A FORÇA AÉREA BRASILEIRA EM TEMPO DE PAZ: BUSCA E SALVAMENTO E O CASO GOL 1907



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A FORÇA AÉREA BRASILEIRA EM TEMPO DE PAZ: BUSCA E SALVAMENTO E O CASO GOL 1907 Tania Regina Pires de Godoy; Tales Luz Andrade Pimenta; Phellip Borelli; Eduardo Oliveira Travessas; Luiz Claudio Mendes dos Santos; André Jorge Dias de Moura Junior. RESUMO Como o Brasil é um país que desfruta de mínimos riscos em comprometer sua posição como nação em paz, temos consciência de que a atuação da Força Aérea Brasileira (FAB) é parcialmente desconhecida pela sociedade civil brasileira. Para buscar dirimir este fato, nosso trabalho se propõe a estudar a atuação da FAB no resgate do Voo Gol 1907, em decorrência do acidente que levou à queda do avião em plena floresta amazônica, ocorrida em 2006, elucidando a participação da equipe de resgate da Força e a operação SAR (search and rescue) desencadeada após o acidente. Pretendemos, a partir do estudo de caso, apresentar e justificar a importância de sua atuação em momentos não beligerantes, com o intuito de demonstrar seu desempenho, sua forma de funcionamento e sua atuação no cenário nacional. O estudo de caso terá como base conceitual os relatórios disponíveis em caráter ostensivo disponibilizados pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes da Aeronáutica (CENIPA), os manuais doutrinários da FAB (Doutrina Aerospacial) e demais documentos e estudos relevantes sobre o assunto. Faremos, inicialmente, uma abordagem geral acerca da Força Aérea Brasileira, sua constituição e missão institucional como Força Armada em tempos de paz, tendo como escopo teórico a Estratégia Nacional de Defesa e o Plano Estratégico Militar da Aeronáutica (PEMAER). Apresentaremos um breve histórico das operações de busca e salvamento com a participação da FAB. Em seguida, abordaremos o caso a que nos propomos utilizar como ilustração de suas missões o acidente do GOL 1907 de 2006 as medidas tomadas e a cadeia de acionamento dos órgãos competentes para o resgate de possíveis sobreviventes. Em seguida apresentaremos o tema central do nosso trabalho: a operação montada de busca das vítimas do acidente, em ambiente inóspito e de difícil acesso, e a aplicação dos treinamentos à luz dos aspectos doutrinários e dos valores militares da FAB empregados naquelas circunstâncias. Por conclusão, analisaremos o caso de forma crítica e com visões prospectivas da atuação da Força Aérea em tempos de paz dentro do território nacional.

INTRODUÇÃO Como o Brasil é um país que desfruta de mínimos riscos em comprometer sua posição como nação em paz, temos consciência de que a atuação da Força Aérea Brasileira (FAB) é parcialmente desconhecida pela sociedade civil nacional. Para buscar dirimir este fato, nosso trabalho se propõe a estudar a atuação da FAB no resgate do Voo Gol 1907, em decorrência do acidente que levou à queda do avião em plena floresta amazônica, ocorrida em 2006, elucidando a participação da equipe de resgate da Força e a operação SAR (search and rescue) desencadeada após o acidente. Pretendemos, a partir do estudo de caso, apresentar e justificar a importância de sua atuação em momentos não beligerantes, com o intuito de demonstrar seu desempenho, sua forma de funcionamento e sua atuação no cenário nacional. O estudo de caso terá como base conceitual os relatórios disponíveis em caráter ostensivo disponibilizados pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes da Aeronáutica (CENIPA), os manuais doutrinários da FAB (Doutrina Aerospacial) e demais documentos e estudos relevantes sobre o assunto. Faremos, inicialmente, uma abordagem geral acerca da Força Aérea Brasileira, sua constituição e missão institucional como Força Armada em tempos de paz, tendo como escopo teórico a Estratégia Nacional de Defesa e o Plano Estratégico Militar da Aeronáutica (PEMAER). Apresentaremos um breve histórico das operações de busca e salvamento com a participação da FAB. Em seguida, abordaremos o caso a que nos propomos utilizar como ilustração de suas missões o acidente do GOL 1907 de 2006 as medidas tomadas e a cadeia de acionamento dos órgãos competentes para o resgate de possíveis sobreviventes. Em seguida, apresentaremos o tema central do nosso trabalho: a operação montada de busca das vítimas do acidente, em ambiente inóspito e de difícil acesso, e a aplicação dos treinamentos à luz dos aspectos doutrinários e dos valores militares da FAB empregados naquelas circunstâncias. Por conclusão, analisaremos o caso de forma crítica e com visões prospectivas da atuação da Força Aérea em tempos de paz dentro do território nacional. 2

