Crítica à terminologia de soldagem adotada pela ABNT PONDERAÇÕES SOBRE A NOVA REDAÇÃO DA ABNT/ONS-58 por Almir Quites Fev-2011

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Transcrição:

www.soldasoft.com.br Crítica à terminologia de soldagem adotada pela ABNT PONDERAÇÕES SOBRE A NOVA REDAÇÃO DA ABNT/ONS-58 por Almir Quites Fev-2011 Prezados Srs e Sras. Apresento aqui minhas ponderações com o intuito de colaborar na nova redação da ABNT/ONS-58, do 1º PROJETO 58:000.13-001/1, DEZ 2010, texto constante sob o título: Parte 1: Descontinuidades em juntas soldadas. Em minha opinião, há muito que corrigir neste documento. Para começar, gostaria de relembrar alguns conceitos básicos, que permitirão que eu faça algumas considerações genéricas. Depois passarei a análise do documento item por item. Devido às altíssimas temperaturas envolvidas, o processo de soldagem tem conseqüências que podem ser agrupadas em três grupos: 1. Descontinuidades e alterações nas propriedades dos materiais; 2. Deformações; deformações globais (também chamadas de distorções) deformações localizadas (também chamadas de deformidades) 3. Tensões internas residuais. Estas conseqüências não devem ser entendidas como defeitos de soldagem. Elas só serão consideradas defeitos se superarem determinados limites, fixados pelo projeto da peça soldada como critérios de aceitação. Neste caso, a solda deverá ser reparada. Se, por exemplo, as tensões internas forem muito elevadas, acima do limite estabelecido nos critérios de aceitação, será prescrito um tratamento térmico de alívio de tensões. Como o linguajar técnico deve ser preciso e levado muito a sério, vou analisar o projeto de norma em causa, começando pelo conceito de descontinuidade. Este é um conceito que tem sido muito mal usado, inclusive em documentos técnicos, mesmo nos

Estados Unidos, até mesmo em normas técnicas. É preciso não confundir descontinuidade de juntas soldadas com outros conceitos, como o de deformação (desvios dimensionais) ou de defeito. Se a intenção for tratar de todas as possíveis imperfeições decorrentes da soldagem, então o nome da norma deve ser alterado. A EN 26520:1992, ISO 6520, por exemplo, tem por título Classification of imperfections... e classifica as imperfeições em seis categorias: trincas, cavidades, inclusões sólidas, falta de fusão e de penetração, imperfeições de forma e outras imperfeições. Não é necessário ser um especialista em soldagem para saber que descontinuidade é uma interrupção. Basta ver qualquer dicionário, de qualquer idioma (em muitíssimos idiomas esta é uma palavra de origem latina). No caso de juntas soldadas, esta interrupção se refere à estrutura do material e se manifesta por uma interrupção em suas propriedades ao longo de uma linha em qualquer direção. Convém observar que este conceito se restringe, obviamente, ao nível macroscópico do material e não é aplicável ao nível microscópico, sub-microscópico ou atômico. Neste último nível, todo o material é descontínuo. As próprias lacunas e discordâncias são descontinuidades. Portanto, ao tratar de descontinuidades de juntas soldadas, estamos restritos ao nível macroscópico. A AWS define descontinuidade assim: An interruption of the typical structure of a material, such as a lack of homogeneity in its mechanical, metallurgical, or physical characteristics. A discontinuity is not necessarily a defect. (o grifo é meu). Portanto, chamar de descontinuidade o que é um desvio dimensional (em relação ao projeto) é um erro. Deformações, globais ou localizadas, não são descontinuidades, são desvios dimensionais. O conceito de descontinuidade provém da metalurgia e tem a matemática em sua origem mais distante, quando define a continuidade de funções. Observem, por exemplo, a figura seguinte. Nela temos quatro funções, em cores diferentes, que representam a variação de uma propriedade qualquer dos materiais numa direção qualquer ao longo ou através da junta soldada. A curva 1, em azul, representa uma função contínua. A curva 2, em marrom, representa uma função descontínua (por exemplo, causada pela inclusão de escória na solda). A curva 3, em vermelho, representa uma função contínua e constante. A curva 4, em oliva, representa outra função descontínua (por exemplo, causada pela existência de uma trinca).

