DESTILAÇÃO POR MEMBRANAS APLICADA AO TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUAIS DA INDÚSTRIA TÊXTIL Heloisa Ramlow (1) ; Victor Hugo Mondini Correa (2) ; Rita de Cássia Siqueira Curto Valle (3) ; José Alexandre Borges Valle (4) ; Andrea Cristiane Krause Bierhalz (5) ; Cintia Marangoni (6) (1) Mestranda; Universidade Federal de Santa Catarina; Campus Reitor João David Ferreira Lima, Florianópolis, Santa Catarina; heloramlow@gmail.com; (2) Graduando; Universidade Federal de Santa Catarina; Rua João Pessoa, 2750, Blumenau, Santa Catarina; v.h.m.c@hotmail.com; (3-6) Professor; Universidade Federal de Santa Catarina; Rua João Pessoa, 2750, Blumenau, Santa Catarina; rita.valle@ufsc.br; alexandre.valle@ufsc.br; andrea.krause@ufsc.br; cintia.marangoni@ufsc.br Resumo A destilação por membranas (DM) é um processo de separação que tem sido cada vez mais pesquisado na última década por sua aplicação eficiente no tratamento de efluente e recuperação de água com possibilidade de reuso. Neste trabalho, investigou-se a aplicabilidade do processo de DM no tratamento de efluente têxtil. Duas soluções de corante preto reativo e vermelho reativo com 30 mg L ¹ cada foram utilizadas como soluções modelo para representar o efluente têxtil. O processo foi conduzido com uma membrana plana de poliamida. Resultados preliminares comprovam a possibilidade de recuperação de água no lado permeado sem a presença de corante, com um fluxo permeado acumulado de até 40,7 kg (m ² h ¹) e com uma recuperação acumulada de corante na alimentação de até 4,36% durante o começo do experimento. Porém, após aproximadamente 60 minutos, observou-se um rápido declínio do fluxo permeado acumulado para até 15,54 kg (m ² h ¹) e da recuperação acumulada de corante na alimentação para até 3,16%. Apesar disso, observou-se a potencialidade da aplicação do na remoção de corante da solução modelo, corroborando a sua aplicabilidade no tratamento de águas residuais da indústria têxtil com possibilidade de reuso de água. Palavras-chave: Corantes. Efluente têxtil. Reuso de água. Área Temática: Sustentabilidade na Indústria Têxtil e de Moda MEMBRANE DISTILLATION APPLIED TO WASTEWATER TREATMENT OF THE TEXTILE INDUSTRY Abstract Membrane distillation (MD) is a separation process that has been increasingly researched in the last decade due to its efficient application in effluent treatment and subsequent water recovery with possible reuse. In this work, the applicability of the MD process was investigated in the treatment of textile wastewater. Two solutions of reactive black dye and reactive red dye with 30 mg L ¹ each were used as model solutions to represent the textile effluent. The process was carried out with a flat polyamide membrane. Preliminary results confirm the possibility of water recovery on the permeate side without dye presence, with an accumulated permeate flow up to 40.7 kg (m ² h ¹) and with a dye recovery of up to 4.36% in
the feed side during the beginning of the experiment. However, after approximately 60 minutes, a rapid decline in permeate flow was observed to 15.54 kg (m ² h ¹) and dye recovery to 3.16%. Nevertheless, it was observed the potentiality of the process in removing dye from the model solution, corroborating its applicability in wastewater treatment of the textile industry with possible water reuse. Key words: Dyes. Textile effluent. Water reuse. 1. Introdução A escassez global de água é um dos maiores desafios do século XXI. Portanto, a regulação ambiental tornou-se mais rigorosa em vários países, resultando no desenvolvimento de fontes renováveis de suprimento de água para um futuro sustentável ambientalmente. 