INCORPORAÇÃO DE BIOMASSA SECA DE SALVINIA AURICULATA AUBL. DO PROCESSO DE FITORREMEDIAÇÃO NA PRODUÇÃO DE CERÂMICA VERMELHA Delaqua, G.C.G. 1,*, Vieira, C.M.F. 1, Amaral, L.F. 1, Monteiro, S. N. 2 1 Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro- UENF, LAMAV; 2 Instituto Militar de Engenharia - IME, Departamento de Ciência dos Materiais Av. Alberto Lamego, 2000, Parque Califórnia, Campos dos Goitacazes - RJ, CEP: 28013-602 *geovanagirondi@gmail.com RESUMO O presente trabalho teve como objetivo a incorporação de biomassa seca de Salvinia auriculata aubl, proveniente do tratamento de esgotos domésticos na massa argilosa para confecção de blocos cerâmicos, e por meio deste avaliar o efeito do resíduo nas propriedades testadas. Foram preparados corpos de prova com até 10% de biomassa, onde foram avaliadas as propriedades de: absorção de água, retração linear e resistência mecânica. As microestruturas das peças foram analisadas por microscopia eletrônica de varredura (MEV). Com os resultados obtidos foi possível avaliar que com a adição de biomassa as propriedades cerâmicas foram prejudicadas, entretanto, em todas as formulações e temperaturas, atenderam as normas técnicas e recomendações para a produção de tijolos de alvenaria. Palavras-chave: Macrofitas, salvinia auriculata, fitorremadiação, cerâmica INTRODUÇÃO A industrialização, mesmo sendo acompanhada do progresso e do desenvolvimento, traz um acentuado dano ambiental devido ao lançamento de efluentes líquidos em ambientes aquáticos, trazendo grandes consequências para os seres vivos que dependem do corpo hídrico [1,2]. Na busca por alternativas para despoluir áreas contaminadas por vários tipos de compostos, fez com que o homem procurasse identificar técnicas que apresentem eficiência na descontaminação, simples execução, baixo custo e menor tempo no processo [3]. A fitorremediação pode se enquadrar no que foi 481
relatado por Pires [3], pois a técnica de fitorremediação é uma opção que tem baixo custo e pode ser utilizada em grandes áreas, com a possibilidade de remediar águas contaminadas, solo e subsolo [4]. A utilização de macrófitas aquáticas no processo de fitorremediação vem sendo muito estudada, em especial para a remoção de metais pesados das águas. No entanto, o processo gera grande quantidade de biomassa, devido à rápida reprodução e desenvolvimento das plantas, e o descarte dessa biomassa no meio provoca impacto ambiental negativo, sendo uma alternativa de matéria-prima para as indústrias [5]. A indústria cerâmica tem se destacado nos últimos anos como uma alternativa promissora para o destino de grandes quantidades de resíduos sólidos poluentes, pois vem incorporando vários tipos de resíduos em seu processo, oferecendo então uma menor degradação ambiental [6]. Baseado em testes, o objetivo do presente estudo é a viabilidade da utilização da biomassa seca de Salvinia auriculata Aubl. oriunda do processo de fitorremediação na produção de blocos cerâmicos. MATERIAIS E MÉTODOS Foram utilizadas como matérias-primas neste trabalho, duas argilas (argila cinza e argila carolinho), e areia, que foram doadas pela Arte Cerâmica Sardinha, localizada no município de Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro. A macrófita Salvinia auriculata foi coletada na estação de tratamento de esgoto de Araruama, no estado do Rio de Janeiro. As matérias-primas foram coletadas e encaminhadas ao Laboratório de Materiais Avançados (LAMAV) da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro UENF. Nas dependências da Universidade, as argilas e foram secas em estufa a uma temperatura de 110ºC por 24 horas. Posteriormente, foram desagregadas manualmente com almofariz e pistilo de porcelana. O material vegetal foi seco em estufa de circulação de ar à temperatura de 60ºC durante 48 horas, após processou-se a moagem do material. Todas a matérias primas foram processadas até passagem completa em peneira de 40 mesh (abertura de 420 μm). 482