1. A FAB EM TEMPO DE PAZ Dentre as inúmeras atribuições do Estado em relação ao povo Brasileiro estão a Defesa e a Segurança 1, as quais são fundamentais para que a sociedade seja capaz de alcançar seus objetivos. Segundo a Política Nacional de Defesa (2005), o Estado apresenta como pressupostos básicos território, povo, leis e governo próprio, detendo, ainda, o monopólio legítimo dos meios coercitivos para fazer cumprir a lei e a ordem, provendo, também, a Segurança e, por último e não menos importante, sendo responsável pela Defesa através de suas Forças Armadas. É de competência do Estado Brasileiro que a nação apresente condições de se desenvolver de forma livre e, principalmente, soberana, sem que tenha que conviver com agressões ou ameaças externas, bem como imposições políticas ou econômicas que venham a interferir em seu progresso. O Estado, para exercer seu papel no que tange à Segurança e à Defesa do Brasil e à garantia dos poderes constitucionais, conta com um Instrumento Militar formado por suas Forças Armadas Marinha do Brasil, Exército Brasileiro e Força Aérea Brasileira. Sobre tal aspecto, se faz pertinente citar o que está estabelecido no Artigo 142 da 35ª edição da Constituição Federal Brasileira de 1988: As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. Segundo a Doutrina Básica da Força Aérea Brasileira, a DCA 1-1 (2005), a missão-síntese da FAB é manter a Soberania do espaço aéreo nacional com vistas à Defesa da Pátria. A FAB, segundo o Livro Branco de Defesa Nacional (2012), tem como objetivo, de forma paralela à sua missão-síntese, impedir o uso do espaço aéreo brasileiro para a prática de atos hostis ou contrários aos interesses nacionais, dispondo, assim, de capacidade de Vigilância, Controle e Defesa do espaço aéreo, com recursos de detecção, interceptação e destruição. Cabe ainda à FAB atividades como: prover a segurança da navegação aérea; operar o Correio Aéreo Nacional (CAN); Operar a infraestrutura aeroespacial, 1 Segurança é a condição que permite ao País preservar sua soberania e integridade territorial, promover seus interesses nacionais, livre de pressões e ameaças, e garantir aos cidadãos o exercício de seus direitos e deveres constitucionais (Política Nacional de Defesa, 2012). 3

aeronáutica e aeroportuária de interesse militar; cooperar, se necessário, através de apoio logístico, de inteligência, de comunicações ou de instrução com os órgãos federais na repressão de delitos de repercussão nacional ou internacional; e atuar contra todos os tipos de tráfegos aéreos ilícitos por meio de ações de controle do espaço aéreo brasileiro. Ressalta-se que, de acordo com a Lei nº 7565, de 19 de dezembro de 1986, alterada pela Lei nº 9614, de 5 de Março de 1998, quando autorizado pelo Presidente da República ou autoridade por ele delegada, tendo os meios coercitivos legalmente previstos esgotados, a Força Aérea tem a atribuição de destruir aeronave que seja classificada como hostil (BRASIL, 2012). Faz-se pertinente relatar o importante papel da FAB em Programas Sociais da Defesa como o Calha Norte, o qual promove a ocupação e o desenvolvimento ordenado e sustentável da região do Norte do Rio Amazonas, da Ilha de Marajó, no estado do Pará, e para o sul da calha do Rio Solimões/Amazonas, até os limites dos estados de Rondônia e Mato Grosso. Estão entre as atividades realizadas pela FAB nesse programa: implantação de unidades militares, apoio por meio de transporte aéreo logístico, manutenção de aeródromos, apoio às comunidades e evacuação aeromédica (BRASIL,2012). Por fim, a FAB, assim como as demais Forças Armadas do Brasil, ainda desempenha ações subsidiárias e complementares, as quais objetivam contribuir para o desenvolvimento nacional e defesa civil, sem comprometer a sua destinação constitucional. Segundo o Livro Branco de Defesa Nacional (2012), são exemplos dessas atividades: realização, através da Comissão de Aeroportos da Região Amazônica (COMARA), de obras de construção e pavimentação de aeroportos e edificações aeroportuárias, de modo a colaborar com a integração nacional; transporte de pessoas, víveres e apoio médico; realização de evacuações aeromédicas em regiões remotas; e apoio humanitário em ocorrências de sinistros e calamidades como quedas de aeronaves, enchentes ou deslizamentos, apoio esse realizado frequentemente na forma de missões de Busca e Salvamento. 2. Busca e Salvamento Uma das Tarefas da Força Aérea é a Sustentação ao Combate, a qual potencializa o poder da FAB. Assim, como missão aplicável a esta tarefa, tem-se a Busca e Resgate. Entretanto, a missão emprega-se tanto em tempos de guerra como de 4

