ANÁLISE DE DISCURSO FRANCESA APLICADA À NOTÍCIA DE JORNAL RESUMO

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Transcrição:

ANÁLISE DE DISCURSO FRANCESA APLICADA À NOTÍCIA DE JORNAL Selmo Ribeiro Figueiredo Junior 1 Antenor Parolin Junior 2 Paulo Marcelo Santos 3 RESUMO Neste artigo, trata-se a discursividade, a ideologia, os sujeitos de uma notícia política veiculada em um jornal impresso de circulação regional de Mato Grosso. Para tanto, contam-se com noções teóricas utilizadas na Análise de Discurso de linha francesa, das quais se encontram, em especial, as de Althusser (1985), Foucault (1997) e Maingueneau (2004, 1997). Além desses autores de primeiro plano, a leitura de Alves & Pinto (2007), Marques (2008), Mussalim (2001), Pinto (2002) e Sandmann (2003) muito contribuiu para a presente empresa, constituída sob o escopo da explicitação das instâncias e mecanismos discursivos mobilizados na notícia política analisada. Palavras-chave: discurso, ideologia, estado, blairo maggi. Considerações iniciais Instrumentalizando os conceitos teóricos da Análise de Discurso de linha francesa, tem-se como corpus uma notícia de jornal que instaura uma linguagem que se constrói com mecanismos que se articulam diretamente a fatores históricos, sociais, culturais e ideológicos; tendo em vista ainda, como enfatiza Maingueneau (2004, p. 53), que o discurso se constrói com efeito em uma função de uma finalidade, devendo, supostamente, dirigir-se para algum lugar. A notícia objeto de nossa análise encontra-se no jornal Diário regional de Sinop e Região Norte do Mato Grosso de quinta-feira, 11 de setembro de 2008, que nos traz uma notícia específica: a lei que aprova a ampliação da licença maternidade de quatro para seis meses. Abordagem da notícia de jornal 1 Departamento de Letras da UNEMAT, campus Universitário de Sinop. E-mail: selmojunior@gmail.com 2 Departamento de Letras da UNEMAT, campus Universitário de Sinop. 3 Departamento de Letras da UNEMAT, campus Universitário de Sinop. E-mail: marcelo.snt@hotmail.com Estudos Linguísticos, Sinop, v. 1, n. 2, p. 156-162, jul./dez. 2008. 156

O gênero notícia de jornal é específico e interpela vários leitores, chama-os a atenção. A notícia preza pela objetividade e pela referencialidade que, sob uma opacidade ideológica atrelada à determinada intencionalidade, induz (ou tenta induzir) esses leitores à aceitabilidade da verdade veiculada pelo jornal, que se apresenta como um aparelho comprometido com a verdade. Ainda, segundo Oliveira: A notícia jornalística é um tipo específico de discurso. Na superfície do texto noticioso está a informação processada supostamente com a isenção que lhe garante a técnica, mas também sujeita aos olhares diversos que se lançam sobre os fatos (OLIVEIRA, 2007, p. 119). Tendo como objeto de análise a notícia de jornal intitulada Maternidade: lei que amplia licença é sancionada no Estado, percebe-se a existência de várias Formações Discursivas (FDs) instauradas nessa notícia que concorrem para uma mesma finalidade: a manutenção das ideologias da classe dominante que se constitui a alta burguesia em sua expressão capitalista. Isso posto, cumpri-se definir, segundo Foucault (1997, p. 43), o conceito de FD: No caso em que se puder descrever, entre um certo número de enunciados, semelhante sistema de dispersão, e no caso em que entre os objetos, os tipos de enunciação, os conceitos, as escolhas temáticas, se puder definir uma regularidade (uma ordem, correlações, posições e funcionamentos, transformações), diremos, por convenção que se trata de uma formação discursiva evitando, assim, palavras demasiado carregadas de condições e consequências, inadequadas, aliás, para designar semelhante dispersão, tais com ciência, ou ideologia, ou teoria, ou domínio de objetividade (FOUCAULT, 1997, p. 43; grifo do autor). Para tanto, são mobilizadas várias instâncias: o Aparelho Ideológico de Estado (AIE) da mídia impressa (jornal), AIE da família e o próprio Estado (Aparelho Repressivo de Estado ARE). Antes de se prosseguir, faz-se necessário a definição de tais aparelhos: Os AIE são as Igrejas, Escolas, Família, Jurídico, Político, Sindical, Cultural e outros. Não quer dizer que não haja, assim como no caso do Direito, alguns aparelhos ideológicos que ao mesmo tempo são AIE e ARE. Uma distinção que não é cabal, mas serve para a maioria dos casos, é a de que os ARE fazem parte do Estudos Linguísticos, Sinop, v. 1, n. 2, p. 156-162, jul./dez. 2008. 157

