A produção das fricativas interdentais [ ] e [ ] na fala de brasileiros aprendizes do inglês: implicações ao processo de ensino-aprendizagem

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Transcrição:

na fala de brasileiros aprendizes do inglês: implicações ao processo de ensino-aprendizagem Alessandra Dutra UTFPR - Londrina alessandradutra@utfpr.edu.br Clara Salles Machado Hirche Pedro UENP - Jacarezinho clarahirche@hotmail.com Resumo Neste trabalho investigamos a produção das interdentais da língua inglesa, surda [ ], como em with [ ], e sonora [ ], como em that [ ], de acordo com o contexto: início, meio e final de palavra, a fim de compreender quais são as principais dificuldades que brasileiros aprendizes do inglês têm ao pronunciá-las e por quais fonemas eles as substituem. Em início de palavra, a fricativa interdental surda [ ] representou 66, 67% das ocorrências e o fone [s] 33,33%. Não houve ocorrências de [f] e [t] nesse contexto. Em meio de palavra, houve 75% do fone [ ] e 25% do [s]. Os fones [f] e [t] não foram produzidos nesse contexto. Em final de palavra, houve 66,67% de ocorrências de [ ], 16,67% de [f] e 16,67 de [t]. Não houve a produção de [s] nesse contexto. A fricativa interdental sonora [ ], em início de palavra, foi produzida em 13,33% das ocorrências e o fone [d] em 86,67%. Não houve ocorrência de [t] e [z] nesse contexto. Em meio de palavra, os informantes produziram o fone [t] para a fricativa interdental sonora em 100% dos casos. Palavras-chave: aprendizagem; fonética; fricativas interdentais; produção oral. Abstract This paper analyzes the variation in the production of interdental fricatives by English learners, the voiceless [ ], as in with [ ], and the voiced [ ], as in that [ ], according to three contexts: beginning, middle and end of words to understand which are the main difficulties that Brazilian learners of English have and which phonemes are used to replace the fricatives. In the beginning Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011 171

of word, the voiceless [ ] represented 66, 67% of cases and the phone [s] 33.33%. There were no occurrence of [f] or [t] in this context. In the middle of word, there was 75% of [ ] and 25% of [s]. The phones [f] and [t] were not produced in that context. In final of word, there were 66.67% of occurrences of the voiceless [ ], 16.67% of [f] and 16.67% of [t]. There was no production of [s] in this context. The interdental fricative sound [ ], in the beginning of word, was produced in 13.33% of cases and [d] by 86.67%. There was no occurrence of [t] or [z] in this context. In the middle of word, informants produced the phone [t] for the interdental fricative sound in 100% of cases. Keywords: learning; phonetics; interdental fricatives; oral production. 1. Introdução Aprender língua estrangeira pode caracterizar, para muitos, algo prazeroso. No entanto, outros consideram esse aprendizado um grande desafio, principalmente no que se refere à comunicação oral. Isso ocorre devido às diferenças existentes entre a língua materna do estudante e a estrangeira, às dificuldades em produzir determinados sons, muitas vezes inexistentes na língua nativa, dentre outros aspectos. Nesse sentido, o trabalho com a Fonética e com a Fonologia é fundamental no ensino-aprendizagem de língua estrangeira, principalmente quanto às questões orais. No entanto, alguns problemas surgem quando se fala em pronúncia e oralidade nas salas de aula. Poucos livros didáticos apresentam atividades sobre oralidade e, muitos deles, de modo superficial. Os professores de língua estrangeira se veem desamparados pelos programas de formação, que geralmente não os preparam para abordar conteúdos de Fonética e Fonologia na sala de aula (HIRAWAKA, 2007, p. 4). A falta da prática oral leva muitos alunos, tanto de escolas públicas quanto de particulares, a procurarem o ensino de línguas estrangeiras em escolas de idiomas. Geralmente, é durante a adolescência que muitos pais pagam para os filhos terem um preparo que lhes é garantido por lei gratuitamente. Nessas escolas de idiomas, os jovens têm o primeiro contato com a oralidade efetivamente praticada e com a aprendizagem de sons da língua estrangeira. Porém, em alguns casos, de acordo com Fernandes (2006), muitos alunos 172 Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011

