Os Pacificadores Filhos de Deus (Mt 5.9) 1



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Transcrição:

Os Pacificadores Filhos de Deus (Mt 5.9) 1 O que os homens chamam de paz nunca é mais que um entreguerras. O equilíbrio precário de que ela é feita dura enquanto o medo mútuo impede que as dissensões se declarem. Paródia da paz verdadeira, esse medo armado, que é supérfluo descrever aos homens do nosso tempo, pode manter certa ordem, mas não basta para proporcionar tranquilidade aos homens. Para que reine a tranquilidade, é preciso que a ordem social seja a expressão espontânea de uma paz interior no coração dos homens Étienne Gilson, O Espírito da Filosofia Medieval, São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 490. O primeiro e mais importante aspecto desta paz com Deus não é a paz do nosso coração, mas o fato de que Deus está em paz conosco Francis A. S- chaeffer, A Obra Consumada de Cristo: A verdade de Romanos 1-8, São Paulo: Cultura Cristã, 2003, p. 123. INTRODUÇÃO: Na quinta-feira de 18 de abril de 1521, Lutero (1483-1546) na Dieta de Worms, diante do Imperador, dos príncipes e de clérigos é interrogado sobre a sua fé que tanto reboliço estaria causando à igreja romana, especialmente na Alemanha. Era um momento crítico; a pressão era para que Lutero se retratasse quanto à sua fé. Ele argumenta em tons respeitosos e com firmeza. A certa altura, na conclusão de sua breve exposição, declara:... estou vencido pelas Escrituras por mim aduzidas e minha consciência está presa nas palavras de Deus não posso nem quero retratar-me de nada, porque agir contra a consciência não é prudente nem íntegro. 2 Lutero, confiante na autoridade suficiente das Escrituras declara que a sua mente é totalmente cativa da Palavra de Deus e, por isso, não pode nem sequer cogitar de pensar de forma contrária. Aqui a Reforma estava de fato deflagrada. Não havia mais volta. A aparente paz 1 Estudo ministrado na Escola Dominical da Igreja Presbiteriana em São Bernardo do Campo, SP., no dia 20 de junho de 2010 e com adequações necessárias no dia 27 de março de 2011. 2 Martinho Lutero, Discurso do Dr. Martinho Lutero Perante o Imperador Carlos e os Príncipes na Assembléia de Worms Quinta-feira depois de Misericordias Domini. In: Martinho Lutero: Obras Selecionadas, São Leopoldo/Porto Alegre, RS.: Sinodal/Concórdia, 1996, Vol. 6, p. 126.

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 2/14 religiosa na Europa terminara definitivamente. Estaria Lutero correto? Não seria melhor manter a paz, retratando-se do que afirmara? Vamos ao estudo. 1. A ORIGEM DA PAZ: A origem de nossa paz está em Deus; por isso, é totalmente inútil procurar a paz fora dele. Paulo escreve aos romanos: E o Deus da paz (ei)rh/nh) seja com todos vós (Rm 15.33) (Também: Rm 16.20; 1Co 14.33; 2Ts 3.16; Hb 13.20). 3 Barclay, resume bem: Em última análise, a paz não é algo que o homem alcança é algo que ele aceita. 4 A paz é de Deus porque dele procede e, também, porque o modelo da paz temos em Deus, Aquele que não vive em ansiedade. 5 2. O FUNDAMENTO DE NOSSA PAZ: A. A Graça de Deus em Cristo: Nas saudações iniciais de Paulo em suas epístolas, encontramos a relação entre graça e paz. Ele diz: Graça a vós outros e paz (ei)rh/nh), da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo (1Co 1.3). Paulo toma essas duas palavras Graça (xa/rij) (= saúde), que era a saudação dos gregos e, Paz, saudação dos judeus, conferindo um sentido teológico: a paz é resultado da graça de Deus. Notemos que nas saudações de Paulo, ele nunca inverte esta ordem: a paz com Deus é resultado de Sua própria graça. Devemos observar, contudo, que a paz aqui, deve ser entendida como o equivalente hebraico, {Olf$ (shãlôm), prosperidade espiritual. 6 A paz como resultado da graça pressupõe um estado anterior de inimizade. 3 E o Deus da paz (ei)rh/nh), em breve, esmagará debaixo dos vossos pés a Satanás... (Rm 16.20). Porque Deus não é de confusão, e sim de paz (ei)rh/nh) (1Co 14.33). Ora, o Senhor da paz (ei)rh/nh), ele mesmo, vos dê continuamente a paz (ei)rh/nh) em todas as circunstâncias. O Senhor seja com todos vós (2Ts 3.16). Ora, o Deus da paz (ei)rh/nh)... (Hb 13.20). 4 William Barclay, As Obras da Carne e o Fruto do Espírito, São Paulo: Vida Nova, 1985, p. 85. 5 Vejam-se:. F.F. Bruce, Filipenses, Florida: Editora Vida, 1992, (Fp 4.7), p. 154. 6 Shãlôm, que ocorre certa de 250 vezes no Antigo Testamento, tem o sentido de: inteireza, integridade, harmonia e realização. Na forma de saudação, podemos observar que, desejar shãlôm é o mesmo que abençoar (2Sm 15.27); retê-lo, equivale a amaldiçoar (1Rs 2.6). Shalõm realmente significa tudo quando contribui para o bem do homem, tudo que faz com que a vida seja verdadeiramente vida (William Barclay, As Obras da Carne e o Fruto do Espírito, São Paulo: Vida Nova, 1985, p. 82-83). No entanto, o principal sentido da palavra está relacionado à atividade de Deus na aliança da graça: Em quase dois terços de suas ocorrências, shãlôm descreve o estado de plenitude e realização, que é resultado da presença de Deus (Garry G. Lloyd, Shãlêm: In: R. Laird Harris, et. al., eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 1573). A origem desta paz está em Deus mesmo.

