Artigo original PREVALÊNCIA DAS PARASITOSES INTESTINAIS NO MUNICÍPIO DE IBIASSUCÊ BAHIA PREVALENCE OF INTESTINAL PARASITES IN THE CITY OF IBIASSUCÊ - BAHIA Márcio Alves de Matos*, Zoraide Vieira Cruz Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) BA Endereço para correspondência* marcioibce@yahoo.com.br RESUMO Entre as doenças que estão relacionadas às condições ambientais, sócio-econômicas e culturais de uma população estão as enteroparasitoses, que são responsáveis pela diminuição da qualidade de vida, grandes perdas econômicas e debilitação do organismo e podem indicar as condições sanitárias e de educação para a saúde de um grupo de indivíduos. Desta forma, este estudo teve como objetivo investigar no município de Ibiassucê - Bahia, com dados referentes ao ano de 2008, a prevalência de enteroparasitos relacionando-os com a idade, gênero e localidade onde os pacientes residem. A coleta dos dados se deu pela análise dos registros do Laboratório de Análises Clínicas do Hospital Municipal São Sebastião. Foram analisados 1.658 exames parasitológicos de fezes, apresentando 41,16% de positividade, principalmente em crianças, que representam 46,42% dos pacientes na faixa etária entre 6 e 10 anos. O sexo feminino apresentou maior prevalência de enteroparasitoses (42,37%) contra 39,13% com indivíduos do sexo masculino. Os indivíduos residentes na zona rural apresentaram maior prevalência de enteroparasitoses (42,09%) contra 39,71% dos indivíduos residentes na zona urbana. O protozoário comensal Escherichia coli foi o mais frequente com 54,42% entre os pacientes infectados. Estes números acusam que as condições de saneamento ambiental e de educação para a saúde no município de Ibiassucê não estão nos padrões ideais, favorecendo, assim, a contaminação pelos enteroparasitos. Palavras-chave: Parasitoses Intestinais, Inquérito Parasitológico, Saneamento Ambiental, Saúde Pública. ABSTRACT Between the diseases that are related to environmental conditions, socio-economic and cultural needs of a population are intestinal parasites which are responsible for diminished quality of life, severe economic loses and weakening of the had and can indicate the health and public health education a group of individuals. Thus, this study aimed to investigate the city of Ibiassucê - Bahia, with data for the year 2008, the prevalence of parasitic diseases relating with the age, gender and location where patients reside. The collection was done through analysis of registers of the Clinical Laboratory, Hospital Municipal São Sebastião. We analyzed 1,658 stool examinations remained, with 41.16% positivity, especially in children, representing 46.42% of patients aged between 6 and 10 years. Women had higher prevalence of intestinal parasites (42.37%) against 39.13% for men. Individuals residing in rural areas had higher prevalence of intestinal parasites (42.09%) against 39.71% of individuals residing in urban areas. The protozoan commensal Escherichia coli was the most frequent with 54.42% among infected patients. These figures have accused the environmental sanitation conditions and health education in the municipality of Ibiassucê patterns are not ideal, thus favoring contamination with intestinal parasites. Keywords: Intestinal Parasites, Parasitological Survey, Environmental Sanitation, Public Health. 64
