VAZÕES CRÍTICAS PARA ESTUDOS AMBIENTAIS EM CORPOS D ÁGUA: A Q 7,10 NA LEGISLAÇÃO E A INFLUÊNCIA DO TEMPO DE RETORNO E DO PERÍODO DE DURAÇÃO DA MÍNIMA

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RESUMO. PALAVRAS-CHAVE: Disposição controlada no solo, nutrientes, capacidade de adsorção. 1.0 INTRODUÇÃO

Transcrição:

VAZÕES CRÍTICAS PARA ESTUDOS AMBIENTAIS EM CORPOS D ÁGUA: A Q 7,10 NA LEGISLAÇÃO E A INFLUÊNCIA DO TEMPO DE RETORNO E DO PERÍODO DE DURAÇÃO DA MÍNIMA Cristiane Peixoto Vieira (1) Engenheira Civil - Especialista em Hidráulica de Barragens pela UFOP e em Hidrologia Geral e Aplicada (CEDEX-Madri-Espanha) - Mestranda em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG. Maria Helena Domingues Ramos Engenheira Civil - Mestranda em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG. Marcos von Sperling Engenheiro civil. Doutor em Engenharia Ambiental pelo Imperial College, Universidade de Londres. Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG. Consultor na área de tratamento de esgotos e controle da poluição das águas. Endereço (1) : Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental - UFMG - Av. Contorno, 842-7 o andar - Centro - Belo Horizonte - MG - CEP: 30110-060 - Tel: (031) 238-1884 - Fax: (031) 238-1879 - e-mail: sperling@africanet.com.br. RESUMO A resolução CONAMA n o 20 de 1986 indica a utilização da vazão crítica Q7,10 para a modelagem da qualidade das águas de corpos receptores. Este trabalho estuda a influência do tempo de retorno e do período de duração da vazão mínima, bem como o impacto da variação destas características na concentração máxima da DBO no despejo, visando atender o padrão do corpo receptor. Os resultados alcançados indicam que o tempo de retorno é o fator que exerce maior influência na vazão crítica, enquanto que a influência da duração da mínima é pequena. A utilização de um tempo de retorno menos restritivo que os 10 anos atualmente indicados pela legislação facilita com que possam ser adotados sistemas de tratamento mais simplificados e econômicos, como reatores UASB e lagoas de estabilização. PALAVRAS-CHAVE: Vazão Crítica, Q 7,10, Estudos Ambientais, Legislação, Qualidade da Água. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 2092

INTRODUÇÃO E OBJETIVOS A Resolução CONAMA n o 20, de 1986, principal legislação vigente no Brasil na área do controle da poluição hídrica, além de estabelecer padrões de qualidade das águas de corpos receptores, também apresenta os padrões para o lançamento de efluentes líquidos. Estando estes padrões interrelacionados, um efluente, além de satisfazer os padrões de lançamento, deve garantir o enquadramento do corpo receptor dentro de seus padrões de qualidade. No que se refere à condição crítica de vazão a ser considerada na modelagem do corpo receptor, o artigo 13 da referida Resolução indica a utilização do valor Q 7,10 (vazão mínima média de 7 dias de duração e 10 anos de tempo de retorno). Dessa forma, a Q7,10 tem sido a vazão utilizada nas simulações do oxigênio dissolvido e da DBO em corpos d água. Acreditase, no entanto, que este tempo de retorno seja bastante restritivo para as condições brasileiras, onde a falta de recursos, na maioria das vezes, conduz ao não atendimento aos padrões em um grande número de corpos d água (von Sperling, 1996). A vazão Q 7,10 é também freqüentemente utilizada nos Estados Unidos para estudos de qualidade da água em rios (Singh e Stall, 1974; ASCE, 1980). Entretanto, vazões mínimas associadas a outros intervalos de recorrência e outros períodos consecutivos de dias de recessão podem também ser utilizadas para este e outros fins (Riggs, 1972; ASCE, 1980; Arceivala, 1981). Dentro deste quadro, este trabalho tem como objetivos investigar a influência do tempo de retorno e do período de duração da mínima na determinação da vazão crítica e o impacto de diferentes valores de vazão crítica na concentração máxima de DBO no despejo, de forma a permitir o atendimento ao padrão do corpo receptor. DETERMINAÇÃO DAS VAZÕES CRÍTICAS Para a definição das situações críticas de vazão a serem utilizadas no estudo proposto, foi feita uma análise dos registros de vazões diárias de 4 estações hidrométricas localizadas em rios de grande porte no centro-sul do estado de Minas Gerais. Portanto, estas estações representam uma dada região do estado, com características hidrológicas distintas de outras regiões que não foram abordadas neste estudo. A escolha dos dados para um estudo de vazões mínimas deve considerar a sua qualidade e quantidade. As estações selecionadas para este trabalho encontravam-se disponíveis com dados diários de vazões consistidos e períodos de registro maiores que 20 anos de observações. A Tabela1 resume algumas características destas estações, fornecidas pela CEMIG. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 2093

