ESTUDO DE IMPACTOS NA GERAÇÃO HIDROELÉTRICA AO LONGO DO RIO SÃO FRANCISCO DEVIDO À TRANSPOSIÇÃO DE SUAS ÁGUAS UTILIZANDO MODELO



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ESTUDO DE IMPACTOS NA GERAÇÃO HIDROELÉTRICA AO LONGO DO RIO SÃO FRANCISCO DEVIDO À TRANSPOSIÇÃO DE SUAS ÁGUAS UTILIZANDO MODELO MATEMÁTICO DE FLUXOS EM REDE ACQUANET Gerson Luiz Soriano Lerner DISSERTAÇÃO SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DA COORDENAÇÃO DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO DE ENGENHARIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM CIÊNCIAS EM PLANEJAMENTO ENERGÉTICO. Aprovada por: Prof. Lucio Guido Tapia Carpio, D.Sc. Prof. Luiz Fernando Loureiro Legey, Ph.D. Prof. Otto Corrêa Rotunno Filho, Ph.D. RIO DE JANEIRO, RJ BRASIL ABRIL DE 2006

LERNER, GERSON LUIZ SORIANO Estudo de impactos na geração hidroelétrica ao longo do rio São Francisco devido à transposição de suas águas utilizando modelo matemático de fluxos em rede AcquaNet [Rio de Janeiro] 2006 IX, 108 p. 29.7 cm (COPPE/UFRJ, M.Sc., Planejamento Energético, 2006) Dissertação Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPE. 1. Bacias hidrográficas 2. Modelo matemático de fluxos em rede 3. Projeto de transposição do rio São Francisco 4. Impactos na geração hidrelétrica I. COPPE/UFRJ II. Título (série) ii

À minha Família iii

AGRADECIMENTOS Ao Prof. Lucio Guido Tapia Carpio pela amizade, confiança e apoio dado para que eu conseguisse elaborar este trabalho. Ao Laboratório de Suporte a Decisão (LabSis) da Universidade de São Paulo USP, em especial o Engenheiro Alexandre Roberto e o Doutor Rubem Porto, pelo carinho e atenção que me deram nas diversas vezes que fui ao LabSis, pelo fornecimento do modelo matemático, pela idéia deste estudo de caso e inúmeras ajudas prestadas para definitivamente empregar corretamente o modelo matemático por eles desenvolvido. Ao Operador Nacional do Sistema, em especial ao Engenheiro Luiz Guilhon que, por diversas vezes, me atendeu, fornecendo todos os dados necessários que requeri para o estudo de caso desta tese. À Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF), pelos dados fornecidos relativos a suas usinas hidrelétricas, fundamentais para utilizar o modelo matemático e desenvolver o estudo de caso desta tese. À Agência Nacional de Águas (ANA), pelos dados gerais por eles fornecidos e essenciais para a compreensão da magnitude e importância da área de estudo a bacia hidrográfica do rio São Francisco. Ao Ministério da Integração Nacional, pela elaboração dos estudos ambientais EIA/RIMA e pelo fornecimento dos dados relativos à demanda hídrica da região a ser beneficiada pelo projeto de transposição do rio São Francisco. Aos meus pais, Leizer Lerner e Judith Soriano de Souza Nunes, que me deram suporte, atenção, carinho e educação, sendo por mim considerados os principais responsáveis pela realização deste sonho. Ao CNPq, pelo apoio financeiro. iv

Resumo da Dissertação apresentada à COPPE/UFRJ como parte dos requisitos necessários para a obtenção do grau de Mestre (M.Sc.) ESTUDO DE IMPACTOS NA GERAÇÃO HIDROELÉTRICA AO LONGO DO RIO SÃO FRANCISCO DEVIDO À TRANSPOSIÇÃO DE SUAS ÁGUAS UTILIZANDO MODELO MATEMÁTICO DE FLUXOS EM REDE ACQUANET Gerson Luiz Soriano Lerner Abril/2006 Orientador: Lucio Guido Tapia Carpio Programa: Planejamento Energético A presente dissertação procura dar uma visão geral do atual projeto de transposição das águas do rio São Francisco para bacias do Nordeste Setentrional para, posteriormente calcular, através da simulação pelo modelo matemático de fluxos em rede AcquaNet, os impactos energéticos nas usinas hidrelétricas localizadas na calha do rio São Francisco decorrente das derivações hídricas. Conclui-se que os impactos energéticos no rio São Francisco variam proporcionalmente com a vazão demandada pela transposição. No entanto, observa-se que o modelo matemático utilizado para o estudo de caso dessa dissertação apresenta limitação de cálculo a ser adequadamente considerada; pois as prioridades de atendimento dos diversos usos hídricos são obedecidas pelo AcquaNet de forma bastante rígida, ou seja, o modelo só permite alocar água para usos menos prioritários quando os usos mais prioritários são totalmente atingidos. v

Abstract of Dissertation presented to COPPE/UFRJ as a partial fulfillment of the requirements for the degree of Master in Science (M.Sc.) HYDRO-GENERATION IMPACTS IN THE SÃO FRANCISCO RIVER DUE TO THE DIVERSION PROJECT OF ITS WATER USING THE NET FLOW MATHEMATICAL MODEL ACQUANET Gerson Luiz Soriano Lerner April/2006 Advisor: Lucio Guido Tapia Carpio Department: Energy Planning The present dissertation looks forward to introduce the actual São Francisco river s water diversion project and afterwards to calculate the hydro-generation impacts using a net flow mathematical model called AcquaNet. The energetic impacts in the São Francisco river varies proportionally with the diversion project s demand flow. The mathematical model used to solve the dissertation s case study has a limitation to be adequately considered. The water supply priorities associated to water uses are obeyed in a very strict way, i.e., the AcquaNet only allows to allocate water to less priorities uses when the most priorities uses are totally served. vi

ÍNDICE 1 INTRODUÇÃO...1 1.1. Informações Gerais...1 1.2. Condições hídricas das bacias receptoras As bacias hidrográficas do Nordeste Setentrional...4 1.3. Condições hídricas da bacia doadora A bacia do rio São Francisco...9 1.4. Breve histórico de projetos de integração da bacia do São Francisco com bacias do Nordeste Setentrional...11 1.3. Objetivo...13 2 A CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO BACIA DO S. FRANCISCO...16 2.1. Localização e características gerais da bacia do São Francisco...16 2.2. Os aproveitamentos hidrelétricos da bacia do São Francisco...21 2.3. Conclusão da caracterização da bacia para a elaboração da tese...29 3 O PROJETO DE TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO...30 3.1. Detalhes do projeto de transposição do rio São Francisco...30 4 O SISTEMA DE SUPORTE A DECISÃO ACQUANET...35 4.1. Introdução...35 4.2. A programação do modelo matemático...35 4.3. Passos para resolução de problemas utilizando o SSD AcquaNet...40 5 ESTUDO DE IMPACTOS NA GERAÇÃO HIDROELÉTRICA NO RIO SÃO FRANCISCO DEVIDO TRANSPOSIÇÃO DE SUAS ÁGUAS...51 5.1 Introdução...51 5.2 Dados de entrada do modelo matemático...56 5.3 Trabalhando com o SSD AcquaNet...71 5.4 Resultados obtidos pelo modelo matemático...73 6 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES...76 vii