poder público e os AIE do privado. O que irá distinguir, no fundo, um do outro é que o ARE atua através da violência e o AIE através da ideologia (sic) (ALTHUSSER apud MARQUES, 2008, p. 4). As FDs presentes na notícia são: a FD do governo, a FD médica, a FD da família e a FD capitalista. Além dessas FDs de natureza extra-subjetivas, isto é, cujos dispositivos enunciativos extrapolam e antecedem o sujeito em sua individualidade, tornado apenas um reprodutor das ideologias que caracterizam as FDs que o interpelam e o assujeitam, encontra-se o discurso de Blairo Maggi em sua particularidade que, dialogando com FDs, apresenta-se interdiscursivamente. Referindo-se às condições de produção da discursividade da notícia em análise, a saber, às vésperas das eleições eleitorais deste ano, é mister perceber a intencionalidade política que subjaz esse todo discursivo de manter a ideologia do Estado, sob a roupagem de aprovação de leis benéficas à população que são, oportunistamente, realizadas nesse período. No que diz respeito à FD do governo, a primeira ocorrência de componentes que a constituem se localiza no seguinte trecho, enunciado pelo sujeito discursivo da redação do jornal: O Estado passa a ser exemplo para a iniciativa privada e também municípios, uma vez que nenhuma administração municipal mato-grossense possui a licença oficialmente ampliada, com devidas leis aprovadas (Diário Regional, 11 de setembro de 2008, p. 5; grifo nosso). O sujeito discursivo José Rubens Zaitum enuncia a favor da medida governamental, criando mais laços de legitimação dessa medida frente ao público leitor, manifestando-se em um interdiscurso onde estão inseridas as FDs médica e familiar, que o torna um sujeito discursivo por elas clivado: Essa lei vai gerar muitos ganhos. Ela aumenta o laço amoroso entre mãe e filhos, tendo vários reflexos. (Diário Regional, 11 de setembro de 2008, p. 5; grifo nosso). Na citação abaixo, a FD médica se reitera onde, ao mesmo tempo, a FD capitalista se desenvolve. A mãe ganha muito. Quanto maior o tempo de amamentação, menor o risco de doenças, como o câncer de seio. Para o empregador, a produtividade da mulher aumenta quando ela está tranqüila em relação ao seu filho em casa, e este maior tempo da mais confiança para todos (Diário Regional, 11 de setembro de 2008, p. 5; grifo nosso). Estudos Linguísticos, Sinop, v. 1, n. 2, p. 156-162, jul./dez. 2008. 158

Maggi, ativando sua Memória Discursiva enquanto sujeito em sua pessoalidade, com a intencionalidade de legitimação da sanção da lei, evoca sua experiência de vida que é, segundo seu posicionamento, compartilhada pelos sujeitos inseridos no lugar social das zonas rurais, a saber, do menor ou inexistente usufruto do direito à licença maternidade, como está explicitado na seguinte citação articulada pelo sujeito discursivo do jornal: Maggi explicou, citando o exemplo da sua infância, no passado e ainda hoje em zonas rurais, a licença maternidade é muito menor ou mesmo inexistente (Diário Regional, 11 de setembro de 2008, p. 5). Porém, mesmo que esse tempo seja menor ou inexistente nesse lugar social, fazse a ressalva de que as mães ficam mais tempo com seus filhos uma vez que elas, em sua maioria, trabalham em casa: Nestes casos, a mãe trabalha em casa e sempre está com o filho, diferente do que acontece hoje, quando as mães trabalham fora durante o dia todo, e muitas vezes, encontram seus bebês dormindo quando retornam (Diário Regional, 11 de setembro de 2008, p. 5). Maggi também se posiciona, num discurso direto postado na superfície da notícia, a partir da FD da família a favor da FD do governo através do não-dito inferido: o Estado se preocupa com a família. Sendo assim, usa como estratégia de aproximação a sua própria inclusão no benefício da lei, o que se percebe com o uso do sujeito gramatical implícito nós rastreado pela flexão do verbo ir no presente do indicativo da primeira pessoa do plural: Vamos aproveitar esses dois meses não só para os filhos que estão chegando, mas também para aqueles que estão pedindo um pouco mais de carinho. O foco principal tem sempre que ser a família (Diário Regional, 11 de setembro de 2008, p. 5). Por meio do sujeito Eumar Novacki, tenta-se instaurar uma construção ideológica de fundo paternalista e assistencialista do Estado: A expectativa do estado é que o exemplo seja seguido pelos municípios e a iniciativa privada, comentou o secretário chefe da Casa Civil, Eumar Novacki (Diário Regional, 11 de setembro de 2008, p. 5). Mais adiante, o secretário Novacki, como reprodutor da ideologia dominante instalada no ARE, numa perspectiva idealista, promove, em seu discurso, o Estado a modelo a ser seguido pelas outras instancias da sociedade que, pretensamente, estaria em processo de construção: Ele apontou que a nova lei traz Estudos Linguísticos, Sinop, v. 1, n. 2, p. 156-162, jul./dez. 2008. 159