Tabela 1 - Características das estações hidrométricas utilizadas. Estação Capim Branco Porto Andorinhas Porto Pará Santa Juliana Curso d água Rio Araguari Rio São Francisco Rio Pará Rio Araguari Lat. Long. Área de Drenagem Período de Registros Número de anos utilizados 18 0 4 48 0 16 18.700 km 2 1969-1994 23 19 0 18 4 0 17 13.300 km 2 197-1994 36 19 0 18 4 0 0 11.300 km 2 1939-1994 46 19 0 23 47 0 38 3.970 km 2 1964-1993 26 Na região Sudeste do Brasil e, particularmente, no estado de Minas Gerais, o período de estiagem, em geral, tem início no mês de maio e estende-se até os meses de setembro/outubro. Dessa forma, a utilização do ano hidrológico (outubro a setembro) para a seleção das vazões mínimas anuais, conforme observa-se nos estudos de vazões máximas, poderia ocasionar a separação do período de estiagem em partes incompletas. Portanto, para a obtenção dos dados deste estudo, foi adotado o ano civil (janeiro a dezembro), tendo em vista que este abrange um período de estiagem completo. A partir das séries históricas foram obtidas as vazões mínimas anuais através da determinação da média móvel de cada ano, considerando períodos consecutivos de 1, 7, 10 e 1 dias de duração. De posse dos valores das vazões mínimas, foi feita uma análise de freqüência das vazões para cada caso. A curva de freqüência pode ser definida graficamente ou matematicamente através do ajuste de uma distribuição teórica aos dados. Na prática, várias são as distribuições teóricas utilizadas para descrever a freqüência de vazões mínimas. Tucci (1981), por exemplo, cita estudos onde foram aplicadas distribuições como as de Gumbel, Log-normal, Gama, Normal, Weibull, Log-Pearson Tipo III, entre outras, a rios americanos e rios no estado de São Paulo. No presente estudo, foram aplicadas as distribuições Normal, Log-normal e Weibull. Através da plotagem dos dados foi possível avaliar o ajuste gráfico destas distribuições teóricas, conforme técnicas apresentadas em Steginger et al (1992), nas quais se baseiam os papéis de probabilidade. A distribuição de Weibull foi a que melhor se ajustou aos dados. A curva de freqüência permite relacionar as vazões e os respectivos tempos de retorno. O inverso deste tempo de retorno representa a probabilidade de que ocorram valores menores que a vazão correspondente na curva de freqüência. Para este trabalho, foram escolhidos os valores de 2, 3, e 10 anos de recorrência, visando estudar alternativas menos restritivas que os 10 anos atualmente utilizados no cálculo da vazão crítica Q 7,10. Os resultados obtidos para cada estação estudada encontram-se na Tabela 2, em termos de vazões específicas, ao passo que a Figura 1 permite visualizar o comportamento das variáveis envolvidas. A Tabela 3 apresenta a variação relativa das descargas específicas, referenciadas a um valor unitário para a Q 7,10. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 2094

Tabela 2 - Vazões específicas médias mínimas anuais (l/s.km 2 ) obtidas para diferentes tempos de retorno e duração da mínima. TR (anos) 1 dia 7 dias 10 dias 1 dias TR (anos) 1 dia 7 dias 10 dias 1 dias Capim Branco Porto Pará 2 7,18 7,43 7,8 7,89 2 4,39 4,71 4,78 4,91 3 6,18 6,43 6,8 6,87 3 3,73 4,00 4,0 4,1,24,48,63,90 3,12 3,33 3,37 3,4 10 4,2 4,48 4,62 4,87 10 2,49 2,6 2,67 2,73 Porto Andorinhas Santa Juliana 2 4,44 4,7 4,6 4,81 2 7,63 8,37 8,62 8,9 3 3,7 3,87 3,94 4,0 3 6,6 7,29 7,2 7,8 3,12 3,22 3,27 3,34, 6,2 6,47 6,78 10 2,47 2, 2,9 2,63 10 4,0,1,3,64 Vazão Espec. (l/s.km2) Estação Capim Branco 8 7 6 Tr = 2 anos Tr = 3 anos Tr = anos Tr = 10 anos 4 3 1 7 10 1 Duração (dias) Vazão Espec. (l/s.km2) 4 3 Estação Porto Andorinhas 2 1 7 10 1 Duração (dias) Tr = 2 anos Tr = 3 anos Tr = anos Tr = 10 anos Estação Porto Pará Estação Santa Juliana Vazão Espec. (l/s.km2) 4 3 2 1 7 10 1 Duração (dias) Tr = 2 anos Tr = 3 anos Tr = anos Tr = 10 anos Vazão Espec. (l/s.km2) 9 8 7 6 Tr = 2 anos Tr = 3 anos Tr = anos Tr = 10 anos 4 1 7 10 1 Duração (dias) Figura 1 - Vazões específicas mínimas em função do tempo de retorno e da duração da mínima. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 209

