Alergia ocular. Patogenia



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Transcrição:

Alergia ocular O globo ocular é constituído por três áreas importantes, denominadas do exterior para o interior, por : 1- túnica fibrosa, composta pela esclerótica e córnea; 2 - túnica vascular ou úvea, composta pela íris, corpo ciliar e coroideia, com funções de nutrição, ópticas e secretoras e 3 - túnica sensorial ou retina, com funções de recepção e transmissão dos estímulos luminosos. Para além destas áreas existem uma série de estruturas intra-oculares, que são a câmara anterior, que contem o humor aquoso, o cristalino, que é uma estrutura capsulada formada por fibras de grande riqueza proteica, cuja saída extra-capsular pode ocasionar reacções imunológicas, a câmara posterior e humor vítreo. A conjuntiva, pálpebras e aparelho lacrimal, constituem os anexos oculares, e são estruturas que, não fazendo parte do globo ocular, são indispensáveis para o seu normal funcionamento, constituindo as defesas anatómicas. A conjuntiva, a estrutura mais importante sob o ponto de vista imunoalergológico, é uma mucosa constituída por epitélio e estroma, com glândulas mucosas e serosas, forrando a parte posterior das pálpebras e a parte anterior do globo ocular. Na zona da córnea transforma-se em epitélio corneano superficial. Anatomicamente tem 3 zonas : a palpebral, que como o nome indica cobre a parte interna das pálpebras; a bulbar que cobre o globo ocular e a zona de transição ou fundos de saco. Patogenia A conjuntiva ocular, por ser um meio hostil com grande capacidade de defesa, é pouco susceptível a infecções por gérmenes patogénicos. A limpeza contínua provocada pelo movimento das pálpebras varrendo constantemente as impurezas, e as variações do ph lacrimal, são factores que dificultam o desenvolvimento dos gérmenes. O ph lacrimal passa de 9,3, com olhos abertos e sob a influência da pressão de CO 2 do ar, para 6 a 6,5 com o encerramento da pálpebras. Para além desta barreiras, concomitantemente, existe um sistema imunitário não específico e um específico. O sistema não específico é constituído por substâncias com características bacteriostáticas e bactericidas, como a lisozima, a lactotransferrina e transferrina sérica (esta proteína passa a barreira hemato-lacrimal).

O sistema imunológico específico, está em grande parte sediado na glândula lacrimal. Esta, tal como as placas de Peyer no intestino e o tecido linfoide sub-mucoso da árvore traqueo-brônquica, possuem uma capacidade excepcional para produzir IgA. A IgA é a imunoglobulina predominante nas lágrimas (100-200 mg/l). A IgG tem apenas uma concentração de 3 mg/l nas lágrimas. A IgE produz-se localmente na conjuntiva, e tem uma baixa concentração nas lágrimas (30 UI/ml). No entanto, em situações patológicas como nas polinoses e na conjuntivite vernal, os níveis de IgE lacrimal atingem altas concentrações. Através da conjuntiva, há uma movimentação continua (diapedese) de neutrófilos e de macrofagos, para as lágrimas. O olho é um orgão alvo, porquanto está em contínuo contacto com o meio ambiente, mas a doenças alérgicas a nível ocular, não são tão frequentes quanto se possa imaginar. A maioria das queixas da doença alérgica ocular traduzem-se por prurido, sensação de queimadura, injecção conjuntival e edema palpebral ou peri-orbitário. A suspeição de doença alérgica ocular deve basear-se em critérios clínicos, patogénicos e laboratoriais, e deve ser colocada sempre que estejam envolvidas reacções imunológicas. Estas reacções, devem-se a alterações nos mecanismo de imunidade celular e humoral, podendo estar implicados os 4 tipos clássicos da classificação de Gell e Coombs. Os alergénios extrínsecos (p. ex. pólenes) provocam reacções de tipo I, enquanto os alergénios transportados pelas mãos (p. ex. verniz das unhas), que originam dermatoconjuntivite de contacto provocam reacções de tipo IV. As reacções tipo III, mediadas pelo complemento, podem ser desencadeadas por reacções a medicamentos via hematogénia. A reacção imunológica pode explicar a patogenia da doença, como acontece na reacção a antigénios externos (p.ex. pólenes). A resposta imunológica surge também quando há patologia afecta ao olho, como a que ocorre quando há infecções (p. ex. toxoplasma), que conduzem à presença de anticorpos e de outras infiltrações celulares. A prevalência e a gravidade das doenças imunológicas oculares, dependem dos mecanismos e das estruturas atingidas. A polinose é frequente, e por vezes origina reacções severas, sem contudo causarem grande repercussão a nível do próprio orgão, enquanto as uveítes, muito menos frequentes, causam lesões graves a nível ocular.

