Um novo fio de aço inoxidável para aplicações ortodônticas

Documentos relacionados
AVALIAÇÃO DO POTENCIAL DE PITE DO AÇO INOXIDÁVEL AUSTENO-FERRÍTICO SEW 410 NR E AUSTENÍTICO AISI 304L

Introdução Conteúdo que vai ser abordado:

Avaliação das propriedades mecânicas em ligas ferríticas com 5% de Mo e diferentes teores de Cr

5.3. ANÁLISE QUÍMICA 5.4. ENSAIO DE DUREZA

Barras e fios de aço para armaduras de concreto

3 MATERIAIS E MÉTODOS

3 Material e Procedimento Experimental

ANÁLISE DO COMPORTAMENTO METAL-MECÂNICO APÓS CONFORMAÇÃO A QUENTE

GMEC7301-Materiais de Construção Mecânica Introdução. Módulo II Ensaios Mecânicos

INFLUÊNCIA DE ASPECTOS MICROESTRUTURAIS NA RESISTÊNCIA À FRATURA DE AÇO ESTRUTURAL COM APLICAÇÕES OFFSHORE

AÇOS INOXIDÁVEIS (Fe-Cr-(Ni))

EFEITO DOS ELEMENTOS DE LIGA NOS AÇOS RSCP/ LABATS/DEMEC/UFPR

ANÁLISE DO COMPORTAMENTO METAL-MECÂNICO APÓS CONFORMAÇÃO A QUENTE

Instituto Federal do Espírito Santo, Av. Vitória 1729, Jucutuquara, CEP , Vitória - ES

- Fornos primitivos, com foles manuais, ainda hoje usados na África Central - Fornos primitivos, com foles manuais, utilizados na europa medieval.

Ensaio de Fluência. aplicação de uma carga/tensão constante em função do tempo e à temperaturas elevadas (para metais T > 0,4 T fusão)

3 Material e Procedimento Experimental

longitudinal para refrigeração, limpeza e remoção de fragmentos de solos provenientes da perfuração, Figura 10.

3 Materiais e Métodos

13/10/2009. Introdução Características gerais Etapas do Processo de Fabricação Geometria Vantagens Equipamentos Produtos

PRECIPITAÇÃO DA AUSTENITA SECUNDÁRIA DURANTE A SOLDAGEM DO AÇO INOXIDÁVEL DUPLEX S. A. Pires, M. Flavio, C. R. Xavier, C. J.

Propriedades Mecânicas Fundamentais. Prof. Paulo Marcondes, PhD. DEMEC / UFPR

Fundido ou Forjado? Fundidos e forjados partem de processos iniciais bastante parecidos.

PROCESSO SELETIVO MESTRADO 2018 Projeto de Pesquisa

Propriedades dos Materiais ENGENHARIA DOS MATERIAIS PROF. KARLA NUNES 2017

Metalurgia da Soldagem Particularidades Inerentes aos Aços Carbono

NOTAS DE AULAS - VII

Ensaios Mecânicos dos Materiais

ENSAIO DE TRAÇÃO EM-641

Sistemas Estruturais. Prof. Rodrigo mero

8º CONGRESSO IBEROAMERICANO DE ENGENHARIA MECANICA Cusco, 23 a 25 de Outubro de 2007

PMR-3101 INTRODUÇÃO A MANUFATURA MECÂNICA Aula 5: Propriedades mecânicas: FRATURA E FADIGA

FORNO T4 (c/ Atm. Controlada) AUTOMATIZADO

Materiais Metálicos: INTRODUÇÃO Engenharia Civil

LAMINAÇÃO A FRIO DE FIOS ORTODÔNTICOS DE AÇO INOXIDÁVEL AUSTENÍTICO AISI 304

ESTUDO COMPARATIVO ENTRE TUBOS DE AÇO INOXIDÁVEL AUSTENÍTICO COM

A Tabela 2 apresenta a composição química do depósito do eletrodo puro fornecida pelo fabricante CONARCO. ELETRODO P S C Si Ni Cr Mo Mn

