XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002

Documentos relacionados
XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002

COMPARAÇÃO ENTRE A PREVISÃO DE CHUVA NO NORDESTE DO BRASIL COM MÉTODO ANÁLOGO E A OBTIDA DINAMICAMENTE

1246 Fortaleza, CE. Palavras-chave: Circulação de brisa, RAMS, modelagem atmosférica.

Avaliação preliminar de um downscaling dinâmico para estimativa dos recursos eólicos em regiões litorâneas do Ceará

RELAÇÃO DA ZONA DE CONVERGÊNCIA SECUNDÁRIA DO ATLÂNTICO SUL SOBRE A OCORRÊNCIA DE SISTEMAS FRONTAIS AUSTRAIS ATUANTES NO BRASIL

Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos CPTEC Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais INPE Rodovia Presidente Dutra, km 40 - CEP

Fabíola Valéria Barreto Teixeira Clemente A. S. Tanajura Elson Magalhães Toledo

MODELAGEM NUMÉRICA DE UM COMPLEXO CONVECTIVO DE MESOESCALA OCORRIDO NO NORTE DO NORDESTE BRASILEIRO ABSTRACT

ANÁLISE DA CLIMATOLOGIA DE PRECIPITAÇÃO SIMULADA EM ESCALA REGIONAL USANDO DOWNSCALING DINÂMICO SOBRE A REGIÃO NORTE DO NORDESTE DO BRASIL

DOWNSCALING DINÂMICO DE PRECIPITAÇÃO NO NORDESTE DO BRASIL: ALGUNS RESULTADOS

ESTUDO CLIMATOLÓGICO DA VELOCIDADE E DIREÇÃO DO VENTO ATRAVÉS DOS DADOS DE REANÁLISES PARA O ESTADO DE ALAGOAS

BOLETIM DE DIAGNÓSTICO CLIMÁTICO NOVEMBRO DE 2011

SISTEMA DE PREVISÃO SAZONAL POR ENSEMBLE UTILIZANDO O MODELO ECHAM4.6 NA FUNCEME

ALTA DO ATLÂNTICO SUL E SUA INFLUÊNCIA NA ZONA DE CONVERGÊNCIA SECUNDÁRIA DO ATLÂNTICO SUL

COMO UM MODELO CLIMÁTICO REPRODUZ A CLIMATOLOGIA DA PRECIPITAÇÃO E O IMPACTO DE EL NIÑO E LA NIÑA NO SUL DA AMÉRICA DO SUL?

Monica Cristina Damião Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos CPTEC

RELAÇÃO DA TEMPERATURA DA SUPERFÍCIE DOS OCEANOS PACÍFICO E ATLANTICO TROPICAIS E A PRECIPITAÇÃO NA MICRORREGIÃO DE PETROLINA (SERTÃO PERNAMBUCANO)

PRECIPITAÇÃO CLIMATOLÓGICA NO GCM DO CPTEC/COLA RESOLUÇÃO T42 L18. Iracema F. A. Cavalcanti CPTEC/INPE ABSTRACT

CORRELAÇÃO DA TSM DO PACIFICO COM A RADIAÇÃO DE ONDA CURTA NO BRASIL

Dados Modelo ETA (INPE) Espaçamento de 40Km de 12 em 12 horas com 32 níveis na vertical. Corta-se a grade de estudo

MONITORAMENTO DA ZONA DE CONVERGÊNCIA INTERTROPICAL (ZCIT) ATRAVÉS DE DADOS DE TEMPERATURA DE BRILHO (TB) E RADIAÇÃO DE ONDA LONGA (ROL)

ACA-223: Climatologia 1. Climatologia Física: Elementos e Controles do Clima: Variabilidade Diurna e Sazonal

I Workshop Internacional Sobre Água no Semiárido Brasileiro Campina Grande - PB

VARIABILIDADE DA PRECIPITAÇÃO SOBRE O SUL DO NORDESTE BRASILEIRO ( ) PARTE 1 ANÁLISE ESPACIAL RESUMO

RELAÇÃO DA TEMPERATURA DA SUPERFÍCIE DOS OCEANOS PACÍFICO E ATLANTICO TROPICAIS E A PRECIPITAÇÃO NA MICRORREGIÃO DE ARARIPINA (SERTÃO PERNAMBUCANO)