Uma massa argilosa foi preparada contendo com 60% de argila cinza, 10% de argila carolinho e 30% de areia. A partir desta massa, foram preparadas composições com incorporação de 0,0, 2,5, 5,0, 7,5 e 10,0% de biomassa vegetal de S. auriculata. A homogeneização das matérias-primas foi realizada em moinho de bolas por aproximadamente 20 minutos. Foram elaborados corpos de prova por prensagem uniaxial, com 8% de umidade nas dimensões 114,0X 25,0X 11,0 mm. Após a prensagem, foram secos em estufa a 110ºC por 24 horas, pesados e medidos. Os corpos de prova secos foram queimados em forno mufla com taxa de aquecimento de 2 C/min com temperatura de patamar de 750, 850, 950 e 1050ºC, onde foram mantidos na temperatura por 3 horas. O resfriamento foi por dado por uma taxa de 2 C/min, até atingir a temperatura ambiente. Após resfriadas, as peças foram novamente pesadas e medidas usando respectivamente uma balança e paquímetro digital. Foram realizados testes para determinar o limite de liquidez e limite de plasticidade, fazendo-se uso das normas técnicas NBR 6459 [7] e NBR 7180 [8]. Para o cálculo do índice de plasticidade (IP), pela norma [9]. Foram avaliadas ainda as propriedades de: absorção de água, retração linear e resistência mecânica a queima, avaliada por tensão de ruptura à flexão em três pontos. RESULTADOS E DISCUSSÃO A tabela 1 contém o índice de plasticidade de Atterberg das massas cerâmicas contendo 0% e 10% de resíduo. A plasticidade das massas cerâmicas aumentou com a adição de resíduo incorporado. Portanto, observase que o aumento de matéria orgânica contribui para o aumento da plasticidade. No entanto, as argilas de Campos dos Goytacazes têm alta concentração de argilomineral, portanto são altamente plásticas [10]. Assim, deve-se ponderar o teor de biomassa incorporado na massa cerâmica tendo em vista sua interferência negativa, neste caso, na propriedade plástica dessas massas cerâmicas. 483
Tabela 1. Limite de liquidez, limite de plasticidade e índice de plasticidade das massas cerâmicas com proporções de 0 e 10% de biomassa de S. auriculata. Biomassa seca (%) LL (%) LP (%) IP (%) 0 % 42,3 % 26,3 % 16,0 % 10% 57,3 % 34,0 % 23,3 % Onde: Limite de liquidez (LL), limite de plasticidade (LP) e índice de plasticidade (IP). Na Figura 1 está representado o prognóstico de extrusão das massas cerâmicas contendo 0% e 10% de resíduo. Este prognóstico relaciona a propriedade plástica de massas cerâmicas com a etapa de extrusão, indicando limites ideias e aceitáveis para a correta extrusão. A massa pura (0%), contendo apenas argilas da região de Campos dos Goytacazes, localizou-se dentro da região de extrusão aceitável. Já a massa com 10% de resíduo aumentou o índice de plasticidade, aferindo à massa uma maior plasticidade, com isso é necessário adicionar maior quantidade de água na etapa de conformação, aumentando o custo na etapa de secagem, e podendo acarretar trincas e deformidades devido à maior retração de secagem das peças. Figura 1. Prognóstico de extrusão por meio dos limites de Atterberg. Na Figura 2 pode-se observar o padrão de Absorção de Água (AA) dos corpos de prova queimado. A taxa de AA aumentou de acordo com a maior 484
AA (%) 60º Congresso Brasileiro de Cerâmica quantidade de biomassa incorporada. Estes resultados são explicados pelo aumento da perda ao fogo. Isso acontece devido à perda de massa durante a queima da matéria orgânica, liberando CO2, ocasionando aumento da porosidade nas peças. Na temperatura de queima de 750ºC, é possível observar que as massas com resíduo não atenderam à norma técnica NBR 15270 3 [11]. Quando queimadas a 850ºC e 950ºC, as peças contendo 2,5% de resíduo, ficaram na faixa recomendada [11]. Na temperatura de 1050ºC, somente as peças com formulações de 10% de biomassa não atenderam à norma, pois a norma técnica NBR 15270 3, considera que para a fabricação de tijolos e blocos cerâmicos a AA deve estar em um patamar entre 8 e 22%. Assim como a retração linear, AA é reflexo da sinterização alcançada pelo material durante a queima. Como já descrito [12], o aumento da temperatura de queima pode influenciar na redução da AA, pois ocorre uma diminuição da porosidade devido a maior formação de fase liquida, consequência das reações que ocorrem durante sinterização. 30 28 26 0 2,5 5 7,5 10 24 22 20 18 750 800 850 900 950 1000 1050 Temperatura (ºC) Figura 2. Absorção de Água dos corpos de prova com formulações de 0%, 2,5%, 5%, 7,5% e 10% de S. auriculata em função das temperaturas de queima: 750 C, 850 C, 950 C e 1050 C. A Figura 3 mostra o comportamento da retração linear (RL) das peças em função da quantidade de biomassa de S. auriclata adicionada. Observa-se 485