AVALIAÇÃO DAS PROPRIEDADES MECÂNICAS DE REGIÃO DE SOLDA MAG (GMAW) DE UM AÇO PATINÁVEL UTILIZANDO DOIS DIFERENTES TIPOS DE ARAMES DE SOLDAGEM

Universidade Estadual de Campinas Faculdade de Engenharia Civil Departamento de Estruturas. Aços para concreto armado

Conhecer os principais tipos de materiais empregados nos projetos industriais;

CARACTERIZAÇÃO MICROESTRUTURAL DO AÇO INOXIDÁVEL DUPLEX UNS S32101: INVESTIGAÇÃO DE REAGENTES 1

FACULDADE SUDOESTE PAULISTA. Ciência e Tecnologia de Materiais Prof. Ms. Patrícia Corrêa. Metais: Conformação

Seleção de Materiais

FRACTOGRAFIA DE JUNTAS SOLDADAS PELOS PROCESSOS GTAW, SMAW E FCAW DE AÇO INOX DUPLEX 2205 APÓS ENSAIO DE TRAÇÃO *

ANÁLISE EXPERIMENTAL E TEÓRICA DO PROCESSO DE CONFORMAÇÃO MECÂNICA DE TREFILAÇÃO 1. Evandro Bertoldi 2.

Aços para Construção Mecânica

INFLUÊNCIA DA SOLDA NA VIDA EM FADIGA DO AÇO SAE 1020

TECNOLOGIA DOS MATERIAIS

MÓDULO 2: Propriedades mecânicas dos metais. Deformação elástica, Deformação plástica

Propriedades Mecânicas e Geométricas dos Perfis Estruturais. Curso de Projeto e Cálculo de Estruturas metálicas

ANÁLISE MECÂNICA E MICROESTRUTURAL DE UM AÇO BAIXO CARBONO (ABNT 1015), SUBMETIDO À RECRISTALIZAÇÃO TÉRMICA PÓS-DOBRAMENTO.

INFLUÊNCIA DE ASPECTOS MICROESTRUTURAIS NA RESISTÊNCIA À FRATURA DE AÇO ESTRUTURAL COM APLICAÇÕES OFFSHORE

TREFILAÇÃO TREFILAÇÃO

Tecnologia dos Materiais Outras ligas metálicas não ferrosas

Fios em varetas Morest standardcrni/ Wires sticks standard MorestCrNi. Fios em varetas Morealloy azulcocr / Wires sticks Morealloy bluecocr.

EMENTA: Processos de fabricação

Introdução ao estudo das Estruturas Metálicas

Brasil 2017 SOLUÇÕES INTEGRADAS EM ENSAIOS NÃO DESTRUTIVOS

NOÇÕES DE SOLDAGEM. aula 2 soldabilidade. Curso Debret / 2007 Annelise Zeemann. procedimento de soldagem LIGAS NÃO FERROSAS AÇOS.

Universidade Estadual de Ponta Grossa/Departamento de Engenharia de Materiais/Ponta Grossa, PR. Engenharias, Engenharia de Materiais e Metalúrgica

METALURGIA FÍSICA TECNOLOGIA DA CONFORMAÇÃO PLÁSTICA. Tecnologia em Materiais Prof. Luis Fernando Maffeis Martins

Título do projeto: SOLDABILIDADE DE UM AÇO ACLIMÁVEL DE ALTO SILÍCIO PARA CONSTRUÇÃO METÁLICA COM RESISTENCIA EXTRA A CORROSÃO MARINHA

5 Discussão dos Resultados

Aula 01: Introdução à Metalurgia

METAIS, AÇOS E PROCESSOS SIDERÚRGICOS

TUBOS DE AÇO SEM COSTURA. PDF created with pdffactory trial version

SOLDAGEM TIG. Prof. Dr. Hugo Z. Sandim. Marcus Vinicius da Silva Salgado Natália Maia Sesma William Santos Magalhães