2. Problema de Pesquisa e Objetivo De acordo com a Revisão Estatística do Comércio Mundial 2016 da Organização Mundial do Comércio (OMC), o valor atual das exportações mundiais de têxteis totalizou US$ 291 bilhões em 2015 (WORLD TRADE ORGANIZATION, 2016). Apesar de ser uma importante contribuinte para a economia, a indústria têxtil é uma das principais fontes de poluição de água (BHUIYAN et al., 2015). O Banco Mundial estima que cerca de 17-20% da poluição da água industrial é causada pela indústria têxtil (KANT, 2012). Em vista disso, a indústria têxtil não vai conseguir manter um desenvolvimento sustentável e tem de enfrentar a pressão para recuperar e reutilizar as suas águas residuais para atender a demanda de regulamentos cada vez mais rigorosos. Logo, muitas empresas têxteis terão que reutilizar o efluente secundário para obter benefícios ambientais e econômicos. A possível reutilização de águas residuais têxteis atraiu a atenção de pesquisadores de todo o mundo. A tecnologia de membranas é uma alternativa atraente para tratar e reutilizar águas residuais têxteis. Particularmente, o processo de destilação por membranas é potencialmente aplicável. O objetivo deste trabalho é avaliar a recuperação de águas residuais da indústria têxtil aplicando-se o processo de separação de destilação por membranas. 3. Revisão Bibliográfica
A destilação por membranas (DM) é um processo de separação conduzido termicamente no qual apenas moléculas de vapor transferem-se através de uma membrana hidrofóbica porosa do lado de alimentação/retentado e são coletadas, após condensação, no lado permeado/destilado (ALKHUDHIRI; DARWISH; HILAL, 2011). Isto é, uma diferença de temperatura através das superfícies da membrana induz a diferença de pressão de vapor em ambos os lados. Durante o processo de separação, a fase vapor é mantida dentro dos poros da membrana (MOZIA et al., 2009). A natureza da força motriz e a característica hidro-repelente da membrana rejeitam teoricamente 100% dos solutos não voláteis, como macromoléculas, espécies coloidais, íons inorgânicos e outros compostos não voláteis (DRIOLI; ALI; MACEDONIO, 2014). Mokhtar, Lau e Goh (2013) indicam que o processo de tingimento é a maior fonte poluidora das águas residuais têxteis. O tecido retém apenas uma certa quantidade de corante durante o processo de tingimento, resultando por exemplo em uma quantidade considerável (10-60%) de corante reativo não fixado em águas residuais têxteis, causando descarga de efluentes altamente coloridos (ROSA et al., 2014). Estima-se que são consumidos aproximadamente 21-377 L de água por kg de produto têxtil (ASGHAR; RAMAN; DAUD, 2014), confirmando o potencial de reuso da água na indústria têxtil. Os métodos convencionais de tratamento de águas residuais, baseados em processos físico-químicos e biológicos, são capazes de atender às exigências legislativas, mas eles não permitir a reutilização de água em processos têxteis (BARREDO-DAMAS et al., 2009). Os corantes são substâncias não voláteis, portanto, são teoricamente completamente separados pelo processo de DM. O processo de DM é interessante para aplicação de tratamento de águas residuais têxteis, uma vez que uma recuperação da energia calorífica é possível diretamente próximo à máquina de tingimento do tecido, requerendo um consumo de energia significativamente menor durante a operação (MOKHTAR et al., 2016). O fluxo permeado e a recuperação do soluto são parâmetros importantes que devem ser levados em conta para avaliação do desempenho da membrana (MOKHTAR et al., 2014b). 4. Metodologia
Os experimentos foram conduzidos em uma unidade experimental em escala laboratorial. Utilizou-se um módulo de aço inoxidável contendo uma membrana plana de nanofiltração composta por poliamida (NF90, DOW FILMTEC TM Membranes). A membrana possui um diâmetro médio de poro de 0,68 nm (SERT et al., 2016). A área efetiva da membrana é de 0,0177 m². Na Figura 1 é apresentado o esquema do experimento realizado em laboratório. O sistema foi projetado para ter duas correntes de circulação, isto é, a corrente quente (fluxo de alimentação) e a corrente fria (fluxo de permeado). As temperaturas das soluções foram controladas usando um aquecedor e um resfriador e foram mantidas aproximadamente a 20 C e 60 C respectivamente para o permeado e para a alimentação. Soluções de corante preto reativo (30 mg L ¹) e de corante vermelho reativo (30 mg L ¹) foram utilizadas durante os experimentos como solução modelo do efluente têxtil. A vazão de alimentação foi mantida a 1,7 L min ¹ e a vazão de permeado a 0,5 L min ¹. O tempo total do experimento foi de 2 horas e a cada 30 minutos foram retiradas amostras dos tanques de alimentação e permeado para análise. Os experimentos foram realizados quatro vezes e os seus valores médios foram utilizados para interpretação dos resultados. Figura 1 Esquema do experimento de DM
