DESENVOLVIMENTO DE EQUIPAMENTO PARA VERIFICAÇÃO IN LOCO DA OBSTRUÇÃO DO ENTORNO: ILUMINAÇÃO NATURAL E INSOLAÇÃO

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Transcrição:

DESENVOLVIMENTO DE EQUIPAMENTO PARA VERIFICAÇÃO IN LOCO DA OBSTRUÇÃO DO ENTORNO: ILUMINAÇÃO NATURAL E INSOLAÇÃO Fernando O. Ruttkay Pereira (1); Juliana R. Venturieri (2); Veridiana A. Scalco (3) (1) PhD, Professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo, LabCon/ARQ/UFSC feco@arq.ufsc.br (2) Graduanda de Arquitetura e Urbanismo, Bolsista de IC/CNPq, UFSC (3) Arquiteta, Dr. em Engenharia Civil, PPGEC, UFSC. Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Arquitetura e Urbanismo, Cx Postal 476, Florianópolis SC, Brasil, 88040-0, Tel.: (48) 3721 4974 RESUMO Adequado acesso a insolação e a luz natural é essencial para promover qualidade do ambiente interno e conforto aos seus usuários. Entretanto, esta condição não depende apenas da geometria da edificação, mas também da configuração do meio urbano de inserção. Áreas muito adensadas podem reduzir a disponibilidade de luz natural e o ganho solar nas fachadas e, conseqüentemente, nos ambientes internos das edificações. A identificação deste contexto demanda o levantamento de muitos dados do entorno e a aplicação de regras da geometria da insolação que nem sempre se apresentam de fácil determinação. O objetivo deste estudo foi o desenvolvimento de um equipamento experimental para o reconhecimento in loco das parcelas obstruídas e visíveis do céu, com a conseqüente verificação das condições de iluminação natural e insolação. A metodologia envolveu o desenvolvimento do projeto, a construção do equipamento e a realização de testes para a avaliação da sua precisão e sensibilidade. Os diversos testes práticos realizados demonstram a utilidade e praticidade do equipamento proposto para avaliações preliminares sobre as condições de insolação e de exposição à luz natural. Além disto, o aparato mostrou bom potencial para ser empregado não apenas profissionalmente, mas também como ferramenta de ensino. Palavras-chave: iluminação natural, insolação, aparato experimental, obstrução do céu ABSTRACT Adequate access to sun and daylight is essential in order to promote indoors quality and user comfort. However, this condition depends not only on the building geometry, but also on the urban configuration. Very dense areas may significantly reduce daylight availability and solar radiation on the building facades and in the indoor environment. The recognition of such context demands the survey of a set of data from the surroundings and the application of solar geometry rules that are not so easy to deal with. The aim of this study was to develop an experimental apparatus for the on-site recognition of the sky vault obstructed by the surroundings, with the subsequent verification of daylight and sunlight admission to interiors. The method involved the design, construction and testing of the equipment, in order to access its accuracy and sensitivity. The tests have shown the utility and practicality of the equipment for performing early evaluations of insolation and daylighting conditions. The ease of use of the proposed equipment for early design assessments showed its great potential not only for professional applications, but also as a teaching tool. Keywords: daylight, insolation, experimental apparatus, sky vault obstruction