Seminário em Projeto de Ferramentas

ESTUDO DA RECRISTALIZAÇÃO DO AÇO ABNT 1010 COM DIFERENTES GRAUS DE DEFORMAÇÃO

TM373 Seleção de Materiais Metálicos

EFEITO DA TEMPERATURA DE REVENIMENTO NO AÇO ASTM A 522 UTILIZADO NA INDÚSTRIA DE PETRÓLEO E GÁS *

3- Materiais e Métodos

EFEITOS DO TRATAMENTO CRIOGÊNICO DE 24 E 36 HORAS EM AÇOS D2 E D6

Nome genérico dos processos em que se aplica uma força externa sobre a matéria-prima, obrigando-a a adquirir a forma desejada por deformação plástica.

ENSAIO DE FADIGA EM-641

AULA 01: ASPECTOS GERAIS DAS ESTRUTURAS DE AÇO

LAMINAÇÃO LAMINAÇÃO. Prof. MSc: Anael Krelling

4 Resultados. 4.1.Perfil do cordão de solda

3 MATERIAL E PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL

Aço Inoxidável Ferrítico com 11% de Cromo para Construção Soldada. Columbus Stainless. Nome X2CrNil2. Elementos C Mn Si Cr Ni N P S

Conteúdo de metal nobre < 25% (ouro, Tabela 2 Classificação das ligas para fundição odontológica em função da nobreza e indicação clínica

ANEXO IV RELAÇÃO DOS ITENS DA LICITAÇÃO

INTRODUÇÃO: Devido a importância dos aços como matéria prima para a produção de elementos de máquinas, um. necessário neste momento.

CLASSIFICAÇÃO DOS AÇOS

Caracterização das Propriedades Mecânicas de Materiais Metálicos: A Influência da velocidade da máquina sobre a tensão obtida no ensaio de tração 1

PROCESSAMENTO DE LIGAS À BASE FERRO POR MOAGEM DE ALTA ENERGIA

OTIMIZAÇÃO DE CARGAS METÁLICAS EM FORNOS DE INDUÇÃO

COMPARAÇÃO DE MOLAS DE SUSPENSÃO TEMPERADAS E REVENIDAS ENROLADAS A QUENTE E A FRIO

ESTUDO DA POROSIDADE EM AÇO INOXIDÁVEL DÚPLEX OBTIDO POR MOAGEM DE ALTA ENERGIA

(22) Data do Depósito: 20/06/2014. (43) Data da Publicação: 31/05/2016

Determinação das resistências à esterilização em autoclave, à corrosão e à exposição térmica de instrumental cirúrgico - estudo de caso


ESTUDO COMPARATIVO DA SOLDABILIDADE DO AÇO PARA GASODUTOS API 5L X80 COM AÇOS TEMPERADOS E REVENIDOS

DIRETORIA GERAL NÚMERO EMP TECNOLOGIA ESPECIFICAÇÃO DE MATÉRIA-PRIMA REVISÃO DATA MOTIVO/REVISÃO

AÇOS E FERROS FUNDIDOS AÇOS E FERROS FUNDIDOS

ENSAIO DE COMPRESSÃO EM-641

SOLDA POR FRICÇÃO EM AÇO CARBONO

Processos Mecânicos de Fabricação. Conceitos introdutórios sobre usinagem dos metais

Determinação das resistências à esterilização em autoclave, à corrosão e à exposição térmica da chave de instalação do implante Tryon estudo de caso

CATÁLOGO DE PRODUTOS

Transcrição:

A r t i g o I n é d i t o Um novo fio de aço inoxidável para aplicações ortodônticas André Itman Filho*, Rosana Vilarim da Silva**, Roney Valdo Bertolo*** Resumo Objetivo: desenvolver uma metodologia para fabricação de fios ortodônticos de aço inoxidável austenoferrítico SEW 410 Nr. 14517 por meio dos processos convencionais de laminação e trefilação. Métodos: o aço austenoferrítico foi elaborado em um forno elétrico de indução. A qualidade dos fios foi avaliada por ensaios de tração e medidas de microdureza. A ductilidade e a manuseabilidade foram analisadas por meio da confecção de componentes ortodônticos. Resultados e Conclusões: os valores encontrados mostraram que os fios de aço inoxidável austenoferrítico atenderam às normas BS 3507:1976 e ISO 58321, e apresentaram ótima ductilidade para confecção de componentes ortodônticos com dobras complexas. Palavraschave: Aços inoxidáveis duplex. Fios ortodônticos. Propriedades de fios ortodônticos. INTRODUÇÃO A prática de implantes cirúrgicos já era conhecida no início da era cristã, embora o primeiro caso documentado, em 1565, tenha sido o da restauração do palato de um paciente com uma placa de ouro 13. Apesar de praticados desde o século XVI, esses procedimentos são pouco conhecidos no que diz respeito à fabricação e qualidade dos componentes utilizados. Somente a partir de 1895, com a observação da fixação metálica e cicatrização óssea das fraturas através do raio X, a aplicação dos biomateriais metálicos em implantes humanos foi estimulada. Inicialmente, as ligas de ouro, prata e platina foram utilizadas por apresentarem um alto grau de biocompatibilidade associado à facilidade de conformação 12,15. A partir de 1930, ligas de metais com níquel, cobalto, cromo e molibdênio começaram a ser empregadas na confecção de próteses parciais, pois a combinação de baixo custo e boas propriedades mecânicas fez com que substituíssem as ligas mais nobres 10,11. Essas ligas, chamadas de básicas, requeriam altas temperaturas de fusão e equipamentos especiais para o acabamento superficial dos componentes fabricados. A metalurgia das ligas era extremamente complexa e as chances Como citar este artigo: Itman Filho A, Silva RV, Bertolo RV. Um novo fio de aço inoxidável para aplicações ortodônticas. Dental Press J Orthod. 2011 JulyAug;16(4):559.» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo. * Doutor em Ciência e Engenharia dos Materiais pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). ** Doutora em Ciência e Engenharia dos Materiais pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESCUSP). *** Cirurgiãodentista pela Faculdade de Odontologia de Lins SP. Dental Press J Orthod 55 2011 JulyAug;16(4):559

Um novo fio de aço inoxidável para aplicações ortodônticas de sucesso dependiam de variáveis importantes como a composição química apropriada do material e a avaliação das propriedades mecânicas, além do conhecimento das técnicas de fundição 4,13. Na mesma linha tecnológica, essas ligas não ferrosas começaram a ser gradualmente substituídas pelos aços inoxidáveis austeníticos da série ASTM 300, no que diz respeito à prática ortodôntica. Esses aços, além da menor densidade, quando comparados às ligas básicas, apresentavam resistência mecânica adequada, boa resistência à corrosão e suficiente biocompatibilidade com menor custo 1,9,12. Nos tratamentos ortodônticos, os fios metálicos são submetidos aos esforços mecânicos provenientes da mastigação, os quais provocam deformações permanentes e tensões residuais localizadas. Para essa finalidade, os fios requerem resistência mecânica suficiente à deformação plástica e às tensões envolvidas nos movimentos das articulações, além de biocompatibilidade. Nesse caso, os aços ASTM 302 e ASTM 304 são os mais utilizados, enquanto o inoxidável austenítico ASTM 316L é o mais apropriado para implantes cirúrgicos (Tab. 1). Atualmente, o conhecimento das propriedades mecânicas das diversas ligas proporciona a otimização dos tratamentos ortodônticos. Em geral, os fios fabricados com os aços inoxidáveis austeníticos são adequados para utilização nos estágios finais dos tratamentos, em razão da ótima rigidez e resistência à corrosão no meio bucal 3,5,8. Outras propriedades, como a tenacidade, a resistência à fadiga e a ductilidade, contribuem para a escolha do material mais adequado. Sendo assim, a liga ideal deverá ter resistência suficiente para suportar as tensões envolvidas nos movimentos das articulações, capacidade de absorver a energia mecânica sem deformação plástica, ser inerte aos fluídos orgânicos e não liberar produtos tóxicos 2. Considerandose a resistência mecânica e à corrosão, os aços inoxidáveis austeníticos têm sido substituídos pelos austenoferríticos em várias aplicações industriais, pois esses últimos, quando comparados aos primeiros, apresentam melhor resistência à propagação de trincas em corrosão sob tensão 6,14. Resultados da literatura também mostraram que as características de biocompatibilidade de um aço inoxidável austenítico e de um austenoferrítico são similares 1. No caso dos tratamentos ortodônticos, a substituição dos aços inoxidáveis austeníticos pelos austenoferríticos poderá apresentar a vantagem da redução do custo e da hipersensibilidade ao níquel nos pacientes. Tabela 1 Composição química dos aços inoxidáveis SEW 410 Nr. 14517 padrão, austenoferrítico elaborado e austeníticos comerciais citados no texto (% em peso). Cr Ni Mo Cu Mn Si C N P S SEW 410 elaborado SEW 410 padrão ASTM 316L ASTM 304 ASTM 302 25,0 5,6 2,5 3,0 0,6 0,6 0,02 0,14 0,03 0,01 24,5 5,5 2,5 3,0 1,0 1,0 0,03 0,12 26,5 7,5 3,5 3,5 max max max 0,25 max max 18,0 8,0 2,0 2,0 1,0 0,03 20,0 10,0 3,0 max max max max max 18,0 8,0 2,0 1,0 0,08 20,0 10,0 max max max max max 17,0 8,0 2,0 1,0 0,15 19,0 10,0 max max max max max Dental Press J Orthod 56 2011 JulyAug;16(4):559