A DESTREZA DAS PREVISÕES CLIMÁTICAS SAZONAIS RETROSPECTIVAS DO MODELO DE CIRCULAÇÃO GERAL DA ATMOSFÉRICA DO CPTEC

1 Introdução. Cícero Fernandes Almeida Vieira. Clodoaldo Campos dos Santos. Francisco José Lopes de Lima. Rafael Aragão Magalhães

INFOCLIMA. Sumário Executivo

Relação entre a precipitação pluvial no Rio Grande do Sul e a Temperatura da Superfície do Mar do Oceano Atlântico

RENDIMENTO DAS CULTURAS DE SEQUEIRO NO NORDESTE DO BRASIL. PARTE II: ASSOCIAÇÃO COM EL NIÑO E DIPOLO RESUMO

ESCOLHA DE MEMBROS PARA PREVISÃO POR CONJUNTO COM O MODELO BRAMS. Ricardo Almeida de Siqueira

PREVISÃO DE CHUVAS ACIMA DA MÉDIA SOBRE O NORDESTE DO BRASIL. Sumário Executivo

1 Introdução. Emerson Mariano da Silva com

Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC/INPE) Cachoeira Paulista, São Paulo - Brasil ABSTRACT

ESTUDO DA CIRCULAÇÃO LOCAL NA REGIÃO DO VALE DO RIO JAGUARIBE NO ESTADO DO CEARÁ

ZONA DE CONVERGÊNCIA INTERTROPICAL DO ATLÂNTICO SUL

A RELAÇÃO DA PREVISÃO DA PRECIPITAÇÃO PLUVIOMÉTRICA E CASOS DE DENGUE NOS ESTADOS DE ALAGOAS E PARAÍBA NORDESTE DO BRASIL.

Journal of Environmental Analysis and Progress

BOLETIM Nº 05/2016 FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DO TOCANTINS. Núcleo Estadual de Meteorologia e Recursos Hídricos

O INÍCIO DA ESTAÇÃO CHUVOSA NO SUDESTE DO BRASIL PELO MCGA CPTEC/COLA

INFOCLIMA BOLETIM DE INFORMAÇÕES CLIMÁTICAS. Previsão de Consenso 1 CPTEC/INPE e INMET para o trimestre Dezembro/04 a fevereiro/05

BOLETIM DE INFORMAÇÕES CLIMÁTICAS Ano de dezembro de 2006 Número 11

XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002

SENSIBILIDADE DO MODELO BRAMS PARA RODADAS MENSAIS E DIÁRIAS PARA A ESTIMATIVA DO VENTO

AVALIAÇÃO DOS DADOS DE PRECIPITAÇÃO SOBRE O BRASIL PROVENIENTES DE DIFERENTES FONTES DE DADOS RESUMO

Análise Preliminar das Previsões Mensais de Precipitação sobre o Brasil, utilizando o Climate Predictability Tool (CPT).

BOLETIM PROJETO CHUVA - 22 DE JUNHO DE 2011

VARIABILIDADE CLIMÁTICA INTERDECADAL DA PRECIPITAÇÃO NA AMÉRICA DO SUL EM SIMULAÇÕES DO PROJETO CMIP5

Revista Brasileira de Geografia Física

UM ESTUDO PRELIMINAR SOBRE A PRECIPITAÇÃO EM ALAGOAS E SUA RELAÇÃO COM O SISTEMA DE BRISAS MARINHA / TERRESTRE

Análise do aquecimento anômalo sobre a América do sul no verão 2009/2010

PREVISÃO CLIMÁTICA SAZONAL. Ana Maria H. de Avila Cepagri/unicamp

COMPARAÇÃO ENTRE A PRECIPITAÇÃO SIMULADA PELO MCGA DO CPTEC/COLA E A RENÁLISE DO NCEP/NCAR E OBSERVAÇÕES

XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002

Modulações da ZCAS pelas temperaturas da superfície do mar no Atlântico Sudoeste

CARACTERÍSTICAS DA PRECIPITAÇÃO SOBRE O BRASIL NO VERÃO E OUTONO DE 1998.