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 3/14 O pecado nos colocou num estado de inimizade, hostilidade e ódio para com Deus: estávamos separados de Deus (Is 59.2). 7 O homem encontrava-se num estado de rebelião contra Deus (Is 65.2). 8 Portanto, a graça que nos vem por Cristo Jesus propiciou de forma eficaz a nossa reconciliação com Deus conduzindo-nos à paz. Agora, reconciliados com Deus, vivemos paz, confiando inteiramente em Sua promessa. A paz da reconciliação conduz-nos à paz interior e, em todas as nossas relações: 9 A graça de Deus, portanto, sempre antecede a paz. Fomos reconciliados com Deus por Sua graça. Somos agraciados com a paz. B. Mediante a Obra de Cristo: A graça de Deus concretiza-se em Cristo, por meio de Seu sacrifício vicário. Paulo diz que Ele é a nossa paz: Em Cristo Jesus, vós [gentios], que antes estáveis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo. Porque ele é a nossa paz (ei)rh/nh), o qual de ambos fez um; e, tendo derribado a parede da separação que estava no meio, a inimizade, aboliu, na sua carne, a lei dos mandamentos na forma de ordenanças, para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem, fazendo a paz (ei)rh/nh), e reconciliasse ambos em um só corpo com Deus, por intermédio da cruz, destruindo por ela a inimizade. E, vindo, evangelizou paz (ei)rh/nh) a vós outros que estáveis longe [gentios] e paz (ei)rh/nh) também aos que estavam perto [judeus]; porque, por ele, ambos temos acesso ao Pai em um Espírito (Ef 2.13-18). (Ver: Cl 1.20-22). 10 Paulo nos ensina que em Cristo passamos a ter paz com Deus e também com o nosso próximo. Dentro do propósito imediato de Paulo, ele demonstra que os gentios, distantes das promessas de Israel, e os judeus agora têm acesso livre a Deus em Cristo, pelo mesmo e único Espírito. Notemos que em tudo isso a iniciativa é de Deus. O Deus Triúno deseja a paz e providencia os meios para isso: Tudo provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo (...). Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo... (2Co 5.18,19). A cruz trouxe a paz, embora não houvesse paz na cruz. Foi uma cena caótica, mas a cruz proporcionou a justiça que, por si só, traz a paz verdadeira. 11 7... as vossas iniqüidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o seu rosto de vós, para que vos não ouça (Is 59.2). 8 Estendi as mãos todo dia a um povo rebelde, que anda por caminho que não é bom, seguindo os seus próprios pensamentos (Is 65.2). 9 Veja-se: D.M. Lloyd-Jones, O Supremo Propósito de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1996, p. 40. 10 20 E que, havendo feito a paz (* ei)rhnopoie/w) pelo sangue da sua cruz, por meio dele, reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus. 21 E a vós outros também que, outrora, éreis estranhos e inimigos no entendimento pelas vossas obras malignas, 22 agora, porém, vos reconciliou no corpo da sua carne, mediante a sua morte, para apresentar-vos perante ele santos, inculpáveis e irrepreensíveis (Cl 1.20-22). (* Este verbo só ocorre aqui). 11 John MacArthur Jr., O Caminho da Felicidade, São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 157.

C. Propiciação: 1) PELO EVANGELHO: Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 4/14 A paz proveniente de Deus, revelada na obra de Cristo, chega a nós pelo Evangelho. Pedro anunciando o Evangelho na casa de Cornélio, diz: Esta é a palavra que Deus enviou aos filhos de Israel, anunciando-lhes o evangelho da paz (ei)rh/nh), por meio de Jesus Cristo. Este é o Senhor de todos (At 10.36). O Evangelho é uma mensagem de paz: Calçai os pés com a preparação do e- vangelho da paz (ei)rh/nh) (Ef 6.15). Os homens, por estarem em guerra contra Deus, são conclamados a se arrependerem e crerem no Evangelho encontrando a verdadeira paz oferecida por Deus. 2) PELA JUSTIFICAÇÃO: Deus pela justiça de Cristo nos declara justos e, por meio deste ato, temos paz com Deus: Justificados, pois, mediante a fé, temos paz (ei)rh/nh) com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo (Rm 5.1). Os homens, pois, só serão bemaventurados depois que forem gratuitamente reconciliados com Deus e reputados por ele como justos. 12 3. A NATUREZA DA PAZ: A. É Diferente: Jesus Cristo nos preparativos para se despedir de Seus discípulos, os consola: Deixo-vos a paz (ei)rh/nh), a minha paz (ei)rh/nh) vos dou; não vo-la dou como a dá o mundo (Jo 14.27). À frente, acrescenta: Estas coisas vos tenho dito para que tenhais paz (ei)rh/nh) em mim. No mundo, passais por aflições; mas tende bom ânimo; eu venci o mundo (Jo 16.33). Paulo em sua oração em favor dos tessalonicenses demonstra de forma prática a experiência desse ensinamento: Ora, o Senhor da paz (ei)rh/nh), ele mesmo, vos dê continuamente a paz (ei)rh/nh) em todas as circunstâncias. O Senhor seja com todos vós (2Ts 3.16). Do mesmo modo, Judas roga a Deus que multiplique a Sua paz sobre a Igreja: A misericórdia, a paz (ei)rh/nh) e o amor vos sejam multiplicados (Jd 2). A paz é resultante de nossa comunhão com Deus, implicando a nossa total confiança na Sua promessa: Não há nenhuma paz genuína que seja desfrutada neste mundo senão na atitude repousante nas promessas de Deus. Os que 12 João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, Vol. 1, (Sl 32.1), p. 39.