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...78 ANEXO 1 - MAPA DA BACIA DO RIO SÃO FRANCISCO...81 ANEXO 2 - MAPA COM INFORMAÇÕES DE PRECIPITAÇÃO MÉDIA NA BACIA DO RIO SÃO FRANCISCO...82 ANEXO 3 - MAPA DA BACIA DO SÃO FRANCISCO COM PRINCIPAIS POSTOS PLUVIOMÉTRICOS...83 ANEXO 4 - MAPA DA BACIA DO SÃO FRANCISCO COM DADOS DE DISPONIBILIDADE HÍDRICA......84 ANEXO 5 - MAPA DA BACIA DO SÃO FRANCISCO DETALHANDO SUAS PRINCIPAIS HIDRELÉTRICAS...85 ANEXO 6 - USINAS PERTENCENTES À BACIA DO RIO SÃO FRANCISCO...86 ANEXO 7 - MAPAS DO PROJETO DE TRANSPOSIÇÃO DO RIO S. FRANCISCO...87 ANEXO 8 - DETALHES DO PROJETO DE TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO...88 ANEXO 9 - PRINCIPAIS TRECHOS DA OUTORGA DE TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO...89 ANEXO 10 - ESQUEMA DO SSD ACQUANET...90 ANEXO 11 - TABELA DE RESULTADOS EM PLANILHAS EXCEL...91 viii

LISTA DE SIGLAS ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica ANA - Agência Nacional de Águas CBHSF Comitê da bacia hidrográfica do São Francisco CEPEL Centro de Pesquisa de Energia Elétrica CF/1988 - Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 1988 CHESF Companhia Hidrelétrica do São Francisco DOU - Diário Oficial da União IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IPEA Instituto de Pesqisa Econômica e Aplicada ITEP - Instituto Tecnológico de Pernambuco LabSid Laboratório de Sistemas de Suporte a Decisões MME Ministério das Minas e Energia ONS Operador Nacional do Sistema RIMA Relatório dos Impactos sobre o Meio Ambiente SBPC Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência SIN Sistema Interligado Nacional SSD Sistema de Suporte a decisão USP - Universidade de São Paulo UHEs Usinas Hidrelétricas WRI - World Resources Institute ix

CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO 1.1. Informações gerais O território nacional está dividido em 8 grandes bacias hidrográficas. São elas: Amazonas; Tocantins e Araguaia; Atlântico Norte e Nordeste; São Francisco; Atlântico Leste; Paraná e Paraguai; Uruguai; Atlântico Sul e Sudeste. A Figura 1 delimita essas grandes bacias no território nacional. Figura 1 Grandes bacias hidrográficas do Brasil Fonte: ANEEL,2006 1

O Brasil pode ser considerado um país hidricamente bem afortunado, pois possui a maior disponibilidade hídrica do planeta. De acordo com o exposto na Tabela 1, o Brasil é responsável por cerca de 13,8% do deflúvio médio mundial. Tabela 1 Deflúvio médio de recursos hídricos no mundo em 1998 Oferta de água doce (Deflúvio médio) Regiões Total Per capita (km 3 /ano) (m 3 /hab/ano) África 3.996 5.133,05 América do Norte 5.308,6 17.458,02 América Central 1.056,67 8.084,08 América do Sul* 10.080,91 30.374,34 Brasil* 5.744,91 34.784,33 Ásia 13.206,74 3.679,91 Europa 6.234,56 8.547,45 Oceania 1.614,25 54.794,64 Mundo 41.497,73 6.998,12 Fonte: WRI, 1998 e *ANEEL, 1999. Apesar de o Brasil possuir água doce em abundância, ela se encontra mal distribuída espacial e temporalmente. A Tabela 2 demonstra a má distribuição espacial da água no âmbito nacional. Observe que somente a região da bacia Amazônia, que concentra apenas 4% da população brasileira, possui aproximadamente 73% da água superficial existente no país. Como exemplo de região onde ocorre uma má distribuição temporal da água, pode-se citar justamente a região beneficiada com o projeto de transposição o Nordeste setentrional. Nesta região de clima semi-árido, o volume anual precipitado concentra-se em apenas 3 meses do ano, enquanto nos 9 meses restantes, praticamente não chove. 2

Tabela 2 Informações básicas sobre bacias hidrográficas brasileiras Área População * Densidade Vazão Disponibilidade Disponibilidade Bacia hidrográfica (Ano Base-1996) (hab/km 2 ) (m 3 /s) Hídrica Per Capita (10 3 km 2 ) % % (km 3 /ano) (m 3 /ano/hab) 1 Amazonas ** 3.900 45,82 6.687.893 4,26 1,70 133.380 4.206,27 628.938,24 2 Tocantins 757 8,89 3.503.365 2,23 4,60 11.800 372,12 106.219,25 3ª Atlântico Norte 76 0,89 406.324 0,26 5,30 3.660 115,42 284.063,36 3B Atlântico Nordeste 953 11,20 30.846.744 19,64 32,40 5.390 169,98 55.100,44 4 São Francisco 634 7,45 11.734.966 7,47 18,50 2.850 89,88 7.658,96 5ª Atlântico Leste 1 242 2,84 11.681.868 7,44 48,30 680 21,44 1.835,71 5B Atlântico Leste 2 303 3,56 24.198.545 15,41 79,90 3.670 115,74 4.782,81 6ª Paraguai ** 368 4,32 1.820.569 1,16 4,90 1.290 40,68 22.345,45 6B Paraná 877 10,30 49.924.540 31,78 56,90 11.000 346,90 6.948,41 7 Uruguai ** 178 2,09 3.837.972 2,44 21,60 4.150 130,87 34.099,88 8 Atlântico Sudeste 224 2,63 12.427.377 7,91 55,50 4.300 135,60 10.911,78 Brasil 8.512 100 157.070.163 100 18,50 182.170 5.744,90 36.575,46 Nota: ** Dados referentes à área situada em território brasileiro Fonte : ANEEL, 2005 ; * IBGE, 1998 De acordo com a atual Constituição da República Federativa do Brasil (CF/1988), em seu artigo 20, inciso III, são bens da União os lagos, rios e quaisquer correntes de água que banhem mais de um estado. Portanto, no caso do rio São Francisco, por ele atravessar diversos estados, suas águas devem se submeter à gestão federal, sendo o mesmo considerado um rio Federal. A CF/1988 realça a necessidade da transposição para fazer cumprir a lei maior em seu artigo 43, parágrafo dois, inciso IV. Este artigo menciona que a União pode atuar administrando complexo geoeconômico e social, visando o seu desenvolvimento e a redução das desigualdades regionais. Particulariza ao citar que os incentivos regionais compreenderão prioridade para o aproveitamento econômico e social dos rios e das massas de água represadas ou represáveis nas regiões de baixa renda, sujeitas a secas periódicas. Considerando os dois últimos parágrafos e o fato de haver na região Nordeste somente dois rios perenes federais o Parnaíba e o São Francisco e que o Velho Chico é o mais caudaloso deles, diversos projetos vêm sendo estudados ano a ano visando transferir 3