PERFIL VERTICAL DO VENTO DE UM CCMT DESENVOLVIDO EM AMBIENTE DE DIPOLO DE TSM

(a) (b) ZCIT (a) (b) aquecimento resfriamento

INFOCLIMA BOLETIM DE INFORMAÇÕES CLIMÁTICAS Ano 9 12 de setembro de 2002 Número 9 Divisão de Operações

Eventos climáticos extremos: monitoramento e previsão climática do INPE/CPTEC

PREVISÃO SAZONAL DE PRECIPITAÇÃO PARA O NORDESTE DO BRASIL - EMITIDA EM JAN/2014 PARA O PERÍODO ENTRE FEV E ABR/2014

MODELAGEM GLOBAL X DOWNSCALING DINÂMICO: UMA ANÁLISE PRECIPITAÇÃO SAZONAL E SUBSAZONAL NO NORDESTE DO BRASIL

XIX CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA 27 de setembro a 01 de outubro de 2010

Extremos na Serra do Mar

Verificação da previsão numérica do tempo por ensemble para as regiões homogêneas do estado do Ceará

Pesquisas Espaciais (INPE),

PREVISÕES SAZONAIS PARA O VERÃO E OUTONO DE 1998 SOBRE O BRASIL, COM O MCG DO CPTEC/COLA.

Palavras-chave: Atlântico subtropical, modelo CPTEC/COLA, precipitação

AVALIAÇÃO DAS PREVISÕES DE MARÉ METEOROLÓGICA REALIZADAS COM O PRINCETON OCEAN MODEL NO LABORATÓRIO MASTER/IAG/USP

SIMULAÇÃO DAS CIRCULAÇÕES LOCAIS NO RIO GRANDE DO SUL: FORMAÇÃO E INTERAÇÃO DAS BRISAS NO INTERIOR E REGIÃO COSTEIRA DO ESTADO

INTRODUÇÃO MATERIAIS E MÉTODOS

Ronaldo Haroldo N. de Menezes Professor Substituto CCA/UEMA/NEMRH. São Luís/MA

INFOCLIMA. BOLETIM DE INFORMAÇÕES CLIMÁTICAS Ano 9 13 de janeiro de 2003 Número 01. Sumário Executivo

XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002

A INFLUÊNCIA DE ALGUMAS VARIÁVEIS ATMOSFÉRICAS A EXTREMOS DE PRODUTIVIDADE DE TRIGO NO RIO GRANDE DO SUL.

BOLETIM DE INFORMAÇÕES CLIMÁTICAS PARA O ESTADO DO PIAUÍ

INFOCLIMA, Ano 12, Número 01 INFOCLIMA. BOLETIM DE INFORMAÇÕES CLIMÁTICAS Ano de janeiro de 2005 Número 01

EVENTOS DE CHUVAS INTENSAS EM PERNAMBUCO DURANTE A ESTAÇÃO CHUVOSA DE FEVEREIRO A MAIO DE 1997: UM ANO DE TRANSIÇÃO

TENDÊNCIA DE CHUVAS VARIANDO DE NORMAL A LIGEIRAMENTE ABAIXO DA MÉDIA EM GRANDE PARTE DA REGIÃO SUL DO BRASIL

MODELAGEM ATMOSFÉRICA

USO DO MODELO WRF PARA A SIMULAÇÃO DA DIREÇÃO E VELOCIDADE DO VENTO INCIDENTE NA REGIÃO DA GRANDE VITÓRIA (ES)

Características Climáticas da Primavera

ESTUDO DE VARIABILIDADE DO VENTO EM ESCALA SAZONAL SOBRE O NORDESTE BRASILEIRO UTILIZANDO O RAMS: OS CASOS DE E

VARIABILIDADE NO REGIME PLUVIAL NA ZONA DA MATA E AGRESTE PARAIBANO NA ESTIAGEM DE

AVALIAÇÃO DA PRÉ-ESTAÇÃO CHUVOSA DE 1997/98 PARTE I: DISTRIBUIÇÃO PLUVIOMÉTRICA NO ESTADO DO CEARÁ

Ciência e Natura ISSN: Universidade Federal de Santa Maria Brasil

CORRELAÇÃO ENTRE ANOMALIAS DE TSM E TEOR D ÁGUA NA ATMOSFERA SOBRE A AMÉRICA DO SUL

ATUAÇÃO DO PAR ANTICICLONE DA BOLÍVIA - CAVADO DO NORDESTE NAS CHUVAS EXTREMAS DO NORDESTE DO BRASIL EM 1985 E 1986

Resumo. 1. Introdução

XIX CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA 27 de setembro a 01 de outubro de 2010

INFLUÊNCIA DOS OCEANOS PACÍFICO E ATLÂNTICO NA VARIABILIDADE DA TEMPERATURA EM BELÉM-PARÁ.