INTRODUÇÃO O momento em que o homem passou do hábito nômade para a vida sedentária, em habitações fixas, foi um marco decisivo no avanço da qualidade de vida (Malta, 2005). A saúde pública teve seu início quando os homens, no seu hábito sedentário, vivendo em comunidade resultavam perigos especiais para a saúde dos indivíduos e foi descobrindo, consciente e inconscientemente, meios de reduzir e evitar esses perigos. Em contrapartida, o hábito sedentário trouxe algumas influências negativas como as relacionadas com as enteroparasitoses (Heller, 1997). Do ponto de vista social, as enteroparasitoses representam um grave problema de saúde pública. Elas são responsáveis pela diminuição da qualidade de vida da população causando grandes perdas econômicas, diminuição de sua produtividade, dificuldade de aprendizado, prejuízo da função de alguns órgãos vitais, além de contribuir para o aumento da desnutrição (Malta, 2005). O grau de insalubridade do meio, o nível e extensão do saneamento básico de uma região, bem como os hábitos de higiene da população podem ser mensurados pelo estudo epidemiológico das infecções parasitárias (Santos et al, 2003), sendo observadas com maior frequência nas classes salariais mais baixas e com menor grau de escolaridade (MACEDO et al, 2005). Uma alta prevalência de enteroparasitoses em estudantes, o que permitiu avaliar as más condições de higiene, aliadas a uma precária situação sócio-econômica (De Carli et al, 1989). Na Bahia, através de análises documentais em 2001, as doenças infecciosas e parasitárias respondiam por 10,0% dos óbitos de crianças menores de um ano e considera que essa taxa ainda é elevada devido às condições demográficas, sociais e econômicas (Guimarães, 2004). Para considerações como esta, três fatores, a clássica tríade epidemiológica das doenças parasitárias, são indispensáveis para que ocorra a infecção: as condições do hospedeiro, o parasito e o meio ambiente, (Frei et al, 2008). Objetivou-se nesta pesquisa realizar um inquérito coprológico em uma amostra da população do município de Ibiassucê, situado no sudoeste da Bahia, através de dados registrados no Laboratório de Análises Clínicas do Hospital Municipal São Sebastião (HMSS), localizado no referido município, procurando identificar os principais enteroparasitos e sua relação com a idade, gênero e localidade onde os pacientes residem, levantando dados visando subsidiar a elaboração de ações 65
políticas pautadas na ética e na sustentabilidade, atuando tanto na profilaxia através de ações educativas como no tratamento das parasitoses. MATERIAIS E MÉTODOS O presente estudo foi realizado no município de Ibiassucê, localizado na região sudoeste do Estado da Bahia, com população de 9.507 habitantes (IBGE, 2007) no período de Janeiro de 2008 a Dezembro de 2008. Os métodos empregados para o exame parasitológico das fezes, no Laboratório de Análises Clínicas do HMSS, foram os de sedimentação espontânea e o método de Baermann. Este, no entanto, somente foi aplicado quando havia suspeita de que o paciente estivesse infectado com Strongyloides stercoralis. Todos os pacientes residentes no município de Ibiassucê, independente da idade ou sexo, residentes na zona urbana ou rural foram incluídos na amostra, sendo totalizado 1.658 pacientes. Dados como idade por anos completos, sexo e localidade onde residem foram analisados. Os pacientes não foram entrevistados, sendo as informações coletadas naqueles submetidos ao exame parasitológico de fezes no HMSS, onde as informações foram e estão sendo utilizadas de forma a valorizar sua dignidade, respeitando-os e garantindo o total sigilo de sua identidade. RESULTADOS No período em estudo constaram nos registrados 1.658 exames parasitológicos de fezes. Destes 1.055 (63,64%) pertenciam ao sexo feminino e 603 (36,36%) foram do sexo masculino. Os dados mostram que de todos os pacientes analisados, 683 destes (41,19%) apresentam resultado positivo para alguma enteroparasitose. Observou-se que a positividade é maior (46.42%) na faixa etária de 6 a 10 anos e menor entre as crianças de 0 a 5 anos, como ilustra a Tabela 01. Quanto ao sexo, o sexo feminino apresentou uma positividade de 42,37% e o sexo masculino apresentou uma positividade de 39,13%. 66