paz, em áreas amigas e inimigas. Tem como objetivo localizar aeronaves abatidas ou acidentadas, embarcações em emergência ou pessoas em perigo, proporcionando apoio ou resgate a tripulantes e passageiros, se necessário (DCA1-1, 2005). A Missão de Busca e Salvamento poderá ocorrer concomitante com outras, tais como Comunicação Social, Controle e Alarme em Voo e Reabastecimento em Voo. A FAB é organizada em 4 comandos operacionais, denominados Forças Aéreas. A Segunda Força Aérea (II FAE) emprega aeronaves em operações aerotáticas independentes ou em conjunto com as outras forças e em operações SAR. Com base nessa atividade, foi criada a Aviação de Busca e Resgate a qual se conceitua como um conjunto de aeronaves, tripuladas por pilotos especializados e com meios materiais e humanos de apoio. As aeronaves utilizadas nesse tipo de operação são: C-105 A, C-130 Hércules, C-95 Bandeirante, H-1H, H-34 Puma, H-36 e H-60. As Aeronaves estão em diversas Unidades Aéreas distribuídas pelo país. De acordo com a sua missão institucional, O Segundo Esquadrão do Décimo Grupo de Aviação (2º/10º Gav), Esquadrão Pelicano, é uma Unidade Aérea que possui como principal atribuição a missão de Busca e Salvamento. 2.1 O Pelicano O Esquadrão Pelicano é a única Organização Militar das Forças Armadas cuja função essencial é a salvaguarda da vida humana. De acordo com sua heráldica aprovada pela portaria COMGAR nº 054/A6, seu simbolo é a ave Pelicano que, com seu vôo gracioso, simboliza a destreza e operacionalidade do 2 /10 GAV. Sua missão é a manutenção do preparo técnico-profissional necessário e suficiente para realizar missões de Busca e Salvamento de aeronaves e embarcações sinistradas ou desaparecidas. Entretanto, a missão de Busca e Salvamento não seria possível somente com o emprego das aeronaves. Em cooperação com o 2º/10º, os militares do Para-Sar, apoiam as operações e resgates. Esses militares estão espalhados em diversas unidades pelo Brasil, para cumprir as missões de resgate, busca e salvamento e serviço de alerta. 2.2 O Para-Sar A palavra Para-Sar é, assim, explicada: "Para" de paraquedistas e "Sar" do inglês Search and Rescue. O Esquadrão Aeroterrestre de Salvamento (EAS), o Para-Sar, 5