parte das águas do São Francisco para as regiões nordestinas mais hidricamente castigadas pela seca. No entanto, segundo a Agência Nacional de Águas - ANA - e diversas conferências sobre transferência de águas entre grandes bacias hidrográficas (SBPC, 2004), qualquer transferência hídrica de uma bacia para outra só pode ser justificada quando diversas análises prévias das conseqüências do projeto forem realizadas. As análises necessárias para implementação de um projeto dessa natureza devem incluir: avaliação se a região receptora de água tem comprovada escassez hídrica para o atendimento de suas necessidades; avaliação se os recursos hídricos da região de origem são suficientes para satisfazer a demanda da transferência sem acarretar impedimento ao desenvolvimento futuro dessa região; avaliação se os impactos ambientais ocasionados pela transferência de água são mínimos para ambas as regiões, de destino e de origem; comprovação que os benefícios sociais da região de destino são compatíveis com o porte do empreendimento; avaliação se os impactos positivos gerados são compartilhados razoavelmente entre as regiões de origem e destino. Verifica-se que, para implantar o projeto de transposição, deve-se averiguar, primordialmente, se há realmente déficit hídrico nas bacias receptoras, no caso, nas bacias do Nordeste Setentrional. Em segundo lugar, é imprescindível estudar as condições da bacia do rio São Francisco (bacia doadora) quanto à possibilidade hídrica de atendimento ao projeto. 1.2. Condições hídricas das bacias receptoras as bacias hidrográficas do Nordeste setentrional Para melhor avaliar as condições hídricas das bacias receptoras, deve-se, primeiramente, explicar o que vem a ser o polígono das secas. O polígono das secas foi delimitado em 1951, visando abranger regiões de necessidades hídricas para que nelas houvesse o combate das secas do Nordeste (RN, 2005). 4

Atualmente, o Ministério da Integração Nacional considera o polígono das secas como sendo a área, pertencente ao nordeste brasileiro, mais propensa a períodos de seca, onde se verifica, em uma história de aproximadamente 70 anos, que mais de 80% das secas ocorridas no país ocorreram em tal região. A Figuras 2 ilustra as delimitações deste polígono. Observa-se que grande parte da bacia do São Francisco localiza-se no polígono das secas. Figura 2 A localização da bacia do São Francisco e o polígono das secas 5

O Nordeste setentrional, área pertencente ao polígono da seca, possui clima semiárido, abrangendo parcialmente os estados de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte, com uma população de cerca de 12 milhões de habitantes. De acordo com a Figura 3, essa região tem média pluviométrica menor que 800 mm/ano, o que é pouco em relação à média nacional (1800 mm/ano), representando menos que metade do valor da mesma. No entanto, o dado mais importante que demonstra a necessidade hídrica do Nordeste setentrional é a sazonalidade de suas chuvas - grande parte do volume lá precipitado concentra-se nos 3 meses de verão, sendo os outros 9 meses do ano extremamente secos. Figura 3 Isoietas no Brasil Fonte: ANA, 2005 6

Observando a Figura 4 e comparando-o com o exposto acima, constata-se que há uma forte correlação entre pluviometria e índice de desenvolvimento humano - IDH. Nota-se que a região do polígono das secas possui baixo IDH médio, o que pode estar ligado ao déficit hídrico da região semi-árida. As cidades de Manari-PE e Traipú-AL, por exemplo, possuem, respectivamente, IDHs equivalentes a 0,467 e 0,479; o que é muito baixo quando comparado ao IDH médio brasileiro que é de 0,769. Figura 4 IDH nas regiões hidrográficas brasileiras Fonte: IPEA, 2000 O quadro de extrema pobreza do Nordeste setentrional é bastante antigo. Essa área vem sendo alvo de grandes secas há séculos, fato que contribui para o agravamento desse quadro e constitui fator limitante para o desenvolvimento social da região. 7

As secas, nessa região, de acordo com registros históricos, ocorrem com intervalos próximos a dez anos, podendo se prolongar por períodos de três, quatro e, excepcionalmente, até cinco anos. Pode-se citar, por exemplo, as secas de 1951, 1958, 1979 a 1983, 1990 a 1993 e 1998 e 1999. No entanto, as secas são conhecidas, no Brasil, desde o século XVI (FJN, 2005). Um grande exemplo de seca catastróficas ocorrida há mais de um século atrás foi a compreendida entre 1877 e 1879, quando se estima que aproximadamente 1,7 milhões de pessoas faleceram por falta de comida e/ou sede. Foi justamente nessa época, portanto, que as autoridades começaram a ser pressionadas pela opinião pública para solucionar o problema de déficit hídrico nordestino. Adotou-se como solução, quase padrão, a açudagem, ou seja, a construção de enormes reservatórios que podem armazenar grande volume de água durante as estações chuvosas para que estas sejam utilizadas em períodos críticos tanto para consumo doméstico como para desenvolvimento da agricultura irrigada. Também data dessa época as primeiras idéias envolvendo o desvio de parte das águas do rio São Francisco para amenizar as freqüentes secas do Nordeste. De qualquer forma, deve-se mencionar que a escassez hídrica do Nordeste setentrional impede o surgimento de oportunidades de empregos sustentáveis na região e induz à emigração para as metrópoles. Estima-se que cerca de 1 milhão de nordestinos vivem atualmente em condições precárias nas periferias ou em favelas dos grandes centros urbanos. Segundo o Ministério da Integração Nacional, se o projeto for implantado, haverá retorno de muitos nordestinos a sua cidade natal e uma significativa redução do êxodo da região semi-árida. Portanto, para aumentar a segurança hídrica nas regiões de clima árido e semi-árido, e assim fixar o nordestino em sua terra, gerar crescimento econômico e criar empregos na 8