que a RL aumentou de acordo com a temperatura de queima, resultado do aumento do grau de sinterização das massas cerâmicas. A 1050ºC ocorreu um elevado aumento dos valores da retração para todas as massas estudadas. Este processo está ligado ao processo da formação de fase liquida dos corpos cerâmicos queimados nesta faixa de temperatura. RL (%) 4,0 3,5 3,0 2,5 2,0 1,5 0 2,5 5 7,5 10 1,0 0,5 0,0 750 800 850 900 950 1000 1050 Temperatura(ºC) Figura 3. Retração linear dos corpos de prova com formulações de 0%, 2,5%, 5%, 7,5% e 10% em função das temperaturas de queima: 750 C, 850 C, 950 C e 1050 C. A Figura 4 mostra a tensão dos valores para a resistência mecânica (RM) dos corpos cerâmicos com as formulações estudadas (0%, 2,5%, 5%, 7,5% e 10%), e as temperaturas (750 C, 850 C, 950 C e 1050 C), avaliados por meio da resistência à flexão por 3 pontos. A argila pura não alcança a resistência mecânica mínima recomendada para a fabricação de telhas. Em 950ºC é alcançado o mínimo para a fabricação de tijolos furados, e em todas as temperaturas analisadas, a argila pura, alcançou o mínimo exigido para a fabricação de tijolos de alvenaria [13]. Em todas as temperaturas investigadas, os corpos de prova com a adição de biomassa de S. auriculata não atingiram o mínimo recomendado para telhas e tijolos furados (6,5 e 5,5 Mpa, respectivamente), porém, alcançam o mínimo exigido para a fabricação de tijolos de alvenaria (2 Mpa), exceto à temperatura de queima de 750ºC, com adição de 7,5% e 1 0% de biomassa. 486
RM (MPa) 60º Congresso Brasileiro de Cerâmica 6 5 5,5 MPa - Tijolos furados 0% 2,5% 5% 7,5% 10% 4 3 2 1 2 MPa- Tijolos de alvenaria 750 800 850 900 950 1000 1050 Temperatura (ºC) Figura 4. Resistência à flexão por três pontos dos corpos cerâmicos As Figuras 5 e 6 contém as micrografias obtidas pela microscopia eletrônica de varredura (MEV) da superfície dos corpos de prova para as formulações estudadas (0% e 5%), e queimadas em temperatura de 1050ºC. Observa-se uma superfície rugosa e porosa, nas peças sem adição de biomassa, sendo possível observar partículas de quartzo circundadas por uma matriz amorfa. A adição de biomassa aumentou ainda mais a porosidade, devido a fatores já citados, corroborando com os dados já obtidos no ensaio de AA. (a) (b) Figura 5. Microscopia eletrônica de varredura dos corpos de prova com 0% resíduo queimados na temperatura de 1050 ºC com aumento de 100x (a) e 400x (b) 487
(a) (b) Figura 6. Microscopia eletrônica de varredura dos corpos de prova com 5% resíduo queimados na temperatura de 1050 ºC com aumento de 100x (a) e 400x (b). CONCLUSÕES Ao avaliar os resultados obtidos, pode concluir que a incorporação de biomassa de Salvinia auriculata de fitorremediação na produção de cerâmica vermelha é uma alternativa como um destino sustentável é de possível realização. Portanto, foi observado que em todas as temperaturas e percentuais incorporados atingiram o mínimo exigido para a confecção de tijolos de alvenaria. A pesquisa realizada mostrou-se de muita importância, pois propõe meios de diminuir o impacto ambiental causado pela retirada de matéria-prima utilizada para a fabricação de blocos cerâmicos, além de apresentar uma destinação adequada à biomassa em questão, pois necessita ser retirada diariamente em sistemas de fitotratamento de efluentes. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à UENF, à Capes, à Arte Cerâmica Sardinha, e à Águas de Juturnaíba, pelo apoio na realização deste trabalho. 488
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