Clínica A reacção habitual da conjuntiva perante agressões externas, é a vasodilatação e a exsudação; clinicamente traduz-se por hiperemia, lacrimejo, aparecimento de membranas, de papilas e granulomas. O prurido, o aspecto leitoso da conjuntiva, e o aparecimento de papilas na conjuntiva tarsal, são típicos da reacção alérgica. Há uma associação frequente entre a rinite alérgica e a conjuntivite alérgica e, em cerca de 30% dos indivíduos com rinite aparece, concomitantemente, a conjuntivite alérgica. No entanto, é raro haver conjuntivite alérgica sem rinite alérgica. A conjuntivite alérgica é uma reacção tipo I mediada por IgE, podendo estar relacionada com um quadro geral, em que há vários órgãos envolvidos, como na rinite, asma, etc., ou surgir por sensibilização local (p. ex. aplicação de colírios e desinfectantes das lentes de contacto). Surge mais frequentemente nos jovens e adultos até aos 50 anos, predominado no sexo feminino. Os alergénios aéreos dissolvem-se facilmente no filme lacrimal e entram assim em contacto com a defesa imunológica, neste caso a IgE. Em consequência, nesta doença há uma grande concentração de IgE no saco lacrimal, e as reacções surgem por desgranulação de mastócitos e basófilos. O prurido é intenso, e quanto mais o doente coça mais prurido provoca, devido ao aumento das reacções lacrimal e vascular, por efeito mecânico. A conjuntiva apresenta-se hiperemiada e o doente fica com os olhos intensamente avermelhados, sentido fotofobia e sensação de corpo estranho e coçeira. Esta, se for intensa, pode desencadear edema. Há lacrimejo constante e por vezes sensação de mal estar geral. As reacções estão também relacionadas com o grau de exposição, p. ex. nos indivíduos com polinose, a ida ao campo traduz-se num agravamento dos sintomas. O diagnóstico de conjuntivite alérgica deve colocar-se nos indivíduos com atopia familiar, portadores de outras doenças alérgicas (rinite, asma, etc.) e com os sinais clínicos acima referidos. Esta doença pode ser de tipo sazonal, nas polinoses, ou de tipo peranual nos indivíduos sensíveis a outros inalantes (p. ex. ácaros do pó de casa).

Nestes doentes haverá sempre um aumento de IgE sérica, e é mandatório proceder-se ao estudo alergológico com testes cutâneos, para conhecimento do(s) alergénio(s) em causa a fim de se poder proceder a um adequado tratamento. Por vezes, há necessidade de estudar-se a concentração de IgE e de eosinófilos no saco conjuntival. O Phadiotop é um outro exame laboratorial (in vitro), que em caso de positividade sugere a presença de doença alérgica. Nos casos de conjuntivite associada a dermatite de contacto, está indicado o estudo com testes epicutâneos ou patch testes, onde são usadas várias substâncias, que colocadas em contacto com a pele do doente (em discos) durante 48 horas, dão a conhecer a existência, ou ausência, de hipersensibilidade retardada. Neste tipo de testes utiliza-se normalmente a bateria standard europeia, que contem cerca de 40 alergénios, sendo habitualmente efectuados por imunoalergologista ou por dermatologista. O diagnóstico diferencial da conjuntivite alérgica deverá ser efectuado com a conjuntivite vírica e a bacteriana. O tratamento da conjuntivite alérgica é semelhante ao preconizado para as outras doenças alérgicas, ou seja, a evicção dos alergénios, o tratamento sintomático e a imunoterapia. No caso de estarmos perante uma conjuntivite alérgica provocada por alergénios aéreos, a sua evicção é difícil. Assim, os doentes com hipersensibilidade aos ácaros do pó de casa deverão proceder a adequada limpeza do pó doméstico, de preferência por aspiração, e evitar lugares pouco limpos e poeirentos. Também os doentes portadores de polinose, devem evitar as idas ao campo, jardins e zonas relvadas, na época polínica e abster-se da ingestão de caracóis (por estes comerem gramíneas). O tratamento sintomático poderá ser efectuado mediante a aplicação de vasoconstritores simpaticomiméticos tópicos, como a nafazolina, a fenilefedrina e a tetrahidrolisina, ou associados com anti-histaminicos locais, na dose de 2 gotas, aplicadas 3 a 4 vezes ao dia. O cromoglicato dissódico também existe em colírio, sendo um excelente medicamento para esta doença atendendo a que é um estabilizador dos mastócitos. Usa-se na dose de 1 a 2 gotas, aplicadas 4 vezes ao dia. Também o ácido espaglumico tem um efeito semelhante, embora menos significativo.

