ESTUDO DA APLICAÇÃO DE RESÍDUO GERADO EM TRATAMENTO DE EFLUENTE COMO COGERADOR DE ENERGIA

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Transcrição:

ESTUDO DA APLICAÇÃO DE RESÍDUO GERADO EM TRATAMENTO DE EFLUENTE COMO COGERADOR DE ENERGIA Weverton Campos Nozela 1 Doutorando em química pela Unesp de Araraquara e Coordenador da Unidade de Tratamento do Departamento Autônomo de Água e Esgotos de Araraquara. Renata Lombardi Mestre em microbiologia pela Unesp de Jaboticabal e Gerente do Tratamento de Esgoto do Departamento Autônomo de Água e Esgotos de Araraquara. Ilma Rosa dos Santos Bacharel em química pela UFSCar e Coordenadora da Unidade de Laboratório de Análises do Departamento Autônomo de Água e Esgotos de Araraquara. Endereço (1) : Rua Domingos Barbieri, 100 - Fonte - Araraquara - SP - CEP: 14802-510 - Brasil - Tel: +55 (16) 3324-9582 - e-mail: ute@daaeararaquara.com.br. RESUMO Fontes não-renováveis de energia causam grandes impactos ambientais como o aquecimento global, além disso são finitas e tendem a se esgotar, entretanto, por conta deste cenário a busca por fontes renováveis de energia como solução alternativa têm sido amplamente estudadas nos últimos anos. As biomassas são matérias primas com excelente potencial para novas matrizes energéticas e os resíduos gerados nos processos de tratamento de esgoto também se apresentam como boa opção para reaproveitamento energético, impulsionados pela Política Nacional de Resíduos Sólidos, que evidencia sua recuperação energética. O município de Araraquara/SP destaca-se no cenário nacional por possuir um sistema moderno de desaguamento e secagem térmica de lodo de esgoto. Nesse trabalho caracterizou-se o resíduo proveniente da Estação de Tratamento de Esgoto de Araraquara, após processo de desaguamento e secagem térmica, além de realização de testes de produção biológica de H 2 com lodo anaeróbio proveniente das lagoas de sedimentação. Os resultados obtidos com esses resíduos de elevados teores de matéria orgânica, poder calorífico e geração de H 2 abrem novas possibilidades de sua aplicação como potencial para geração de energia limpa e renovável. ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 1

Palavras-chave: Lodo de esgoto, Gás Hidrogênio, Poder Calorífico. INTRODUÇÃO/OBJETIVOS A instabilidade do sistema energético brasileiro vem sendo motivo de grandes discussões. A maior parte da energia elétrica gerada no país tem origem nas usinas hidrelétricas e na escassez de chuvas as usinas termelétricas são acionadas, o que proporciona um aumento no seu preço final. Neste contexto, o país mostrou ser muito dependente deste setor, sendo necessário investimento e exploração de outras matrizes energéticas, como a solar, eólica, biomassa entre outras. A Tabela 1 apresenta a repartição da oferta interna de energia no Brasil, por fontes de energia. Tabela 1. Repartição da oferta interna de energia. Renovável 42,4% Não Renovável 57,6% Biomassa de cana 15,4% Gás natural 11,5% Hidráulica e eletricidade 13,8% Petróleo e derivados 39,2% Lenha e carvão vegetal 9,1% Carvão mineral 5,4% Lixívia e outras renováveis 4,1% Urânio 1,5% FONTE: (BRASIL, 2013) Biomassa é o termo utilizado para designar todo material derivado de vegetais cuja composição se trata de uma estrutura lignocelulósica capaz de estocar a energia dos raios solares na forma de ligações químicas (McKENDRY, 2002). Tabela 2: Poder Calorífico Superior para alguns combustíveis e biomassas. Combustível/Biomassa Poder Calorífico Superior/MJkg -1 Gás Hidrogênio 141,86 Gás Metano 55,53 GLP 49,12 Briquete 18,91 Bagaço de cana 15,47 Lodo de esgoto 11-23 1 Briquete de resíduo de madeira misturado com casca de arroz FONTE: (ANDREOLI, 2001; QUIRINO et al, 2004) ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 2