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 5/14 não lançam mão delas podem ser bem sucedidos por algum tempo em a- bafar ou expulsar os terrores da consciência, mas sempre deixarão de desfrutar do genuíno conforto íntimo. 13 A paz de Deus independe das circunstâncias. Ela é conferida por Deus e é subjetivada em nós pela confiança na justiça e cuidado de Deus. B. Excede ao nosso entendimento: A paz de Deus não pode ser explicada com argumentos; ela está além de nossa capacidade de planejamento vejam-se os esforços ainda que notáveis, mas, fracassados de paz no Oriente e compreensão. Daí, Paulo falar à igreja que passava por perseguição e, ao mesmo tempo, enfrentava dissensões internas: E a paz (ei)rh/nh) de Deus, que excede todo o entendimento, guardará o vosso coração e a vossa mente em Cristo Jesus (Fp 4.7). Ilustremos isso com a experiência de Davi: O Salmo 4 foi provavelmente redigido quando Davi fugia da perseguição de Absalão. Ele é do entardecer, quando há a o- casião, muitas vezes involuntária, de rememorar e remoer as angústias e o mal que nos fizeram. No entanto, Davi, se vale deste período para sossegar confiantemente em Deus e transmitir confiança aos seus amigos abalados em sua fé devido às vicissitudes que os cercavam. Temos aqui um brado de fé e estímulo à confiança em Deus nas aflições. Surpreendentemente, Davi fala do seu descanso porque confia no cuidado de Deus. Somente Deus pode nos conceder esta paz: Em paz me deito e logo pego no sono, porque, SENHOR, só tu me fazes repousar seguro (Sl 4.8). De fato, a paz concedida por Deus excede a todo o entendimento visto que, mesmo ela tendo elementos de racionalidade resultantes de nosso conhecimento de Deus, ultrapassa em muito a nossa lógica; a nossa natural de estruturar o nosso pensamento. A paz de Deus é uma característica do Reino de Deus. Portanto, vivenciá-la significa antegozar o Reino: O reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz (ei)rh/nh), e alegria no Espírito Santo (Rm 14.17). Isto se torna possível pelo Espírito, já que Ele mesmo produz esse fruto em nós: O fruto do Espírito é: amor, alegria, paz (ei)rh/nh), longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio (Gl 5.22-23). 13 João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, Vol. 2, (Sl 51.8-9), p. 436. Em outro lugar: Não há outro método de aliviar nossas almas da ansiedade, senão repousando sobre a providência do Senhor (...). Nossos desejos e petições devem ser oferecidos com a devida confiança em sua providência, pois quem há que ore com clamor de espírito e que, com inusitada ansiedade e vencido pela inquietação, parece resolvido a ditar termos ao Onipotente? Em oposição a isso, Davi a recomenda como sendo a devida parte da modéstia em nossas súplicas para que transfiramos para Deus o cuidado daquelas coisas que pedimos, e não pode haver dúvida de que o único meio de refrear nossa excessiva impaciência é mediante a absoluta submissão à divina vontade quanto às bênçãos que queremos nos sejam concedidas (João Calvino, O Livro dos Salmos, Vol. 2, (Sl 55.22), p. 488-489).

