ESTUDO PRELIMINAR DA QUALIDADE BACTERIOLÓGICA DA ÁGUA DE CISTERNA DE POLIETILENO EM QUATRO MUNICÍPIOS DO SEMIÁRIDO PERNAMBUCANO Alba de Oliveira Lemos (1) Dra. em Biologia Vegetal, Bióloga da Fundação Nacional de Saúde. Osman de Oliveira Lira (2) Especialista em Saúde Pública, Farmacêutico Bioquímico da Fundação Nacional de Saúde. Gloria Maria Costa da Cunha (3) Especialista em Saúde Pública, Técnica de Laboratório da Fundação Nacional de Saúde. Maria das Graças Coelho de Oliveira (4) Técnica de Laboratório da Fundação Nacional de Saúde. Maria de Fátima de Vasconcelos Silva (5) Técnica de Laboratório da Fundação Nacional de Saúde. (1) Av. Conselheiro Rosa e Silva, 1489, Aflitos, Recife-PE, CEP 52050-020. Brasil. Tel.: +55 81 34278377. E-mail: alba.lemos@funasa.gov.br RESUMO Por meio do Programa Água para Todos, estão sendo distribuídas cisternas a famílias que vivem em situação de extrema pobreza, residentes na zona rural da região do semiárido. A fim de avaliar a qualidade bacteriológica da água de cisternas, o presente trabalho realizou análises em amostras de água coletadas de cisternas de polietileno nos municípios de Gravatá, Chã Grande, Taquaritinga do Norte e Passira. Nos municípios de Gravatá e Chã Grande, também foram realizadas entrevistas sobre os cuidados com a água das cisternas. Em 75%, 55%, 45% e 65% das amostras analisadas, observou-se a presença de Escherichia coli nas amostras de Gravatá, Chã Grande, Taquaritinga do Norte e Passira, respectivamente. Quanto aos cuidados com a água, 60% e 10% dos entrevistados relataram realizar desinfecção na cisterna, em Gravatá e Chã Grande, respectivamente, apesar de nenhuma amostrar apresentar residual de cloro livre. Nos dois municípios, 10% realizam coação com pano, como tratamento intradomiciliar. Apenas um entrevistado de Chã Grande afirmou receber a solução de hipoclorito de sódio a 2,5%. A maioria dos entrevistados nos dois municípios declarou desconhecer a importância e não realizar o desvio das primeiras águas. PALAVRAS-CHAVE: Qualidade da água, cisternas, semiárido. ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 1
INTRODUÇÃO/OBJETIVOS A escassez da água potável para consumo humano, sobretudo na região Nordeste do Brasil, vem sendo uma preocupação para a saúde pública, principalmente para a população infantil. Associada à falta de água, a má qualidade das diversas fontes de água, converte-se em um risco à saúde, uma vez que a água é um veículo de doenças diarreicas. Diante da falta de cobertura de abastecimento água potável, fontes alternativas são buscadas por populações, que, em geral, consomem água sem tratamento. Segundo o IBGE (2012), nas áreas rurais a maior parte dos domicílios (66,8%) não tem acesso à rede de distribuição de água (Tabela 1), tendo que contar com fontes alternativas. A garantia da qualidade da água, nesse caso, depende essencialmente da proteção sanitária destas fontes e do manejo adequado da água. Tabela 1: Abastecimento de água por domicílio na área urbana e rural no Brasil. Fonte: IBGE/PNAD 2012. A fim de garantir o acesso à água, foi instituído, através do Decreto 7.535/2011, no âmbito do Plano Brasil sem Miséria, o Decreto 7.492/2011, que estabelece o Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Água Água para Todos, para comunidades rurais, para a produção agrícola e alimentar, visando o pleno desenvolvimento humano e à segurança alimentar e nutricional de famílias em situação de vulnerabilidade social. Nesse sentido, estas famílias, que não contam com abastecimento público de água e que vivem em situação de extrema pobreza, estão recebendo cisternas do Governo Federal, por meio de instituições governamentais e não governamentais. Os riscos à saúde, associados ao consumo de água, podem ser de curto prazo, quando a água está contaminada por micro-organismos patogênicos, ou de médio e longo prazo, quando resultam do consumo regular e contínuo, durante certo período de tempo de água contaminada por substâncias químicas, como metais, pesticidas e toxinas (OPAS, 2001). Frente a esse cenário, estudos vêm sendo realizados para avaliar a qualidade da água de cisternas e o impacto do uso de água de cisternas nos casos de diarreia infantil, em populações do semiárido brasileiro. Diante do exposto, este trabalho visa avaliar a qualidade ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 2