O poder calorífico é avaliado quando o combustível atinge a combustão completa (carbono é convertido em dióxido de carbono (CO 2 ) e hidrogênio convertido em água (H 2 O) em uma temperatura de 18ºC ou 25ºC e 760 mmhg de pressão (HILSDORF et al., 2004). O lodo de esgoto apresenta característica, quanto ao poder calorífico, compatível com o bagaço de cana, biomassa usualmente conhecida como fonte energética, conforme dados apresentados na Tabela 2, e seu reaproveitamento torna-se interessante por ser um resíduo que tende a aumentar com o crescimento populacional e com grandes impactos ambientais se mal destinado. O município de Araraquara/SP conta com um moderno sistema de secagem de lodo. Após o processo de tratamento de esgoto (lagoa de aeração seguido de lagoa de sedimentação), o resíduo gerado no sistema é dragado da lagoa de sedimentação e enviado para a etapa de desaguamento de lodo, com auxílio de soluções de cloreto férrico e poliacrilamidas, posteriormente o material sólido é recalcado a uma centrífuga à alta rotação e adição de solução de poliacrilamidas favorecendo o processo de separação sólido-líquido. Em seguida a parte sólida, ainda com umidade, denominada torta, é enviada a um secador rotativo aquecido com ar à 300 C proveniente de uma fornalha abastecida com GLP (Gás Liquefeito de Petróleo) para desidratar fortemente esse material. Ao final do processo o resíduo seco, classificado segundo a NRB 10.004/2004 como classe II-A - não perigoso e não inerte - é encaminhado ao aterro sanitário do município de Guatapará/SP, licenciado para codisposição deste resíduo de acordo com a CETESB (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental). O objetivo deste trabalho foi avaliar a aplicação de resíduo gerado no processo de tratamento de esgoto sanitário da cidade de Araraquara, como cogerador de energia. METODOLOGIA RETIRADA E PREPARAÇÃO DA AMOSTRA As amostras de estudo foram obtidas de uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) do município de Araraquara. Foi retirada uma amostra de lodo após processo de tratamento térmico (lodo inertizado) e posteriormente foi submetida a secagem em estufa a 105 C por 24 horas, triturada, peneirada em peneira ASTM/ABNT (Mesh 60) com abertura de 250 µm e quarteada, dividindo a amostra em quatro partes iguais pré-homogeneizada, sendo tomada duas partes opostas entre si para constituir uma nova amostra e descartadas as partes restantes. As partes não descartadas são totalmente misturadas e o processo de quarteamento é repetido até que se obtenha o volume desejado segundo a NBR 10.007/2004. ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 3

Foi retirada uma amostra de lodo in natura (anaeróbio) proveniente da lagoa de sedimentação para testar o potencial de geração de gás hidrogênio. TERMOGRAVIMETRIA (TG) E ANÁLISE TÉRMICA DIFERENCIAL (DTA) As curvas termogravimétricas (TG) e de análise térmica diferencial (DTA) foram obtidas em um módulo de análise térmica simultânea SDT-2960, Simultaneous DTA-TGA do fabricante TA Instruments, cujo equipamento é capaz de operar nas faixas de temperatura ambiente até 1500 ºC. Os termopares para amostra e referência são de Pt-Pt/Rh 13%, sensibilidade T (DTA) de 0,001ºC. A sensibilidade da balança é de 0,1 μg, precisão de ± 1 % e capacidade de massa de 200 mg (350 mg incluindo os cadinhos). Os cadinhos utilizados foram de alumina e o material de referência empregado foi α-alumina. O sistema foi calibrado com relação ao peso TGA, linha base DTA e temperatura, utilizando-se para tanto de Índio de alta pureza. Pesou-se aproximadamente 7 mg da amostra. Essa amostra foi submetida a uma razão de aquecimento de 10ºCmin -1, em atmosfera dinâmica de ar sintético, com fluxo de gás de 100 mlmin -1. As temperaturas inicial e final foram, respectivamente, 30ºC e 1000ºC. ANÁLISE ELEMENTAR Os elementos básicos de qualquer biomassa são carbono, hidrogênio, enxofre, nitrogênio e oxigênio. Para essa análise foi utilizada aproximadamente 2,0 mg da amostra em um analisador elementar da marca CE Instruments, modelo EA 1110 CHNS-O sendo a porcentagem de oxigênio determinada por diferença levando em consideração a umidade e as cinzas obtidas pelas curvas TG. CALORIMETRIA O Poder Calorífico Superior (PCS) Experimental da amostra foi medido, em duplicata, através de uma bomba calorimétrica modelo IKA C 2000 de acordo com as normas ASTM E7 e NBR 8633. Carbono, nitrogênio e oxigênio são os principais componentes dos combustíveis sólidos. Carbono e oxigênio reagem durante a combustão em uma reação exotérmica, gerando CO 2 e H 2 O. Assim C e O contribui para o PCS que é a indicação da quantidade de energia contida em um combustível, que ao ser submetido em um processo termoquímico pode ser convertida em calor. Após a determinação do PCS Experimental da amostra foi comparado com o PCS Teórico calculado de acordo com a Equação Modificada de Dulong (Equação 1) usando os valores obtidos para carbono, hidrogênio e oxigênio na Análise Elementar (HILSDORF et. al., 2004). ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 4