Itman Filho A, Silva RV, Bertolo RV objetivo O objetivo deste trabalho foi a confecção de fios de aço inoxidável austenoferrítico SEW 410 Nr. 14517 por meio da laminação e trefilação, similares aos processos de fabricação dos fios comerciais de aço inoxidável austenítico utilizados nos tratamentos ortodônticos. Esse aço duplex foi o escolhido, pois é muito utilizado em diversas aplicações industriais. Para verificar se os fios confeccionados atendiam aos requisitos das normas, foram realizados ensaios em tração e medidas de microdureza. A ductilidade do material foi avaliada por meio de análises fratográficas e confecção de componentes ortodônticos. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL O aço austenoferrítico foi elaborado em um forno elétrico de indução, com capacidade nominal de 500kg, na Fundição do Grupo Metal (Tietê/SP). O metal líquido foi vazado em um molde de areia aglomerada com resina fenólica uretânica na forma de bloco tipo quilha (ASTM A781M) adaptado a uma peça. A composição química do aço foi obtida por meio da análise em um espectômetro de emissão óptica. A barra inicial, de aproximadamente ø11 180mm de comprimento, foi usinada em torno mecânico até atingir o diâmetro de 10mm e, posteriormente, foi reduzida ao diâmetro de 2,5mm pelo processo de laminação. Esses fios laminados, com aproximadamente 1m de comprimento, foram soldados aos do aço inoxidável ASTM 304 para ser trefilados até o diâmetro de 0,4mm, conforme procedimento convencional a frio na Superfine Steel (Santa Bárbara D Oeste/SP). Para avaliar a resistência máxima à tração, amostras dos fios cortadas durante as etapas do processo de trefilação foram tracionadas em uma máquina universal EMIC DL 10000 com a velocidade de 1mm/minuto, conforme especificação das normas ASTM E 800 e NBR 6152/92. Nessas amostras também foram feitas medidas das microdureza, seguindo os critérios da norma ASTM E 384 89. A manuseabilidade dos fios foi avaliada comparativamente à dos fios de aços inoxidáveis comerciais, por meio da confecção de componentes ortodônticos. Para verificar as características morfológicas da fratura após ensaio em tração, uma amostra do fio com 0,9mm de diâmetro foi analisada por meio de microscopia eletrônica de varredura. RESULTADOS Os valores, em percentuais de peso, mostrados na Tabela 1, revelam que os teores dos elementos atendem às especificações da composição química do aço inoxidável austenoferrítico SEW 410 Nr. 14517. A Tabela 2 mostra os valores médios de resistência à tração com os respectivos desviospadrão, após realização dos ensaios em cinco corpos de prova nos diâmetros relacionados. Esses valores atendem às exigências das normas BS 3507:1976 e ISO 58321. Na mesma tabela são apresentadas as medidas de microdureza das amostras submetidas aos ensaios em tração. Na Figura 1 é mostrado um Bionator confeccionado com os fios do aço inoxidável austeno ferrítico. As Figuras 2A, 2B e 2C mostram as características fractográficas representativas de uma amostra submetida ao ensaio de tração. FIGURA 1 Bionator confeccionado com o fio de aço SEW 410 Nr. 14517. Tabela 2 Resistências à tração e microdureza Vickers dos fios fabricados com o aço SEW 410 Nr. 14517. ø 2,5mm ø 1,1mm ø 0,9mm ø 0,4mm σ t (MPa) 1423 ± 16 1596 ± 26 1726 ± 41 2030 ± 25 Vickers (HV) 341 ± 13 427 ± 6 430 ± 5 509 ± 13 Dental Press J Orthod 57 2011 JulyAug;16(4):559