1. INTRODUÇÃO Um acelerado crescimento populacional das cidades brasileiras foi verificado no século passado. Segundo dados do Ministério das Cidades (2004, p.20), em 2004, 82% da população brasileira residiam em cidades que ocupavam apenas 10% do território nacional. Esta proporção resulta em uma alta densidade construtiva e possui conseqüências negativas, especialmente nos grandes centros urbanos: A tendência ao adensamento e verticalização dos grandes centros urbanos acaba por comprometer o acesso das edificações ao Sol e à luz, muitas vezes com sérias conseqüências quanto a aspectos sanitários e de habitabilidade dos ambientes interiores. Entretanto, outro aspecto importante também deve ser considerado, que é o relativo aumento do consumo energético das edificações para condicionamento artificial (tanto térmico, quanto luminoso), devido à progressiva piora das condições ambientais externas da cidade (ASSIS, 2002, p.991). Edificações localizadas em contextos que dificultam o acesso a recursos naturais, como a luz natural e insolação, estão condenadas à dependência de sistemas artificiais de condicionamento e iluminação. Entretanto, é possível desenvolver um projeto para que estes recursos naturais sol e luz - sejam aproveitados de maneira adequada. Para tanto, a verificação da geometria da insolação e a visibilidade do entorno construído são fundamentais e podem ser efetuadas com o auxílio de simuladores de insolação, seja através de modelos físicos (heliodon ou solarscópio) ou com modelos digitais avaliados por aplicativos computacionais (SCHILER, 1987; THANACHAREONKIT et al, 2005). Entretanto, muitos elementos importantes que interferem no resultado da análise podem não ser considerados adequadamente por demandarem maior detalhamento e tempo de trabalho, como, por exemplo, edifícios vizinhos, vegetação, topografia, postes de iluminação e os revestimentos das fachadas. Lechner (2009) apresenta diversas alternativas de equipamentos de baixo custo para realizar o levantamento no local. De forma geral, proporcionam a visualização espacial na qual as trajetórias aparentes do sol podem ser sobrepostas, informando imediatamente a extensão de obstrução do sol. Para apoiar o arquiteto no levantamento mais preciso das condições de iluminação natural e insolação, buscou-se desenvolver um aparato experimental para o reconhecimento in loco das parcelas obstruídas e visíveis do céu. Esta ferramenta apresenta o potencial de aproximar o arquiteto do fenômeno, dispensando o emprego de métodos gráficos mais complexos nas etapas iniciais de projeto. 2. OBJETIVO Desenvolvimento de um equipamento para a avaliação in loco das condições de iluminação natural e insolação no ambiente urbano. 3. MÉTODO O trabalho foi desenvolvido através das seguintes etapas: 1) pesquisa sobre equipamentos existentes; 2) escolha dos parâmetros de análise de insolação e disponibilidade de luz natural; 3) desenvolvimento do projeto, pesquisa de materiais e produção de protótipos; 4) Testes em laboratório e uso in loco. 3.1. Levantamento de equipamentos existentes O próprio LabCon/ARQ-UFSC já desenvolveu uma série de equipamentos de baixo custo para análise da geometria da insolação com modelos físicos em escala reduzida, Solarscópio (Fig. 1), e para análise de insolação e visibilidade do entorno, AME Analisador de Mascaramento do Entorno (Fig. 2). Este último pode ser usado para levantamentos in-loco, mostrando uma vista panorâmica de 360º de todo o entorno refletida numa lente plano-convexa. Ao mesmo tempo, é possível ver através da lente as trajetórias aparentes solares desenhadas no plano inferior da lente. Entretanto, a leitura e interpretação da imagem exigem uma capacidade de abstração espacial que prescinde de um entendimento sólido sobre a geometria espacial e solar. Já outro instrumento, denominado de Solar Site Selector (ver Fig. 3 (a) e (b)), permite uma leitura semelhante, mas de uma forma mais simples com uma visão direta do entorno com as trajetórias solares por trás, possibilitando a identificação das horas em que o sol estará obstruído ou não. O princípio básico que 2

caracteriza este instrumento, devido a sua leitura direta das condições de obstrução, foi escolhido para o desenvolvimento do equipamento descrito no presente estudo. Figura 1 - Simulador da trajetória solar para modelos físicos - Solarscópio (LabCon/ARQ UFSC) Figura 2 - Analisador de Mascaramento do Entorno AME (LabCon/ARQ UFSC) (a) Figura 3 (a, b) - Equipamento de visualização da trajetória solar específica de um lugar Solar Site Selector (acesso: http://www.solardesign.co.uk/pw-solar.php) (b) 3.2 Parâmetros de análise: insolação e luz natural 3.2.1 Insolação Para o levantamento das condições de insolação, a leitura é feita diretamente pela identificação visual das trajetórias aparentes do sol e do intervalo de horas em que elas estão obstruídas ou não pela paisagem natural ou edificadas, caracterizando a ocorrência ou não da insolação no ponto de verificação em qualquer época do ano. 3.2.2 Luz natural Para avaliar as condições de disponibilidade de luz natural, adotou-se um parâmetro denominado Janela do Céu Preferível (JCP), que consiste na representação da porção do céu que apresenta o maior potencial de iluminação natural para ambientes internos iluminados lateralmente (ver Figura 4). Conseqüentemente, quanto maior for a desobstrução desta porção do céu, maior será o aproveitamento deste potencial para o local de verificação. Figura 4 - Representação esquemática da Janela de Céu Preferível (LEDER, 2007) 3