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 6/14 Muitas de nossas angústias resultantes de pequenas coisas e algumas incertezas, são resultado da nossa falta de confiança em Deus e do Seu cuidado. Um dos pontos distintivos do Cristianismo é a certeza de que Deus não nos deixa à mercê de nossa sorte, antes, que Ele cuida pessoalmente de nós, nos amparando, disciplinando, consolando, estimulando e fortalecendo. O Deus Todo-Poderoso cuida de nós. Jesus Cristo nos instrui e consola: 29 Não se vendem dois pardais por um asse? E nenhum deles cairá em terra sem o consentimento de vosso Pai. 30 E, quanto a vós outros, até os cabelos todos da cabeça estão contados. 31 Não temais, pois! Bem mais valeis vós do que muitos pardais (Mt 10.29-31/Mt 6.25-34). 14 A oração é um antídoto 15 contra a ansiedade 16 que tenta nos dominar diante dos problemas próprios de nossa existência. Não podemos combater a ansiedade apenas argumentando contra ela. A oração sincera e submissa é o caminho para a paz em nossa mente e coração. Paulo instrui os filipenses: 6 Não andeis ansiosos de coisa alguma; em tudo, porém, sejam conhecidas, diante de Deus, as vossas petições, pela oração e pela súplica, com ações de graças. 7 E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará o vosso coração e a vossa mente em Cristo Jesus (Fp 4.6-7). Quando confiamos em Deus e depositamos sobre Ele as nossas angústias, podemos usufruir da Sua paz que guarda a nossa mente e o nosso coração. A paz de Deus não significa, necessariamente, o escape do problema, ou um estado ideal de imperturbabilidade como queriam os gregos, 17 mas, a paz em meio à dificuldade resultante da nossa confiança em Deus. 4. VIVENDO EM PAZ NA BENDITA ESPERANÇA: Pedro partindo da certeza dos acontecimentos finais, culminando com o regresso triunfante de Cristo, extrai do fato algumas responsabilidades da Igreja. A certeza é clara: Esperando (prosdoka/w) e apressando (speu/dw) a vinda do dia de Deus, por causa do qual os céus incendiados serão desfeitos e os elementos abrasados se derreterão (2Pe 3.12). O verbo esperar (prosdoka/w) tem o sentido de olhar com expectação, antever alguém ou algo. Pedro emprega a mesma palavra nos versos 12,13 e 14. 14 Bridges desenvolve bem as implicações desta compreensão. Veja-se: Jerry Bridges, A Vida Frutífera, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 75-77. 15 Calvino comentando Rm 12.12, enfatiza que a diligência na oração é o melhor antídoto contra o risco de soçobrarmos (João Calvino, Exposição de Romanos, São Paulo: Paracletos, 1997, (Rm 12.12), p. 438). Da mesma forma, Bridges: O grande antídoto para ansiedade é a- proximar-se de Deus em oração (Jerry Bridges, A Vida Frutífera, p. 76). 16 A oração é o nosso principal meio de combater a ansiedade (John MacArthur Jr., Abaixo a Ansiedade, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2001, p. 31). Este [a oração] é o único remédio que pode aplacar nossos temores, a saber, lançar sobre Ele todas as preocupações que nos atribulam (João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, Vol. 1, (Sl 3.1-2), p. 82). 17 Veja-se: W. Foerster, Ei)rh/nh: In: G. Kittel; G. Friedrich, eds. Theological Dictionary of the New Testament, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1982 (Reprinted), Vol. II, p. 400-402.

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 7/14 A palavra traduzida por apressar (speu/dw), 18 indica um desejo intenso pelo que virá, envolvendo a ideia de diligenciar com zelo, solicitude, urgenciar, etc. Ela revela uma pressa prazerosa daquilo que terá de ocorrer. 19 Não significa também, uma simples pressa para que aconteça de uma vez aquilo que terá de acontecer, como por exemplo, no caso de alguém que diz: Já que tenho de ser operado mesmo, vou logo ; ou, se tenho que ir mesmo, vou de uma vez.... A ideia aqui é totalmente diferente; denota uma urgência prazerosa de que Cristo venha. A Igreja mesmo sem poder alterar o dia da Vinda de Jesus e devemos dar graças a Deus por isso, faz parte do cronograma relativo ao regresso glorioso e triunfante de Cristo. Somos intimados a levar adiante os eventos que devem ocorrer antes do dia de Deus. A questão é: Como a Igreja, dirigida pelo Espírito, pode manifestar este desejo expectante pelo Advento de Cristo? A Palavra de Deus nos fornece a resposta. Neste texto queremos apenas analisar um destes aspectos: Pedro exorta: Por essa razão, pois, amados, esperando estas coisas, empenhaivos (spoud/a/zw) por serdes achados por ele em paz (ei)rh/nh)... (2Pe 3.14). O empenhai-vos (spoud/a/zw) 20 significa: ser diligente, esforçar-se, ser solícito, ser zeloso com entusiasmo ardente. O termo empregado é da mesma raiz da palavra usada no verso 12, traduzida por apressando (ARA). Spouda/zw denota uma diligência, um entusiasmo ardente que se esforça por fazer todo o possível para alcançar o seu objetivo. 21 Toda a nossa expectação deve se traduzir em uma vida que se caracterize pela paz. Em paz (e)n ei)rh/nh). Paz, nas Escrituras, descreve um estado de reconciliação com Deus, sendo mantida por meio de nossa comunhão com Cristo. É deste modo que Pedro saúda as igrejas: Paz (ei)rh/nh) a todos vós que vos achais em Cristo (1Pe 5.14). 22 18 O verbo speu/dw ocorre 6 vezes no Novo Testamento, a saber: Lc 2.16; 19.5,6; At 20.16; 22.18; 2Pe 3.12. 19 A única possível exceção está em At 22.18; todavia, talvez possamos interpretar o texto, entendendo o prazer de Deus em preservar a vida de Saulo, que seria o Seu instrumento especial na proclamação do Evangelho (Cf. At 9.15). 20 Spouda/zw ocorre 11 vezes no NT (* Gl 2.10; Ef 4.3; 1Ts 2.17; 2Tm 2.15; 4.9,21; Tt 3.12; Hb 4.11; 2Pe 1.10,15; 3.14), tendo o sentido de correr, apressar-se, fazer todo o esforço e empenho possível, urgenciar, ser zeloso, diligente, esforço, aplicação. 21 Apenas para ampliar a compreensão da palavra, cito o fato de que Paulo, preso em Roma, pede a Timóteo esta urgência em encontrá-lo (2Tm 4.9,21). Depois, em outro contexto, solicita o mesmo a Tito (Tt 3.12). Esta palavra tem também uma implicação ética, visto que está associada, por exemplo, ao esforço que os crentes devem despender em manter a unidade (Ef 4.3), ao zelo em socorrer a outros irmãos (Gl 2.10; 2Co 8.7,8,16) e, em corrigir uma injustiça (2Co 7.11-12). Por sua vez, é recomendado que aquele que lidera (preside), deve fazê-lo com empenho (diligência, zelo) (Rm 12.8). Pedro demonstrou esta mesma diligência em ensinar o Evangelho às Igrejas (2Pe 1.15). Judas revela o mesmo ao escrever a sua epístola (Jd 3). 22 Estas coisas vos tenho dito para que tenhais paz (ei)rh/nh) em mim. No mundo, passais por aflições; mas tende bom ânimo; eu venci o mundo (Jo 16.33). (Do mesmo modo: Fp 4.7).

