MORFOLOGIA ESPERMÁTICA DE JAÚ Zungaro jahu - ANÁLISE DO SÊMEN in natura E PÓS-DESCONGELADO

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Transcrição:

MORFOLOGIA ESPERMÁTICA DE JAÚ Zungaro jahu - ANÁLISE DO SÊMEN in natura E PÓS-DESCONGELADO Mariana Martins Drumond*, Gilmara Junqueira M. Pereira, Viviane de Oliveira Felizardo, Luis David Solis Murgas, Priscila Vieira Rosa Logato, Daniel Okamura e Ulisses Simon da Silveira *Universidade Federal de Lavras, campus universitário, caixa postal 37, CEP 37200-000 Lavras, MG. E-mail: mariana@linuxreference.com.br Resumo O jaú, Zungaro jahu, é uma espécie nativa de piracema, ameaçada de extinção, que apresenta grande interesse comercial. Assim como em todas as espécies de piracema, sua reprodução em cativeiro só ocorre através de técnicas de indução hormonal. Por se tratar de espécie ameaçada de extinção, o desenvolvimento de protocolos de congelamento de sêmen eficazes é de suma importância para a manutenção da espécie. O presente estudo teve como objetivo testar a ação de quatro soluções diluidoras diferentes sobre a morfologia dos espermatozóides de jaú, visando otimizar a utilização do sêmen nos processos de congelamento. A obtenção do material analisado ocorreu na Estação de Piscicultura de Jupiá (CESP) no mês de novembro de 2006. O sêmen foi obtido após indução hormonal e parte do volume obtido foi utilizada no processo de congelamento e posterior armazenamento em nitrogênio líquido. Uma alíquota do sêmen in natura foi fixada em solução de formol-citrato para avaliação da morfologia espermática. Após descongelamento quatro amostras de cada tratamento foram analisadas quanto à morfologia espermática. Os resultados parciais demonstram que a morfologia espermática do material que sofreu congelamento está relacionada com os diluidores e crioprotetores empregados na composição de cada solução. Observou-se alterações estatisticamente significativas (P<0,05) apenas para alterações de pela intermediária. O estudo continua em fase de execução, mas a princípio, o tratamento 03 apresentou melhores resultados com um percentual menor de alterações morfológicas totais. Introdução Estudos sobre a biologia do sêmen de peixes foram iniciados no século XIX. Várias características da biologia seminal de peixes foram rapidamente identificadas: a imobilidade do espermatozóide no sêmen in natura, a curta duração do seu desenvolvimento após sua ativação e a necessidade de diluição em um meio hiposmótico para a iniciação do movimento espermático (Billard & Cosson, 1992). A preocupação e o interesse no desenvolvimento de técnicas cada vez mais apuradas de conservação de espermatozóides de peixes vão ao encontro das questões econômicas e ecológicas atuais. As grandes barragens hidrelétricas constituem obstáculo à rota migratória dos peixes de piracema e acabam por reduzir ou eliminar sua eficiência reprodutiva, pois também causam modificação do curso natural dos rios, transformando-os em uma sucessão de lagos artificiais com a perda quase que completa de seu caráter fluvial. É relativamente difícil se estabelecer protocolos de conservação de sêmen para as diferentes espécies de peixes neotropicais, uma vez que mesmo as espécies que coabitam nossas bacias hidrográficas, tendem a apresentar diferentes sensibilidades de seus espermatozóides à redução na temperatura e ao contato com soluções crioprotetoras.