compõem um esquadrão paraquedista de elite da Força Aérea Brasileira e, conforme sua missão institucional, tem por finalidade a Instrução Especializada para os tripulantes e equipes de Busca e Resgate (SAR) da organizações militares, bem como, a realização de ações, relacionadas com a atividade de Busca e Resgate, a execução de Operações Especiais e outras que lhe forem determinadas O Para-sar foi criado no Campo dos Afonsos (RJ), onde permaneceu por 47 anos. No entanto, foi necessário a mudança de sua sede para o Mato Grosso do Sul, devido a sua posição estratégica no centro do país. A partir deste momento o esquadrão ganhou mais capacidade de pronta-resposta em todo território brasileiro. Então, em novembro de 2010, foi movimentado para a Base Aérea de Campo Grande. Atualmente, o EAS possui cerca de 150 militares e dá apoio as equipes de resgate em todo país. O Esquadrão Aeroterrestre de Salvamento, além de sua honrosa missão, tem maior notoriedade pelos valores de seus militares. São forjados tanto na parte física como na parte intelectual. A progressão operacional máxima é atingida após realizados 7 cursos obrigatórios. Quando concluído todos os cursos de especialização em combate e salvamento, esses militares recebem o título de "Pastor". Esse nome deve-se a raça de cães Pastor Alemão, os quais são conhecidos por serem leais, vigilantes e, se necessário, agressivos. Nas últimas décadas o Para-Sar participou de muitas operações importantes para a aviação e o Brasil. São inúmeras e inesperadas missões. De acordo com o depoimento do Tenente Edward Wilson Sadler Guedes no artigo "PARA-SAR: A Tropa de Elite da Força Aérea Brasileira", com 16 anos de EAS ele já perdeu a noção de quantos resgates já participou. Os Pastores são expostos a todo o momento a situações de risco e estressantes. Eu havia retirado o corpo de um menino. Alguns dias depois, quando eu consegui ligar e falar com minha esposa, ela comentou que no voo havia um menino, ele chamava Daniel. Pela descrição, lembrei que eu havia retirado o corpo dele. O menino tinha exatamente a idade do meu filho. Naquele momento eu fiz a relação com minha família. Por um momento, eu parei, afirma o tenente no artigo acima citado. 3. O Acidente O Embraer Legacy 600 da empresa norte-americana ExcelAire decolou em 29 de Setembro de 2006 da cidade de São José dos Campos (SBSJ), com destino ao Aeroporto Internacional de Manaus (SBEG), um dos pontos previstos na rota, com a finalidade de 6

se concluírem os tramites alfandegários para prosseguirem para os EUA. Na mesma data, decolou de Manaus, com destino à Brasília (SBBR), um Boeing 737 da GOL, que realizava o voo rotineiro 1907, com 154 pessoas a bordo. O Legacy 600 deveria decolar de SBSJ e prosseguir para SBBR no nível de voo FL370, quando então deveria descender para FL360 e seguir na aerovia superior UZ6 em direção a SBEG enquanto o GOL 1907 oriundo de SBEG deveria prosseguir diretamente para SBBR, também na aerovia superior UZ6, mantendo o nível de voo FL370. Seguindo o planejamento, as aeronaves deveriam se cruzar em algum lugar sobre a Amazônia, com uma diferença de 1000ft (304,8m) de altura entre eles. Por voarem ambas em espaço aéreo classe A estariam sujeitas ao serviço de controle de trafego aéreo bem como separações entre si, de acordo como o item 7.4.1 da ICA 100-12, porém 07 minutos após sobrevoar SBBR o Transponder do Legacy não mais transmitiu informações ao ACC Brasília, não permitindo, então, a correta altimetria da aeronave e consequentemente não permitindo a correta separação entre as aeronaves voando na mesma aerovia em sentidos opostos. Aproximadamente 54 minutos após o desligamento inadvertido do Transponder do Legacy 600, ainda sobrevoando a selva amazônica, as aeronaves colidiram em voo com uma velocidade próxima do 1600 km/h, segundo o relatório final do CENIPA. Logo após a colisão, o Boeing 737 veio a perder uma seção de 6,96m de sua asa esquerda entrando em descontrole imediato e de forma irreversível. Como consequência, o Boeing entrou em uma espiral descendente pela esquerda, sendo submetido às excessivas forças aerodinâmicas em sua fuselagem e vindo a sofrer ruptura estrutural em voo. 3.1.Cadeia de Acionamento Imediatamente após a colisão os pilotos do Legacy realizaram 3 chamadas para o ACC Brasília na frequência de emergência 121.5MHz sem, entretanto, obterem resposta. Em seguida o Transponder é religado e o sinal é recebido por cinco diferentes antenas de radar do ACC Amazônico, logo após é inserido o código de emergência 7700. Os ARCC (Centro de Coordenação de Salvamento Aeronáutico) de Brasília e Amazônico são acionados (BRASIL, 2008). 7