CHUVAS LIGEIRAMENTE ACIMA DO NORMAL NO NORTE E INTERIOR DO NORDESTE. Sumário Executivo

Mudanças interdecadais na estrutura da circulação de grande escala do Hemisfério Sul

NOTA TÉCNICA No. 014/2012/CAPRE/CDP/INMET

PREVISÃO DE TEMPERATURAS MÁXIMAS E MÍNIMAS DO AR AO NÍVEL DE ABRIGO UTILIZANDO MODELO ATMOSFÉRICO DE MESOESCALA.

A INFLUÊNCIA DAS CARACTERÍSTICAS FISIOGRÁFICAS NO LESTE DO NORDESTE DO BRASIL UTILIZANDO O MODELO RAMS

INFORMATIVO CLIMÁTICO

INFLUÊNCIA DO EL NIÑO NO COMPORTAMENTO PLUVIOMÉTRICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO DURANTE O ANO DE 1998

Estudo da Variação Temporal da Água Precipitável para a Região Tropical da América do Sul

Transcrição:

UMA BREVE DESCRIÇÃO DO SISTEMA DE PREVISÃO CLIMÁTICA REGIONALIZADA (DOWNSCALING DINÂMICO) IMPLANTADO NA FUNCEME. David Ferran Moncunill 1 Emerson Mariano da Silva 1 Vicente de Paula Silva Filho 1 Wagner Luís Barbosa Melciades 1 Alexandre Araújo Costa 2 Liqiang Sun 3 Antônio Divino Moura 3 Paulo Nobre 4 1.Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos 2.Universidade Estadual do Ceará 3.International Research Institute for Climate Prediction 4.Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos ABSTRACT FUNCEME (Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos) and IRI (International Research Institute for Climate Prediction) developed a dynamical climate downscaling prediction system over Northeast Brazil, having the NCEP regional spectral model (RSM) and ECHAM atmospheric general circulation model (AGCM) as its core. Sea surface temperature forecasts are produced first, and then used as lower boundary condition forcing for the RSM - ECHAM4.5 AGCM nested system. A number of simulations were performed to obtain the best combination of horizontal resolution and domain size for the RSM. Then, an ensemble of ten runs of the RSM - ECHAM4.5 AGCM nested system was carried out for the period of 1971-2000, using observed SSTs as boundary forcing. Skill estimates obtained from this sort of hindcasting are considered as upper limit of forecast skills. A number of statistical tools were used to correct for systematic and conditional biases in the post-processing of model forecasts. Results of seasonal climate forecasts for February-May 2002 are presented. INTRODUÇÃO A região do Nordeste do Brasil (NEB) tem no passado uma história de secas que afetam de forma drástica sua população rural (Magalhães e Glantz, 1992). Essas secas estão associadas às características climáticas da região, que possui grande variabilidade espacial e temporal na distribuição de chuvas, bem como a concentração de mais de 80% do total anual de precipitação ocorrendo num período de quatro meses. Daí, é de grande importância a construção de um sistema de previsão climática adequado e a utilização correta da informação gerada. Devido à natureza não-linear das equações que regem sua dinâmica, a atmosfera é fundamentalmente caótica. Diferenças infinitesimalmente pequenas no estado inicial da atmosfera crescem até atingir as dimensões da variância observada do tempo em um período de 10 a 14 dias. Por esse motivo, é teoricamente impossível prever a exata localização e momento de ocorrência de eventos de tempo. Na prática, dado as limitações no conhecimento das observações, nos modelos de previsão e na limitada capacidade computacional, a habilidade de se prever deterministicamente a evolução dinâmica do fluido atmosférico é, via de regra, ainda mais limitada. Não obstante, o comportamento médio do tempo, isto é, o clima, responde à intervenção de forçantes cujas variações têm escala temporal tipicamente superior ao limite de previsibilidade de eventos individuais acima referido. Dentre as principais condições de fronteira para o clima destacam-se a radiação solar incidente, mudanças na cobertura vegetal e mudanças no campo de temperatura da superfície do mar (TSM). Vale ressaltar que a circulação atmosférica sobre os trópicos é particularmente sensível a flutuações na TSM (Lindzen e Nigam, 1987). Uma vez que a escala de tempo associada a anomalias de TSM é da ordem de vários meses ou mais, isto proporciona um certo grau de previsibilidade às anomalias climáticas correspondentes, pelo menos a nível sazonal. Particularmente num contexto de mudança climática global, ferramentas como modelos numéricos, em que os processos físicos envolvendo a circulação atmosférica e seus forçantes são representados explicitamente, tendem a ser 1291