Fig. 1: Funções descontínuas Permitam-me repetir, para clareza, que, embora algumas descontinuidades possam ser defeitos (e vice-versa), nem todo o defeito é uma descontinuidade, como também nem toda a descontinuidade é um defeito. Defeito e descontinuidade são conjuntos distintos, que possuem uma intersecção. Para que uma detectada descontinuidade seja considerada um defeito, é preciso confrontá-la com um critério de aceitação. Somente será defeito a descontinuidade que não satisfizer a este critério. A N-1738 (Petrobrás) acrescenta corretamente que a descontinuidade só deve ser considerada defeito, quando, por sua natureza, dimensões ou efeito acumulado, tornar a peça inaceitável, por não satisfazer os requisitos mínimos da norma técnica aplicável. Tenho lido materiais didáticos e até normas técnicas que confundem os conceitos de defeito e de descontinuidade. A própria N-1738 da Petrobrás faz esta confusão e seus erros têm sido reproduzidos numa enorme quantidade de materiais didáticos, especialmente naqueles que se destinam à preparação de candidatos à certificação de inspetores. No documento em análise, a definição dada para o termo DESCONTINUIDADE (item 2.1) repete a N-1738 da Petrobrás, assim: Descontinuidade é a interrupção das estruturas típicas de uma peça, no que se refere à homogeneidade de características físicas, mecânicas ou metalúrgicas. Isto é tradução da definição da

AWS. O problema está na aplicação desta definição no restante do documento, tanto na N-1738 como no documento em análise. Vamos agora examinar a Parte 1, que tem por título Descontinuidades em juntas soldadas. Como escopo da norma (ver item 1), consta o seguinte: Esta Norma define os termos empregados na denominação de descontinuidades em materiais metálicos, oriundos de processos de fabricação, montagem ou operação, detectáveis por meio de ensaios não destrutivos (grifo meu). É claro que a norma em estudo se propõe a definir descontinuidades e não defeitos. No entanto, o que se segue é uma enorme confusão entre estes termos. Passarei agora a uma análise item por item. O item 2.1 define descontinuidade. Consideração: Esta definição deveria anteceder ao item 1, intitulado Escopo. O item 2.2 refere-se à ABERTURA DE ARCO como sendo uma descontinuidade. Está errado! Considerações: 1) Abertura de arco é o ato de transformar um gás em um plasma sob uma diferença de potencial. Logo, não se trata nem de descontinuidade, nem de defeito. No entanto, em soldagem, a abertura de arco, em local indevido, pode causar uma descontinuidade, a qual, dependendo dos critérios de aceitação, pode vir a ser considerada defeito. Portanto, a abertura de arco não é uma descontinuidade, mas pode ser responsável por ela. 2) Quando se faz referência à descontinuidade, fala-se de MARCA DE ABERTURA DE ARCO ou INDICAÇÃO DE ABERTURA DE ARCO. O item 2.3 se refere a ÂNGULO EXCESSIVO DE REFORÇO como uma descontinuidade. Considerações: 1) Aqui está evidente uma confusão entre os conceitos de defeito e de descontinuidade. Este ângulo, se excessivo, seria um defeito. Adjetivos como excessivo, insuficiente etc. não cabem em definições de descontinuidades, mas sim de defeitos. Esta norma refere-se a descontinuidades e não a defeitos. 2) Por outro lado, ÂNGULO EXCESSIVO DE REFORÇO também não é descontinuidade, porque não satisfaz a definição de