Segundo VIEIRA (2011, p. 9), o ARCC Brasília, tão logo foi confirmado o acidente, acionou os meios de resgate apropriados para o início da busca: aeronaves de Busca e Salvamento da FAB são deslocadas para o Campo de Provas Brigadeiro Veloso a fim de auxiliarem na operação. No dia seguinte, em 30 de Setembro, assim que foram avistados os destroços do Boeing 737, o ARCC AZ acionou a primeira equipe de salvamento a ser infiltrada no local. 4. Resgate das Vítimas Logo depois que as unidades competentes foram acionadas, deu início uma complexa operação de resgate da Força Aérea Brasileira. Como afirma VIEIRA (2011, p. 8), foram empregados quarenta e nove tipos de aeronaves diferentes, não só da Força Aérea Brasileira, como do Exército Brasileiro, que ficou responsável, com sua aeronave H-60L BlackHawk do Batalhão de Aviação do Exército (BAVEX), por suprir a fazenda Jarinã local de apoio aos militares próximo à área do ocorrido com combustível para dar continuidade a missão de resgate. A operação iniciou-se logo após a confirmação do acidente e, no dia 30 de setembro de 2006, uma aeronave da FAB C-130 Hércules localizou os destroços da aeronave e tão logo comunicou à base, a primeira equipe de militares já era deslocada para o local. A partir de uma Aeronave Bell H-1H do 2º/10º Grupo de Aviação, dois militares desceram do helicóptero para verificar a existência de sobreviventes. Concomitantemente, 20 militares paraquedistas do PARA-SAR e do 2º/10º GAV eram lançados da aeronave destinada ao resgate SC-95 Bandeirante para darem prosseguimentos à busca. Um dia após a localização dos destroços e a percepção de que não havia sobreviventes, os militares abriram uma clareira na região onde mais peças do avião foram encontrados, já que, com a queda, o avião se despedaçou e pedaços foram avistados em um raio de 12 quilômetros. O objetivo da clareira era permitir que os helicópteros envolvidos na missão de resgate pudessem apoiar a equipe mais ativamente, além de transportar os corpos e pertences das vítimas. Assim que a missão fora iniciada, os envolvidos na operação relataram grande desgaste físico e moral. Apesar de treinados para isso, o ambiente amazônico, onde ocorrera o sinistro, oferece dificuldades ímpares ao ser humano. O Tenente Coronel 8

Josoé dos Santos Lubas, militar envolvido diretamente com o resgate, relatou a imprensa cinco anos depois do acidente alguns dos desafios da operação: Como o avião foi despedaçado no ar e os corpos das pessoas foram lançados, não tínhamos noção de onde encontrar todo mundo. Isso nos preocupava. Mas informávamos sempre as equipes da comoção nacional que havia e o quanto seria importante para as famílias receber seus entes queridos: esse era o foco. (UOL, 2011) Para os militares alocados na fazenda Jarinã, o ponto de apoio avançado entre o local do acidente e o Campo de Prova Brigadeiro Veloso, base da FAB mais próxima, foi estabelecido uma rotina de resgate, como divulgou o PARA-SAR apud VIEIRA (2011, p. 13): As 154 vítimas do acidente, todos os passageiros da aeronave pertencente à companhia GOL Linhas Aéreas S/A, foram encontradas entre o dia 01 de outubro de 2006 e 23 de Novembro de 2006, quando o último corpo foi identificado no Instituto Médico Legal de Brasília, por meio de um exame de DNA. Apesar do aparente sucesso da operação, haja vista o resgate de todos os corpos, a missão de resgate do voo Gol 1907 constituiu um ponto de inflexão para a Força Aérea Brasileira. A partir das 9