Tabela 3- Variação relativa das descargas específicas referenciadas à Q7,10 para diferentes tempos de retorno e duração da mínima. TR (anos) 1 dia 7 dias 10 dias 1 dias TR (anos) 1 dia 7 dias 10 dias 1 dias Capim Branco Porto Pará 2 1,6 1,7 1,7 1,8 2 1,7 1,8 1,8 1,9 3 1,4 1,4 1, 1, 3 1,4 1, 1, 1,6 1,2 1,2 1,3 1,3 1,2 1,3 1,3 1,3 10 1,0 1,0 1,0 1,1 10 0,9 1,0 1,0 1,0 Porto Andorinhas Santa Juliana 2 1,7 1,8 1,8 1,9 2 1, 1,6 1,7 1,7 3 1, 1, 1, 1,6 3 1,3 1,4 1, 1, 1,2 1,3 1,3 1,3 1,1 1,2 1,3 1,3 10 1,0 1,0 1,0 1,0 10 0,9 1,0 1,0 1,1 Uma análise dos valores da Tabela 2 e dos gráficos da Figura1 permite concluir que a variação dos valores de vazões mínimas sofre uma maior influência do tempo de retorno. A pequena influência da duração da mínima reflete a pequena variação das vazões no período de estiagem. Este fato pode ser geralmente observado nos rios da região em estudo. Os resultados da Tabela 3 conduzem às mesmas conclusões. Nestas quatro estações fluviométricas analisadas, a vazão mínima pode ser até 1,9 vezes superior à Q 7,10 (ex: Q 1,2 em Porto Andorinhas e Porto Pará). INFLUÊNCIA DA VAZÃO MÍNIMA SOBRE A DBO Para a realização de uma análise simplificada dos diferentes valores de vazão crítica na assimilação de esgotos domésticos foi escolhido o parâmetro DBO. Esta escolha deve-se à sua inconteste importância e ao fato deste parâmetro ser de fácil modelagem e apresentar concentração máxima no ponto de lançamento. A simulação do oxigênio dissolvido não foi incluída no presente trabalho por ser mais complexa, necessitando de diversos dados do curso d água, o que foge ao escopo do trabalho. O valor da DBO resultante da mistura do esgoto com o rio pode ser calculado sendo conhecidas as características do esgoto a ser lançado e as do curso d'água: DBO mistura DBO * Q DBO * Q esgoto esgoto rio rio Q esgoto Q rio (1) A situação analisada assume que o rio pertence à classe 2 e encontra-se totalmente limpo a montante do lançamento (DBO rio = 0 mg/l). Conforme os padrões de qualidade para a classe 2, segundo a Resolução CONAMA n o 20, 18/06/86, tem-se para o parâmetro DBO o padrão de mg/l (DBO mistura = mg/l). O padrão de lançamento para a DBO, segundo a legislação do estado de Minas Gerais (COPAM, 1986), é de 60 mg/l (DBOesgoto = 60 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 2096

