MORADIA DOS POBRES: CORTIÇOS, CASEBRES E PALHOÇAS UMA AMEAÇA À SAÚDE PÚBLICA EM SÃO LUÍS NA PRIMEIRA REPÚBLICA (1889-1920).



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Transcrição:

MORADIA DOS POBRES: CORTIÇOS, CASEBRES E PALHOÇAS UMA AMEAÇA À SAÚDE PÚBLICA EM SÃO LUÍS NA PRIMEIRA REPÚBLICA (1889-1920). Profa. Msc. Maria da Conceição Pinheiro de Almeida. A cidade de São Luís, no início da República, a exemplo do que acontecia na maioria das capitais brasileiras, enfrentava problemas sérios referentes às questões sanitárias, com a inexistência de serviços básicos de saneamento, tais como, água encanada, esgoto sanitário, coleta regular de lixo, disponíveis para grande parcela da população. As esferas estadual e municipal não apresentavam políticas públicas de saúde que contemplassem a oferta desses serviços a curto e médio prazo. Por outro lado, era urgente que algo fosse feito a fim de sanear a capital do Estado e pudesse diminuir a vulnerabilidade da cidade em abrigar uma série de enfermidades, tanto endêmicas quanto epidêmicas, como vinha acontecendo ao longo de sua história. Sem condições de resolver a questão do saneamento, em princípio, as autoridades locais investiram na política de evitar o surgimento das doenças, especialmente, as que pegavam, através do incentivo à higienização da cidade, criando para isso todo um aparato legal contendo uma série de normas de higiene a serem seguidas pelos habitantes locais, e, visando garantir o cumprimento dessas normas pela população da cidade, investiram num forte esquema de fiscalização, voltado especialmente aos ambientes ocupados pelas camadas mais pobres da população, pois, em regra geral, o surgimento das enfermidades se dava em suas moradias, formadas por cortiços, casebres ou palhoças, como eram conhecidas as mesmas. De um modo geral, a campanha de higienização nas cidades tinha como alvo principal as camadas pobres da sociedade, vistas pelas elites como classes perigosas, em princípio por oferecerem problemas à ordem pública, e depois por representarem também o perigo do contágio, especialmente, devido aos hábitos de moradia, os quais eram considerados 1

nocivos à sociedade como um todo 1, e por isso, ponto de partida para as políticas de saúde pública no Brasil do início da República. Nas primeiras décadas da República, na grande maioria das cidades brasileiras, e é o caso de São Luís, as camadas pobres da população dividiam os mesmos espaços com as elites, razão pela qual seus hábitos de moradia incomodavam ainda mais, visto que, gente morando em precárias condições não só agredia a vista, o olfato, a saúde, quem sabe a vida das elites dirigentes. Era uma chaga exposta, um problema a ser resolvido. 2 A população pobre em São Luís, inicialmente, ocupava, sobretudo, os baixos de sobrados, preterido pelas famílias mais abastadas (que em regra ocupavam os andares superiores), os quais representavam os cortiços da cidade, uma vez que esses locais eram subdivididos, transformados em habitações coletivas, e posteriormente alugados por seus proprietários às famílias humildes da cidade. Cada família tinha à sua disposição dois cômodos ligados entre si, porém inteiramente isolados do resto da casa. As famílias ocupantes desse tipo de moradia não tinham direito à cozinha, à latrina, ao uso do quintal e menos ainda água canalizada. Assim, eram obrigados a fazer dos cômodos que dispunham, sala, quarto de dormir, varanda, cozinha e latrina. 3 As condições higiênicas desse tipo de habitação eram degradantes, conforme descreve o Relatório do Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural do Maranhão:... a umidade do ambiente, a obscuridade, o mau cheiro que ali reina proveniente dos objetos lançados durante o dia em latas e em outros depósitos, de odores de comida, feita nessa área quase fechada, de emanações individuais tornadas mais fortes pela escassez de água para o banho, do lixo guardado a um canto para despejos noturnos(na via pública)... 4 A Lei Sanitária de 1904 apresentava em seus artigos a preocupação com esse tipo de moradia coletiva, procurando evitar a ocupação dos baixos de sobrados quando esses não atendessem às mínimas condições de higiene, e representassem perigo à saúde pública, conforme se pode observar na recomendação abaixo contida no art. 67 dessa Lei: 2