AVALIAÇÃO DA GERAÇÃO DE GÁS HIDROGÊNIO EM REATORES ANAERÓBIOS EM BATELADA À amostra (5mL) do lodo anaeróbio foi adicionada, em reatores anaeróbios em batelada, 50 ml de meio de cultivo PYG (Glicose 10.000 mgl -1, Extrato de levedura 5.000 mgl -1, Extrato de Carne 5.000 mgl -1 e Peptona de Carne 5.000 mgl -1 ), headspace preenchido com N 2 (100%), ph 5,5. O procedimento foi realizado com auxílio de seringas estéreis. As amostras foram incubadas a 37 C. Para a determinação do gás hidrogênio foram efetuadas leituras, em reatores pressurizados, por meio da retirada de 1,0 ml de amostra da fase gasosa, utilizando seringa gastight com trava. Foi utilizado cromatógrafo a gás, Thermo Trace GC Ultra, equipado com injetor split/splitess, detector de condutividade térmica (TCD) e detector de ionização por chama (FID). Foram utilizadas duas colunas analíticas Carboxen 1006 plot 30 m x 0,53 mm i.d. e Rt-MSieve 5A 30 m x 0,53 mm i.d. As condições utilizadas foram as seguintes: Injetor e detector TCD a 150 C; detector FID a 250 C. Programação de temperatura do forno: 50 C (4,5 min), seguido de aquecimento a 40 C/min até 180 C (1,5 min) e resfriamento a 50 C/min até 50 C (3,15 min). Gás de arraste: argônio a 1,5 mlmin -1 e fluxo de split a 60 mlmin -1. Foram realizadas análises da geração de gás hidrogênio, por cromatografia gasosa, no headspace dos reatores anaeróbios, após 72 h de operação. PRÉ-TRATAMENTO DO INÓCULO CHOQUE TÉRMICO No inóculo reativado foi aplicado pré-tratamento a quente, de acordo com Maintinguer et al. (2008) adaptado de Kim et al. (2006), com o objetivo de inibir o crescimento e desenvolvimento de bactérias consumidoras de gás hidrogênio e favorecer o enriquecimento celular. Alíquota de 100 ml de inóculo reativado foi colocada em Becker. O material foi levado para aquecimento a 100ºC, durante 10 minutos, em agitação constante para promover a homogeneidade térmica em todo volume aquecido. A amostra foi imersa em banho de gelo e monitorada até atingir a temperatura de 25ºC. Alíquotas dessa amostra foram reativadas em meio de cultivo PYG e ph 5,5, conforme descrito anteriormente, objetivando a reativação celular de bactérias produtoras de gás hidrogênio. O ensaio foi mantido a 37 C. Após 168 h de operação foram realizadas novas medidas no headspace dos reatores anaeróbios, por cromatografia gasosa. ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 5

RESULTADOS TERMOGRAVIMETRIA (TG) E ANÁLISE TÉRMICA DIFERENCIAL (DTA) A Figura 1 ilustra as curvas TG, DTG e DTA e a Tabela 3 apresenta os resultados obtidos para a amostra em atmosfera de ar sintético. Figura 1. Curvas TG, DTG e DTA. Tabela 3. Resultados obtidos pelas curvas TG/DTG e DTA. Temperatura/ºC m/% Evento de decomposição Pico DTA 121 2,8* Desidratação Endotérmico 121 554 45,0 Combustão da material orgânica Exotérmico 554 900 1,8 Decomposição de carbonatos Endotérmico Acima de 900 50,4* Cinzas - * valores utilizados na Análise Elementar ANÁLISE ELEMENTAR A análise elementar mostrou que a amostra apresenta maior porcentagem de carbono (28,1%), haja visto que o carbono é a base da matéria orgânica, dado confirmado também pela TG, seguido de oxigênio (10,4%), hidrogênio (4,1%), nitrogênio (3,3%), enxofre (0,9%) além de cinzas (50,4%) e umidade (2,8%). ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 6