Um novo fio de aço inoxidável para aplicações ortodônticas A B C FIGURA 2 Fractografia do fio com ø 0,9mm submetido ao ensaio de tração: A) superfície de fratura do fio, B, C) ampliação da região indicada em (A). Discussão A principal dificuldade para a realização deste trabalho foi desenvolver o processo de fabricação do fio em equipamentos convencionais de conformação mecânica, pois esses são utilizados para grande quantidade de material, diferentemente da amostra inicial do aço austenoferrítico, de aproximadamente 500g. Em geral, as fusões nos fornos são realizadas para, no mínimo, 500kg de aço, fato que encarece a obtenção de materiais para projetos de pesquisa. Assim, para obter uma amostra inicial do aço inoxidável austenoferrítico, foi necessária a adaptação de um molde tipo quilha a uma peça. A redução até o diâmetro de 2,5mm foi realizada em laboratório, tendo como resultado fios com aproximadamente 1m de comprimento. Como as trefilas industriais necessitam de comprimentos maiores para o início do processo, foi necessária a soldagem dos fios ø2,5mm aos do aço inoxidável ASTM 304, que tem composição compatível ao austenoferrítico. Considerando as etapas de conformação, o efeito do elevado grau de deformação a frio pode ser constatado na Tabela 2, com redução de 80,2% no último passe de trefila (ø0,9mm ø0,4mm). Mesmo com o aumento significativo do valor da dureza após a trefilação no diâmetro final, não houve prejuízo da ductilidade e da manuseabilidade, pois foram confeccionados vários componentes com diversas dobras, sem que houvesse a ruptura dos fios. Quanto à resistência mecânica elevada, associada à rigidez característica do aço inoxidável, são parâmetros importantes para assegurar que o fio mantenha os dentes na posição adequada após o término do tratamento ortodôntico. Outro fator importante é que o processo de conformação para obter o diâmetro desejado foi similar aos utilizados na fabricação de fios de aços inoxidáveis comerciais. Isso favorece a produção em escala industrial sem alterações no processo de manufatura dos aços. Os valores da dureza e resistência máxima à tração, similares aos dos fios inoxidáveis ortodônticos comerciais ASTM 302 e ASTM 304, são um indicativo de que o aço pode suportar o atrito característico da movimentação dos fios entre os braquetes com propriedades adequadas para aplicações na Ortodontia, conforme a norma BS 3507/1976 e ISO 58321. Com relação à ductilidade do aço, essa característica é comprovada por meio da Figura 2, que mostra a fractografia da microtrinca iniciandose no centro do fio e terminando por cisalhamento nas bordas, conforme o modelo típico taça e cone 7. Quanto à manuseabilidade do fio, foi observado que o aço inoxidável austenoferrítico tem ductilidade adequada para dobramentos intensos, tais como os exigidos na confecção do Bionator, e é apropriado para fabricação de outros componentes ortodônticos. Dental Press J Orthod 58 2011 JulyAug;16(4):559

