralogical and microstrutural characterisation of alcali-activated fly ash/slag pastes. Cement and Concrete Composites 25 (2003) 287-292. [19] Yip, C. K.; Deventer, S. J. S. - Microanalysis of calcium silicate hydrate gel formed within a geopolymeric binder. Journal of Materials Science 38 (2003) 3851-3860. Fernando Torgal J.P. Castro Gomes Said Jalali Assist. Engº Civil Prof. Engº Civil Prof. Engº Civil ESTCB UBI UM