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 8/14 5. A NOSSA RESPONSABILIDADE: A PROMOÇÃO DA PAZ: A paz, como todo o nosso bem-estar espiritual, está relacionada à nossa submissão ao Espírito Santo. O pendor da carne dá para a morte, mas o do Espírito, para a vida e paz (ei)rh/nh) (Rm 8.6). A paz com nossos irmãos não é algo mecânico, resultado natural de nossa paz com Deus. Em Cristo fomos reconciliados com Deus. Em relação aos nossos irmãos, devemos promover e nos esforçar por preservar esta paz possibilitada pelo Espírito que frutifica em nós. A nossa paz com Deus deve refletir-se em nossa paz com o nosso próximo, cultivando-a e preservando-a. Paulo, assim se despede da igreja de Corinto: Quanto ao mais, irmãos, adeus! Aperfeiçoai-vos, consolai-vos, sede do mesmo parecer, vivei em paz (ei)rhneu/w); e o Deus de amor e de paz (ei)rh/nh) estará convosco (2Co 13.11). Devemos manifestá-la em nossa cotidianidade. Se possível, quanto depender de vós, tende paz (ei)rhneu/w) com todos os homens (Rm 12.18). 23 Como nem sempre nos parece possível, devemos persegui-la, buscá-la intensamente. Ao jovem Timóteo, Paulo exorta: Foge (feu/gw), 24 outrossim, das paixões da mocidade. Segue (diw/kw) 25 a justiça, a fé, o amor e a paz (ei)rh/nh) com os que, de coração puro, invocam o Senhor (2Tm 2.22). (Do mesmo modo: Hb 12.14). A paz, portanto, nunca deve ser à revelia da justiça e do amor. Paz na injustiça é apenas um mascaramento do sofrimento e um aumento da amargura que se revelará de forma ainda mais grave. Por outro lado, a paz em detrimento do amor pode ser apenas uma concessão racional cuja durabilidade logo se extinguirá. Segundo a visão de Deus, paz é muito mais do que a ausência de algo. É a presença da justiça que produz relacionamentos verdadeiros. A paz não é apenas a suspensão da guerra; a paz é a criação da justiça que reúne inimigos em amor. 26 Em 19 de agosto de 1561, na Dedicatória de seu comentário do Profeta Daniel, Calvino fala de seu esforço por manter a paz o que nem sempre tem sido possível, e, ao mesmo tempo, estimula seus irmãos a não ultrapassarem determinados limites. Escreve: 23 Aparta-te do mal e pratica o que é bom; procura a paz e empenha-te por alcançá-la (Sl 34.14). 24 O verbo, no presente imperativo indica uma ação que deve se tornar um hábito de vida. 25 O verbo está no presente imperativo ativo. Associando-se o fugir ao seguir, temos um comportamento constante e complementar que deve fazer parte da conduta cristã. Conforme já vimos em nota supra, Diw/kw é utilizado sistematicamente para aqueles que perseguiam a Jesus, os discípulos e a Igreja (Mt 5.10-12; Lc 21.12; Jo 5.16; 15.20). Lucas emprega este mesmo verbo para descrever a perseguição que Paulo efetuou contra a Igreja (At 22.4; 26.11; 1Co 15.9; Gl 1.13,23; Fp 3.6), sendo também a palavra utilizada por Jesus Cristo quando pergunta a Saulo do porquê de sua perseguição (At 9.4-5/At 22.7-8/At 26.14-15). Paulo diz que prosseguia para o alvo (Fp 3.12,14). O escritor de Hebreus diz que devemos perseguir a paz e a santificação (Hb 12.14). Pedro ensina o mesmo a respeito da paz (1Pe 3.11). 26 John MacArthur Jr., O Caminho da Felicidade, São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 151.