região, autoridades políticas e diversos setores da sociedade vêm propondo a transposição do São Francisco para a região Nordeste setentrional como forma de aliviar os problemas hídricos e sociais nordestinos. 1.3. Condições hídricas da bacia doadora a bacia do rio São Francisco Esta é uma das questões mais polêmicas deste projeto de integração de bacias, visto que, em geral, os estados pertencentes à bacia do São Francisco e o próprio comitê dessa bacia hidrográfica (CBHSF) são contrários ao projeto. Este sub-item tentará abordar esta questão bastante complexa de forma imparcial, visto que não é o objetivo da tese gerar polêmica de natureza política. Primeiramente, deve-se esclarecer que 60% da bacia do São Francisco pertencem à região semi-árida e que 50% do semi-árido localiza-se na bacia do São Francisco. Outro aspecto importante é que 90 % das vazões do São Francisco são geradas nos estados de Minas Gerais e Bahia, em sua maioria em rios de domínio estadual (Tabelas 3 e 4). Tabela 3 Percentual de vazão de contribuição para o rio São Francisco gerado por estado Contribuição para o São Francisco Rios (%) Rio Paracatu 14 Rio das Velhas 13 Rio Grande 9 Rio Urucuia 9 Afluentes mineiros 8 Rio Corrente 7 Entorno da Represa 7 Rio Paraopeba 6 Rio Pará 6 Rio Carinhanha 6 Outros 15 Total 100 Fonte: Asfora,2005 9

Tabela 4 Percentual de vazão de contribuição para o rio São Francisco de seus afluentes Estados brasileiros Contribuição para o São Francisco (%) Minas Gerais 73,5 Bahia 20,4 Pernambuco 3,2 Goiás 1,2 Alagoas 0,7 Distrito Federal 0,6 Sergipe 0,4 Total 100 Fonte: Asfora, 2005 De acordo com o plano decenal da bacia do São Francisco (ANA), a vazão média na foz é 2850 m 3 /s. No entanto, para haver garantia de vazão na foz, considera-se a vazão firme na foz como sendo 1850 m 3 /s, ou seja, em toda a série histórica do São Francisco (cerca de 70 anos de dados), não houve registro de um evento em que a vazão na foz fosse inferior a esse valor. Considerando que a vazão mínima na foz para garantir um adequado uso múltiplo das águas (geração de energia, irrigação, navegação e vazão ecológica) foi estipulada por portaria do IBAMA em 1300 m 3 /s e, adicionalmente, uma folga de 10% para acomodar a operação dos reservatórios e contingências na geração hidrelétrica, pode-se considerar a vazão mínima na foz do rio como sendo 1430 m 3 /s. Analisando os dados exibidos nos dois últimos parágrafos, obtém-se o saldo da oferta hídrica do São Francisco em sua foz ( 1850-1430m 3 /s = 420 m 3 /s). No entanto, estipulou-se o valor de 360 m 3 /s (valor decidido na terceira reunião plenária do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco), vazão esta que pode ser utilizada para abastecer demandas consuntivas, inclusive para o projeto de transposição. O tema transposição do São Francisco consiste em uma das questões mais polêmicas da atualidade. Tal fato se dá porque há basicamente duas correntes de pensamento completamente opostos os que são a favor e os que são contra ao projeto ou pode-se dizer, 10

os estados beneficiados com a transposição, que são a favor, e os estados doadores hídricos, que são contrários ao projeto. Segundo o governo federal, o volume requerido pelo projeto de transposição representa apenas 3,4% do total que o rio despeja no mar (1.850 m³/s) e, portanto, a obra não prejudicaria a fluência das águas. Os opositores do projeto alegam que o volume retirado deve ser comparado com os 360 m³/s outorgáveis (máximo permitido para ser retirado do rio incluindo outros projetos) e não com os 1.850 m³/s. Outro ponto divergente é o aproveitamento das águas. De acordo com a outorga da ANA, a captação do projeto poderá chegar a uma vazão máxima diária de 114,3 m³/s. No entanto, só poderá se transpor 114,3 m³/s excepcionalmente, e quando o reservatório de Sobradinho estiver acima do normal (DOU, 2005), o que, segundo especialistas, acontece em 40% do tempo. Para os opositores, isso representa um desperdício de dinheiro público, uma vez que a obra ficará 60% do tempo sub-utilizada. 1.4. Breve Histórico de projetos de integração da bacia do São Francisco com bacias do Nordeste Setentrional A preocupação de solucionar a seca no semi-árido brasileiro é bastante antiga, tendo seus primeiros relatos históricos datados da época do Brasil império, quando Dom Pedro II prometeu que venderia, se preciso fosse, todas as jóias da Coroa para solucionar o problema da seca do Nordeste (Filho, 2005). A primeira idéia envolvendo a captação de água do rio São Francisco para amenizar as secas no Nordeste também data do período de Brasil monárquico. Em 1856, a comissão científica de exploração, chefiada pelo barão de Capanema, recomendou a abertura de um canal ligando o rio São Francisco ao rio Jaguaribe (Rebouças, 1997). 11

No entanto, até o início da década de 1980, a transposição do rio São Francisco não podia ser realizada devido a problemas de ordem técnica, pois não havia energia elétrica em quantidade suficiente para acionar as bombas de recalque necessárias para transportar este grande volume de água até as regiões de destino. Já em 1983, Mário Andreazza, quando disputava sua indicação como candidato à presidência da República, apresentou um projeto como um dos pontos de sua plataforma de governo. O projeto propunha a construção de uma barragem para represar o São Francisco perto de Cabrobó (PE), com a finalidade de dali se bombear água para o Ceará e Rio Grande do Norte. Como Andreazza foi derrotado, o projeto foi arquivado (Andrade, 2002). No final dos anos 80, o Departamento Nacional de Obras e Saneamento - DNOS elaborou um projeto de integração das águas do São Francisco com o semi-árido setentrional, cuja finalidade era fortalecer a atividade agrícola na região através da captação de 15% da vazão do Velho Chico. Esse estudo foi retomado e detalhado em 1994, prevendo retirar uma vazão de cerca de 7,5 % da vazão regularizada pela barragem de Sobradinho (Coelho, 2004). O atual projeto, elaborado e defendido com ardor pelo ministério da Integração Nacional, tem custo estimado em 2,7 bilhões de reais e, devido a diversos estudos mais elaborados e precisos, estima-se uma transferência média de aproximadamente 2% da vazão regularizada do rio São Francisco. Estima-se uma média de 45,2 m³/s destinados às bacias do Ceará, do Paraíba e do Rio Grande do Norte e 18,3 m³/s destinados ao estado de Pernambuco, totalizando 63,5 m³/s. A redução de 2/3 da vazão prevista em 1994 foi devido a flexibilidade de retirada de água, pois o novo projeto permite a retirada de águas variar de zero a 114,3 m³/s. Mais detalhes desse projeto serão expostos no Capítulo 3. Portanto, a história da transposição pode ser dividida em 2 períodos: antes da década de 1980, quando estudos eram realizados mas havia limitações técnicas para implementar os 12

