Uso de Modelos de Mesoescala na Reavaliação do Potencial Eólico da Região do Campo das Vertentes, MG Adaiana F.G. Silva, Sérgio A.A.G. Cerqueira, Cláudia R.S. Mendes, Cláudio C. Pellegrini Universidade Federal de São João del-rei, email: pelle@ufsj.edu.br ABSTRACT: Wind energy is the fastest growing renewable energy source around the world. In Brazil, an important obstacle to the expansion of the wind energy production is the lack of detailed and reliable information about the wind potential. For much of the Brazilian territory, the sole source of information is the Wind Potential Atlas of Brazil, elaborated through numerical models in the late 1990's, reflecting the technological state of the art of the time. In this work, the MM5 mesoscale model was employed to reevaluate the wind potential of the central region of the state of Minas Gerais. We present maps for the wind speed and the energy flow at the heights of 10, 50 and 80 meters, allowing for the comparison with the existing Atlas but extending the information for both small and large modern day wind turbines. The results show noticeable differences with those found in the Atlas, but also support the existence of high wind potential in areas of the region, mostly associated with elevated terrain. Palavras-chave: potencial eólico regional, modelos de mesoescala 1. INTRODUÇÃO A energia eólica é a fonte renovável com maior crescimento em todo o mundo atualmente, contribuindo significativamente com o total de energia elétrica consumido em países como Dinamarca, Espanha, Portugal e Alemanha. No Brasil, um importante obstáculo à sua expansão é a falta de informações detalhadas a respeito do potencial eólico. Um Atlas do Potencial Eólico do Brasil (Amarante et al., 2001) foi elaborado no final dos anos 90, identificando características gerais do potencial nacional. Coerente com a tecnologia mais avançada à época, fixava-se o potencial para a altura de 50 m do eixo. Hoje são de uso corrente turbinas de maior potência, com altura do eixo na faixa de 80 a 120 m, mas também turbinas de pequeno porte, com alturas na faixa de 10 a 30 m. Mapas regionais, refinando os resultados do Atlas foram elaborados mais recentemente para os estados da Bahia, Alagoas, Rio de Janeiro, Ceará e Rio Grande do Sul, esses dois últimos, em conjunto com o Rio Grande do Norte, os estados brasileiros com maior geração de energia de fonte eólica. Para o estado de Minas Gerais e sua vizinhança, dados mais recentes ainda não foram publicados. O Atlas identifica um potencial de mais de 29 GW, com 54,9 TWh/ano para a região sudeste como um todo, com regiões com elevado potencial no norte do estado de Minas Gerais, no Triângulo Mineiro e em manchas espalhadas pelo estado. Também são relevantes os potenciais de estados vizinhos, em especial o do litoral dos estados do Espírito Santo e Rio de Janeiro. Ainda que o método definitivo para avaliar o potencial eólico de uma região seja a observação direta, com anemômetros instalados em torres micrometeorológicas, este tipo de avaliação ainda não é muito comum devido às dificuldades na instalação das torres e aos elevados custos de manutenção envolvidos. O uso das medidas anemométricas feitas pelas redes sinópticas existentes no país tem sido sugerido como um paliativo para o problema, mas apresenta alguns inconvenientes: (i) as medidas geralmente só se encontram disponíveis por curtos períodos de tempo; (ii) medidas de velocidade são realizadas apenas a 10 m; (iii) as estações geralmente não são localizadas em sítios apropriados ao levantamento de potencial eólico. Para contornar o problema, Atlas eólicos tem sido criado por simulação numérica. No Brasil, seu uso começa em 1996 com o relatório da CHESF (Bittencourt et al., 1996) para o
litoral do Ceará e o do Rio Grande do Norte, ampliado em 1999 para o estado do Paraná. Para o levantamento do potencial eólico por simulação numérica o sistema mais utilizado é a combinação de um modelo atmosférico de meso-escala com um de micro-escala, combinação que apresenta alguns inconvenientes (Silva et al., 2010). Tais problemas têm levado a comunidade científica a buscar alternativas para a simulação do potencial eólico regional e nacional. Uma possibilidade que tem sido muito explorada é o uso isolado de modelos de meso-escala utilizando malha refinada. A confiança depositada na capacidade dos modelos é alicerçada pela comparação com dados experimentais de testes realizados com modelos como o MM5, o WRF, o Eta e outros (Dvorak et al., 2010, Claveri et al., 2005, Pérez et al., 2003, Durante e de Paus, 2004, Jimenez et al., 2007). O presente trabalho apresenta parte dos resultados obtidos na reavaliação do potencial eólico da região central do estado de Minas Gerais utilizando o MM5 (Dudhia et al. 2003). São apresentados mapas de velocidade e de fluxo de potência a 10, 50 e 80 m, pensando tanto em reavaliar os resultados do Atlas, originalmente obtidos para a altura de 50 m, quanto em apresentar novos resultados para as turbinas modernas de grande e pequeno porte, com centro em torno de 80 e 10 m, respectivamente. 