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 9/14 Mais ainda, é vossa incumbência, amados irmãos, tomar prudente cuidado para que a verdadeira religião possa novamente readquirir uma posição sã; isto é, até onde cada um tiver o poder e a vocação. Não é necessário dizer o quanto tenho lutado para remover toda e qualquer o- casião geradora de tumultos até agora. Clamo aos anjos e a vós para testemunhardes diante do supremo juiz que não é de minha responsabilidade que o progresso do reino de Cristo não tenha sido calmo e inofensivo. De fato, julgo ser em decorrência de meu cuidado que pessoas particulares ainda não passaram dos limites. 27 Paulo apresenta uma recomendação preventiva: Seja a paz (ei)rh/nh) de Cristo o árbitro (brabeu/w) 28 em vosso coração, à qual, também, fostes chamados em um só corpo; e sede agradecidos (Cl 3.15). As nossas atitudes, decisões e escolhas, devem ser dirigidas pela paz de Cristo que arbitra, governa e lidera o nosso coração. Deste modo, havendo pessoas que dificultem a paz, devemos tentar promovê-la. 29 Paulo recomenda aos efésios que se esforcem por preservar a unidade no vínculo da paz: Esforçando-vos diligentemente (Spouda/zw) por preservar a unidade do Espírito no vínculo (Su/ndesmoj) da paz (ei)rh/nh) (Ef 4.3). Duas observações podem ser feitas aqui: a) O próprio tempo verbal de esforçando-vos, (Spouda/zw) (particípio presente), apresenta o conceito de um esforço contínuo, sem esmorecimento. b) A ideia expressa neste substantivo, Su/ndesmoj, 30 é a de unir, manter as coisas ligadas, ligar, algemar, prender, amarrar, acorrentar. (*At 8.23; Ef 4.3; Cl 2.19; 3.14). A paz promove a perpetuação da unidade. 31 A paz enlaça, envolve a unidade com as cordas do amor (Cl 3.14). 32 Não devemos permitir que a unidade 27 João Calvino, O Profeta Daniel: 1-6, São Paulo: Parakletos, 2000, Vol. 1, p. 26. 28 Esta palavra só ocorre aqui. Ela tem o sentido também de dar prêmios, julgar, reger. No grego clássico, o brabeu/w funcionava como juiz de um jogo. No entanto a palavra também era empregada de forma metafórica, significando liderar, reger e determinar. A forma brabei=on ocorre 2 vezes no NT. sendo traduzida por prêmio (1Co 9.24 e Fp 3.14). 29 Bom é o sal; mas, se o sal vier a tornar-se insípido, como lhe restaurar o sabor? Tende sal em vós mesmos e paz (ei)rhneu/w) uns com os outros (Mc 9.50). 30 O verbo sunde/w ocorre uma única vez no NT (Hb 13.3). Ele é constituído de duas palavras su/n, junto com e de/w, amarrar, atar, prender, algemar, casar (Mt 12.29; 16.19; Lc 13.16; Jo 19.40; At 9.2; 21.11,13,33; Rm 7.2; 1Co 7.27, etc.). Do mesmo modo, o substantivo (Su/ndesmoj) é composto de su/n, junto com e desmo/j, prisão, cadeia, algemas (Lc 13.16; At 23.29,31; Fp 1.7,13,14,17; 2Tm 2.9, etc.). No texto de Efésios, Paulo já empregara a expressão para si, como prisioneiro de Cristo Jesus (Ef 3.1) e prisioneiro do Senhor (Ef 4.1). Em ambos os textos, a palavra é de/smioj, expressão muito utilizada por Lucas e pelo próprio Paulo para falar de suas prisões. Ver: At 16.25; 23.18; 25.14; 27; 28.17; 2Tm 1.8; Fm 1,9. 31 William Hendriksen, Exposição de Efésios, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1992, (Ef 4.2-3), p. 230. 32 Acima de tudo isto, porém, esteja o amor, que é o vínculo (su/ndesmoj) da perfeição (teleio/thj)

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 10/14 do Espírito seja abalada em nosso relacionamento. A unidade é obra do Espírito, mas cabe a nós viver a sua plenitude no vínculo da paz (Rm 12.18) e no amor de Cristo (Jo 13.34-35; 15.12,17). Jesus Cristo considerou bem-aventurados os promotores da paz: Bemaventurados os pacificadores (ei)rhnopoio/j), 33 porque serão chamados filhos de Deus (Mt 5.9). Tiago diz que a sabedoria concedida por Deus, lá do alto, é primeiramente pura; depois pacífica (ei)rhniko/j) 34 (Tg 3.17). A grande estratégia da sabedoria é promover a paz. A Igreja, portanto, deve estar comprometida com a paz: procurar a paz, evitar as contendas e as atitudes que provocam dissensões. Pedro, então, diz que a Igreja deve se esforçar para que Cristo quando voltar a encontre em paz com Deus e com o seu semelhante (2Pe 3.14). Devemos procurar a paz, não a divisão e os mexericos que causam tanto mal à vida da Igreja. Lembremo-nos, contudo, que o fundamento da paz está em Cristo Jesus, não na acomodação do erro. Temos um exemplo importante em Calvino. Mesmo desejando a paz e a concórdia, ele entendia que essa paz nunca poderia ser em detrimento da verdade. Comentando 1Co 14.33, escreve: Naturalmente, há uma condição para entendermos a natureza desta paz, ou seja, a paz da qual a verdade de Deus é o vínculo. Pois se temos de lutar contra os ensinamentos da impiedade, mesmo se for necessário mover céu e terra, devemos, não obstante, perseverar na luta. Devemos, certamente, fazer que a nossa preocupação primária cuide para que a verdade de Deus seja mantida em qualquer controvérsia; porém, se os incrédulos resistirem, devemos terçar armas contra eles, e não devemos temer sermos responsabilizados pelos distúrbios. Pois a paz, da qual a rebelião contra Deus é o emblema, é algo maldito; enquanto que as lutas, indispensáveis à defesa do reino de Cristo, são benditas. 35 Portanto, zelemos por nossa Igreja, estejamos atentos para nos encontrar com o Senhor; esforcemo-nos para que Ele nos encontre em paz: Em paz com Deus e com os homens, fundamentados na verdade. 6. A PAZ DESEJADA E A VERDADE: Ênfases corretas podem esconder determinados vícios. Quem ousaria discordar de nós, na afirmação do propósito de que como cristãos devemos buscar a paz e a (Cl 3.14). 33 Esta palavra só ocorre aqui. 34 Esta palavra ocorre duas vezes no NT.: Hb 12.11; Tg 3.17. 35 J. Calvino, Exposição de 1 Coríntios, São Paulo: Edições Paracletos, 1996, (1Co 14.33), p. 437.