O fluxo permeado (J) foi calculado utilizando a Equação (1), onde M (kg) é a massa de permeado coletada em um tempo pré-determinado t (h) do processo e A (m²) é a área efetiva da membrana. Avaliou-se o fluxo permeado a cada 30 minutos e o fluxo permeado acumulado de cada medição em relação ao valor no tempo zero. M A t ( ) A recuperação de corante, R (%), da membrana foi calculada conforme Equação (2), onde C é a concentração de corante na alimentação. Avaliou-se a recuperação de corante a cada 30 minutos e a recuperação acumulada de cada medição em relação ao valor no tempo zero. ( ) ( NAL N AL N AL ) 100 (2) As concentrações de corante nas amostras de alimentação e de permeado foram obtidas através de uma curva padrão de absorbância versus concentração utilizando um espectrofotômetro UV-vis (AJX 1900, Micronal) medindo a quantidade de luz absorvida em comprimento máximo de onda (598 nm). 5. Análise dos Resultados 5.1 Avaliação do fluxo permeado Na Figura 2 e na Figura 3 são apresentados os fluxos permeados em função do tempo de filtração respectivamente para os corantes preto reativo e vermelho reativo. Os resultados mostram que há uma recuperação de água no começo do experimento, com um aumento do fluxo de permeado. Porém, após aproximadamente 60 minutos, esse fluxo diminui. O fluxo permeado acumulado máximo para o corante preto reativo foi de 20,7 kg (m ² h ¹) e para o corante vermelho reativo foi de 40,7 kg (m ² h ¹). Um declínio do fluxo permeado no início do experimento também foi obtido por An et al. (2016 a, b).
Figura 2 Variação do fluxo permeado acumulado e do fluxo permeado a cada 30 minutos em função do tempo (corante preto reativo) Figura 3 Variação do fluxo permeado acumulado e do fluxo permeado a cada 30 minutos em função do tempo (corante vermelho reativo)
5.2 Avaliação da recuperação de corante Na Figura 4 e na Figura 5 apresentam-se as remoções de corante em função do tempo de filtração respectivamente para os corantes preto reativo e vermelho reativo. Os resultados mostram que há uma recuperação eficiente no começo do experimento para ambos os corantes. Porém, após aproximadamente 60 minutos, essa recuperação cai rapidamente para o corante preto reativo. Uma redução da recuperação do corante vermelho reativo também pode ser visualizada através dos valores medidos a cada 30 minutos. Uma redução da recuperação de corante também foi relatada por Mokhtar, Lau e Goh (2013), Mokhtar, Ismail e Lau (2014a), Mokhtar et al. (2014b) e Mokhtar, Ismail e Lau (2015). Figura 4 Variação da remoção acumulada e da remoção a cada 30 minutos de corante em função tempo (corante preto reativo)
Figura 5 Variação da remoção acumulada e da remoção a cada 30 minutos de corante em função do tempo (corante vermelho reativo)
5.3 Comparação entre os corantes Na Figura 6 apresenta-se um gráfico comparativo de fluxo permeado acumulado e da recuperação acumulada de corante em função do tempo de filtração para os corantes preto reativo e vermelho reativo. Os resultados mostram que há uma maior recuperação de água no lado permeado para o corante vermelho reativo. Porém, ao final do experimento, observa-se um declínio do fluxo permeado acumulado para ambos os corantes. Em relação à recuperação de corante, observa-se um aumento no início do experimento, seguido de um declínio para ambos os corantes. Figura 6 Comparação da variação do fluxo permeado acumulado e da recuperação acumulada de corante em função do tempo para os corantes preto reativo e vermelho reativo