Alessandra Dutra e Clara S. M. H. Pedro também questionam a pronúncia aprendida nas escolas de idiomas, e não só nas escolas públicas. Segundo a autora, tanto o professor da escola pública quanto o professor de escola de idiomas não se sentem totalmente à vontade para ensinar oralidade. Uma das consequências que a falta de preparo para trabalhar com a oralidade pode trazer é causar, nos alunos, desconforto e desestímulo por não conseguirem produzir os sons da língua alvo de modo satisfatório. No caso da aprendizagem da língua inglesa, por exemplo, muitas pessoas têm receio de aprendê-la, muitas vezes pelos sons que não apresentam correspondentes no português e que, por sua vez, são totalmente desconhecidos por eles, causando embaraço na comunicação. As fricativas interdentais surda [ ] e sonora [ ] são dois exemplos. Alunos brasileiros tendem a substituir esses dois fonemas pelos do português que lhes parecem mais próximos dentro da estrutura geral da própria língua. Trevisol (2010), em pesquisa sobre a produção das fricativas interdentais do inglês por antigos e futuros professores brasileiros de Inglês como língua estrangeira, relata que a dificuldade encontrada para a produção do /D/ final pode estar relacionada mais à falta de familiaridade com as palavras do teste realizado do que apenas com as restrições de marcação. Para Reis (2006), os estudantes brasileiros tendem, normalmente, a substituir a fricativa interdental surda [ ] por [s] ou [t], mas também ocorrem casos em que o fonema é substituído por [f], como em three [ ]. A partir das dificuldades de pronúncia observadas na fala de alunos aprendizes do inglês, objetivamos analisar a produção das fricativas interdentais surda [ ] e sonora [ ] de acordo com o contexto: início, meio e final de palavra, por falantes de língua inglesa de três escolas de idiomas da região de Ourinhos, Estado de São Paulo. 2. Metodologia Ao considerarmos a necessidade de estudos que abarquem questões fonéticas e fonológicas, no ensino de línguas, e as dificuldades que os alunos brasileiros apresentam ao produzir determinados fonemas na aquisição da língua inglesa, neste estudo Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011 173

propomos-nos a analisar a produção das fricativas interdentais surda [ ] e sonora [ ] de acordo com os contextos: início, meio e final de palavra, de um grupo de seis estudantes, de modo a identificarmos o emprego desses fonemas e a alternância decorrente desse uso. Esses alunos estavam no nível avançado de inglês, de três escolas de idiomas da região de Ourinhos-SP, Para realizar o trabalho, optamos pela pesquisa de campo, pois a consideramos adequada para abarcar nossos propósitos em elaborar instrumento de coleta de dados, selecionar informantes, entrevistá-los, sistematizar e analisar os dados obtidos. Os passos para elaborarmos este estudo serão descritos a seguir. 2.1. A elaboração do questionário O instrumento de coleta de dados foi dividido em três partes: estilo de fala espontânea, estilo de fala dirigida e estilo de leitura de texto (Apêndice). Buscamos elaborá-lo dessa forma para que os informantes produzissem diferentes estilos de linguagem, que nos permitissem depreender desde a fala espontânea até a fala em contextos mais formais. Adotamos a metodologia de coleta de dados empregada nas pesquisas sociolinguísticas de Labov (1979, p. 79), pois ela permite ao pesquisador coletar os mesmos fenômenos em vários estilos de linguagem. No estilo de fala espontânea, os informantes discorreram, sem serem interrompidos, sobre o motivo que os levou a estudar Inglês. Informaram se conheciam outras línguas, se usavam o inglês profissionalmente e o que gostavam de fazer nos fins de semana, além de também relatarem um momento feliz de suas vidas. Em seguida, a partir de um estilo de fala dirigido, os informantes traduziram, oralmente, sete frases do português para o inglês. Em cada frase há uma ocorrência da fricativa surda ou da sonora. São cinco ocorrências da fricativa sonora, e três estão localizadas em início de palavra: that (duas), they e this; uma no meio do vocábulo: clothes; e duas ocorrências da fricativa surda, ambas no final de palavra: with e seventh. Por fim, em estilo de fala mais cuidadosa, eles realizaram leitura da letra da letra da música All you need is love, dos Beatles, selecionada por conta das ocorrências de uma 174 Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011