bacteriológica da água de cisternas, para servir de subsídio aos programas de saúde, bem como de educação e vigilância ambiental, instituídos pelas autoridades em saúde pública, de acordo com as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS). METODOLOGIA Foram analisadas vinte amostras de água coletadas de cisternas de polietileno de quatro municípios, Gravatá, Chã Grande, Taquaritinga do Norte e Passira, os quais foram contemplados com as cisternas instaladas pela Funasa, utilizando-se o método de contagem de coliformes totais e Escherichia coli através do uso de substrato cromogênico - fluorogênico, preconizado pelo Standard methods of the examination of water and wastewater (APHA, 1995). Nos municípios de Gravatá e Chã Grande, foi realizada entrevista com os moradores dos domicílios em que foram coletadas amostras de água, sobre os cuidados com a água da cisterna. Nas entrevistas foram perguntados se era realizado algum tratamento da água dentro da cisterna e intradomicilia; se o morador recebia a solução de hipoclorito de sódio a 2,5%; qual o conhecimento sobre a importância do desvio das primeiras águas da chuva; e se as primeiras águas da chuva eram desviadas. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados das análises microbiológicas indicaram contaminação na maioria das amostras, não estando próprias para consumo humano, segundo a Portaria MS 2914/2011. Destas, 75%, 55%, 45% e 65% apresentaram presença de Escherichia coli nas amostras de Gravatá, Chã Grande, Taquaritinga do Norte e Passira, respectivamente (Figura 1). Figura 1. Análise bacteriológica de amostras de água de cisternas de polietileno, instaladas em quatro municípios do semiárido pernambucano. ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 3
CT: Coliformes totais; EC: Escherichia coli. Estes resultados estão de acordo com estudos realizados, em que foi verificada a presença de contaminação fecal nas águas das cisternas analisadas, estando impróprias para o consumo humano, caso não haja tratamento adequado. A Portaria MS 2914/2011, estabelece a ausência de Escherichia coli (E. coli) em 100 ml das amostras de água, porém na maioria das amostras analisadas nos estudos apresentam concentrações de Coliformes totais e E. coli acima do permitido (Tabela 2). Tabela 2. Estudos que indicaram presença de Coliformes totais e Escherichia coli em águas armazenadas em cisternas do semiárido brasileiro. Autor (es) Local E. Coli (%) Silva et al. (2012) Berilo e Chapada do Norte-MG 77 Nóbrega (2011) Caruaru e Pesqueira-PE 83 Xavier (2010) São João do Cariri e Campina Grande-PB 100 Tavares (2009) São João do Cariri, São José do Sabugi e Campina Grande-PB 100 Silva (2006) Araçuaí-MG 70 Brito et al. (2005a) Petrolina-PE 100 Brito et al. (2005b) Ouricuri-PE 73 %: percentual das amostras analisadas com presença de Escherichia coli. Durante as visitas aos domicílios em que foram coletadas amostras de água das cisternas, as famílias foram entrevistadas quanto aos cuidados com a água. De acordo com a entrevista, 55% dos pesquisados em Gravatá, informaram realizar tratamento com cloro granulado ou em pastilhas, 5% com sulfato de alumínio e 40% não realiza tratamento nas cisternas. Em Chã Grande, 10% informou tratar a água na cisterna com cloro e 90%, não ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 4