para o debate o modelo de sociedade que estamos construindo (Diário Regional, 11 de setembro de 2008, p. 5). Numa outra manifestação da FD do governo onde se pressupõe a FD capitalista que veria a sanção da lei como um impacto financeiro negativo, que seria a face negativa da medida apresenta-se a face positiva dessa sanção, vendo-a ideologicamente como um investimento e não como uma despesa: O importante de destacar é que a lei que amplia o direito não é uma despesa, mas sim um investimento do Estado na família. (Diário Regional, 11 de setembro de 2008, p. 5). Tal polarização das faces encontra respaldo na teoria das faces mutatis mutandis na Análise de Discurso, desenvolvida principalmente por P. Brown e S. Levinson, retomada por Maingueneau: Considera-se que todo indivíduo possui duas faces; o termo face deve ser aqui tomado no sentido que este termo possui numa expressão como perder a face : uma face negativa, que corresponde ao território de cada um (seu corpo, sua intimidade etc.); uma face positiva, que corresponde à fachada social, à nossa própria imagem valorizante que tentamos apresentar aos outros (MAINGUENEAU, 2004, p. 38). É assim que os sujeitos tratados aqui se posicionam, segundo essa polarização, projetando suas faces positivas em relação ao outro e recalcando suas faces negativas em relação a si mesmo, negando, por extensão, a negatividade que constitui essa medida de lei no que diz respeito a seu impacto financeiro e afirmando, através do discurso, a sua positividade ao bem comum. Considerações finais A notícia de jornal tem como pressuposto, em geral, a apresentação impessoal do(s) fato(s) abordado(s). Contudo, como é o caso da notícia analisada, como se pôde perceber, há traços de parcialidade que atravessam o discurso de um dos sujeitos discursivos, Maggi, enquanto sujeito em sua pessoalidade como efeito ideológico elementar para constituí-lo em forma-sujeito. Além disso, esse mesmo sujeito, em relação aos demais enunciadores presentificados na notícia, evidencia-se com maior complexidade e clivagem em razão de sua interdiscursividade ao manifestar-se através de várias FDs e discursos. E qual é o grande porquê que subjaz Estudos Linguísticos, Sinop, v. 1, n. 2, p. 156-162, jul./dez. 2008. 160

essa manifestação enunciativa fragmentária? Para uma importante finalidade ideológica: mobilizar mecanismos (FDs da família, capitalista, médica, do governo) Aparelhos Ideológicos de Estado (AIEs midiático, da família) e, por consequência, os sujeitos (leitores etc.) com o fito de garantir a manutenção da ideologia dominante da alta burguesia em sua expressão capitalista alojada no Estado, de onde se irradia e se reproduz escamoteada nas outras estruturas da sociedade. Referências ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos de Estado. 2. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1985. ALVES, Fábio Lopes; PINTO, Aroldo José Abreu (orgs.). Representações sociais em comunicação: fragmentos de história em histórias. São Paulo: Editora Arte e Ciencia, 2007. FOUCAULT, Michel. Arqueologia do saber. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2004.. Novas tendências em análise do discurso. 3. ed. Pontes: Editora da Unicamp, 1997. MARQUES, Rafael da Silva. Os aparelhos ideológicos de estado: breves considerações sobre a obra de Louis Althusser. Disponível em: http://www.ihj.org.br/. Acesso em: 28 de setembro de 2008. MUSSALIM, Fernanda. Análise do discurso. In: MUSSALIM, Fernanda; DENTES, Anna Christina. Introdução à lingüística: domínios e fronteiras. Vol. 2, 2. ed. São Paulo: Cortez, 2001. PINTO, Milton José. Comunicação e discurso: introdução à análise de discursos. 2. ed. São Paulo: Hacker Editores, 2002. SANDMANN, Antônio José. A linguagem da propaganda. 7. ed. São Paulo: Contexto, 2003. Estudos Linguísticos, Sinop, v. 1, n. 2, p. 156-162, jul./dez. 2008. 161

FRENCH ANALYSIS OF DISCOURSE APLLIED TO THE NEWS OF NEWSPAPER ABSTRACT In this article, the discourseness, the ideology, the subject of a political news published in a newspaper of regional circulation of Mato Grosso are treated. For that, theoretical notions used in the Analysis of Discourse of French orientation are taken, of the which are, especially, the Althusser (1985), Foucault (1997) and Maingueneau s (2004, 1997) notions. Beyond of those authors of first plan, the reading of the Alves & Pinto (2007), Marques (2008), Mussalim (2001), Pinto (2002) and Sandmann (2003) contributed a lot to this work, constituted under the mark of the recuperation of the instances and discursive mechanisms established in the analyzed political news. Keywords: discourse, ideology, state, blairo maggi. Estudos Linguísticos, Sinop, v. 1, n. 2, p. 156-162, jul./dez. 2008. 162