dificuldades encontradas na selva, inúmeras mudanças foram adotadas para aperfeiçoar o resgate e o apoio aos militares. (UOL, 2011) A farda, que se mostrou insuficiente para segurar picadas de abelha e suportar o calor do ambiente amazônico, foi mudada. O apoio ao homem operando distante da base, aperfeiçoado e incrementado, tendo em vista a necessidade pungente que toda a missão demonstrou precisar. E todo o sistema de controle do espaço aéreo brasileiro foi, dentro dos limites necessários, revisto, como afirma o relatório do CENIPA citado anteriormente. Mas o preparo técnico, profissional e psicológico dos militares envolvidos mostrou-se, indubitavelmente, preciso e importante para a missão.(brasil, 2008) 5. Cultura Organizacional Militar e o Resgate As missões de Busca e Salvamento como a do Voo Gol 1907 podem abranger desde o apoio a população em situações emergenciais de calamidade por causas naturais, como também em acidentes de cunho aeronáutico ou não. O envolvimento nesse tipo de missão e as atividades dela inerentes deixam claro o aspecto essencialmente voluntário de todos os envolvidos, especialmente ao analisar o tipo de missão em si. Desde o treinamento e capacitação de um resgateiro (como são conhecidos aqueles que cumprem tal missão), os militares são submetidos a diversas situações que comprovam o sentimento de abnegação presente em todos os envolvidos. As situações de treinamento abrangem diversos aspectos onde se há a perturbação das condições normais das necessidades humanas, com a finalidade de capacitar e demonstrar aos aprendizes o modus operandi de diversas situações em que o militar possa a vir ser inserido em detrimento da função exercida, buscando assim a excelência no cumprimento do dever inclusive nas situações não previstas e que exijam atitudes e decisões não teorizadas previamente. A partir do momento que se dá início à operacionalidade em missões reais, o militar enfrenta toda uma gama de situações que reafirmam cada vez mais o espírito de união entre as equipes de resgate em prol de um ideal onde se busca colocar a dignidade humana em primeiro lugar. Os Resgateiros lidam por vezes com a necessidade de trabalharem deslocados de suas unidades, tendo em vista das dificuldades logísticas 10

encontradas face as diferentes situações em que se faz necessário o acionamento de uma unidade de busca e salvamento. A privação de condições adequadas de sono, viveres e, por vezes, água, é uma constante enfrentada por esses combatentes que visam o bem dos outros tanto quanto o próprio. Diante dessas situações, torna-se nítida a presença de um fator que diferencia esse tipo de militar dos outros, definido nos valores preconizados na doutrina básica da FAB, pois se submeter a tais condições além de demonstrar um alto grau de comprometimento com a profissão e os nortes morais que o definem, comprova o quão arraigado está o sentimento de abnegação pela profissão, comprovando não só os valores reconhecidamente militares, como a disciplina e o respeito a hierarquia, como também deveres comuns à todos, como o Dever de Cidadão e o Amor à Profissão, que ficam evidentes cada vez mais que se conhece a história desses abnegados profissionais. REFERÊNCIAS:, Comando da Aeronáutica. Relatório Final A-022/CENIPA/2008. 2008. Disponível em: < www.cenipa.aer.mil.br/cenipa/paginas/relatorios/pdf/pp_gam_14_09_08> Acesso em: 04 ago. 2015. Constituição Federal (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 35ª Ed. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. p. 87.. Ministério da Defesa. Decreto nº 5484, Política Nacional de Defesa. Brasília, 2005.. Ministério da Defesa. Livro Branco de Defesa Nacional. 1. Ed. Brasília, 2012.. Ministério da Defesa; Comando da Aeronáutica. DCA1-1, Doutrina Básica da Força Aérea Brasileira. Brasília, 2005. BRASIL. Comando da Aeronáutica. ICA 100-12 REGRAS DO AR. Brasília, 2013. DEFESANET. A Tropa de Elite da Força Aérea Brasileira. 2013. Disponível em <http://www.defesanet.com.br/sof/noticia/13471/para-sar--a-tropa-de-elite-da- Forca-Aerea-Brasileira>. Acesso em: 01 ago. 2015. VIEIRA, F.. Análise do Resgate das Vítimas de Acidente Aéreo como Atividade de Transporte: Um Estudo de Caso do Voo Gol 1907. Conexão SIPAER, América do Norte, 2, mai. 2011. Disponível 11

em: <http://inseer.ibict.br/sipaer/index.php/sipaer/article/view/89/117>. Acesso em: 08 ago. 2015. 12