*dados obtidos na TG Figura 2 Resultados obtidos na Análise Elementar CALORIMETRIA Os resultados do PCS Teórico, obtidos a partir da Equação modificada de Dulong (Equação 1) e PCS Experimental são 13,65 MJkg -1 e 12,12 ± 0,1061 MJkg -1, respectivamente. AVALIAÇÃO DA GERAÇÃO DE GÁS HIDROGÊNIO EM REATORES ANAERÓBIOS EM BATELADA Foi verificado geração de H 2 (96% de headspace) e CH 4 (0,80% de headspace) após 72 h de operação nos reatores anaeróbios incubados em ph 5,5. A Figura 3 apresenta os dados referentes as porcentagens de headspace para a geração de gás hidrogênio e metano antes e após o tratamento térmico. DISCUSSÃO Figura 3. Geração de Gás Hidrogênio. TERMOGRAVIMETRIA (TG) E ANÁLISE TÉRMICA DIFERENCIAL (DTA) ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 7

As curvas TG, DTG e DTA (Figura 1) apresentam uma perda de massa de 2,8% referente à desidratação em 121 C, confirmada pelo primeiro pico endotérmico da curva DTA. Após essa temperatura observa-se a ocorrência de três eventos sucessivos até 554 C com uma perda de massa de 45% atribuído a degradação da matéria orgânica, na seguinte sequência: moléculas orgânicas menores como monômeros de lignina (BOTERO, 2008), compostos fenólicos e carboidratos (SHEPPARD; FORGERON, 1987), por fim compostos lignocelulósicos presentes na matéria orgânica (ALMEIDA et al., 2008). Estes eventos foram acompanhados por picos exotérmicos da curva DTA, o que comprova a combustão da matéria orgânica presente na amostra. A partir de 554ºC, pode-se observar a ocorrência de um pequeno evento, provavelmente, referente à decomposição de carbonatos existentes na amostra, cuja perda de massa corresponde a 1,8 %. Capana (2009) obteve em suas pesquisas comportamento térmico semelhante, porém, com algumas variações nas porcentagens de perdas de massas, indicando semelhança na composição de umidade, matéria orgânica, carbonatos e cinzas. Na hipótese de se reutilizar este resíduo seco e inerte para geração de energia, uma redução na granulométrica do mesmo é prevista, gerando uma economia financeira com transporte até um aterro sanitário proporcional a redução da perda de massa. ANÁLISE ELEMENTAR A Figura 2 apresenta a composição elementar. Os teores de umidade e cinzas foram retirados da TG. A maior porcentagem de carbono está associada ao elevado teor de matéria orgânica. Borges et.al. (2008) em seu trabalho com lodo sanitário da cidade de São Bento do Sul/SC encontraram teor de carbono de 27,5%, Pedroza et. al. (2011) determinaram teores de carbono, hidrogênio, nitrogênio de 27%, 4,4% e 3,6%, respectivamente, porém com amostras provenientes de tratamento anaeróbio de efluente. Segundo Malta (2001), o teor de nitrogênio deve ser de 0,5 a 7,6% para lodos sanitários gerados a partir de digestão aeróbia. O teor de enxofre de 0,9% é pouco superior ao encontrado por Vieira Neto (2012) que foi de 0,68% para lodo sanitário aeróbio. CALORIMETRIA O PCS Experimental foi 12,12 MJkg -1, relativamente próximo ao PCS Teórico e compatível com a literatura. O PCS encontrado por Borges et. al.(2008) foi de 20,1 MJkg -1, esta diferença pode estar ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 8