A determinação gráfica da JCP foi desenvolvida por Leder (2007), testada e empregada em diversos estudos (LEDER et al, 2008; LEDER et AL, 2009), é caracterizada pelos limites horizontais de 45 à esquerda e 45 à direita e limites verticais de 15 inferior e 60 superior (Figura 5). (a) Planta baixa (b) Corte Figura 5 - Ângulos de determinação da JCP. (LEDER, 2007) 3.3 Produção do equipamento Um primeiro protótipo foi desenvolvido, como exercício de aula em disciplina do Programa de Pós- Graduação em Arquitetura e Urbanismo PósARQ (ARQ1307), transpondo os limites da JCP para uma meia cúpula de plástico, para ser visualizada através de uma lente olho de peixe, no próprio local de análise (ver Figura 6). Figura 6 Protótipo do visualizador das condições de obstrução da JCP Tomando este como base, buscou-se desenvolver um aparato mantendo-se o mesmo princípio de visualização espacial. Além da JCP, as trajetórias solares (solstícios e equinócio) foram também incorporadas para a análise simultânea das condições de iluminação e insolação local. Esta inclusão exigiu o desenvolvimento de um mecanismo que permitisse o ajuste da mesma de acordo com a latitude e orientação estudadas. Produziu-se uma série de protótipos experimentais com materiais alternativos, até se chegar ao protótipo final apresentado nas Figuras 7 e 8. O equipamento consiste numa base circular na qual são acopladas duas porções de superfícies hemisféricas: uma traz a representação dos limites da Janela de Céu Preferível e a outra apresenta as trajetórias solares aparentes (solstícios e equinócio). Sendo que esta última é móvel para permitir o ajuste da latitude e a visualização em diferentes orientações. A base é complementada com uma bússola, uma bolha de nível e uma lente do tipo olho mágico. Esta lente, de baixo custo e usada para o controle e segurança, apresenta uma projeção muito próxima das lentes de grande angular tipo olhode-peixe, muito usadas em fotografia. As imagens obtidas por estas lentes possibilitam a visualização de todo o hemisfério e apresentam uma projeção eqüidistante (DELTA-T, 1999). Desta forma, a imagem visualizada apresenta uma distribuição espacial eqüidistante, garantindo a coincidência angular dos limites da JCP e das posições das trajetórias solares aparentes. 4

Figura 7 Modelo final do equipamento com os componentes alternativos utilizados na sua construção. Figura 8 Fotos lateral, frontal e superior do equipamento, com a JCP em verde e trajetórias solares demarcadas por linhas pretas 3.3. Testes em laboratório e uso in loco Para a etapa de testes foram desenvolvidos dois tipos de experimentos: testes em laboratório com modelos físicos em escala reduzida e testes in loco com ambientes reais. Nos testes em laboratório foram empregados blocos de madeira de dimensões distintas representando edificações para a criação de diferentes cenários de configuração urbana. Os testes de uso in loco foram feitos em três condições diferentes: ambientes abertos, semi-abertos e internos. Para representação das imagens visualizadas, usou-se uma máquina digital (Sony Cybershot) com uma lente de pequenas dimensões para facilitar as fotografias através da lente olho mágico. Cabe aqui salientar que as fotografias são usadas para apresentar o que era visualizado, não sendo relevantes as eventuais interferências da sobreposição das lentes, pois o que interessa é verificar em que ponto das trajetórias ocorre o cruzamento das obstruções, permitindo identificar os horários de início e final da insolação e, no caso da 5

iluminação natural, verificar a razão da JCP obstruída. Foram encontradas pequenas distorções de ajuste de orientação, pois a indicação do Norte baseia-se numa bússola e pequenos erros de precisão por se tratar de um protótipo feito artesanalmente. Porém, ainda assim, o aparato cumpriu com sua função de análise preliminar rápida, com fácil manuseio e compreensão (ver Figura 9). Figura 9 Uso in loco do equipamento com auxílio de um tripé. 4. ANÁLISE DE RESULTADOS 4.1 Testes com cenários de modelos físicos em escala reduzida Foi criado um cenário físico com blocos de madeira simulando um ambiente urbano de forma a garantir maior precisão nas medidas e distâncias e facilitar a determinação manual das máscaras de obstrução em pavimentos diferentes. O cenário, apresentado na Figura 10, é composto por apenas três blocos; cada bloco representa uma edificação (um bloco de 5 pavimentos e dois de 10 pavimentos). Os pontos de análise foram definidos bem em frente do bloco intermediário com um afastamento de 30 m, com os blocos afastados entre si de 10 m. O aparato foi posicionado em 6 níveis distintos (térreo, 3º, 5º, 7º, 10º e cobertura), a uma altura de aproximadamente 1,5 m (representando o ponto central de uma abertura). Figura 10 Esquema de posicionamento do cenário Nas Figuras 11 (a, b, c, d, e, f) pode-se verificar a diferença na obstrução da abóbada à medida que se localize o ponto de visualização em diferentes pavimentos: 6