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 11/14 unidade? O fato é que podemos estar tão desejosos de que haja unidade o que sem dúvida é um nobre desejo, que nos esquecemos da verdade. Na realidade não podemos fazer concessões com aquilo que não nos pertence. Muitas vezes fechamos os nossos olhos à verdade a fim de criar uma unidade artificial, erguida sobre o frágil fundamento da mentira, do engano, da conivência, ou da omissão. Além disso, está na moda ser simpático para com a posição diferente da sua. Em nome da unidade ironiza MacArthur, esses assuntos de doutrina jamais devem ser contestados. Somos encorajados a insistir em nada mais do que uma simples afirmação de fé em Jesus. Além disso, o conteúdo específico da fé deve ser um assunto de preferências pessoais. 36 Por trás do conceito de tolerância abriga-se, muitas vezes, a simples compreensão da impossibilidade de se chegar à verdade: Hughes chama-nos atenção para esta acepção de tolerância : A atitude de tolerância com relação a todos os outros pontos de vista passa a ser a regra básica de convivência dentro de uma mentalidade pós-moderna. No entanto, a tolerância não é mais definida como uma graciosa resposta individual para uma pessoa que sustenta pontos de vista errados. A tolerância é agora definida como a expectativa de que toda pessoa chegue a abandonar a ideia que sua compreensão da verdade tenha mais validade que a perspectiva de outra pessoa. 37 A tolerância nunca deve substituir o interesse pela verdade ou, simplesmente, ter a roupagem daquilo que denominamos de politicamente correto. Quanto a este ponto em particular, vale a pena citar as palavras enfáticas de MacArthur: Passividade em relação ao erro conhecido não é uma opção para o cristão. A intolerância para com o erro encontra-se permeada nas próprias Escrituras. E tolerância para com o erro conhecido é tudo menos uma virtude. 38 A unidade que se consegue em detrimento da verdade não é produzida pelo Espírito, portanto, não é unidade pelo menos não a do Espírito, é apenas um ajuntamento circunstancial, formado de partes desconexas sem um elemento central que os preserve ali. 39 Uma unidade obtida por estes meios seria pagar um preço excessivamente alto e, o pior, sem verdadeiros frutos duradouros. 40 36 John F. MacArthur Jr. Introdução do Editor: In: John F. MacArthur Jr. ed. Ouro de Tolo? Discernindo a Verdade em uma Época de Erro. São José dos Campos, SP.: Fiel, 2006, p. 10. 37 John A. Hughes, Por que Educação Cristã e não Doutrinação Secular?: In: John MacArthur Jr., ed. ger. Pense Biblicamente!: recuperando a visão cristã do mundo, São Paulo: Hagnos, 2005, p. 373. 38 John F. MacArthur Jr. Princípios para uma Cosmovisão bíblica: Uma mensagem exclusivista para um mundo pluralista, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2003, p. 50. À frente: Uma cosmovisão bíblica é incompatível com qualquer tipo de tolerância de mentiras (John F. MacArthur Jr. Princípios para uma Cosmovisão bíblica, p. 68). 39 Veja-se: D.M. Lloyd-Jones, A Unidade Cristã, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1994, p. 209-220. 40 Analisando a reprimenda feita por Paulo a Pedro, Calvino comenta: Cegar a consciência dos santos, porém, através da obrigação de guardar a lei e silenciar a doutrina da liberdade era pagar pela unidade um preço demasiadamente alto (João Calvino, Gálatas, São Paulo: Paracletos, 1998, (Gl 2.14), p. 64-65).

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 12/14 Não podemos sustentar uma unidade que negue a Trindade, a suficiência das Escrituras ou a obra expiatória de Cristo. Esta não seria a unidade do Espírito, pelo menos, não a do Espírito Santo. No entanto, sem perceber, muitos crentes se detêm em ouvir pregadores que dizem verdades, mas, que na realidade, negam doutrinas fundamentais da fé cristã. É preciso discernimento quanto a isso para que não estejamos, involuntariamente, patrocinando heresias em nome de uma suposta unidade cristã. Conforme vimos, Calvino mesmo desejando a paz e o entendimento, entendia que essa paz nunca poderia ser em detrimento da verdade, pois, se assim fosse, essa dita paz seria maldita. 41 MacArthur discorrendo sobre o abandono da crença da verdade e a preocupação da Igreja na presente época em agir de forma politicamente correta, acrescenta: Até mesmo os erros grosseiros são agora totalmente toleráveis em alguns ambientes em nome de preservar a paz. Em lugar de manejar bem a Palavra da verdade e proclamá-la como verdadeira, muitas igrejas agora apresentam palestras, dramas, comédias e outras formas de entretenimento motivacionais enquanto ignoram as grandes doutrinas da fé. 42 7. A PAZ E A NOSSA FILIAÇÃO: Entre todos os dons da graça, a adoção é o maior, resume Packer. 43 Todas as demais bênçãos que recebemos decorrem da nossa graciosa filiação. Enquanto que pela justificação somos declarados justos perante Deus, visto que Cristo, o Justo, levou sobre Si os nossos pecados: estamos em paz com Deus. A adoção consiste na declaração legal de que agora, um inimigo de Deus foi reconciliado com Ele, nascendo de novo e, portanto, foi adotado como Seu filho, ingressando na família de Deus, 44 passando a ter todos os privilégios e responsabilidades como tal. A regeneração e a justificação se constituem no fundamento de nossa adoção. Tornamo-nos filhos porque Deus pelo Espírito nos gerou para Ele e por meio de Cristo fomos declarados justos: não há mais condenação para nós (Rm 8.1). Jesus Cristo diz: Bem-aventurados os pacificadores (ei)rhnopoio/j), porque serão 41 João Calvino, Exposição de 1 Coríntios, (1Co 14.33), p. 437. Do mesmo modo, Stott comenta: A unidade cristã tem a sua origem em possuirmos um só Pai, um só Salvador, e um só Espírito que habita em nós. Não podemos, portanto, de modo algum, acalentar uma unidade a- gradável a Deus se negarmos a doutrina da Trindade ou se não tivermos chegado a conhecer Deus Pai através da obra reconciliadora do seu Filho Jesus Cristo e pelo poder do Espírito Santo (John R.W. Stott, A Mensagem de Efésios, São Paulo: ABU Editora, 1986, p. 110). 42 John MacArthur, Jr., Princípios para uma Cosmovisão bíblica, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2003, p. 53. 43 J.I. Packer, O Conhecimento de Deus, São Paulo: Mundo Cristão, 1980, p. 197. 44 Na regeneração Deus nos dá uma nova vida espiritual interior. Na justificação dá-nos o direito legal de estar diante dele. Mas na adoção Deus nos faz membros de sua família (Wayne A. Grudem, Teologia Sistemática, São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 615).