Alessandra Dutra e Clara S. M. H. Pedro fricativa surda: nothing, que se repete no texto cinco vezes; e de sete fricativas sonoras, a saber: there, que aparece duas vezes, that, quatro e they, com uma ocorrência na letra da música. 2.2. Os informantes Foram escolhidos seis informantes, quatro homens e duas mulheres, com idades entre 19 e 34 anos. O grupo foi selecionado por apresentar de três a cinco anos de estudo de inglês, considerados de nível avançado. Cada um estudava em uma escola de idiomas diferente, o que foi um ponto interessante para distingui-los, pois cada escola possui um método 1 particular de ensino, ou seja, cada informante aprende a língua de uma maneira diversa. 2.3. As entrevistas A pesquisa foi realizada individualmente e em locais diferentes. Cada pessoa foi ouvida por cerca de dez minutos. A entrevista foi gravada em um Mini Gravador de Voz Digital RR- US511, da marca Panasonic, para garantir qualidade de gravação, necessária à análise dos dados. Nenhum dos informantes foi avisado antecipadamente sobre o assunto da entrevista. Os fonemas em evidência só foram revelados após a entrevista ser gravada. 2.4. Os fonemas selecionados Selecionamos para a análise a fricativa interdental surda / / e a fricativa interdental sonora / / nos contextos: início, meio e final de palavra. O motivo da escolha desses fonemas foi o fato de não existirem na língua materna dos aprendizes e de causarem muitas dificuldades de pronúncia para a maioria dos brasileiros aprendizes do Inglês, conforme verificamos nos resultados das pesquisas de Trevisol (2010), Leitão e Ferreira-Gonçalves (2010) e Reis (2006). 1 Não consideramos em nossa análise o método e/ou abordagem utilizada pelos professores dos informantes. Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011 175

2.5. As transcrições O arquivo sonoro da entrevista foi transcrito pelas pesquisadoras e, por meio de análise perceptual foram elencadas as produções das fricativas surda e sonora. Foram realizadas várias audições a fim de extrair e confirmar os fones produzidos pelos informantes. Os dados foram computados, tabulados e apresentados por meio de porcentagens em tabela. Nenhum dado foi descartado. Neste trabalho, no entanto, decorrente do espaço disponível, não serão apresentados os dados referentes aos estilos de linguagem, somente os pertencentes aos contextos de produção das fricativas interdental surda e sonora: início, meio e final de palavra. 3. Análise e discussão dos dados Nesta seção apresentamos a análise e discussão dos resultados obtidos nas entrevistas com o grupo de informantes. No primeiro momento da entrevista, por ser estilo de conversa espontânea, não houve muitas ocorrências das fricativas interdentais surda e sonora. No estilo de linguagem dirigida (tradução de frases do português para o inglês), percebemos que, em várias situações, os alunos pronunciaram a mesma palavra de maneiras diferentes. Na leitura da letra da música, embora os estudantes possuíssem de três a cinco anos de aprendizado de inglês, tiveram dificuldade em pronunciar palavras como there e nothing, devido aos sons que elas apresentam. Apesar disso, pronunciaram corretamente algumas fricativas [ ] e [ ]. A seguir, serão apresentadas as ocorrências em porcentagens da fricativa interdental surda e, posteriormente, da fricativa interdental sonora. 3.1. A fricativa interdental surda [ ] Segundo Reis (2006) e Trevisol (2010), os estudantes brasileiros tendem, normalmente, a substituir a fricativa interdental surda [ ] por [s] ou [t], mas também ocorrem casos em que o fonema é substituído por [f], como em three [ ]. 176 Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011