projetos e, devido a esses empecilhos, procurava-se outros tipos de solução para amenizar a seca no Nordeste setentrional; depois da década de 1980, quando a engenharia já se encontra avançada o suficiente para enfrentar esta empreitada, restando apenas estudos mais aprofundados para a estipulação de sua viabilidade sócio-econômica e ambiental. 1.5. Objetivo No caso do projeto de transposição do São Francisco para bacias do Nordeste setentrional, um grande impacto, que influenciará no processo de tomada de decisão do projeto, é justamente a possível diminuição de geração de energia elétrica nas usinas localizadas a jusante dos eixos de captação do projeto de transposição. Deve-se esclarecer que tal impacto será amenizado pela estrutura já consolidada e em constante expansão do Sistema Interligado Nacional SIN (Figura 5), que consiste da interligação de transmissão elétrica entre diversas regiões do país, mais especificamente as regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e parte da região Norte e corresponde a cerca de 96% da capacidade de produção de eletricidade do país. Figura 5 O Sistema Interligado Nacional Fonte: ONS, 2005 13

No entanto, não se deve utilizar o argumento de que caso falte energia na bacia do São Francisco (consumo maior que a oferta), o SIN iria cobrir esta falta de energia local enviando energia de outras bacias, para justificar qualquer valor de déficit energético. Se a gestão das bacias hidrográficas brasileiras for conduzida com este raciocínio, não haverá auto-suficiência elétrica em muitas bacias e, o risco de novas crises nacionais de energia, como a ocorrida em 2001, irá aumentar. A presente dissertação visa, portanto, calcular o impacto energético devido a transposição de parte das águas do rio São Francisco e está dividida em 8 capítulos. São eles, além deste Capítulo introdutório: Capítulo 2 - Caracterização da área de estudo Bacia do S. Francisco São expostos aspectos gerais da área de estudo: o rio São Francisco e sua bacia hidrográfica, com realce para as principais características das diversas hidrelétricas ao longo do Velho Chico. Capítulo 3 O projeto de transposição do rio São Francisco É apresentado o atual projeto de transposição do rio São Francisco e mencionado seua aspectos técnicos mais relevantes. Capítulo 4 - O Sistema de Suporte a decisão ACQUANET Explica-se a teoria de modelos baseados em fluxos em rede; e demonstra-se sucintamente como utilizar o SSD AcquaNet, detalhando apenas o módulo energia do modelo, pois este foi o módulo utilizado para a elaboração do estudo de caso. 14

Capítulo 5 - Estudo de impactos na geração hidroelétrica no rio São Francisco devido transposição de suas águas Descreve-se a utilização do modelo para desenvolver o estudo de caso. Através do SSD AcquaNet, os resultados dos impactos energéticos são obtidos e são analisados. Capítulo 6 Conclusões e recomendações Comenta-se sobre os resultados obtidos para o estudo de caso, as limitações do SSD AcquaNet e faz-se recomendações para melhorar a qualidade dos resultados em estudos futuros que se utilizarem deste modelo matemático. Capítulo 7 - Referências bibliográficas Capítulo 8 - Anexos 15

CAPÍTULO 2 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO - A BACIA DO RIO SÃO FRANCISCO A bacia do rio São Francisco, por ser uma bacia de enorme dimensão, com área estimada em 8% do Brasil, possui grande diversidade de climas, relevos, ecossistemas e culturas. O presente capítulo será subdividido em: localização e características gerais da bacia do São Francisco e aproveitamentos hidrelétricos da bacia do São Francisco. 2.1. Localização e características gerais da bacia do São Francisco O rio São Francisco tem este nome por causa da data de chegada do navio do italiano Américo Vespúcio a sua foz, em 4 de outubro de 1501, dia de São Francisco de Assis. O rio nasce no estado de Minas Gerais, na serra da Canastra, mais especificamente no alto do Chapadão da Zangaia, a 1428 metros de altitude em relação ao nível do mar. Ele flui por 2800 km até a divisa dos estados de Alagoas e Sergipe onde deságua no oceano Atlântico com vazão média anual de aproximadamente 2850 m 3 /s. O São Francisco é o 5º maior rio do Brasil, 18º do mundo e o maior genuinamente brasileiro, pois é o único dentre os 5 maiores rios nacionais em que sua bacia hidrográfica localiza-se, integralmente, em território nacional (Hermuche, 2000). Esse grandioso rio possui uma bacia de contribuição hídrica estimada em 640.000 km 2, o que equivale a cerca de 8% do território nacional. Sua bacia é constituída de 7 estados distintos, são eles: grande parte do território dos Estados de Minas Gerais, Bahia, Pernambuco e Alagoas; e pequena parcela dos Estados de Goiás, Distrito Federal e Sergipe. O ANEXO 1 além de delinear a bacia, detalha sua localização no território do Brasil. 16

O curso do rio São Francisco pode ser dividido em quatro trechos: alto São Francisco (desde a sua nascente até próximo à confluência com o rio das Velhas); o médio (desde onde começa o trecho navegável do rio e segue até a barragem de Sobradinho, na Bahia); o submédio (desde Sobradinho até a confluência com o rio Ipanema) e o baixo (desde a cidade de Pão de Açúcar até sua foz) (MI, 2004). O mapa do ANEXO 1 (vide sua legenda) ilustra essa divisão da bacia em regiões fisiográficas. O Velho Chico deve sua existência a seus afluentes, que são uma espécie de sangue que dão força e vivacidade para fluir de forma perene por tantos quilômetros em condições climáticas nem sempre favoráveis (JN, 2005). Pode-se observar também, no ANEXO 1, a localização de alguns de seus principais afluentes, como os rios, de montante para jusante, Paraopeba, das Velhas, Paracatu, Urucuia, Corrente, Grande, Jacaré, Pajeú, Ipanema, entre outros. No entanto, deve-se destacar que através de avaliação da geologia, do relevo e dos solos da bacia, concluiu-se que o principal manancial responsável pela regularização das vazões do rio no período seco do ano é o sistema aqüífero Urucuia. Sua descarga de base representa quase metade da vazão do rio São Francisco a partir de alguns de seus rios afluentes como os citados rios Grande e Corrente. Eles tendem a ter vazões regulares mesmo nos períodos secos do ano ou em períodos de alguns anos com baixa precipitação média. Esse fenômeno é relacionado à função reguladora do aqüífero, que funciona como um grande pulmão hídrico para a bacia do São Francisco (Campos, 2005). É fato que o desmatamento vem aumentando continuamente na bacia, estimulado principalmente pela necessidade de carvão para alimentar siderúrgicas. Outro fato alarmante é que praticamente não existe mais mata ciliar ao longo do São Francisco. No lugar das árvores, só tem capim, e as pastagens avançam até o leito. Segundo cálculos dos ambientalistas, 80% das matas ciliares do rio São Francisco foram destruídas (JN, 2005). 17