vantajosos diante de ferramentas do tipo estatístico/estocástico. Assim, modelos de circulação geral da atmosfera (MCGs), que têm experimentado significativa evolução nas últimas décadas, mostram-se capazes de prever, com relativa acurácia, anomalias climáticas de grande escala (Stern e Miyakoda 1995). Uma das limitações mais óbvias dos MCGs, no entanto, especialmente quando usados em estudos e previsões climáticas, é a sua baixa resolução espacial. Uma vez que MCGs possuem um espaçamento de grade da ordem de centenas de quilômetros, a variabilidade atmosférica associada a forçantes locais (topografia, presença de espelhos d'água, cobertura vegetal heterogênea, etc.) é comumente não é bem representada. Estes efeitos, via de regra, só podem ser representados por meio de modelos atmosféricos de mesoescala (vide, por exemplo, Pielke et al. 1992, Juang e Kanamitsu 1994). Tais modelos possuem, tipicamente, resolução espacial da ordem de dezenas de quilômetros. Com isso, são capazes de simular circulações forçadas por topografia, sistemas de brisa marítima e terrestre, circulações de vale-montanha, etc. Como o seu custo computacional é relativamente elevado, os mesmos são comumente executados em domínios de área limitada. Ao invés de simularem a evolução do fluido atmosférico na escala planetária, os modelos de mesoescala precisam ser alimentados por observações de grande escala e/ou dados de modelos globais. Sob esta óptica, modelos atmosféricos de mesoescala se constituem numa ferramenta útil para fins de previsão climática regional, possibilitando o detalhamento das previsões obtidas por intermédio de MCGs (Small et al. 1999), neles aninhados. Esta técnica combina a habilidade dos MCGs em prever o comportamento estatístico da atmosfera em resposta a um forçante de grande escala com a capacidade dos modelos de mesoescala em simular a ocorrência de circulações locais. Desta maneira, a aplicação da técnica de "downscaling" (ou ampliação da resolução) torna-se uma ferramenta importante para o usuário poder utilizar a previsão climática em um nível temporal e escala espacial mais compatível com o seu processo de tomada de decisão. METODOLOGIA e PRODUTOS A técnica do "downscaling dinâmico" consiste no aninhamento de um modelo regional atmosférico a um MCG, sendo o regional forçado unidirecionalmente em todo o domínio (e.g., Nobre et al. 2001) pelas informações geradas pelo MCG. O projeto é uma parceria entre a FUNCEME (Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos) e o IRI (International Institute Research for Climate Prediction). O modelo regional utilizado é o Modelo Regional Espectral (MRE) do NCEP (National Centers for Environmental Prediction) descrito por Juang e Kanamitsu (1994, 1997). Nas previsões numéricas o modelo regional é integrado em uma grade de 60 x 60 km, o que implica na ampliação de 25 vezes na resolução espacial dos resultados (isto é, no lugar de um pixel de 300 x 300 km tem-se 25 pixels de 60 x 60 km cada), comparativamente ao que é obtido através do modelo global. A diminuição do espaçamento de grade também implica numa melhor previsão da Zona de Convergência Intertropical (Nobre et al. 2001), bem como, na definição dos processos físicos, já que o downscaling incorpora melhor os efeitos da topografia, vegetação, contrastes entre continente e oceano e outros. A configuração do MRE para previsão numérica foi determinada depois de uma série de simulações- testes, realizadas com o objetivo de se determinar o melhor tamanho de grade, domínio, tipo de solo, passo de tempo, vegetação, percentual de cobertura de vegetação, etc. como função dos recursos computacionais, e da avaliação subjectiva da previsibilidade da anomalia de precipitação em anos extremos. O domínio, determinado a partir destes testes, abrange a área entre as latitudes de 21S e 16N, e as longitudes de 56W a 2E. Nas simulações foram utilizados 18 níveis verticais. A vegetação considerada foi a do tipo savana, com 70% de cobertura da superfície. A umidade do solo e temperatura foram inicializadas pelo MCG. O MGC utilizado para alimentar o MRE é o ECHAM4.5 do Max Planck Institute for Meteorology. Uma descrição detalhada do mesmo pode ser encontrada em Roeckner et al. (1996). Para verificar a habilidade desse método em reproduzir os aspectos característicos regionalizados do clima na região do NEB e obter a climatologia do modelo, foi utilizada a Temperatura da Superfície do Mar (TSM) observada como condição forçante para a integração do ECHAM4.5-MRE no período de 1971 a 2000. Foram calculados os índices de correlação entre a anomalia de precipitação observada e a simulada. Os índices de correlação obtidos são similares aos obtidos pelos MCGs para a região e são considerados como limite superior da previsão regionalizada, dado que foram calculados a partir de TSMs observadas. Na Figura 1, mostra-se a distribuição espacial dos coeficientes de correlação entre a anomalia da precipitação simulada e a observada, onde a anomalia é o desvio da climatologia. 1292