descontinuidade dada anteriormente no próprio documento em análise. Qual a propriedade física, mecânica ou metalúrgica que teria sido interrompida? Reforço é apenas uma deformação localizada (deformidade) que, se tiver um ângulo de ataque (também chamado de ângulo maciço) muito grande, excessivo, será considerado um defeito, devido ao seu potencial para induzir o surgimento de uma descontinuidade (fissuras ou trincas), principalmente quando a peça soldada estiver em serviço. 3) Este item deve ser excluído do título de DESCONTINUIDADES. Proponho que se criem itens no documento que separem DESCONTINUIDADES e DEFORMAÇÕES. Item 2.4 (cavidade alongada): sem objeções. O item 2.5 se refere à CONCAVIDADE como sendo uma reentrância na raiz da solda. Há aqui vários problemas: 1) Primeiro, porque define o termo concavidade como aplicável apenas à raiz da solda. 2) Segundo, porque, pelo texto, qualquer reentrância seria uma concavidade. Não é verdade. Um rechupe aberto não é uma concavidade; uma falta de penetração não é uma concavidade. O conceito de concavidade implica na existência de uma superfície curva em depressão. 3) Em terceiro lugar, uma reentrância ou concavidade na raiz da solda não é necessariamente uma descontinuidade, depende de sua geometria (se ultrapassa ou não a superfície do verso da chapa). Também pode ser uma deformidade (desvio dimensional) aceitável ou não, depende do critério de aceitação. Será um defeito se sua magnitude superar certo valor fixado em um critério de aceitação. 4) Finalmente, para que não se confunda descontinuidades com deformações localizadas (desvios geométricos), proponho que este item passe para um item referente à DEFORMAÇÕES. O item 2.6 define CONCAVIDADE EXCESSIVA como sendo a solda em ângulo com a face excessivamente côncava (ver Figura 4). Considerações: 1) Concavidade não é solda! Concavidade é uma forma, uma qualidade de qualquer coisa que seja côncava.

2) Isto não é definição ( com a face excessivamente côncava ), é pleonasmo absolutamente inútil. 3) CONCAVIDADE EXCESSIVA pode haver não só em soldas de ângulo, mas também em soldas de juntas sobrepostas e até mesmo, embora seja raríssimo, em soldas de topo e de aresta. 4) O item 2.6, está sob o título geral de descontinuidade, portanto define CONCAVIDADE EXCESSIVA como uma descontinuidade. CONCAVIDADE (excessiva ou não) não é descontinuidade, porque não satisfaz a definição de descontinuidade dada anteriormente no próprio documento em análise (interrupção brusca de propriedades físicas, mecânicas ou metalúrgicas). Repito: adjetivos como excessivo, insuficiente, adequado etc. não cabem em definições de descontinuidades, mas sim de defeitos. Esta norma refere-se a descontinuidades e não a defeitos. 5) CONCAVIDADE é um desvio dimensional que, se excessivo, seria um defeito. A concavidade pode ser quantificada pela sua máxima altura em relação a uma corda de referência. Corda, aqui, é uma entidade da geometria, um conceito da matemática. Chamar a altura da concavidade simplesmente de concavidade é também uma imprecisão de linguagem. 6) A figura 4 é absurda (ver 4-a) porque apresenta uma convexidade como sendo o perfil adequado para uma concavidade. 7) Teoricamente e, geralmente, também na prática, o desejável é o filete côncavo, para evitar a concentração de tensões. Em peças de responsabilidade, o filete exigido é mesmo o côncavo. Em soldas de múltiplos passes quase sempre se exige um filete côncavo. A figura dá a entender que o filete convexo é o melhor. Isto não é bom para os usuários e leitores desta norma. 8) O lado (b) da fig. 4, por sua vez, sugere que toda a concavidade é excessiva! Outro absurdo! O item 2.7 define convexidade excessiva como sendo a solda em ângulo com a face excessivamente convexa. (ver Figura 5). Considerações: 1) Convexidade não é solda! Convexidade é uma forma, uma qualidade de qualquer coisa que seja convexa. 2) Outra vez, isto não é definição ( com a face excessivamente convexa ), é pleonasmo absolutamente inútil.