Assim como os espermatozóides de vertebrados, os espermatozóides de peixes podem ser divididos morfologicamente em cabeça, peça intermediária e cauda (Nagahama, 1983). A cabeça dos espermatozóides de peixes é, na maioria dos grupos, destituída de acrossoma, o que é compensado pela presença da micrópila no córion do oócito (Cosson et al., 1999). A cauda, ou flagelo, pode ainda ser subdivida em colo e peças intermediária, principal e terminal, assim como ocorre para os espermatozóides de mamíferos domésticos. O colo, ou peça de conexão, representa a inserção do corpo basal do flagelo à cabeça. A peça intermediária consiste de uma bainha mitocondrial disposta em hélice responsável pela geração de energia necessária à propulsão mótil dos espermatozóides (Hafez, 2004). O jaú Zungaro jahu, espécie utilizada na realização deste trabalho, é um pimelodídeo de tamanho avantajado que pode atingir 1,5 m de comprimento e alcançar até 150 kg de peso. É uma espécie predadora, encontrada na Bacia do rio Paraná (CEMIG - CETEC, 2000). Assim como parte da fauna íctica brasileira, é uma espécie de piracema, que realiza migrações durante o período reprodutivo. Sua alta fecundidade compensa a baixa taxa de sobrevivência das larvas e alevinos, bastante susceptíveis a predação em ambiente natural. Os estoques naturais de jaú encontram-se muito reduzidos, possivelmente devido à pesca predatória e às alterações e eliminação de seu hábitat natural. Por essas razões, o jaú é uma espécie vulnerável, incluída na lista oficial do estado de Minas Gerais e no Livro Vermelho das espécies ameaçadas de extinção do estado de Minas Gerais (Machado et al., 1998). Por se tratar de espécie vulnerável à extinção, de difícil manejo reprodutivo, o objetivo deste trabalho foi analisar as alterações morfológicas encontradas no sêmen de jaú in natura e pós-descongelamento como forma de se estabelecer protocolos mais eficazes de congelamento do sêmen desta espécie. Material e Métodos Foram utilizados machos de jaú do plantel de reprodutores da Estação Piscicultura de Jupiá (CESP), localizada na divisa dos estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, durante as reproduções realizadas no mês de novembro de 2006. Para coleta do sêmen in natura, realizou-se massagens manuais delicadas sobre a parede celomática, na região da nadadeira anal, no sentido crânio-caudal. As amostras de sêmen foram coletadas em tubos de ensaio graduados estéreis, mantidos à temperatura ambiente (em torno de 23 C) e protegidos da entrada de luz por papel opaco.uma alíquota foi fixada em solução de formol-citrato para avaliação da morfologia do sêmen in natura. No processo de congelamento do sêmen foram avaliados quatro diluidores, que diferiram entre si no tipo de crioprotetor empregado. Dessa forma, quatro crioprotetores foram testados da seguinte forma: Dimetilsulfóxido (DMSO) associado à gema de ovo (D1) e à lactose (D3) e Metanol associado à gema de ovo (D2) e à lactose (D4). A solução diluidora (base) para cada tratamento consistiu de solução de BTS (Belltsville Thawing Solution ) na concentração final de 5% (p:v). A Tabela 1 resume as soluções diluidoras testadas no estudo.

Tabela 1. Soluções diluidoras* avaliadas ao longo dos experimentos. Crioprotetor % D1 D2 D3 D4 DMSO 8-8 - Gema de ovo 5 5 - - Lactose - - 5 5 Metanol - 8-8 Diluidor base BTS 5 5 5 5 * volumes para preparação de 100mL de solução. D1= diluidor 1; D2= diluidor 2; D3= diuidor 3 e D4= diluidor 4. Imediatamente após a diluição pelas soluções crioprotetoras, as amostras seminais foram envasadas em palhetas de 0,5 ml (três palhetas por tratamento) que, por sua vez, foram vedadas com massa cirúrgica estéril. As palhetas foram acondicionadas em botijão de vapor de nitrogênio líquido (Taylor-Wharton, modelo CP 300, tipo dry shipper) para resfriamento. Após 24 horas, as raques foram transferidas para botijão de armazenamento (Cryometal, modelo DS-18) e congeladas, permanecendo submersas em nitrogênio líquido por quatro dias. O descongelamento ocorreu no Laboratório do Setor de Fisiologia e Farmacologia da Universidade Federal de Lavras (UFLA), em Lavras, Sul de Minas Gerais. Foram descongeladas duas palhetas por tratamento via imersão em água (banho-maria) a 60 C, durante oito segundos, totalizando quatro repetições amostradas por tratamento. O sêmen descongelado foi depositado em um tubo de ensaio estéril. As análises morfológicas do sêmen descongelado foram realizadas em microscópio óptico composto, com iluminação episcópica fluorescente. Uma alíquota de 10 μl de sêmen descongelado foi diluída em 990 μl de solução de formol-citrato. A seguir, uma fração de 10 μl da amostra fixada foi depositada em lâmina histológica e coberta por lamínula. O exame consistiu da observação da morfopatologia de 100 espermatozóides focalizados em diversos campos ao longo de toda a lâmina. ob um aumento de 1.000 dioptrias, foram investigadas as patologias de cabeça, de peça intermediária e do restante da cauda (peças principal e terminal), conforme resumido na Tabela 2. Tabela 2. Patologias dos espermatozóides examinadas no smen in natura e pós congelamento de jaú. Cabeça Porção acometida Patologias Microcefalia Macrocefalia Isolada Peça Intermediária Cauda Degenerada Curta Enrolada Isolada