ECHAM4.5 - RSM97 Anomalia de precipitação: 1971-2000 MAR-MAIO Correlação de anomalia Figura 1 - Correlação entre as anomalias de precipitação simuladas e observadas para o período de março a maio de 1971 a 2000. Para realizar a previsão, o MRE utilizou-se de 10 membros do ECHAM4.5 (processados no IRI), com dois cenários de Temperatura da Superfície do Mar (TSM). Para cada conjunto (10 membros) de um dos cenários de TSM, a única diferença entre cada rodada individual é a condição inicial da atmosfera no momento de iniciar a simulação. Nas Figuras 2, 3 e 4 são mostrados três dos produtos de previsão gerados pelo modelo para o período de março a maio de 2002, realizada em fevereiro de 2002. A figura 2 mostra a previsão do percentual da climatologia da precipitação do modelo. As áreas em cinza mostram onde o modelo não teve habilidade em realizar a previsão, considerando que o coeficiente de correlação foi menor que 0,3 na simulação "histórica". Figura 2 - Previsão da distribuição do percentual da climatologia da precipitação (com mascara estatística) para os meses de março a maio de 2002, com TSM prevista a partir do mês de fevereiro de 2002. As anomalias da precipitação observadas e simuladas (1971 a 2000), para cada membro e para a média dos membros foram classificadas em 3 categorias em cada ponto de grade, sendo considerado que 1/3 dos anos mais chuvosos foi categorizada como "Acima do Normal"; o 1/3 dos anos mais secos como "Abaixo do Normal" e o 1/3 dos anos restantes como "Próximo da Normal". Posteriormente foram construídas tabelas de contingência, as quais relacionam a categoria simulada com a observada e permitem avaliar o desempenho da simulação histórica. 1293

Na figura 3, observam-se quatro mapas relacionados com a previsão de probabilidade por categorias de anomalia da precipitação no período de março a maio de 2002. Para cada uma das três categorias é mostrado o mapa com a probabilidade de ocorrência "histórica", gerado a partir da anomalia de precipitação média dos membros (conjunto médio) simulados com condições iniciais de janeiro de 2002 e a respectiva tabela de contingência. O quarto mapa mostra a "previsão reconstruída" seguindo os critérios dados na Tabela 1. Tabela 1- Definição das categorias da previsão reconstruída. As condições são obtidas dos percentuais mostrados nos mapas de probabilidade de ocorrência de cada categoria (tabela de contingência). Condições Categoria Acima da normal > 50 % Acima da normal (A) Próximo da normal > 50 % próximo a Normal (N) Abaixo da normal > 50 % abaixo da normal (B) Abaixo da normal > Acima da normal e acima da normal < 30 % Não Acima da normal (NA) Acima do normal > abaixo da normal e abaixo da normal < 30 % Não abaixo da normal (NB) Nenhuma das condições acima Sem habilidade de previsão A figura 4 é similar a figura anterior, entretanto utiliza-se a anomalia de precipitação de cada membro simulado (conjunto espalhado) com sua respectiva tabela de contingência e calcula-se a média dos valores obtidos da tabela de contingência. Figura 3 - Previsão da probabilidade da categoria de precipitação baseada no conjunto médio dos membros. Mapa "Abaixo da Normal": probabilidade percentual de ocorrer na categoria A. Mapa "Normal": probabilidade percentual de ocorrer na categoria N: Mapa "Acima da Normal": probabilidade percentual de ocorrer na categoria A, Mapa "Rebuilt Previsão reconstruída": Categoria prevista de acordo com os critérios da tabela 1: onde azul é categoria A, verde NB, amarelo N, laranja NA, vermelho B, e cinza indica que o modelo não teve habilidade. 1294