3) CONVEXIDADE EXCESSIVA pode haver não só em soldas de ângulo, mas também em todos os tipos de soldas. 4) O item 2.7, está sob o título geral de descontinuidade, portanto define CONVEXIDADE EXCESSIVA como uma descontinuidade. No entanto, esta convexidade, se excessiva, seria um defeito, não apenas uma descontinuidade. Repito e repito: adjetivos como excessivo, insuficiente, etc. não cabem em definições de descontinuidades, mas sim de defeitos. Esta norma refere-se a descontinuidades e não a defeitos. 5) CONVEXIDADE (excessiva ou não) não é nem mesmo descontinuidade, porque não satisfaz a definição de descontinuidade dada anteriormente no próprio documento em análise (interrupção brusca de propriedades físicas, mecânicas ou metalúrgicas). Trata-se de uma deformidade (desvio dimensional) que, se excessiva (e isto depende da altura permitida em relação à corda de referência), será considerada um defeito. 6) A figura 5-b está errada porque apresenta uma convexidade com o título de concavidade excessiva. O item 2.8 se refere à DISTORÇÃO ANGULAR. Consideração: Trata-se de uma deformação global (distorção angular) definida como sendo uma descontinuidade. Qual a propriedade física, mecânica ou metalúrgica que teria sido interrompida? Todos os tipos desvios dimensionais devem estar sob o título correto: Deformações. O item 2.9 se refere à DEPOSIÇÃO INSUFICIENTE. Considerações: 1) Deveria ter outro nome. Esta deformação já está contemplada dentro do item concavidade. No caso, é uma deformação localizada (deformidade) causada pela deposição insuficiente de material de adição. 2) Deve estar sob o título correto: Deformações. 3) A figura 7 não mostra uma deposição insuficiente, mas apenas mal distribuída. O item 2.10 é referente à DESALINHAMENTO. Consideração:

O que se define aqui, outra vez, é um defeito, não uma deformação, porque diz textualmente que as superfícies apresentam-se desalinhadas, excedendo a configuração de projeto (o grifo é meu). Mais uma vez, a idéia de defeito supera a de definição de um tipo de deformação global, que seria o título correto em que este item deveria estar. O item 2.11 trata de EMBICAMENTO. Consideração: Trata-se de uma deformação global e, portanto, valem, mutatis mutandis, as considerações do item anterior. O item 2.12 trata de FALTA DE FUSÃO. Este item trata, neste sim, de uma descontinuidade, definida assim: fusão incompleta entre a zona fundida e o metal de base ou entre passes da zona fundida, podendo estar localizada: a) na zona de ligação (???) (ver Figura 10 a); b) entre os passes (ver Figura 10 b); c) na raiz da solda (ver Figura 10 c e d). (grifo meu). No entanto, esta redação apresenta vários erros. Considerações: 1) A idéia confusa de quem fez esta redação refletiu-se também na elaboração da figura 10 (a,b,c e d)! O que se quer dizer é que uma região da face da junta não fundiu ou que uma região da face de um passe não foi refundida. 2) Não cabe aqui falar em zona de ligação (item a). A zona de ligação é a região do metal de base que fundiu, mas não se solubilizou com a solda. Trata-se de uma região muito estreita (medida em microns) e que não é detectável sem uma análise micrográfica de muito boa resolução. 3) A figura 10 resulta errada porque representa a falta de fusão no limite da solda ao invés de localizá-la na face plana do chanfro. 4) Além disso, a falta de fusão não implica em vazios, como mostra a figura, mas numa solidificação sem ligação, isto é, uma solidificação que não é epitaxial, ou seja, que parta do crescimento de grãos parcialmente fundidos. O item 2.13 referente à FALTA DE PENETRAÇÃO, definida como insuficiência de metal na raiz da solda (ver Figura 11). Considerações:

1) Falta de penetração é uma descontinuidade, portanto está sob o título correto, mas a definição está errada. Penetração é a distância da raiz da solda até a superfície da placa a soldar. Portanto, há falta de penetração sempre que esta distância for inferior a espessura a soldar. 2) Não se trata necessariamente de um defeito (a penetração parcial é muito usada), pois depende do critério de aceitação, mas é uma descontinuidade. 3) A figura da direita, em baixo (junta de filete), não é referente à falta de penetração, porque ali, não tem raiz, pois a fusão não alcançou a face de raiz. Portanto, trata-se de fusão incompleta (falta de fusão). O item 2.14, INCLUSÃO DE ESCÓRIA: está correto! Trata-se mesmo de descontinuidade. O item 2.15 (INCLUSÃO METÁLICA) está correto! Trata-se mesmo de descontinuidade. O item 2.16 (MICROTRINCA) está correto! Trata-se mesmo de descontinuidade. Aqui tenho uma sugestão: Sei que o jargão técnico não deve mudar o nosso idioma, mas apenas torná-lo mais específico, ou para enriquecer seu conteúdo ou para torná-lo mais preciso, ou ambos. É este o caso de minha proposição, como segue: reservar o termo trinca para as fendas que afloram na superfície e reservar o termo fissura para as fendas internas, que não afloram. Isto é comum em alguns livros de metalurgia e acho que seria ainda mais útil no campo da soldagem, porque enriquece seu conteúdo e torna-o mais preciso. Sempre que se falar em fissura já se saberá que é interna e quais métodos podem detectá-la. Sempre que se falar em trinca já se saberá que é externa e quais métodos podem detectá-la. O item 2.17 (MORDEDURA) está correto! Trata-se mesmo de descontinuidade, porque, traçando uma linha reta que parte do material de base e atravessa a solda, chagase a uma interrupção das propriedades na mordedura. O item 2.18 (MORDEDURA NA RAIZ) está correto!

Trata-se mesmo de descontinuidade. O item 2.19 (PENETRAÇÃO EXCESSIVA) está errado! 1) Não é uma descontinuidade, mas uma deformação localizada. 2) Quando se fala em excessiva já se embute um critério de aceitação. Novamente as idéias se confundem na noção de defeito. Esta norma não trata de defeitos. Se tratasse seria bem mais complexa. 3) O texto do projeto define penetração excessiva assim: metal da zona fundida em excesso na raiz da solda (ver Figura 15). Pleonasmo à parte, a definição está errada. Penetração é uma distância. É a distância da face da peça até a raiz da solda. Em outras palavras, é a distância da face da placa a soldar até o ponto mais profundo da face da raiz alcançada pela fusão do material de base. Portanto, por definição, a penetração nunca será maior que a espessura da placa. É impossível haver excesso de penetração. O que está representado na figura é uma deformação localizada causada pelo vazamento de metal fundido pela folga da junta (abertura de raiz). Normalmente chamamos a isto simplesmente de vazamento, mas nunca excesso de penetração. O item 2.20 (PERFURAÇÃO) apresenta a seguinte definição: furo na solda (ver Figura 16 a) ou penetração excessiva localizada (ver Figura 16 b), resultante da perfuração do banho de fusão durante a soldagem. Considerações: 1) É claro que a fonte de calor pode causar uma perfuração na junta por onde vazaria o metal fundido, mas colocar ou penetração excessiva localizada... não faz sentido algum. Vazamento é um tipo de perfuração? Não. Ou temos vazamento, que é uma deformação localizada, ou temos perfuração, que é uma descontinuidade. 2) A Figura 16 b é desnecessária, até porque não tem perfuração alguma. Item 2.21 (PORO): sem objeções! Item 2.22 (PORO SUPERFICIAL): sem objeções!

Item 2.23 (POROSIDADE): sem objeções! Item 2.24 (POROSIDADE AGRUPADA): sem objeções! Item 2.25 (POROSIDADE ALINHADA): sem objeções! Item 2.26 (POROSIDADE VERMIFORME): sem objeções! Item 2.27 (RECHUPE DE CRATERA): sem objeções! Item 2.28 (REFORÇO EXCESSIVO). A definição dada foi a seguinte: excesso de metal da zona fundida, localizado na face da solda (ver Figura 22). Considerações: Novamente a confusão com a noção de defeito. Adjetivos como excessivo, insuficiente, etc. não cabem em definições de deformações ou de descontinuidades, mas sim de defeitos. Esta norma refere-se a descontinuidades e não a defeitos. Por outro lado, REFORÇO não é descontinuidade, porque não satisfaz a definição de descontinuidade dada anteriormente no próprio documento em análise. Qual a propriedade física, mecânica ou metalúrgica que teria sido interrompida? Reforço é apenas uma deformação localizada (deformidade) que, se for excessiva, será considerada um defeito devido ao seu potencial para induzir o surgimento de uma descontinuidade (fissuras ou trincas), principalmente quando a peça soldada estiver em serviço. Um colega meu, tentando justificar a redação deste projeto de norma, sugeriu que se poderia considerar que o reforço é uma descontinuidade porque interromperia as linhas de força na solda. Não dá, seria um erro! Em primeiro lugar, linhas de força não são características ou propriedades dos materiais (dependem das cargas externas). Em segundo lugar, um reforço não transforma um fluxo de força contínuo em um descontínuo. Apenas causa uma variação (sem interrupção) na direção das linhas de força e também uma variação (contínua) na sua densidade. Portanto, reforço não é descontinuidade. A variação de uma propriedade não é uma descontinuidade; a sua interrupção sim. Item 2.29 (RESPINGOS). Definição apresentada: glóbulos de metal de adição, transferidos durante a soldagem e aderidos à