mg/l). Considerou-se o atendimento simultâneo do padrão do corpo receptor (DBOmistura = mg/l) e do padrão de lançamento (DBO esgoto = 60 mg/l) como ocorrendo apenas em condições de Q 7,10. O rearranjo da Equação 1, tendo como incógnita a DBO do esgoto, é apresentado na Equação 2 para a DBO mistura = mg/l e DBO rio = 0mg/l. Nesta equação, Q rio é expresso como Q d,t, ou seja, a vazão correspondente à duração d e ao tempo de retorno t. Os valores de Q d,t podem ser obtidos através das descargas específicas apresentadas na Tabela 2 e das áreas de drenagem apresentadas na Tabela 1. DBO onde, esgoto Qesgoto Qd t *, Q esgoto (2) Q esgoto DBOmistura DBOrio * Qrio ( 0) * Q ( 60 ) DBOesgoto DBOmistura 7, 10. Q 7, 10 A Tabela 4 apresenta os resultados de DBO do esgoto obtidos (valores máximos permissíveis para o efluente), de forma a permitir o atendimento do padrão de DBO do corpo receptor ( mg/l). Tabela 4 - Concentração máxima de DBO esgoto (mg/l) para atendimento ao padrão do corpo receptor (DBO = mg/l) para diferentes tempo de retorno e duração da mínima. TR (anos) 1 dia 7 dias 10 dias 1 dias TR (anos) 1 dia 7 dias 10 dias 1 dias Capim Branco Porto Pará 2 93 96 98 102 2 96 103 104 107 3 81 84 86 89 3 82 88 89 91 69 72 74 77 70 74 7 76 10 7 60 62 6 10 7 60 60 62 Porto Andorinhas Santa Juliana 2 101 104 10 109 2 87 94 97 101 3 86 88 90 92 3 7 83 8 89 72 74 7 77 64 72 74 77 10 8 60 61 62 10 3 60 62 6 Em todas as estações, o valor de 60 mg/l corresponde a um lançamento em um curso d água em condições de Q 7,10. A interpretação da Tabela 4 permite a inferência de importantes pontos. Da mesma forma que com a vazão crítica, a influência do tempo de retorno na concentração máxima permissível de DBO no efluente é marcante. Caso se considere um tempo de retorno inferior a 10 anos (ex: 2 anos - Q 7,2 ), o valor máximo no efluente pode ser aumentado consideravelmente, ainda assim permitindo o atendimento ao padrão de DBO no corpo receptor ( mg/l). Nestas condições, segundo a Tabela 4, os valores de DBO do efluente 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 2097

variam entre 94, 96, 103 e 104 mg/l nas quatro estações. A implicação de tal fato é que sistemas de tratamento que situam-se em um limiar de não atendimento aos padrões de lançamento de 60 mg/l, como reatores UASB e lagoas de estabilização, passam a satisfazer às condições menos exigentes de concentrações efluentes entre 94 e 104 mg/l. Analisando um outro aspecto, para este mesmo tempo de retorno de 2 anos e utilizando-se a duração de 1 dia (Q 1,2 ), estes valores apresentam pouca variação, uma vez que a influência da duração da mínima é pequena. No entanto, as vazões mínimas de 1 dia de duração podem ser obtidas dos registros fluviométricos disponíveis de forma mais simples e imediata, o que pode se tornar uma vantagem adicional, no sentido da simplificação dos cálculos, dispensando a determinação das médias móveis da série histórica de vazões. Considerando-se a realidade de nosso país, com a grande dificuldade no atendimento aos padrões, poderia ser considerado como um incentivo adicional à implantação de sistemas mais simplificados, econômicos e viáveis, caso o tempo de retorno admitido nos estudos ambientais da legislação fosse inferior a 10 anos, possivelmente 2 anos. Em um país em que grande parte dos cursos d água já está há décadas fora dos padrões devido à inexistência de tratamento de esgotos, a possibilidade de se ter um eventual descumprimento do padrão a cada dois anos não parece uma situação de grande preocupação. Quando, no futuro, a nossa situação ambiental melhorar, pode-se considerar a adoção de tempos de retorno superiores. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES Tendo em vista as análises efetuadas e os resultados obtidos, pode-se concluir que: o tempo de retorno é o fator que exerce maior influência na variação das vazões médias mínimas anuais de 1, 7, 10 e 1 dias de duração; o tempo de duração da mínima resulta em uma influência bastante pequena na vazão crítica; a adoção de 1 dia de duração da mínima facilita a obtenção da vazão crítica; a adoção de um tempo de retorno menos restritivo que os 10 anos da Q 7,10 permitiriam a aceitação de valores de DBO efluentes superiores a 60 mg/l, viabilizando a adoção de sistemas de tratamento mais simplificados e econômicos, como reatores UASB e lagoas de estabilização. Deve-se ressaltar que as presentes conclusões foram embasadas na análise de apenas quatro estações hidrométricas, situadas em cursos d água aproximadamente homogêneos no Estado de Minas Gerais. De forma a ampliar a abrangência das conclusões, é importante a realização de estudos similares em cursos d água situados em regiões distintas e melhor distribuídas geograficamente no território nacional. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 2098

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