realizar tratamento. Apesar de informarem realizar tratamento na cisterna, não havia residual de cloro nas amostras de água analisadas em Gravatá e em Chã Grande. Com relação ao tratamento intradomiciliar, nenhum dos entrevistados confirmou realizar a desinfecção da água. Apenas 10% em cada município realiza a coação da água antes do consumo, prática que não é eficaz na inativação de bactérias. Quanto ao recebimento da solução de hipoclorito de sódio a 2,5%, em Gravatá 100% informou não receber a solução, apenas um morador de Chã Grande disse que recebia. A distribuição da solução de hipoclorito de sódio a 2,5% é uma ação importante para a garantia do tratamento da água, quando associada a ações educativas sobre a importância do seu uso. Foi relatado pela maioria dos entrevistados (95% e 90%, de Gravatá e Chã Grande, respectivamente) não ter conhecimento sobre a importância do desvio das primeiras águas, bem como não realizar este desvio. De acordo com Silva e colaboradores (2012), programas educativos para a mudança de prática das famílias no meio rural são de suma importância, sugerindo também que seja estudada uma forma de controle da qualidade da água armazenada em cisternas. Na verdade, o termo correto é vigilância da qualidade da água, uma vez que as soluções alternativas individuais estão sujeitas à vigilância pelas autoridades de saúde pública. CONCLUSÃO As comunidades estudadas estão vulneráveis quanto ao uso de água não segura, correndo o risco de contrair doenças de veiculação hídrica, principalmente crianças e idosos, que são mais susceptíveis. A presença de Escherichia coli em amostras de água de cisternas está relacionada à falta de barreiras sanitárias e de boas práticas no manuseio da água, necessitando de tratamento adequado no domicílio. Faz-se necessário, como medidas de prevenção e promoção à saúde: programas educativos sobre os cuidados com a água, junto às populações beneficiadas com cisterna; a distribuição regular da solução de hipoclorito de sódio a 2,5%; e que haja um plano de ação de vigilância da qualidade da água das cisternas por parte das autoridades em saúde pública. ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 5
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS APHA, 1995. Standard methods for the examination of water and wastewater: part 9000: microbiological examination. 19. ed. Washington. BRASIL, 2011. Portaria n. 2914. Estabelece os procedimentos e responsabilidades relativos ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade, e dá outras providências. BRITO, L.T.L.; PORTO, E.R.; SILVA, A.S. Análise da qualidade das águas de cisternas em cinco municípios do Semi-Árido Brasileiro. In: Anais do III Congresso Brasileiro de Agroecologia, Florianópolis: A sociedade construindo conhecimentos para vida, 2005a, Florianópolis. BRITO, L.; PORTO, E.; SILVA, A.; SILVA, M.; HERMES, L.; MARTINS. S. S. Avaliação das características físico-químicas e bacteriológicas das águas das cisternas da comunidade de Atalho, Petrolina-PE. In: Anais do V Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva. Associação Brasileira de Captação e Manejo de Água de Chuva, ABCMAC. 2005b. Teresina, Piauí ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DA SAÚDE (OPAS), 2001. Água e Saúde. NÓBREGA, R. L. B., Avaliação da Qualidade da Água e da Eficácia de Barreiras Sanitárias em Sistemas para Aproveitamento de Águas de Chuva. Revista Brasileira de Recursos Hídricos Vol 16 n.3, 2011. p. 81-93. SILVA, C.V. Qualidade da água de chuva para consumo humano armazenada em cisternas de placas: Estudo de caso: Araçuaí, MG. Dissertação (Mestrado em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos) Escola de Engenharia, Universidade Federal de Minas Gerais, 2006. Belo Horizonte. SILVA, C.V.; HELLER, L.; CARNEIRO, M. Cisternas para armazenamento de água de chuva e efeito na diarreia infantil: um estudo na área rural do semiárido de Minas Gerais. Eng. Sanit. Ambient. vol.17 no.4, 2012. p. 393-400. TAVARES, A. C. Aspectos físicos, químicos e microbiológicos da água armazenada em cisternas de comunidades rurais no semiárido Paraibano. Dissertação, Universidade Federal de Campina Grande, 2009. Campina Grande. ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 6