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 13/14 chamados filhos (ui(oi\) de Deus (Mt 5.9). Aqui temos uma declaração do mais alto privilégio que poderemos ter: sermos chamados filhos de Deus. Aqueles que promovem a paz se parecem com o Seu Filho, Jesus Cristo, o Deus da paz (Jo 14.27; Cl 3.15). Pela graça nos parecemos com Jesus Cristo, o Filho de Deus. Esta semelhança não é meramente incidental ou física, antes, faz parte de nossa constituição genética: nascemos de novo por obra do Espírito do Pai e do Filho (Jo 3.3,5; Tt 3.5); 45 temos o Espírito de Deus em nós (Rm 8.9) 46 que nos guia e dá testemunho de nossa filiação (Rm 8.14,16). 47 Portanto, é natural que nós pareçamos com Jesus Cristo, o nosso irmão mais velho, o primogênito que possibilitou e efetivou a nossa adoção e se constitui no modelo para o qual devemos caminhar conforme o propósito de Deus (Rm 8.29). 48 Jesus Cristo é o modelo de pacificador, sendo Ele mesmo Aquele que nos pacificou com Deus, nos conduzindo ao Pai (2Co 5.18-19). Os filhos de Deus por já usufruírem da paz, podem, de fato, promover a paz. A pregação do Evangelho é o primeiro e mais eficaz meio para fazê-lo. A paz genuína deverá sempre começar pela reconciliação com Deus. Esta mensagem reivindicatória de Deus é confiada exclusivamente aos filhos de Deus. Paulo escreve aos coríntios: 18 Ora, tudo provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo e nos deu o ministério da reconciliação, 19 a saber, que Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões, e nos confiou a palavra da reconciliação. 20 De sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus (2Co 5.18-20). Os que promovem a paz do homem com Deus por meio do Evangelho e entre os homens pela promoção da justiça em conformidade com a Palavra, serão reconhecidos como filhos de Deus. Amados, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que haveremos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é (1Jo 3.2). IMPLICAÇÕES CONCLUSIVAS: 1. A verdadeira e genuína paz está em Deus: a paz procede de Deus. Não podemos ter paz dentro de nós mesmos ou paz com outras pessoas se não tivermos paz com Deus. 49 45 Não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo sua misericórdia, ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo (Tt 3.5). 46 Vós, porém, não estais na carne, mas no Espírito, se, de fato, o Espírito de Deus habita em vós. E, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele (Rm 8.9). 47 14 Pois todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. (...) 16 O próprio Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus (Rm 8.14,16). 48 Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos (Rm 8.29). 49 Jerry Bridges, A Vida Frutífera, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 74.

Mt 5.9 Os Pacificadores Filhos de Deus Rev. Hermisten 29/03/11 14/14 2. A nossa paz só será possível pela reconciliação com Deus. Fora de Cristo estamos alienados de Deus, separados de sua comunhão, em estado de rebelião; pela fé em Cristo fomos reconciliados com Deus: Justificados, pois, mediante a fé, temos paz (ei)rh/nh) com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo (Rm 5.1). 3. A paz de Deus em nossos corações é resultado de uma fé inabalável no poder soberano de Deus e no Seu cuidado paternal para conosco. 4. Devemos nos esforçar por viver em paz com o nosso próximo. No entanto, o desejo pela paz nunca deve justificar atos de injustiça ou conivência com o mal. A paz verdadeira só ocorre dentro dos padrões justos, verdadeiros e santos de Deus. Os únicos verdadeiros pacificadores no mundo são aqueles que levam as pessoas à justiça, aos padrões de Deus. 50 Lutero, portanto, estava certo: era impossível conscientemente negar os ensinos das Escrituras: O justo viverá pela fé! 5. Por sermos filhos de Deus, experimentamos a paz. Cabe a nós promover a paz anunciando e vivendo o Evangelho. Os evangelistas, portanto, são os grandes pacificadores porque levam a mensagem, o Evangelho da paz, promovendo a reconciliação dos filhos rebeldes com o Seu Pai Celestial. São Paulo, 29 de março de 2011. Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa 50 John MacArthur Jr., O Caminho da Felicidade, São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 154.