Tabela 1. Dados referentes à positividade quanto a enteroparasitos relacionada à idade dos pacientes no município de Ibiassucê-Ba entre os meses de janeiro de 2008 a dezembro de 2008. Idade Pacientes 0 5 6 10 11 15 16 59 60 95 215 196 128 923 196 Infectados (nº.) 85 91 49 374 84 nfectados (%) 39.53% 46.42% 38.28% 40.52% 42.85% A frequência de enteroparasitos entre pacientes da zona rural foi de 42,09% o que se mostrou levemente maior em relação aos pacientes da zona urbana, onde o índice de infestação foi de 39,71%. Não foi observado diferença entre a frequência de enteroparasitoses comparando-se às zonas rural e urbana. Os parasitos que apresentaram diferença mais marcante foram E. histolistica, S. stercoralis prevalecendo nos indivíduos residentes na zona rural e A. lumbricoides, G. lamblia naqueles residentes na zona urbana (Tabela 2). Tabela 2. Distribuição da frequência relativa dos parasitos entre a zona rural e zona urbana Parasito Zona rural (%) Zona urbana (%) E. coli 51.15 54.62 E. nana 23.73 20.88 E. histolistica 18.20 10.84 A. lumbricoides 5.76 7.23 G. lamblia 4.61 8.03 E. vermicularis 4.15 4.02 I. butschlii 1.15 0.80 Ancilostomídeos 0.46 0.80 S. stercoralis 2.53 0.00 S. mansoni 0.23 0.00 H. diminuta 0.23 0.00 T. trichiurus 0.00 0.40 DISCUSSÃO Os enteroparasitos foram encontrados em 41,19% da população ibiassuceense e a alta incidência das enteroparasitoses está relacionada com precárias condições socioeconômicas e culturais da população brasileira. Isto pode indicar que a 67
condição socioeconômica e cultural da população em estudo não está muito distante daquelas encontradas em grande parte do território nacional necessitando de melhorias no abastecimento de água, esgoto, educação ambiental e educação para a saúde (Carrillo et al, 2005; Ferreira e Andrade, 2005; Pereira e Santos, 2005; Saturnino et al, 2005). No contexto epidemiológico, a diversidade das taxas de prevalências de alguns enteroparasitos justifica-se por dependerem de vários fatores como o tipo de solo, de fatores como a presença de indivíduos infectados, da contaminação fecal, da temperatura ambiente, da umidade, contato entre o solo infectante, da susceptibilidade dos indivíduos e da densidade populacional (Malta, 2005). Observou-se que a positividade é maior (46,42%) na faixa etária de 6 a 10 anos e menor entre as crianças de 0 a 5 anos. Algumas situações como o fato de começar a se deslocar por uma área maior e o hábito de chupar o dedo e/ou colocar objetos contaminados na boca além de, frequentemente, não apresentarem o hábito de lavar as mãos ou mesmo não manter as unhas cortadas. Estes hábitos contribuem para o auto índice de contaminação em crianças por elevar o risco de se infectarem com helmintos pelo contato da pele com o solo contaminado (Teixeira e Heller, 2004). Crianças na faixa etária de 6 a 10 anos costumam brincar em parques ou praças públicas entrando em contato com areia que por sua vez podem estar contaminadas sendo que a frequência com que o indivíduo entra em contato com o meio contaminado e do grau de contaminação deste influenciam no risco (Malta, 2005). A frequência de enteroparasitos entre pacientes da zona rural (42,09%) foi levemente maior em relação aos pacientes da zona urbana (39,71%). Este resultado pode ser explicado pelo fato de quase toda zona rural do município de Ibiassucê estar abastecida com água tratada. Os indivíduos residentes na zona rural, geralmente, não dispõem de condições sanitárias satisfatórias como abastecimento de água e esgoto. Muitas vezes o esgoto é encaminhado a fossas sépticas rasas o que pode levar à contaminação do solo por ovos de enteroparasitos. Também é observado que muitos os homens das localidades rurais trabalham na lavoura o que leva ao contato direto com o solo (Ribeiro Junior, 2002). As altas prevalências de comensais intestinais não patogênicos como E. nana e E. coli indicam que os pacientes estão sujeitos aos mesmos mecanismos de 68