Itman Filho A, Silva RV, Bertolo RV No teste comparativo com fios de aço inoxidável austenítico utilizado nos procedimentos de rotina, não foi constatada diferença ao manusear os dois tipos. CONCLUSÃO Os resultados dessa pesquisa mostraram que o aço inoxidável austenoferrítico suportou uma grande redução de área nas etapas de fabricação dos fios. Assim, o valor da resistência mecânica à tração superior a 2 000MPa, associado à ductilidade, à biocompatibilidade e às características de processamento, indica que os aços inoxidáveis austenoferríticos apresentam grande potencial para substituir os austeníticos nas aplicações ortodônticas. A new stainless steel wire for orthodontic purposes Abstract Objective: To develop a method to manufacture austeniticferritic stainless steel orthodontic wires (SEW 410 Nr. 14517) using conventional rolling and wiredrawing processes. Methods: Austeniticferritic steel was produced in an induction furnace. Traction trials and microhardness measurements were used to evaluate wire quality. Orthodontic parts were fabricated to assess ductility and malleability. Results and Conclusions: Austeniticferritic stainless steel wires meet the BS 3507:1976 and ISO 58321 norms and have excellent ductility for the fabrication of orthodontic parts with complex folds. Keywords: Duplex stainless steel. Orthodontic wires. Orthodontic wires properties. Referências 1. Beloti MM, Rollo JMDA, Itman A, Rosa AL. In vitro biocompatibility of duplex stainless steel with and without 0,2% niobium. J Appl Biomater Biomech. 2004;2(3):1628. 2. Dainesi EA, Dainesi EA, Consolaro A, Woodside DG, Freitas MR. Nickel hypersensitivity reaction before, during and after orthodontic therapy. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 1998;113(6):65560. 3. Drake SR, Wayne DM, Powers JM, Asgar K. Mechanical properties of orthodontic wires in tension, bending, and torsion. Am J Orthod. 1982 Sept;82(3):20610. 4. Felton DA, Brien RL. Comparison of titanium and cobaltchromium removable partial denture clasps. J Prosthet Dent. 1997;78(2):18793. 5. Finn ME, Srivastava AK. Machining of stainless steel. Proceedings of the International Conference on Manufacturing of Advanced Materials. Las Vegas; 2000. 6. Gunn RN. Duplex stainless steel: microstructure, properties and applications. Cambridge: Cambridge University Press; 1997. 7. Hull D. Fractography. Cambridge: Cambridge University Press; 1999. 8. Kapila S, Sachdeva R. Mechanical properties and clinical applications of orthodontic wires. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 1989;96(2):1008. 9. Padilha AF, Guedes LC. Aços inoxidáveis austeníticos: microestruturas e propriedades. São Paulo: Hemus; 1994. 10. Ratner BD. Biomaterial science introduction to materials in Medicine. New York: Academic Press; 1997. 11. Rubin L. Biomaterials in reconstructive surgery. St. Louis: CV Mosby; 1983. 12. Silva ALC, Mei PR. Aços e ligas especiais. Sumaré, SP: Eletrometal S.A. Metais Especiais. 2ª ed. São Paulo: Pannon; 1988. 13. Skinner EW. Materiais dentários. 9ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1991. 14. Truman JE, Pirt KR. Properties of a duplex (austeniticferritic) stainless steel and effects of thermal history. Duplex Stainless Steel Conference Proceedings. 1983 Oct 2328. Metals Park: American Society for Metals; 1983. p. 11342. 15. Willians DF, Roaf R. Implants in surgery. London: W. B. Saunders Company; 1973. Enviado em: 23/03/2006 Revisado e aceito: 02/12/2009 Endereço para correspondência André Itman Filho Rua José Teixeira, 228, apto. 1102 Praia do Canto CEP: 29055310 Vitória / ES Email: andreitman@hotmail.com Dental Press J Orthod 59 2011 JulyAug;16(4):559