Figura 4 - Previsão da probabilidade da categoria de precipitação baseada no conjunto espalhado dos membros. Mapa "Abaixo da Normal": probabilidade percentual de ocorrer na categoria A. Mapa "Normal": probabilidade percentual de ocorrer na categoria N: Mapa "Acima da Normal": probabilidade percentual de ocorrer na categoria A, Mapa "Rebuilt Previsão reconstruída": Categoria prevista de acordo com os critérios da tabela 1: onde azul é categoria A, verde NB, amarelo N, laranja NA, vermelho B, e cinza indica que o modelo não teve habilidade. A figura 5 mostra a previsão de probabilidade de precipitação para os meses de março a maio de 2002, realizada em fevereiro de 2002, por categorias de ocorrência, com alguns comentários logo após a figura. Esta figura é parte do resultado da interpretação dos produtos gerados pelo modelo. Figura 5 - Previsão de probabilidade por categoria para os meses de fevereiro a maio de 2002, realizada em fevereiro de 2002. A previsão da probabilidade de categoria de chuva derivada do modelo regional para o período de março a maio de 2002, para a região Nordeste do Brasil, executada em fevereiro de 2002 (Figura 5) indica: 50 % de probalidade 1295

de ocorrência da categoria "abaixo da normal" na área em cor caqui, que abrange o Piauí, grande parte do Maranhão e Ceará, o norte da Bahia, o oeste e centro dos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas e Sergipe. 50% para a categoria "acima da normal" na área em verde, que se estende do litoral do Rio Grande do Norte até Sergipe e parte do litoral do Pará e Maranhão; 40% para a categoria "próximo da normal" no litoral do Ceará. As áreas em branco são as regiões onde o modelo não possui habilidade em realizar a previsão. CONCLUSÕES O novo sistema de previsão climática regionalizada utilizando a técnica de "downscaling" dinâmico, implantado na FUNCEME em parceria com o IRI, tem-se mostrado uma ferramenta de grande importância, por fornecer maior detalhamento sobre as características climática encontradas no NEB. O usuário poderá ter acesso mensalmente a previsões através do site www.funceme.br e utilizar-se destas informações em um nível mais compatível com o seu processo de tomada de decisão. BIBLIOGRAFIA Juang, H. M. H., and M. Kanamitsu, 1994: The NCEP nested regional spectral model. Mon.Wea.Ver.,122, 3-26. Juang, H. M. H., and M. Kanamitsu, 1997: The NCEP regional spectral model: An update. Bul. Amer. Met. Society.,78, 2125-2144. Lindzen, R. S., S. Nigam, 1987: On the role of sea surface temperature gradients in forcing low-level winds and convergence in the tropics. J. Atmos. Sci., 44, 2418-2436. Magalhães, A. R., e M. H. Glantz, 1992: Socioeconomic impacts of climate variations and policy responces in Brazil, United Nations Environment Program (UNEP), Secretariat for Planning and Coordination State of Ceara (SEPLAN), Esquel Brasil Foundation, 155 pp. Nobre, P., A. D. Moura, e L. Sun, 2001: Dynamical downscaling of seasonal climate prediction over Nordeste Brazil with ECHAM3 and NCEP's Regional Spectral Models at IRI. Bull. Amer. Meteor. Soc., 82, 2787-2796. Pielke, R. A., W. R. Cotton, R. L. Walko, C. J. Tremback, W. A. Lyons, L. D. Grasso, M. E. Nicholls, M. D. Moran, D. A. Wesley, T. J. Lee, J. H. Copeland, 1992: A comprehensive meteorological modeling system - RAMS. Meteorol. Atmos. Phys., 49, 69-91. Roeckner, E., Arpe, K., Bengtsson, L., Christoph, M., Claussen, M., Dümenil, L., Esch, M., Giorgetta, M., Schlese, U., Schulzweida, U., 1996: The atmospheric general circulation model ECHAM-4: Model description and simulation of present-day climate. Max-Planck- Institute for Meteorology, Hamburg, 218, 90 p. Small, E. E., F. Giorgi, L. C. Sloan, 1999: Regional climate model simulation of precipitation in central Asia: Mean and interannual variability. J. Geophys. Res., 104, 6563-6582. Stern, W., K. Miyakoda, 1995: Feasibility of seasonal forecasts inferred from multiple GCM simulations. J. Climate, 8, 1071-1085. 1296