O desmatamento da bacia adicionado ao crescimento descomunal dos volumes de água captados dos rios e do aqüífero Urucuia para fins de irrigação, fazem com que as vazões dos principais rios da região e, conseqüentemente, a regularidade das vazões do São Francisco no período seco do ano, deva sofrer diminuições significativas nos próximos 10 ou 20 anos (Campos, 2005). Apesar de todos esses fatores negativos, ao final de seu longo trajeto, o rio encontra força para desembocar no mar. Sua foz é do tipo estuário, pois é constituída por um longo canal de forma afunilada, ou seja, a medida que ele se aproxima do mar, suas margens tornam-se cada vez mais próximas uma da outra, formando uma passagem única e direta (Hermuche, 2000). 2.1.1 Clima O clima da bacia é muito diversificado devido a sua grande dimensão e características distintas, como diferenças de relevo e de proximidade com o mar. O alto São Francisco caracteriza-se por possuir umidade alta e altitude elevada, sendo a estação chuvosa na época de verão e a seca durante o inverno. As precipitações médias anuais variam de 1000 a 1500 mm e a temperatura média anual é de cerca de 23º C. O clima dessa região é considerado como sendo úmido e sub-úmido. O médio São Francisco, por ser a maior das regiões fisiográficas da bacia, possui diferentes tipos de clima. Essa região, em seu início, tem clima parecido com o Alto São Francisco, com precipitações médias anuais de 1000 mm. No entanto, passado esta parte, há um trecho de região semi-árida onde a precipitação é baixa, havendo anos em que a média anual fica abaixo de 600 mm. A temperatura média anual é de cerca de 24º C. Os climas dessa região são caracterizados como sub-úmido seco e semi-árido. 18

O sub-médio São Francisco abriga a região mais seca de toda a bacia. Nesse local a precipitação média anual varia de 350 a 800 mm, distribuída irregularmente durante o ano. Os meses chuvosos ocorrem no verão e os outros 9 meses do ano caracterizam-se por serem muito secos. A temperatura média anual é de cerca de 27º C. Pode-se classificar os climas dessa região como semi-árido e árido. O baixo São Francisco caracteriza-se por um clima um pouco mais ameno pela proximidade do mar. Nessa região, há uma forte mudança na distribuição anual da chuva do interior para o litoral, já que na foz do rio elas são bem distribuídas ao longo de todo o ano, sendo um pouco mais intensas na época de outono e inverno. As precipitações médias anuais variam de 800 a 1300 mm, e a temperatura média anual é de cerca de 25º C. Os climas desta região variam entre semi-árido e semi-úmido úmido (Hermuche, 2000). Devido a essa diferença nas características climatológicas da bacia, as chuvas que chegam ao rio variam muito de volume ao longo do seu percurso. A média anual varia de 1.900 mm na nascente, em Minas Gerais, a 400 mm no semi-árido nordestino. A taxa evaporação varia de 500 mm anuais, nas nascentes, a 2.200 mm, em Petrolina, perto da fronteira da Bahia com Pernambuco. Essa evaporação elevada, característica do semi-árido nordestino, dificulta a manutenção de água nos açudes da região, que não são abastecidos por rios perenes (Izique, 2005). Os ANEXOS 2 e 3 mostram, respectivamente, a precipitação média em diversas localidades da bacia do rio São Francisco e o mapa da bacia do rio São Francisco com detalhes de informações pluviométricas de diversas estações localizadas nas várzeas do rio São Francisco. Comprova-se, através da análise desses mapas e dos dados neles contidos, a grande variação de distribuição de chuvas ao longo do rio e de sua bacia hidrográfica. Por essa razão, 19

juntamente ao fato de ser uma bacia importante no âmbito nacional, torna-se imprescindível a elaboração de estudos que visem à melhora da gestão hídrica nessa bacia. 2.1.2 População Como mencionado anteriormente, o rio possui um extenso vale. Esse vale abrange aproximadamente 500 municípios de 7 estados brasileiros. Cerca de 16,14 milhões de pessoas (9,5% da população do país) habitam a bacia, com maior concentração no alto (56%) e médio São Francisco (24%). A população urbana representa 77% da população total e a densidade populacional é de 22 hab/km 2. Nas demais regiões observa-se percentual de população da ordem de 10% no sub-médio e no baixo São Francisco (Silva et al., 2005). Os dados referentes à população urbana e rural e taxa de urbanização estão apresentados na Tabela 5: Tabela 5 Dados populacionais das sub-bacias do São Francisco Sub-bacia População (hab) Urbana Rural Total Urbanização (%) Alto 6.461.510 269.230 6.730.740 96 Médio 2.814.511 2.302.782 5.117.293 55 Sub-médio 1.375.230 1.080.538 2.455.768 56 Baixo 901.713 938.518 1.840.231 49 Total 11.552.964 4.591.068 16.144.032 77 Fonte: Silva et al., 2005 20

2.1.3 Disponibilidade hídrica O mapa do ANEXO 4, que retrata a disponibilidade hídrica na área da bacia do São Francisco, ilustra que a área de maior escassez hídrica da bacia corresponde às sub-bacias localizadas em seu trecho médio e sub-médio. É justamente, nessa região, que se localizarão as captações hídricas (eixo Norte e eixo Leste) que estão previstas pelo projeto de transposição hídrica. 2.2. Os aproveitamentos hidrelétricos da bacia do São Francisco As usinas hidrelétricas situadas na bacia do São Francisco produzem 10643,9 MW, ou seja, aproximadamente 17% do total produzido no país. As situadas no próprio leito do rio estão entre as maiores do Brasil (Porto, 2005). O ANEXO 5 localiza as diversas usinas hidrelétricas da bacia. Pode-se observar, pelo ANEXO 6, que as usinas localizadas no leito do São Francisco são responsáveis por grande parte da energia produzida na bacia. A soma da energia instalada nessas usinas responde por aproximadamente 97% do total da energia hidrelétrica instalada na bacia. A Figura 6 ilustra o esquema topológico da geração hidrelétrica no rio São Francisco. Neste esquema há informações de posicionamento de seus aproveitamentos hidrelétricos e principais afluentes do rio São Francisco. A Tabela 6 exibe numericamente as principais características dos reservatórios localizados no rio São Francisco. 21