superfície do metal de base ou à zona fundida já solidificada. Consideração: Aí está algo que não é descontinuidade, nem deformação, mas é um inconveniente, que prejudica a produção por soldagem. Um grave inconveniente como tantos outros, como a presença de graxas na superfície a soldar, restos de escória, poeiras, como a radiação ultravioleta, que obriga o soldador a proteger-se, como o ozônio e os óxidos de nitrogênio produzidos pelo arco voltaico, que prejudicam a saúde do soldador, o choque elétrico, o ruído etc. Acho que este item, se for citado, deve entrar em algum lugar à parte. Item 2.30, (SEGREGAÇÃO INTERDENDRÍTICA), com a seguinte definição: rechupe interdendrítico, vazio alongado situado entre dendritos da zona fundida. Está correto! Trata-se mesmo de descontinuidade. Item 2.31 (SOBREPOSIÇÃO), com a seguinte definição: excesso de metal da zona fundida sobreposto ao metal de base na margem da solda, sem estar fundido ao metal de base. (ver Figura 23). Considerações: 1) Na verdade, trata-se de um derramamento lateral, que causa uma deformação localizada (deformidade). 2) O termo sobreposição é usado para tantas coisas em soldagem! Há um outro termo, muito usado para indicar este tipo de deformação, o qual é bem preciso e adequado para ser usado como termo técnico em soldagem: lapela. Eu prefiro este. Coloco-o como proposta. Item 2.32 (SOLDA EM ÂNGULO ASSIMÉTRICA): solda em ângulo, cujas pernas são desiguais, estando em desacordo com a configuração de projeto (ver Figura 24). Considerações: Sugiro mudar o nome para assimetria de filete. Se a assimetria não estiver prevista no projeto, então, trata-se de uma deformação localizada. Não é descontinuidade. Item 2.33 (TRINCA), com a definição: descontinuidade bidimensional produzida pela ruptura local do material. Considerações:

Está correto! Trata-se mesmo de descontinuidade. Aqui reitero a minha sugestão: reservar o termo trinca para as fendas que afloram na superfície e reservar o termo fissura para as fendas internas, que não afloram. Isto é comum entre autores na área da metalurgia e acho que seria ainda mais útil no campo da soldagem, porque enriquece seu conteúdo e torna-o mais preciso. Sempre que se falar em fissura já se sabe que é interna e que métodos a detectam. Sempre que se falar em trinca já se sabe que é externa e que métodos a detectam. Sei que o jargão técnico não deve mudar o nosso idioma, mas apenas torná-lo mais específico, ou para enriquecer seu conteúdo ou para torná-lo mais preciso, ou ambos. É este o caso de minha proposição! Item 2.34 (TRINCA DE CRATERA). Sem objeção. E agora, já não tenho tempo! Terei que deixar de analisar o final do documento. Acredito que o que foi dito até aqui já dá muitos subsídios para uma revisão mais detalhada do projeto de norma. Já temos assunto para começar um debate, não é mesmo? Há muitas outras falhas a apontar, em outras normas, tão graves como me parecem essas que assinalei aqui. Proponho-me a continuar a colaborar. Há graves problemas nos documentos que tratam de terminologia da soldagem. Fico à disposição para colaborar na redação final desta Norma Técnica. Atenciosamente Prof. Almir Quites