Alessandra Dutra e Clara S. M. H. Pedro Conforme mostra a figura 1, a fricativa interdental surda [ ] foi pronunciada 54 vezes pelos informantes, e em 59,26%, ou seja, 32 vezes, produziram o fone [ ]; em 18,52%, dez vezes, empregaram [s]; em 18,52% dos casos, dez vezes, pronunciaram [t] e uma pequena parte, 3,70%, duas vezes, foi produzida como [f]. Assim, a maioria das ocorrências foi reproduzida corretamente. Figura 1. Produção da fricativa interdental surda Os resultados mostram que, embora a maior parte dos falantes de inglês como língua estrangeira pronuncie a fricativa interdental surda, ainda ocorre a substituição desse fonema por [s] e [t], quando não pronunciado corretamente. Na tabela 1, apresentamos os dados dos fones em questão relacionados aos contextos: início, meio e final de palavra. Tabela 1. Porcentagem de ocorrências de trocas do fone [ ] de acordo com a posição na palavra Contexto do fonema [ ] [s] [f] [t] Início de palavra 66,67 33,33 Meio de palavra 75,00 25,00 Final de palavra 66,67 16,67 16,67 Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011 177

Na pesquisa, as palavras mais frequentemente pronunciadas com a fricativa interdental surda foram: with, nothing, seventh e think. No início de palavra, os informantes pronunciaram o fone [ ] em 66,67%% das vezes e [s] em 33,33% das vezes; no meio de palavras, os informantes pronunciaram [ ] em 75% das vezes e [s] em 25% das vezes; por fim, no final de palavras, pronunciaram [ ] em 66,67% das vezes, [f] em 16,67% das vezes e [t] em 16,67% das vezes. É interessante comentar que os informantes substituíram o fone [ ] por [s] somente em início e meio de palavra. Em final de palavra, eles foram substituídos por [f] e [t], inclusive com a mesma porcentagem de ocorrências. Percebemos por meio dos dados coletados que há uma tendência na pronúncia da fricativa interdental surda de ficar levemente mais fácil quando ela se encontra no meio de palavras, por exemplo, em nothing e birthday. Quando o fonema se encontra em início de palavras, como em think, os estudantes podem a pronunciar [s] em vez de [ ]. Talvez isso ocorra pelo fato de que o ruído da fricção produzida durante a articulação da fricativa interdental surda no momento em que o ar passa pela língua, que está posicionada entre os dentes superiores e inferiores, assemelhe-se ao [s] do português e quando a fricativa se encontra em início de palavras, esse som torne-se mais saliente e semelhante a um [s], o que contribuí para que os alunos se confundam um pouco mais. Já em final de palavras, como seventh e with, os informantes alternaram a produção da fricativa interdental surda entre [f] e [t]. Uma possível explicação para essa alternância é o fato de que em português existem algumas palavras e nomes próprios que terminam com o [f] e o [t] mudos. Também em expressões de línguas estrangeiras, mas que costumamos falar, como habitat, Robert, Alif. Alguns nomes, inclusive, terminam com [th] e os pronunciamos com som de [t], como Judith. 3.2. Fricativa interdental sonora [ ] Igualmente à fricativa interdental surda, a sonora também pode sofrer algumas alternações de pronúncia e ser substituída por [d]. Na 178 Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011