Figura 6 Topologia das usinas hidrelétricas da bacia do rio São Francisco Fonte: Freitas, 2002. 22

Tabela 6 Principais características dos reservatórios hidrelétricos do rio São Francisco UHE Dist. até foz (km) Dist. usinas (km) Área de drenagem (km 2 ) A. de drenagem incremental (km 2 ) Vútil (hm3) Pinstalada (MW) 3 Marias 2220 50560 50560 15278 396 Sobradinho 800 1420 498425 447865 28669 1050 Itaparica 310 490 587000 88575 3548 1500 Moxotó 270 40 599200 12200 226 400 P. A. 1/3 270 0 599200 0 90 1423 P. A. 4 270 0 599200 0 30 2460 Xingó 210 60 608700 9500 5 3000 Fonte: ANA/GEF/PNUMA/OEA, 2002. Na bacia do rio São Francisco, existem basicamente dois tipos de usinas hidrelétricas as barragens com reservatório, que se caracterizam pela possibilidade de controlar cheias e regularizar o rio a jusante das mesmas, e as barragens sem reservatório, conhecidas como usinas a fio d água. Como se pode observar pelo quadro exposto acima, a maior área de drenagem entre 2 usinas hidrelétricas ocorre no trecho entre Três Marias e Sobradinho, portanto, para evitar inundações catastróficas em regiões próximas ao Velho Chico, decidiu-se que essas 2 barragens deveriam possuir grandes reservatórios, visando a regularização do rio a jusante e o impedimento da passagem da onda de cheia. As usinas hidrelétricas de Três Marias e Sobradinho regularizam o rio com uma vazão de, respectivamente, 517m 3 /s e 1.815m 3 /s (quando somada à regularização de Três Marias). Além de evitar inundações à jusante, essas duas represas também exercem fundamental papel estratégico, pois através da regularização do rio São Francisco, possibilita a geração de energia hidroelétrica, durante todo o ano, nas 23

usinas a jusante de Sobradinho, isto é, Itaparica, Moxotó, Complexo de Paulo Afonso e Xingó. No entanto, cada uma das grandes usinas hidrelétricas do Velho Chico operam segundo normas que atendam a certas restrições de vazões e níveis de água, restrições essas que visam garantir, além do suprimento hídrico para atendimento aos diversos usos da água, o controle de cheias para evitar catástrofes em regiões habitadas situadas em sua margem. A Figura 7, além de dar características gerais, ilustra a composição dos principais reservatórios da bacia do São Francisco. Figura 7 Principais reservatórios hidrelétricos da bacia do rio São Francisco Fonte: ANA,2005 Figura acima. A seguir, caracteriza-se brevemente cada uma das usinas hidrelétricas expostas na 24

2.2.1 Três Marias: Inaugurada em 1952 pela CEMIG - Centrais Elétricas de Minas Gerais S.A., a barragem tem 2.700 metros de comprimento e forma um reservatório de cerca de 21 bilhões de metros cúbicos de água. Situa-se a 2.221 Km acima da foz do rio e foi construída para fins de uso múltiplo das águas de seu reservatório. Usos como produção de energia hidrelétrica, controle de enchentes, irrigação e melhoria das condições de navegabilidade do São Francisco. A usina e seu lago estão localizados na parte central de Minas Geral, pertencente a MRH - 173, compreendendo os municípios de: Felixlândia, Morada Nova de Minas, Biquinhas, Paineiras e Barreiro Grande. Esses municípios situam-se ao redor da represa da hidrelétrica e tiveram parte de suas áreas inundadas. A represa de Três Marias tem papel estratégico importante para a bacia do São Francisco, já que é através de sua operação que o rio ganha força para enfrentar um clima hostil, característico do sertão. Situada a 95 km a montante de Pirapora, onde começa o principal trecho navegável do São Francisco, a barragem de Três Marias retém as enchentes nos períodos chuvosos e garante os níveis mínimos de água para a navegabilidade durante as estiagens. Essa vazão controlada, cujos benefícios vão repercutir até na usina de Paulo Afonso, possibilita ainda o desenvolvimento de irrigação às margens do rio, afastando os efeitos danosos de eventos chuvosos. A hidrelétrica, além de importante função de controle de cheias no rio São Francisco, tem instalada 6 unidades de geração elétrica que somam um total de 396 MW. 25

2.2.2 Sobradinho Inaugurada em 1979 pela CHESF Companhia Hidroelétrica do São Francisco, Sobradinho localiza-se na Bahia e constitui-se em um dos projetos hidrelétricos mais importantes executados na bacia do São Francisco, em função de sua capacidade de fazer regularização plurianual do rio São Francisco. A regularização plurianual permite que Sobradinho garanta uma vazão mínima de 2.060 metros cúbicos por segundo e possibilita, assim, a utilização plena dos demais aproveitamentos hidrelétricos, situados a jusante. Os 34,1 bilhões de metros cúbicos de água da represa de Sobradinho inundam uma área de 4.214 Km 2, formando o maior lago artificial da América Latina e um dos maiores do mundo. Para fins de ordem de grandeza, o lago ocupa uma área 10 vezes maior do que a Baía de Guanabara - RJ. Para a formação de tão grandioso lago, quatro cidades - Casa Nova, Santo Sé, Remanso e Pilão Arcado tiveram que ser submersas pelas águas. A hidrelétrica, além de importante função de regularização plurianual do São Francisco, tem instalada 6 unidades de geração elétrica que tem um total de 1050 MW, potência esta que acrescenta cerca de 4 bilhões de KW anuais de energia firme para o Nordeste. 2.2.3 Itaparica (Luiz Gonzaga) Inaugurada em 1988 pela CHESF, Itaparica localiza-se em Pernambuco, mais especificamente a cerca de 10 km a jusante da cidade de Petrolina-PE e constitui-se de barragem de seção mista (terra/enrocamento), associada às estruturas de concreto da casa de máquinas e do vertedouro, com uma extensão total da crista de 4.700 m. O reservatório acumula quase 11 bilhões de m³. A formação do lago inundou áreas da Bahia e Pernambuco, como as cidades de Rodelas (BA), Petrolância e Itacuruba (PE), antes 26