Para alivio geral, deverão ser usados os anti-histaminicos que são potentes, podendo ser usados apenas uma vez por dia. Refira-se, o melhor desempenho da cetirizina no prurido. Nos casos em que a medicação com vasoconstritores e anti-histaminicos não resolva o problema, deverá usar-se corticoides tópicos (dexametasona, prednisolona, fluormetolona, medrisona), por um período não superior a sete dias, pois podem provocar alterações na pressão intra-ocular. É importante pensar numa contra-indicação ao uso deste tipo de medicamentos - a conjuntivite vírica, em particular a herpética, pois podem provocar o desenvolvimento de uma querato-conjuntivite grave. Neste grupo terapêutico dos corticoides é de destacar a medrisona, que é de entre os corticoides em colírio, o que revela o melhor efeito tópico, com escassa absorção. Em alternativa, podem ser usados anti-inflamatórios não esteróides como a indometacina e fluorbiprofeno na dose de 2 gotas, aplicadas 3 vezes ao dia. A imunoterapia especifica, está indicada nos casos de conjuntivite alérgica em que a evicção dos alergénios não seja possível (pólenes e ácaros de pó de casa), ou quando possuam outra atopia, como nos indivíduos com rinite alérgica e/ou asma. Este tipo de tratamento deverá ser sempre efectuado por imunoalergologista. A conjuntivite vernal, é uma doença de etiologia desconhecida, que aparece com maior frequência nos jovens, com predomínio do sexo masculino; caracteriza-se por lesões bilaterais, com carácter inflamatório intersticial, cuja característica principal é a hipertrofia papilar. Habitualmente surge a partir dos 8-10 anos, perdurando até aos 18-20 anos; há contudo casos que surgem mais precocemente (desde os 4 anos), prolongando-se até aos 30 anos. A conjuntivite vernal é de tipo peranual, mas com agravamento durante a primavera. Provoca intenso prurido, lacrimejo, eritema ocular, intensa fotofobia com blefaro-espasmo, a que se segue muitas vezes a pseudo-ptose palpebral devido ao edema e peso das papilas. Na pálpebra superior pode ver-se, com facilidade, a hipertrofia papilar que é o sinal característico desta doença; esta apresentase com formato em pedra e com papilas com mais de 1 mm de diâmetro. A complicação mais frequente é a queratite. O tratamento por evicção de factores irritantes é difícil, devendo o doente proteger-se sempre :

- da luz solar, usando óculos de protecção escuros; - do pó doméstico; - dos pólenes; - de fungos O tratamento farmacológico ficará restrito aos estabilizadores de membrana e aos corticoides tópicos. O cromoglicato dissódico deverá ser usado na concentração mais forte (4%), e na dose de 2 gotas aplicadas 4 vezes ao dia. Os corticoides deverão ser usados por períodos curtos, de 5 dias, ou em dias alternados, se for necessária a sua utilização por maiores períodos de tempo. Tentar sempre usar os anti-inflamatórios não esteróides, se bem que a sua eficácia nesta doença seja pouco efectiva; no entanto, sempre que utilizados, a escolha deverá recair sobre a forma de colírio. Para alivio do prurido a hidroxizina é excelente, podendo ser usada, via oral, na dose de 10 a 50 mg, 2 a 3 vezes por dia, devendo ser ajustada à idade, peso do doente e sintomatologia. Os corticoides via sistémica podem ser úteis nas fases agudas, ou em situações que não seja possível o controle com a medicação acima referida. A conjuntivite papilar gigante, é um síndrome inflamatório da conjuntiva associado ao uso de lentes de contacto, prótese ocular ou a suturas post-queratoplastia; traduz-se por hipertrofia papilar da conjuntiva tarsal superior (fig. 5), embora menor que na conjuntivite vernal. Aparece igualmente nos dois sexos, e quase sempre nos adultos. Como tratamento deverá proceder-se à evicção do agente causador, como por exemplo retirar as lentes de contacto, e até à cura poderá ser usado o cromoglicato dissódico a 2 e 4%. A querato-conjuntivite atópica, surge habitualmente em indivíduos atópicos, e de entre estes nos portadores de dermatite atópica. Os portadores de dermatite atópica podem ter várias lesões oculares, sendo a conjuntiva e a córnea as regiões mais afectadas, podendo, no entanto, surgir lesões no cristalino e descolamento da retina. É uma doença mais ou menos severa, que na fase aguda manifesta-se por intenso prurido, principalmente matinal, acompanhada de fotofobia, e de lacrimejo. As conjuntivas tarsais e bulbares estão hiperemiadas e acompanhadas de edema conjuntival (quemose).