Para testar as variações das alterações morfológicas por tratamento, utilizou-se o pacote estatístico SAEG para realização do teste não-paramétrico de Kruskal-Wallis visando determinar as diferenças estatisticamente significativas (P<0,05), de amostras independentes. Resultados e Discussão A Tabela 3 demonstra os valores médios encontrados para as observações de cada um dos tratamentos testados enquanto a tabela 4 demonstra os percentuais de alterações encontradas para cada um dos tratamentos. Tabela 3. Médias das alterações morfológicas encontradas no sêmen in natura (N) e pósdescongelamento (D1, D2, D3 e D4). Cabeça Peça Cauda Sêmen intermediária isolada microcefalia macrocefalia degenerada enrolada dobrada Isolada N 6,00 3,00 2,75 2,25 a 5,75 4,50 5,00 D1 5,75 2,50 0,75 5,25 a,b 5,00 2,50 2,75 D2 6,50 2,75 2,25 4,50 a,b 6,00 3,50 3,25 D3 4,50 2,75 2,00 2,25 a 6,75 2,50 2,00 D4 4,50 2,75 3,50 7,00 b 5,75 4,75 2,00 P 0,5525 0,9941 0,1109 0,0376 0,9423 0,3853 0,1119 Valores seguidos de letras iguais na mesma coluna são estatisticamente semelhantes (p<0,05). Tabela 4. Percentuais médias das alterações morfológicas encontradas, de acordo com sua localização, no sêmen in natura (N) e pós-descongelamento (T1, T2, T3 e T4). Alterações Sêmen cabeça peça intermediária cauda Total N 11,75 2,25 15,25 29,25 D1 9,00 5,25 10,25 24,50 D2 11,50 4,50 12,75 28,75 D3 9,25 2,25 11,25 22,75 D4 10,75 7,00 12,50 30,25 Segundo o Colégio Brasileiro de Reprodução Animal (1998), índices de espermatozóides com anormalidades acima de 30%, 30% e 20% são inapropriados à inseminação artificial de bovinos, eqüinos e suínos, respectivamente. Como a fecundação artificial em jaú envolve a utilização de uma elevada proporção entre espermatozóides e ovócitos em um ambiente controlado, é provável que o porcentual crítico de anormalidades espermáticas de peixes de fecundação externa oscile em torno de 50%. A percentagem média de patologias totais observada no sêmen in natura (29,25%) relativamente alta quanto às observadas por Kavamoto et al. (1999) e Moraes et al. (2004) que constatararam uma ocorrência de 7,22%, 9,54% para Prochilodus lineatus. Em comparação ao percentual encontrado por Murgas et al. (1998), que foi de 40,2%, também estudando P. lineatus, o valor obtido neste estudo foi consideravelmente menor. Apesar de se tratarem de espécies diferentes, é importante se estabelecer comparações entre espécies nativas neotropicais uma vez que estudos morfológicos seminais são escassos para estas espécies.

Observou-se um maior percentual de alterações relacionado à cauda, o que gera questionamentos acerca da manipulação do material, pois é sabido que sob forte agitação, as caudas de espermatozóides de peixes sofrem avarias que podem comprometer o sucesso da fertilização. Os resultados encontrados nestes trabalhos confirmam que a análise morfológica dos espermatozóides de peixes também reflete variações ambientais e genéticas. Além disto, as alterações encontradas no presente estudo podem estar relacionadas à composição dos meios diluidores, que podem ter exercido ação criotóxica sobre o sêmen. Dentre as alterações morfológicas descritas neste estudo para o sêmen de jaú, apenas a de peça intermediária apresentou diferença estatística (P<0,05), quando comparada ao sêmen in natura e aos tratamentos empregados no congelamento. Conclusão Mais repetições serão avaliadas nos próximos passos do estudo, porém, à princípio, o diluidor 3 mostrou-se mais eficaz na criopreservação do sêmen de jaú, apresentado menor percentual de alterações seminais totais. Agradecimentos Ao IEF e ao Consórcio da UHE de Funil pelo apoio financeiro Referências BILLARD, R.; COSSON, M. P. Some problems related to the assessment of sperm motility in freshwater fish. The Journal of Experimental Zoology, New York, v. 261, n. 2, p. 122-13, Feb. 1992. COLÉGIO BRASILEIRO DE REPRODUÇÃO ANIMAL - CBRA. Manual para exame andrológico e avaliação do sêmen animal. 2. ed. Belo Horizonte: CBRA, 1998. 49 p. COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, FUNDAÇÃO CENTRO TECNOLÓGICO DE MINAS GERAIS. Guia ilustrado de peixes da bacia do rio Grande. Belo Horizonte: CEMIG/CETEC, 2000. 144 p. COSSON, J.; BILLARD, R.; CIBERT, C.; DRÉANNO, C.; SUQUET, M. Ionic factors regulating the motility of fish sperm. In: GAGNON, C. (Ed.) The male gamete: from basic science to clinical applications. Vienna: Cache River Press, 1999. Chap. 16, p. 162-186. HAFEZ, E. S. E. Reprodução Animal. 7. ed. São Paulo: Manole, 2004. 513 p. KAVAMOTO, E. T.; BARNABE, V. H.; CAMPOS, B. E. S. de; ANDRADETALMELLI, E. F. de Anormalidades morfológicas nos espermatozóides do curimbatá, Prochilodus lineatus (Steindachner, 1881) (Osteichthyes, Characiformes, Prochilodontidae). Boletim do Instituto de Pesca, São Paulo, v.25, p. 61-66, 1999.

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