habitadas por 10 mil e 500 famílias que foram reassentadas em 3 cidades e um povoado, em projetos de irrigação que hoje contam com mais de 15.000 hectares em operação. A hidrelétrica, apesar de prever na etapa final de seu projeto final a instalação de 10 unidades geradoras com potência de 250 MW cada uma, possui atualmente somente 6 unidades, somando um total de 1500 MW instalados. A usina de Itaparica estará interligada, através de linhas de 500 KV, com a usina de Sobradinho e com o complexo hidrelétrico de Paulo Afonso, por onde escoará a sua energia para o sistema de transmissão existente. 2.2.4 Moxotó (Apolônio Sales) Inaugurada em 1977 pela CHESF, a usina hidrelétrica de Moxotó localiza-se entre os aproveitamentos de Paulo Afonso e Itaparica, e constitui-se de barragem de terra e enrrocamento, formando um reservatório de regularização pluri-semanal do rio, com o volume de 1,2 bilhões de metros cúbicos, e de uma casa de máquinas com 4 unidades geradoras de 100 MW, perfazendo o total de 400 MW. Integrante do complexo hidrelétrico de Paulo Afonso, Moxotó localiza-se cerca de 3 km a montante da primeira barragem, de modo que a água que aciona suas turbinas, através de queda líquida de 21 metros, aciona também as unidades geradoras das usinas de Paulo Afonso I, II e III, num segundo desnível em cascata. Além disso, através de um canal escavado a partir de sua margem direita, o reservatório de Moxotó fornece água para acionar a Usina de Paulo Afonso IV. Deve-se mencionar o importante papel estratégico do reservatório de Moxoto pois, através de sua água acumulada, permite a operação racional das usinas de Paulo Afonso I, II, III e IV, não restringindo geração de energia por parte das mesmas nem em época de estiagem. 27

2.2.5 Paulo Afonso I, II, III e IV: A história das usinas de Paulo Afonso confunde-se com a história de sua criadora, a CHESF, já que a criação da empresa, em 1948, teve como finalidade imediata a construção da primeira usina de Paulo Afonso. Paulo Afonso I foi implementada para aproveitar eletricamente o potencial hidráulico de um desnível natural de 80 metros do rio São Francisco - a cachoeira de Paulo Afonso. Portanto, em 1948 foram iniciadas as obras do acompanhamento e implementados os estudos técnicos e o projeto para construção de Paulo Afonso I. As obras foram parcialmente concluídas seis anos depois, em setembro de 1954, quando fez-se o fechamento do rio. As duas primeiras unidades geradoras de Paulo Afonso I entraram em operação ainda no final de 1954, passando a produzir energia para o abastecimento das duas principais cidades da região - Recife e Salvador. No mês de outubro do mesmo ano, a obra foi finalmente concluída, com a entrada em funcionamento de sua terceira unidade. Prevendo-se a grande expansão que viria a ocorrer no mercado de energia elétrica regional, provocada principalmente pela própria oferta criada pela usina de Paulo Afonso I, a barragem de Paulo Afonso fora projetada de modo a permitir a ampliação do aproveitamento em condições econômicas extremamente favoráveis, através da construção de mais duas tomadas de água e respectivas casas de máquinas, que mais tarde viriam a ser chamadas de Paulo Afonso II e III. A usina de Paulo Afonso II foi executada dentro da mesma concepção da anterior, porém com maior dimensão, com seis unidades geradoras, totalizando 445 MW. As obras dessa segunda usina começaram em 1955, e as suas duas primeiras máquinas entraram em funcionamento no final de 1961. As demais foram sendo instaladas até o ano de 1967, quando entrou em serviço a sexta e última unidade geradora. 28

Já a terceira usina, Paulo Afonso III, teve o seu projeto aprimorado, avançando-se a tomada d'água em relação às duas outras, obtendo-se, com isso um melhor rendimento de altura e queda. A usina tem potência total instalada de 800 MW e foi iniciada em 1967 e concluída em 1974. As 4 usinas de Paulo Afonso totalizam 3885 MW instalados, e permite o aproveitamento da água oriunda da barragem de Moxotó. 2.2.6 Usina de Xingó A Usina Hidrelétrica Xingó é bastante recente, pois tem como data de início de operação o ano de 1994. Constitui-se de uma das hidrelétricas mais modernas do Brasil e a maior em potência instalada de toda a bacia do São Francisco, já que suas unidades geradoras totalizam 3000 MW instalados. Localizada na divisa dos Estados de Alagoas e Sergipe, a 210 quilômetros da foz, Xingó é a última usina do rio São Francisco. Ela é totalmente automatizada. Através do centro de controle informatizado, são operadas as unidades geradoras da usina e a subestação elevadora de 500 kv. 2.3. Conclusão da caracterização da bacia Aproximadamente 75% das vazões no rio São Francisco são provenientes do seu terço superior (Minas Gerais). Por essa razão, a derivação de água em quantidade significativa em qualquer trecho a montante de Xingó trará impactos relevantes na geração de energia. Sendo o Velho Chico o rio mais representativo na geração de energia da região Nordeste do Brasil, e considerando que já houve crise energética no país (em 2001), nada mais lógico do que estudar as conseqüências do projeto de transposição do rio São Francisco nas usinas dessa importante bacia. 29

CAPÍTULO 3 O PROJETO DE TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO PARA O NORDESTE SETENTRIONAL 3.1 Detalhes do projeto de transposição do rio São Francisco Este capítulo visa resumir brevemente o atual projeto de integração do rio São Francisco com as bacias hidrográficas do Nordeste Setentrional elaborado pelo Ministério da Integração Nacional. O projeto tem como principal objetivo aumentar a garantia de atendimento hídrico de 45% da população do Nordeste setentrional, o que corresponde a ajudar cerca de 12 milhões de pessoas que atualmente sofrem por viver nesta região hidricamente castigada (Izique, 2005). A situação hídrica da região a ser beneficiada com o projeto é caótica. Segundo a ONU, a mínima disponibilidade hídrica per capita para mantimento de vida sustentável é de 1500 m 3 /hab.ano e a disponibilidade no Nordeste setentrional é de apenas 450 m 3 /hab.ano, ou seja, inferior a 1/3 deste mínimo (Silva, 2005). Por possuir cerca de 70% do total de água doce do Nordeste em sua bacia, concentrado principalmente no leito de um rio perene, e pelo fato de se localizar relativamente próximo a região hidricamente problemática, o São Francisco foi escolhido pelo Ministério da Integração Nacional para ser o doador hídrico do projeto de transposição (Gomes, 2005). A transposição consiste, portanto, na integração da bacia do maior rio perene da região Nordeste às bacias dos rios intermitentes de Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte e do Ceará (Silva, 2005). 30