As pálpebras estão quase sempre inflamadas. Nesta doença a hipertrofia papilar é rara, podendo, contudo, haver atingimento do limbo. As lesões conjuntivais progridem para a cicatrização com formação de crostas, podendo surgir retracção do fundo de saco inferior, entrópio ou ectrópio das pálpebras e triquíase. O tratamento, devido às complicações subsequentes, deverá ser, sempre que possível, endereçado a um oftalmologista e compreende três aspectos : 1 - profiláctico, evitando as infecções bacterianas a estafilococos e as infecções virais e, em especial o contacto com indivíduos portadores de herpes; 2 - sintomático, com o uso de vasoconstritores locais para controle da hiperemia e edema; pode ser usada a dexamatesona ou a medrisona em colírio nos casos mais complicados, podendo mesmo ser necessário administrar via sistémica a prednisolona (40 a 60 mg/dia) associados ou não a anti-histaminicos. Os anti-histaminicos usam-se para controle do prurido e os corticoides para o controle da inflamação. Deverá ser sempre usado como medida preventiva o cromoglicato dissódico, em colírio na concentração a 4%. Nos casos de queratocone podem usar-se lentes de contacto. Nos casos de querato-conjuntivite severos, pode ser necessário efectuar-se transplante de córnea. 3 - imunoterapia só deverá ser usada em casos específicos e com ponderação. A dermato-conjuntivite alérgica de contacto, está relacionada com uma reacção de tipo retardada (tipo IV) que se manifesta por eczema palpebral e conjuntivite. É mais frequente no sexo feminino e está relacionada com a aplicação de cosméticos locais ( sombras nos olhos, rimel) ou noutros locais (p. ex. verniz das unhas). Também as escovas e esponjas usadas na aplicação destes cosméticos, podem provocar dermatite. Por outro lado, o uso de cremes faciais e sabonetes, pode também provocar uma dermatite selectiva da pálpebra devido à fina espessura da pele nesta área. Qualquer medicação aplicada no olho pode sensibilizá-lo e produzir dermatite de contacto. Está descrito que substâncias voláteis (p.ex. laca do cabelo), podem provocar também este tipo de dermatite. Refira-se, que alguns destes produtos, p.ex lacas de

cabelo e verniz de unhas, podem provocar sómente lesão nas pálpebras, deixando livre de lesões o local onde são aplicados (couro cabeludo e mãos). em : Os alergénios mais comummente implicados nesta doença, são os constantes 1 - cosméticos, como nas bases de maquilhagem (lanolina, cera), nos corantes (óxido de alumínio, dióxido de titânio, trifenilmetálicos, etc.), nos perfumes (álcool, aldeídos, eugenol, etc.) e nos conservantes (p. ex. parabenos); 2 - medicamentos, sob a forma de colírios ou pomadas, tais como alguns antibióticos - neomicina, bacitracina, sulfanilamida ou anestésicos locais do grupo para (tetracaína, benzocaina, etc.) Clinicamente, a manifestação típica é o aparecimento de eczema nas pálpebras. Na forma aguda a nível palpebral, há eritema, prurido e edema local e a nível conjuntival, há eritema e por vezes prurido. Nas formas crónicas a nível palpebral existe eczema unilateral ou bilateral com liquenificação, prurido mais intenso; e a nível conjuntival coexiste eritema, prurido, lacrimejo, quemose, sensação de corpo estranho a que se seguem secreções mucosas ou muco-purulentas, principalmente matinais. O diagnóstico tem por base uma adequada história clínica e a efectuação de testes epicutâneos, para determinação do alergénio causal. O tratamento é fundamentalmente a evicção e profilaxia de novos contactos com o alergénio conhecido. A aplicação deste, noutras zonas do corpo, pode provocar agravamento da conjuntivite devido à crescente sensibilização ao(s) alergénio(s). Enquanto não for detectado o agente causal utilizar-se-ão os corticoides via tópica ou geral, consoante a gravidade da sintomatologia; para combater o prurido utilizam-se os anti-histamínicos orais.