Alessandra Dutra e Clara S. M. H. Pedro pesquisa de Leitão e Ferreira-Gonçalves (2010), com base nos dados recolhidos das produções orais de aprendizes brasileiros de Inglês como L2, em estágios intermediários da aquisição, as estratégias de reparo mais recorrentes são a substituição da fricativa interdental desvozeada /ө/ pelo segmento [t] e da fricativa interdental vozeada /ð/ pelo segmento [d]. Conforme reportado na figura 2, a fricativa interdental sonora foi pronunciada 86 vezes e em apenas 11,63% das ocorrências ela foi pronunciada com o fone [ ]. Na maioria das vezes, em 81,40% das vezes, a fricativa sonora foi produzida como [d]; e em 6,97%, como [t]. Nenhum dos informantes empregou o [z] em substituição a esse fonema. Figura 2. Produção da fricativa sonora Percebemos que os informantes produziram corretamente apenas 11,63% das vozeadas contra 59,26% das surdas, o que corrobora os achados de Reis (2006) e Trevisol (2010). Portanto, a pronúncia da fricativa interdental sonora deveria ser mais frequentemente trabalhada pelos professores de inglês. Da mesma forma, a pronúncia alternada da fricativa interdental surda pode mudar totalmente o significado de uma palavra. E isso pode ocorrer se modificarmos a pronúncia da fricativa interdental sonora. Alguns exemplos: a palavra those [ ], que significa esses/as, Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011 179

pronunciada com [d] transforma-se em dose [ ], que significa medicar ou dosar. Se unirmos duas variações em uma palavra, that [ ] [ æ ], aquilo, transforma-se em dad [ æ ], papai, se variarmos o [ ] pelo [d] e o [t] pelo [d]. Na tabela 2, apresentamos os dados das realizações da fricativa interdental sonora pelos informantes em início e meio de palavra. Para as sonoras, não há contexto final de palavra. Tabela 2. Porcentagem de ocorrências de trocas do fone [ ] de acordo com a posição na palavra Contexto do fonema [ ] [d] [t] [z] Início de palavra 13,33 86,67 Meio de palavra 100,00 Na tabela 2, notamos que as palavras com a fricativa interdental sonora mais frequentemente pronunciada foram: there, that, the, they, clothes, pronunciadas pelos informantes com o fone [ ] 13,33% das vezes em que se encontrava no início de palavras. Quanto ao fone encontrado no meio de palavras, os informantes pronunciaram [t] em 100% das vezes. Isso se deve ao fato de que havia apenas um vocábulo com a interdental sonora em meio de palavra. Percebemos, por meio dos dados coletados que, na maioria das vezes, os estudantes substituíram o fone [ ] por [d] em início de palavras, 86,67%, que de fato é o fone da língua portuguesa que mais se assemelha com a fricativa interdental sonora da língua inglesa. Foi somente na palavra clothes que os estudantes variaram o fone [ ] para outro que não fosse [d] e o pronunciaram como [t]. Esse fato pode ter ocorrido porque o fone se encontra em meio da palavra e não em início, conforme acontece nos demais vocábulos. Há também o fato de eles não terem pronunciado a vogal [e] que sucede o fone [ ], dessonorizando o [d] e formando um fone mudo [t] sucedido de [s]. Novamente verificamos a necessidade de os professores de línguas realizarema prática oral e usarem o auxílio do alfabeto fonético para que os alunos reconheçam os sons e saibam distingui-los no ato da comunicação. Muitas vezes o aluno tem dificuldade em saber a 180 Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011

Alessandra Dutra e Clara S. M. H. Pedro pronúncia dessa ou daquela palavra do dicionário por não conhecer os símbolos que representam tais sons. O trabalho com os símbolos auxiliaria os aprendizes a desenvolverem mais autonomia na aquisição da língua-alvo, pois eles próprios reconheceriam a pronúncia das palavras buscadas e poderiam empregá-las com mais propriedade no ato da comunicação. 4. Considerações finais O objetivo da pesquisa foi analisar a pronúncia de dois fenômenos de variação da língua inglesa, as fricativas interdentais surda / / e sonora / / de acordo com os contextos: início, meio e final de palavra produzidas por seis estudantes de três escolas de idiomas da região de Ourinhos, Estado de São Paulo. Ao analisarmos o uso da fricativa interdental surda por nossos informantes, notamos que, apesar de a pronunciarem corretamente [ ] na maioria das vezes, eles também a pronunciaram como [s], 33,33%, em início de palavra; como [f], 16,67%, em final de palavra e como [t], também 16,67% em final de palavra. A produção correta da fricativa interdental sonora [ ] apresentou baixa ocorrência nesta pesquisa, 13,33%, em início de palavras. Os informantes substituíram o fone [ ] por [d] nesse contexto, em 86,67%. Isso pode dever-se à semelhança desse fonema do inglês com o fonema [d] do português. Essa alternância ocorreu, na maioria das vezes, em posição inicial de palavra. Em meio de palavras, os informantes pronunciaram [t] em substituição a [ ] em 100% das vezes. Havia apenas um vocábulo com a interdental sonora nesse contexto. A alternância do emprego dos fonemas interdentais mostradas nessa análise pode interferir na comunicação oral dos aprendizes. Por exemplo, na proficiência em uma situação de comunicação oral formal, no caso de uma entrevista de emprego, em que o indivíduo precisa mostrar com eficiência seu conhecimento oral do idioma. Chegamos à conclusão de que os professores devem trabalhar mais aspectos de pronúncia em sala de aula. Para isso, podem utilizar Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011 181