2. METODOLOGIA O terreno foi representado através dos dados do United States Geological Survey (USGS), com resolução horizontal de 0,5 (925 m) e precisão vertical na elevação do terreno de no máximo 30 m (http://dss.ucar.edu/datasets/ds758.0/docs/readme.txt). O modelo foi inicializado com dados de reanálise do modelo global GFS (Global Forecast System) do National Centers for Environmental Prediction (NCEP), com resolução geográfica espacial de 1º (111 km) e temporal de 6 horas, sendo os mesmos dados utilizados como condição de contorno durante a integração. Para que a simulação do potencial fosse representativa de um ano inteiro, o modelo foi rodado para 60 dias extraídos dos últimos 10 anos por meio de amostragem estratificada aleatória. A estratificação foi feita dividindo o ano em apenas duas estações, caracterizadas por ventos acima e abaixo de 3,0 m/s (SILVA ET AL., 2010), sendo 30 dias selecionados de cada uma. Os períodos foram definidos com base nos dados horários de vento obtidos das estações do INMET para as cidades de São João del-rei, Barbacena e Juiz de Fora e mostraram que, para o período de dados considerado (últimos 3 anos), o vento permanece abaixo dos 3 m/s no período fevereiro-julho e acima no período agosto-janeiro. O tempo de simulação de cada rodada foi de 30 horas, mas apenas os resultados das últimas 24 foram utilizados na análise, sendo as primeiras 6 horas consideradas tempo de ajuste do modelo, necessário para permitir que as condições de contorno, relativamente esparsas em relação à grade numérica, pudessem migrar até o centro da grade. Testes inicias foram realizados para verificar a sensibilidade do MM5 ao tamanho dos domínios e à influência do modelo de solo-superfície Noah/LSM. Foram testadas 5 configurações, todas com dois domínios aninhados e centrados no município de Rio Espera (20,85 S 43,47 W): um domínio interno fixo (211x289 km) combinado com três domínios externos progressivamente maiores (291x369, 375x453 e 489x591 km) e o LSM ligado ou desligado. Exceção foi feita ao caso do maior domínio externo com o LSM ligado, pois o custo computacional tornou-se proibitivo em nosso equipamento. As rodadas de teste foram iniciadas em um mesmo dia (25/01/2008), sem perturbações atmosféricas detectáveis na escala sinóptica e utilizando comunicação bi-direcional de dados entre os domínios. Após os testes optou-se por utilizar o menor domínio externo (291x369 km), para minimizar o custo computacional, pois não se verificaram diferenças qualitativamente significativas na velocidade média na área simulada entre os casos testados, ainda que o caso com domínio maior mostrasse uma tendência marcante a velocidades mais altas. Ficou
também claro que a influência do uso do LSM sobre a velocidade local do vento é significativa desde o início das rodadas, ainda que a velocidade média só seja afetada após 15 horas de simulação. Para uma descrição completa desses testes ver Silva et al. (2009). Nas simulações definitivas (assim como nos testes de sensibilidade), o espaçamento das grades menor e maior foram de 3x3 e 1x1 km, respectivamente, o que representa um aumento em relação à resolução usada no Atlas (3,6 x 3,6 km). O passo de tempo do maior domínio foi de 10 s. Uma alta resolução espacial vertical (54 níveis), com maior concentração na região próxima à superfície, foi utilizada para melhor representar o escoamento na altura típica das turbinas eólicas atualmente utilizadas. Utilizaram-se as seguintes parametrizações físicas (Dudhia et al 2003): para a camada limite planetária, esquema MRF; para nuvens Cumulus, nenhuma; para radiação, esquema RRTM de ondas longas; para as trocas com a superfície, NOHA-LSM; para a umidade, esquema de chuva quente. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO As figuras 1-3 mostram as médias de velocidade e fluxo de potência eólica obtidas pelo modelo para a alturas de 10, 50 e 80 m. A escala de velocidades para todas as figuras está compreendida entre 0 e 10 m/s e a do fluxo de potência entre 0 e 450 W/m 2. Fig. 1. Da esquerda para a direita: médias Ago-Jan, Fev-Jul e anual. De cima para baixo: velocidade do vento (m/s) e potencial eólico (W/m 2 ) a 10 m. Os resultados das simulações para ambos os períodos do ano mostram diferenças significativas em relação ao Atlas. É notável o maior nível de detalhes, devido seguramente ao aumento de resolução tanto da grade numérica quanto da representação do terreno em relação ao Atlas, permitindo-nos distinguir regiões com potencias tanto maiores quanto menores do que os ali apresentados. Os resultados confirmam que a região estudada possui bom potencial eólico em diversos pontos, na maior parte das vezes associados a regiões de relevo elevado. Os resultados também indicam que a distribuição geográfica do potencial e da velocidade do vento não se altera significativamente entre as estações consideradas. Por outro lado, quantitativamente, a diferença na velocidade do vento é pequena, porém perceptível. Tomando como exemplo os pontos 42,75W; 20,10S e 42,25W; 20,50S, verifica-se que ambos apresentam velocidades maiores no período agosto-janeiro. A diferença se faz sentir um pouco mais no fluxo de po-