6. Conclusão Os resultados dos experimentos mostram a possibilidade de recuperação de água sem a presença de corante no lado permeado. Apesar disso, um rápido declínio do fluxo permeado e da recuperação de corante são observados. As condições experimentais empregadas devem ser otimizadas e testadas em uma faixa mais ampla de forma a melhorar a recuperação de água pelo processo. Dessa forma, mais testes precisam ser realizados para melhor entendimento do processo de DM e sua aplicabilidade no tratamento de águas residuais têxteis, já que os dados aqui apresentados são resultados preliminares. No entanto, ressalta-se a potencialidade de aplicação do processo visto que este, apesar de bem estabelecido, é pouco aplicado para reuso de águas residuais da indústria têxtil. 7. Referências ALKHUDHIRI, A.; DARWISH, N.; HILAL, N. Membrane distillation: A comprehensive review. Desalination, n. 287, p. 2-18, set. 2011. AN, A. K.; GUO, J.; JEONG, S.; LEE, E.; TABATABAI, S. A. A.; LEIKNES, T. High flux and antifouling properties of negatively charged membrane for dyeing wastewater treatment by membrane distillation. Water Research, n. 103, p. 362-371, jul. 2016a. AN, A. K.; GUO, J.; JEONG, S.; LEE, E.; ZHAO, Y.; WANG, Z.; LEIKNES, T. PDMS/PVDF hybrid electrospun membrane with superhydrophobic property and drop impact dynamics for dyeing wastewater treatment using membrane distillation. Journal of Membrane Science, n. 525, p. 57-67, out. 2016b. ASGHAR, A.; RAMAN, A. A. A.; DAUD W. M. A. W. Advanced oxidation processes for in-situ production of hydrogen peroxide/hydroxyl radical for textile wastewater treatment: a review. Journal of Cleaner Production, n. 87, p. 826-838, set. 2014. BARREDO-DAMAS, S.; ALCAINA-MIRANDA, M. I.; BES-PIÁ; A.; IBORRA-CLAR, M. I.; IBORRA-CLAR, J. A.; MENDOZA-ROCA, J. A. Ceramic membrane behavior in textile wastewater ultrafiltration. Desalination, n. 250, p. 623-628, nov. 2009. BHUIYAN, M. A. R.; RAHMAN, M. M.; SHAID, A.; BASHAR, M. M.; KHAN, M. A. Scope of reusing and recycling the textile wastewater after treatment with gamma radiation. Journal of Cleaner Production, n. 112, p. 3063-3071, out. 2015. DRIOLI, E.; ALI, A.; MACEDONIO, F. Membrane distillation: Recent developments and perspectives. Desalination, n. 356, p. 56-84, out. 2014.
KANT, R. Textile dyeing industry an environmental hazard. Natural Science, v. 4, n. 1, p. 22-26, jan. 2012. MOKHTAR, N. M.; LAU, W. J.; GOH, P. S. Effect of hydrophobicity degree on PVDF hollow fiber membranes for textile wastewater treatment using direct contact membrane distillation. Jurnal Teknologi, n. 65:4, p. 77-81, nov. 2013. MOKHTAR, N. M.; LAU, W. J.; ISMAIL, A. F. The potential of membrane distillation in recovering water from hot dyeing solution. Journal of Water Process Engineering, n. 2, p. 71-78, jun. 2014a. MOKHTAR, N. M.; LAU, W. J.; ISMAIL, A. F.; NG, B. C. Physicochemical study of polyvinylidene fluoride Cloisite15A composite membranes for membrane distillation application. RSC Advances, n. 4, p. 63367-63379, nov. 2014b. MOKHTAR, N. M.; LAU, W. J.; ISMAIL, A. F. Dye wastewater treatment by direct contact membrane distillation using polyvinylidene fluoride hollow fiber membranes. Journal of Polymer Engineering, n. 35 (5), p. 471-479, jun. 2015. MOKHTAR, N. M.; LAU, W. J.; ISMAIL, A. F; KARTOHARDJONO, S.; LAI, S. O.; TEOH, H. C. The potential of direct contact membrane distillation for industrial textile wastewater treatment using PVDF-Cloisite 15A nanocomposite membrane. Chemical Engineering Research and Design, n. 111, p. 284-293, maio 2016. MOZIA, S.; MORAWSKI, A. W.; TOYODA, M.; TSUMURA, T. Integration of photocatalysis and membrane distillation for removal of mono- and poly-azo dyes from water. Desalination, n. 250, p. 666-672, out. 2009. ROSA, J. M.; FILETI, A. M. F.; TAMBOURGI, E. B.; SANTANA, J. C. C. Dyeing of cotton with reactive dyestuffs: the continuous reuse of textile wastewater effluent treated by ultraviolet/hydrogen peroxide homogeneous photocatalysis. Journal of Cleaner Production, n. 90, p. 60-65, nov. 2014. SERT, G.; BUNANI, S.; KABAY, N.; EGEMEN, Ö.; ARDA, M.; PEK, T. Ö.; YÜKSEL, M. Investigation of mini pilot scale MBR-NF and MBR-RO integrated systems performance - preliminary field tests. Journal of Water Process Engineering, n. 12, p. 72-77, jul. 2016. WORLD TRADE ORGANIZATION. World trade statistical review 2016. Disponível em: < https://www.wto.org/english/res_e/statis_e/wts2016_e/wts2016_e.pdf>. Acesso em: 13 fevereiro 2017. 8. Agradecimentos Os autores agradecem pelo apoio financeiro da CAPES e do CNPq.