várias metodologias e também vários recursos: cantar músicas, recitar poemas, promover diálogos entre os estudantes, ouvir algumas canções, entre muitas outras atividades. Embora este estudo tenha apresentado muitas limitações, como poucos participantes e corpus pequeno, esperamos contribuir para pesquisas futuras sobre a pronúncia das fricativas interdentais surda e sonora da língua inglesa. Assim, esperamos reafirmar a importância de se trabalhar a oralidade com os estudantes em sala de aula, de modo a reconhecer esse grande desafio do ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras. Referências FERNANDES, Claudia Sousa. Representações e construção da identidade do professor de inglês. 2006. 119f. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo. HIRAKAWA, Daniela Akie. A fonética e o ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras: teorias e práticas. 2007. 235f. Dissertação (Mestrado em Língua e Literatura Francesa) Universidade de São Paulo, São Paulo. LABOV, William. Sociolinguistic University of Pennsylvania Press, 1972. patterns. Philadelphia, PA.: LEITÃO, Emília Lorentz de Carvalho; FERREIRA-GONÇALVES, Giovana. O papel do léxico na aquisição das fricativas interdentais do inglês: uma abordagem via Teoria da Otimidade Conexionista. Letrônica, Porto Alegre v.3, n.1, p.171, julho 2010. REIS, Maria Sílvia (2006). The perception and production of English interdental fricatives by Brazilian EFL Learners. Dissertação (Mestrado em Letras/Inglês e Literatura Correspondente) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. 182 Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011

Alessandra Dutra e Clara S. M. H. Pedro TREVISOL, Juliane Regina. The production of the English Interdental Fricatives by Brazilian former and future EFL Teachers. 2010.139f. Dissertação (Mestrado em Letras/Inglês e Literatura Correspondente) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2010. Apêndice: instrumento de coleta de dados 1. Identificação a. Informante: b. Sexo: c. Idade: d. Escolaridade: e. Profissão: f. Há quanto tempo estuda ou estudou inglês: 2. Fala espontânea Fazer as apresentações; Perguntar por que decidiu estudar inglês; Se conhece outras línguas além do inglês; Se usa o inglês profissionalmente; O que gosta de fazer nos momentos de lazer; Falar um momento feliz de sua vida. 3. Estilo de fala dirigida - traduzir para o inglês a. Eu moro com meus pais. b. Onde está aquela camiseta? c. Eles são meus amigos. d. Moro no sétimo andar. e. Gosto de dirigir este carro. f. Eles pensam em comer naquele restaurante. g. Aquelas são minhas roupas. 4. Leitura da letra da música All you need is love (The Beatles) There s nothing you can do that can t be done Nothing you can sing that can t be sung Nothing you can say, Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011 183

but you can learn how they play the game It s easy There s nothing you can make that can t be made No one you can save that can t be saved Nothing you can do, but you can learn how to be you in time It s easy All you need is love Recebido em: 28/09/2011 Aceito em: 16/10/2012 Title: The production of the interdental fricatives [ ] e [ ] by Brazilian learners of English: implications to the teaching-learning process 184 Horizontes de Linguística Aplicada, ano 10, n. 2, jul./dez. 2011