Quando os prédios de habitação coletiva, por suas más condições higiênicas, não puderem continuar a servir sem perigo para a saúde pública, o Inspetor Sanitário intimará os proprietários, arrendatários ou locatários a fechá-lo dentro do prazo que fixar, não podendo os mesmos ser reabertos senão depois de feitos os melhoramentos exigidos... 5 Ou ainda como mostra o art. 71 da mesma Lei:... não se pode permitir a moradia em baixo de sobrados ou de outras dependências de prédios desde que não recebam ar e luz diretos e mais ainda se não tiverem instalações próprias para cozinha, latrina e quintal, sob pena de vinte mil réis de multa 6 Percebemos, por outro lado, que os baixos de sobrados continuaram servindo de habitação para as famílias humildes de São Luís por bastante tempo, apesar das recomendações contidas na Lei Sanitária de 1904, e sem que nenhuma melhoria fosse feita nesse tipo de moradia, conforme nos mostra a Lei Sanitária de 1916 em seu art. 49: Após dois anos a contar da data da publicação dessa Lei, não será mais permitida a moradia em baixo de sobrados que não possuam boas condições higiênicas e todas as instalações necessárias ao uso dos seus habitantes 7. O Relatório apresentado pelo Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural do Maranhão aponta em 1923 que, sob pressão das autoridades sanitárias, alguns desses baixos de sobrados perderam a função domiciliária. O fim da função domiciliária de alguns baixos de sobrados, aliado ao aumento da população urbana de São Luís registrado no início do século XX, levou as classes pobres de São Luís aos chamados bairros pobres, surgidos no perímetro urbano da cidade, como Baixinha, Cambôa do Mato e Codozinho, onde foram erguidas um sem número de palhoças. 8 As palhoças em São Luís eram casebres cobertos, e por vezes tapados com palhas da palmeira de babaçu. Aliás, casebres eram habitações comuns em outras cidades brasileiras no início do século XX, e presentes, inclusive nos dias atuais, representando uma alternativa de 3

moradia para os excluídos urbanos, trazendo consigo toda a carga negativa das moradias dos pobres. 9 O Relatório do Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural do Maranhão descrevia as palhoças como... simples abarracamento, lôbregos, em áreas de restritas dimensões, baixos, de paredes esburacadas, feitas de taipa ou palha, dotados em regra de um simples compartimento.(...) moradores, gente doentia, (...) clientes demorados diários do Posto de Profilaxia, que com eles emprega grande parte do pessoal do serviço para visitas e fiscalização domiciliares. 10 Das palhoças dizia ainda o referido Relatório:... construídas pelo Géca(...) sem ar, sem luz, sem asseio; casas de solo lodacento no inverno; de paredes gretadas e anfractuosas onde se esconde a vermina e a sujeira;... 11 Conforme dados desse Relatório, havia em São Luís, cerca de 1.166 palhoças nos bairros populares da Baixinha, Cambôa do Mato e Codozinho, abrigando um total de 5.162 pessoas. As ações sanitárias em relação às moradias dos pobres em São Luís, recaía sobretudo nos baixos de sobrados, onde pobres e ricos ocupavam o mesmo espaço, visto que o segundo ou o terceiro andar do prédio era habitado por famílias de maiores posses, inquilinos ou mesmo proprietários. A Lei Sanitária de 1916 em seu Capítulo V, que trata da higiene dos domicílios, normalmente refere-se aos baixos de sobrados utilizando o termo prédio, como mostra o 2º do art. 41: Se o prédio carecer de condições higiênicas por vícios e defeito de construção.... Ou ainda Desocupado o prédio, será lançado interdito... 12, confirmando nossa afirmação sobre os baixos de sobrados como alvos principais das ações sanitárias. A situação da higiene nas palhoças era reconhecidamente precária, porém, segundo consta no Relatório de 1923, pouco ou nada era feito em benefício de seus habitantes. Estes três bairros [Baixinha, Cambôa do Mato e Codozinho] são o mais desolador atestado do 4