(a) visão do térreo (b) visão do 3º pav. (c) visão do 5º pav. (d) visão do 7º pav. (e) visão do 10º pav. (f) visão da cobertura Figura 11 (a, b, c, d, e, f) - Simulação com blocos físicos. Máscaras visualizadas através do equipamento em diferentes pavimentos. Após esses testes foram geradas máscaras do mesmo cenário, pelo método tradicional através do levantamento dos ângulos de visão e o desenho da máscara com um transferidor de ângulos de sombra de projeção eqüidistante, para serem comparadas às máscaras visualizadas através do equipamento. Uma grande diferença entre as duas formas de representações da visualização do entorno é o posicionamento do ângulo de visão, que pode dificultar a compreensão e comparação dos resultados. Nas máscaras convencionais o observador se posiciona no plano horizontal olhando para cima, para o zênite (ver Figura 12 (a) e (b)), enquanto que com o equipamento apresentado o entorno é visualizado exatamente a partir de onde o observador se encontra, neste caso, no plano vertical olhando na direção dos prédios (ver Figura 13 (a) e (b)). (a) (b) Figura 12 (a) Observador no plano horizontal voltado para o zênite e (b) sua respectiva máscara de obstrução. 7

(a) (b) Figura 13 (a) Observador no plano vertical voltado para o cenário e (b) sua máscara vista através do equipamento. 0 4.1 Testes de uso in loco Como mencionado anteriormente, os testes de uso in loco foram feitos em três condições distintas: i) ambiente aberto; ii) semi-aberto; iii) interno. 4.1.1. Ambiente aberto Neste caso, foi avaliado um espaço aberto disponível para a construção de um parquinho infantil num condomínio residencial (Fig. 14). Analisou-se as horas de insolação direta que o local receberia durante o dia, variando conforme estações do ano, para a latitude de Florianópolis (27 35' 48' Sul'). As trajetórias solares estão representadas pelas linhas pretas (linha inferior: solstício de inverno; linha média: equinócios; e a linha superior, próxima ao zênite: solstício de verão) e os números representam as horas solares. Figura 14 Posição do equipamento em planta Figura 15 Visão através do equipamento num ambiente externo (orientação Norte) Pode-se perceber, analisando a imagem obtida através do equipamento, que o local apresenta uma exposição com elevada quantidade de horas de sol durante o ano todo (ver Figura 15). No solstício de verão, a incidência direta de raios solares no ponto estudado começa a partir das 8h da manhã até as 16h30min aproximadamente. Já no solstício de inverno a incidência direta do sol só ocorre depois das 10h da manhã, por causa da obstrução do entorno, até as 16h. 8

4.1.2. Ambiente semi-aberto Neste caso, uma varanda de serviço de uma edificação em Florianópolis foi o objeto de estudo. A intenção de análise também eram as horas de insolação direta no ponto onde se encontra o varal para saber, por exemplo, qual seria o melhor horário para a secagem das roupas (Figuras 16 e 17). A disponibilidade de insolação resultou muito mais reduzida que no caso anterior, como se pode ver na Figura 18, no solstício de inverno, de 12:45h a 13:45h (+/- 1 hora), período no qual a vegetação do vizinho intercepta os raios de sol por aproximadamente 1 hora. Já no equinócio, a insolação se dará entre 12:00h e 14:30h, enquanto no solstício de verão, a duração da insolação acontece de 11:30h até 14:45h.. Figura 16 Posição do equipamento em planta Figura 17 Ambiente analisado Figura 18 Visão através do equipamento (orientação Nordeste) 4.1.3. Ambiente interno Para um ambiente interno (Fig. 19), além da verificação da incidência solar direta, a verificação do potencial da iluminação natural difusa da abóbada celeste, possibilitada pelo parâmetro da Janela do Céu Preferível, também mostra fundamental. Neste caso, como pode ser visto na Figura 20, somente as três parcelas da direita da JCP se encontram desobstruídas, representando 3/9 partes (aproximadamente 33%) que, de acordo com Leder et al (2009), está abaixo dos 40% necessários para garantir iluminação natural mínima para o ambiente interno. Figura 19 Posição do equipamento em planta Figura 20 Visão através do equipamento num ambiente interno no 3º pav. (orientação próxima a Sudoeste) 9