tência (que depende do cubo da velocidade). Outro exemplo é a serra localizada em torno de 43,80W; 21,20S. Estes resultados mostram que o modelo confirma para a região o regime sazonal de ventos observado nas três estações. Com relação à direção predominante dos ventos, não mostrada aqui, não existem grandes diferenças entre os períodos, com predominância para ventos de E a NE, em acordo geral com os resultados do Atlas, ainda que este mostre alguma tendência a ventos de SE. Fig. 2. Idêntico à Fig. 1 para 50 m. Fig. 3. Idêntico à Fig. 1 para 80 m. As figuras 3 e 4 indicam regiões com alto potencial eólico. Dentre as regiões de serra destaca-se a Serra do Brigadeiro, localizada no extremo norte da Serra da Mantiqueira, entre 20,3 20,6S e 42,4 42,8W, dentro do Parque Estadual da Serra do Brigadeiro, uma região preservada. Outra região de destaque aparece no extremo norte do domínio da Fig. 6b, entre 20,0 20,5S e 43,65 44,0W aproximadamente, mais um trecho da Serra da Mantiqueira (localmente denominado Serra da Moeda, Serra do Curral, etc.). As duas serras mencionadas,
porém, nos lembram que aspectos sociais e legais precisam ser considerados ao se pensar em investimentos em energia eólica. O potencial do Parque Estadual da Serra do Brigadeiro, por exemplo, possivelmente não poderia ser aproveitado. Os resultados mostram ainda outras regiões de interesse eólico próximas a Barroso e a São João del-rei que merecem estudos posteriores. 4. CONCLUSÕES O presente estudo utilizou um modelo de mesoescala, gratuito e de código aberto, i- soladamente para a prospecção numérica do potencial eólico regional de Minas Gerais. Os resultados obtidos indicam diferenças perceptíveis em relação aos resultados para a região disponíveis no Atlas Eólico. Ao que tudo indica, o motivo é a mais alta resolução (numérica e do terreno) utilizada em nossas simulações. Percebem-se pequenas diferenças no posicionamento das regiões de alto potencial eólico mostradas no Atlas. Os resultados confirmam que a região estudada possui bom potencial em diversos pontos, na maior parte das vezes, mas nem sempre, associados a regiões de relevo elevado. Agradecimentos : à CAPES, FAPEMIG e CNPq BIBLIOGRAFIA AMARANTE, O. A.C., BROWER, M., ZACK, J., SÁ, A.L., 2001, Atlas do potencial eólico brasileiro, MME/ELETROBRÁS/CEPEL, Brasília, 45 pp. BITTENCOURT, R., ALMEIDA G. E CARPENTIERI, E., 1996, Potencial Eólico no Litoral do Ceará e Rio Grande do Norte para Geração de Energia Elétrica. DEFA-EO-RT-002/96 rev.1, CHESF, Out 1996 DUDHIA, J.; GILL, D.; MANNING, K.; WANG, W., BRUYERE, C., 2003, PSU/NCAR Mesoscale Modeling System Tutorial Class Notes and User s Guide: MM5 Modeling System Version 3, PSU/NCAR, 255 p. SILVA, A.F.G.; CERQUEIRA, S.A.A.G., PELLEGRINI, C.C.: 2009, Estimativas Preliminares do Potencial Eólico na Região do Campo das Vertentes, MG, Ciência e Natura, Vol. Especial. SILVA, A. F. G. ; CERQUEIRA, S. A. A. G. ; PELLEGRINI, C. C., 2010. Estimativa do Potencial Eólico na Região do Campo das Vertentes, MG, anais do IX Simpósio de Mecânica Computacional, São João del-rei, MG, Brasil, 26 a 28 Maio, 2010, em CD-ROM. DVORAK, M. J., ARCHER, C. L., JACOBSON, M. Z., 2010 California offshore wind energy potential, Renew. Energ., 35(6), 1244-1254 CLAVERI, L., BERAN, J., DURANTE, F., LANGE, B., STRACK, M.: 2005 Offshore wind resource assessment with a mesoscale model, In: 6th WRF/15th MM5 Users' Workshop, National Center for Atmospheric Research, Boulder, CO, USA, June 27-30, 2005 PÉREZ, S., JIMENEZ, P. A., NAVARRO, J., MONTAVEZ, J. P., BARQUERO, C. G., CUERVA, A., GONZALEZ-ROUCO, J. F., VALERO, F.: 2003, Using the MM5 model for wind prediction in a complex terrain site, In: European Wind Energy Conference & Exhibition EWEC 2003, Madrid, Spain, 16-19 Jun. 2003 DURANTE, F., de PAUS, T.: 2004, A comparison of MM5 and meteo mast wind profiles at Cabauw, The Netherlands and Wilhelmshaven, Germany, In: European Wind Energy Conference & Exhibition (EWEC 2004), London, UK, 22-25 Nov. 2004 JIMENEZ, B., DURANTE, F., LANGE, B., KREUTZER, T., TAMBKE, J., Offshore Wind Resource Assessment Research with WAsP and MM5: Comparative Article Study for the German Bight,Wind Energ. 2007; 10:121 134