relacionada com degradação do lodo do presente estudo, pois o mesmo já possui um tempo de vida mais avançado. O reaproveitamento do lodo, seco e inerte, como fonte de energia, pode gerar uma economia financeira no consumo de GLP, da ordem de 25% comparando-se os PCS s da amostra (12,12MJkg -1 ) com do GLP (48 MJkg -1 de amostra). AVALIAÇÃO DA GERAÇÃO DE GÁS HIDROGÊNIO EM REATORES ANAERÓBIOS EM BATELADA As gerações de H 2 foram elevadas para a amostra analisada, entretanto, verificou-se também geração de gás metano, para essa condição. A geração de CH 4 está associada ao crescimento de microrganismos metanogênicos que podem utilizar H 2 para a formação de metano. Após o tratamento térmico verificou-se a ausência de CH 4 e presença de H 2 (90% de headspace). Kim e Kim (2011) obtiveram gerações de H 2 (v/v) inferiores ao presente trabalho, com culturas de bactérias anaeróbias provenientes de águas residuais do processamento de tofu. Esse inóculo foi pré-tratado a quente (90ºC, durante 15 minutos) para inativar os consumidores de H 2. Foi realizada a operação de reator CSTR (5L) contendo glicose (10g DQOL -1 ), ph 5.5, a 60ºC e tempo de retenção hidráulica (TRH) de 12 h. A geração de H 2 foi de 46±2%; não sendo detectado metano (CH 4 ). Sá et al. (2013) estudaram a produção biológica de hidrogênio com lodo anaeróbio (10440,0 mg SSVL -1 ) do Sistema de tratamento de esgoto do município do Rio de Janeiro, Brasil. Primeiramente, os autores (op. cit.) efetuaram pré-tratamentos do inóculo: ácido (ph 2,0 durante 1 h), alcalino (ph 12 por 1 h) e a quente (120ºC por 1 h). Triplicatas de reatores anaeróbios em batelada foram incubados com os inóculos pré-tratados, alimentados com sacarose (10 gl -1 ) e solução traço de metais, a 35ºC, ph 5,5 durante 120 h, sob agitação de 100 rpm. Todos os pré-tratamentos foram eficazes para geração de H 2 e inibição da metanogênese. Entretanto os melhores resultados foram verificados para o inóculo pré-tratado a quente (4,62 mol H 2 /mol sacarose), em 72 h de operação, como verificado no presente trabalho. O gás hidrogênio pode ser usado como combustível, substituindo o GLP usado no processo local, visto que é quase 3 vezes mais energético, conforme Tabela 1, além de ser considerado uma fonte de energia limpa, pois deixa como resíduo a água. ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 9

CONCLUSÃO O resíduo gerado no processo de tratamento da ETE Araraquara é formado principalmente por matéria orgânica (45%) e apresenta uma estabilidade térmica até 121ºC. Com um potencial energético de 12,12 MJkg -1, mostra-se compatível com as principais biomassas já usada para esta finalidade, sendo possível sua utilização preferencialmente no processo de secagem térmica na própria ETE reduzindo o consumo de combustível fóssil, além de reduzir o tamanho granulométrico, importando em menor custo com transporte. O lodo de esgoto (in natura) pode ser usado como uma fonte alternativa de energia, pois possui consórcio de bactérias geradoras de gás hidrogênio, uma vez que este gás é mais energético que combustíveis provenientes de hidrocarbonetos, além de ser considerada uma fonte de energia limpa, podendo abrir novas possibilidades de sua aplicação em pesquisas futuras. As análises de TG e Análise Elementar ajudaram na obtenção do PCS Teórico e está de acordo com o PCS Experimental. A amostra apresenta um potencial energético o qual possibilita sua utilização como fonte de energia na própria ETE Araraquara no processo de desaguamento e secagem térmica do lodo. O uso do recurso energético ajudará na redução do consumo do combustível fóssil usado no sistema de aquecimento do secador rotativo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, S.; CRESPI, M. S.; LIMA, E. N.; SCHALCH, V. Determination of organic matter present in urban waste residue from a sanitary landfill using thermogravimetric curves: the case of São Carlos. HOLOS Environment, v. 8, n. 1, p. 88-99, 2008. EROL, M.; HAYKIRI-ACIMA, H.; KÜCÜKBAYRAK, S. Calorific value estimation of biomass from their proximate analyses. Renewable Energy, v. 35, n. 1, p. 170-173, 2010. MAINTINGUER, S. I.; FERNANDES, B. S.; DUARTE, I. C.; SAAVEDRA, N. K.; ADORNO, M. T.; VARESCHE. M. B. Fermentative hydrogen production by microbial consortium. International Journal of Hydrogen Energy, v. 33, p. 4309-4317, 2008. QUIRINO, W. F.; VALE, A. T.; ANDRADE, A. P. A.; ABREU, V. L. S.; AZEVEDO, A. C. S. Calorific value of wood and wood residues. Biomassa & Energia, v. 1, n. 2, p. 173-182, 2004. SÁ L R V, CAMMAROTA M C, OLIVEIRA T C, OLIVEIRA E M M, MATOS A, FERREIRA-LEITÃO V S. Pentoses, hexoses and glycerin as substrates for biohydrogen production: an approach for Brazilian biofuel integration. Int J Hydrogen Energy. 2013; 38: 2986-2997. ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 10