5. CONCLUSÕES Os resultados alcançados mostraram que o equipamento tem potencial para ajudar a prever as condições de disponibilidade de iluminação natural e insolação a partir da visualização da obstrução do entorno. Além disto, mostrou potencial também para ser de grande auxílio nas seguintes verificações: Prever o melhor posicionamento de aberturas e recuos para prédios a serem construídos; Prever as condições de iluminação natural e insolação de um imóvel na hora da compra e servir de apoio para a indicação de possíveis modificações na construção; Indicar o melhor posicionamento de placas solares (aquecimento de água ou fotovoltaicas) para que fiquem expostas a maior quantidade de irradiação possível. Prever a duração da insolação para um ponto desejado em qualquer estação do ano; Avaliar condições de sombreamento / insolação de áreas externas e facilitar a localização de parques infantis, hortas, piscinas, etc.; Prever melhor posicionamento de barreiras solares (brises, pergolados, vegetação, etc.) de modo a impedir insolação direta em horários e datas específicos; Servir como instrumento de ensino, por sua facilidade de uso e compreensão. Trata-se de um equipamento portátil, de fácil manuseio e transporte que possibilita uma análise visual rápida, no próprio local de estudo, Apesar de ser um protótipo experimental, a praticidade do modelo testado para avaliações preliminares e seu grande potencial tanto para aplicação profissional, como ferramenta de ensino, são satisfatoriamente verificados neste estudo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ASSIS, E. S. de: Bases para a Determinação dos Recuos e Volumetria dos Edifícios, considerando a Insolação e Iluminação Natural, na Revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo de Belo Horizonte, MG. Anais do III Encontro Nacional e I Encontro Latino-Americano de Conforto no Ambiente Construído, ANTAC, 1995, Porto Alegre, Brasil. ps. 511/51. DELTA-T: Hemiview User Manual, Delta-T Devices Ltd., Cambridge, UK, 79p. LEDER, S. M.: Ocupação urbana e luz natural: proposta de parâmetro de controle da obstrução do céu para garantia da disponibilidade de luz natural. Florianópolis, Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro Tecnológico. Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, 2007, 240 p. LEDER, S. M.; PEREIRA, F.O.R. & CLARO, A. Janela de céu preferível: proposição de um parâmetro para controle da disponibilidade de luz natural no meio urbano. Ambiente Construído (Online), v. 8, p. 89-104, 2008 LEDER, S. M.; PEREIRA, F. O. R. ; MORAES, Letícia N. ; Lenzi, Cecília C.. Padrões de Ocupação Urbana e Disponibilidade da Luz Natural. In: X Encontro Nacional e VI Latino-Americano de Conforto no Ambiente Construído, 2009, Natal. Anais do X ENCAC e VI ELACAC 2009. Natal, p. 1-10. LECHNER, N.: Heating, Cooling,Lighting: Sustainable Design Methods for Architects, John Wiley & Sons, New Jersey, Canadá, 2009, 697p. SJOBERG, G. Origem e evolução das cidades. In: Cidades, A Urbanização da humanidade, Zahar Editores, Rio de Janeiro/RJ 1982. AUCKLAND. Appendix 6: Bulk in relation to boundary (04/07/2003). Disponível em: <http://www.aucklandcity.govt.nz/council/documents/district/app6.pdf >. Acessado em: ago, 2009. MINISTÉRIO DAS CIDADES, Secretaria Nacional de Transportes e Mobilidade. Política Nacional de Mobilidade Sustentável (2004). Disponível em: < http://www.cidades.gov.br/>. Acessado em: mai 2007. THE SOLAR DESIGN COMPANY. A sun-path indicator for solar engineers. Disponível em: <http://www.solardesign.co.uk/pw-solar.php>. Acesso em: ago. 2009. LABCON/ARQ Laboratório De Conforto Ambiental. Equipamentos desenvolvidos: Solarscópio. Disponível em: <http://www.labcon.ufsc.br/equip_desenv_solarscopio.php>. Acesso em: agosto 2009. SCHILER, M. (Eds.), Simulating Daylight with Architectural Models. Daylighting Network of North America/University of Southern California, Los Angeles, USA, 1987. THANACHAREONKIT, A; ANDERSEN, M; SCARTEZZINI, J-L., Comparing daylighting performances assessment of buildings within scale models and test modules. Journal Solar Energy, v. 79, p. 107-220, 2005. 10