absoluto descaso com que os poderes públicos vinham encarando o problema do saneamento e embelezamento urbanos. Procuravam os poderes públicos, antes se livrarem da presença incômoda dos habitantes das palhoças do perímetro urbano, em princípio, proibindo a construção de casas cobertas de palha no perímetro urbano, ou então, a cobertura daquelas já existentes, punindo aos infratores com multas. 13 Já os moradores dos baixos de sobrados tinham seus hábitos por vezes condenados pela imprensa local, como mostra trechos desse artigo publicado no Jornal do Maranhão de 1900: A imprensa tem-se ocupado (...) do péssimo costume que há, sobretudo da parte dos moradores de baixos de sobrados, que não comunicam com os respectivos quintais, de fazer da rua depósito de lixo.(...) Os Srs. Médicos da Inspetoria de Higiene, que andam efetuando visitas sanitárias, se ali fossem verificariam a exatidão do que deixamos afirmado. 14 Finalmente, salientamos que o aparato legal elaborado pelas autoridades políticas e sanitárias para fazer de São Luís uma cidade higienizada, atendendo aos parâmetros de civilização vigentes na época, era inteiramente compatível com o projeto nacional, cujo objetivo maior era eliminar das vistas a pobreza, que, por convicção da elite, era suja, e perigosa. Se o centro era o cartão de visitas, as camadas populares, desalojadas, deveriam ir para os subúrbios. 15 Assim se verificou em Paris, no Rio de Janeiro, em Porto Alegre. As determinações contidas na legislação do período eram praticamente impossíveis de serem cumpridas pela maioria da população, constituída de pessoas pobres, além do que, uma higienização satisfatória deveria contar com os serviços mínimos de saneamento, água canalizada e tratada, esgoto sanitário, coleta regular de lixo, serviço de saúde para atender à população, os quais até hoje a cidade de São Luís carece, e onde os governos daquela época nem de longe acenavam com essa possibilidade. 5

NOTAS: 1 CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte Imperial. São Paulo; Companhia das Letras, 1996, p.29 2 PESAVENTO, Sandra Jatahy. Os pobres da cidade: vida e trabalho 1880/1920. Porto Alegre, Editora Universidade, 1994, p.104 3 Relatório do Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural do Maranhão, 1923. p.137. O Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural do Maranhão foi implantado no Estado em 1919, a partir do segundo movimento sanitarista, que criou a Liga Pro-Saneamento no Brasil em 1918. Ver mais sobre o assunto em Hochman, Gilberto. A era do Saneamento: as bases da política de saúde pública no Brasil. São Paulo: HUCITEC/ANPOCS, 1998. 4 Idem 5 Lei nº 358 de 09 de junho de 1904, que organizava o Serviço Sanitário do Estado e instituía o Código Sanitário de 1904. 6 Idem 7 Lei Sanitária nº 736 de 11 de abril de 1916, que reorganizava o Serviço Sanitário do Estado. 8 Relatório do Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural do Maranhão, Op. Cit. p. 137 9 PESAVENTO, Op.cit., p.116 10 Relatório da Saneamento e Profilaxia Rural do Estado do Maranhão, Op. Cit. p.137 11 Idem 12 Lei Sanitária nº 736, de 11 de abril de 1916. 13 Relatório de Saneamento e Profilaxia Rural do Maranhão, Op. Cit. p.105 14 Jornal da Manhã,29.08.1900. In. ALMEIDA, Maria da Conceição Pinheiro de. A Saúde pública e a pobreza em São Luís na Primeira República 1889/1920. Dissertação de Mestrado; Recife, UFPE, 2002. p.75 15 PESAVENTO, Sandra Jatahy. O imaginário da cidade.: visões literárias do urbano-paris, Rio de Janeiro,Porto Alegre. Porto Alegre; Editora da UFRGS, 2002. p.176 6