transmissão de outros protozoários patogênicos como E. histolytica e G. duodenalis, podendo servir como bons indicadores das condições sócio-sanitárias e da contaminação fecal a que os indivíduos estão expostos (Macedo, 2005). Nesta pesquisa a taxa de infestação por A. lumbricoides (6,44%) é abaixo das encontradas em outras pesquisas (Santos Júnior et al., 2006) que detectaram uma prevalência deste parasito de 48,3% de uma amostra da população de um município do sertão baiano. Na região semi-árida do Nordeste brasileiro (Paraíba) revelou uma baixa infestação A. lumbricoides e T. trichiura na população, justificando-a pela estreita dependência destes parasitos com a umidade do solo e que a longa estação seca é uma das circunstâncias limitantes para a proliferação destes parasitos (ALVES et al, 2003). Os dados coletados indicam uma maior prevalência dos protozoários E. coli e E. nana. Ambas as espécies são comensais não patogênicas, porém com importante implicação na epidemiologia das doenças parasitárias por possuírem o mesmo mecanismo de transmissão de outros protozoários patogênicos como a Giardia lamblia, podendo servir como bons indicadores das condições sócio-sanitárias e da contaminação fecal a que os indivíduos estão expostos (Pezzi e Tavares, 2007). Referindo-se especificamente ao enteroparasito A. lumbricoides, sua frequência relativa entre os habitantes da zona rural foi igual a 5,76% enquanto para aqueles da zona urbana foi 7,23%. Estes dados reforçam a idéia de Malta (2005) observando diferença significativa entre as populações moradoras em zonas rurais, com maior prevalência em relação às moradoras de zona urbana. Mas várias outras estão associadas às periferias das grandes cidades. CONCLUSÃO Com base nos resultados obtidos, no presente estudo, pode-se verificar que Ibiassucê apresentou, no ano de 2008, 41,16% de positividade para as parasitoses intestinais. A maior prevalência está nos indivíduos entre 6 e 10 anos, observando uma positividade mais elevada no sexo feminino e entre os residentes na zona rural. O enteroparasito que apresentou maior prevalência foi o protozoário comensal E. coli, com 54,42% entre os pacientes infectados. Isto indica que os pacientes estão susceptíveis às mesmas vias de transmissão de outros protozoários e helmintos patogênicos. De modo geral, as protozooses apresentaram maior frequência que as 69
helmintíases. As informações acima indicam que as condições sanitárias e de educação para a saúde não estão nos padrões ideais, favorecendo, assim, a contaminação pelos enteroparasitos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, J. R. et al. Parasitoses intestinais em região semi-árida do Nordeste do Brasil: resultados preliminares distintos das prevalências esperadas. Cad. Saúde Pública, v. 19, n. 2, p. 667-670, mar./abr., 2003. CARRILLO, M. R. G. G., LIMA A. A. & R. NICOLATO, L. C. Prevalência de enteroparasitoses em escolares do bairro Morro de Santana no Município de Ouro Preto, MG. Revista Brasileira de Análises Clínicas, n. 37, v. 3, p. 191-193, 2005. DE CARLI, G. et al. Extensão Comunitária - Estudo de Enteroparasitoses e das Condições Sócio Econômicas e Sanitárias das Vilas Periféricas de Porto Alegre, RS, Brasil, Durante o Período de 1965 a 1981. Caderno de Farmácia, v. 5, n. 1/2, p. 73-92, 1989. FERREIRA, G. R.; ANDRADE C. F. S. Alguns aspectos socioeconômicos relacionados a parasitoses intestinais e avaliação de uma intervenção educativa em escolares de Estiva Gerbi, SP. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, n. 38, n. 5, p. 402-405, 2005. FREI, F.; JUNCANSEN, C.; RIBEIRO-PAES, J. T. Levantamento epidemiológico das parasitoses intestinais: viés analítico decorrente do tratamento profilático. Cad. Saúde Pública, v. 24, n. 12, p. 2919-2925, dez, 2008. GUIMARÃES, J. R. S. Condições de vida, desigualdade e dinâmica demográfica na Bahia durante a década de 1990. Dissertação (Mestrado). Escola Nacional de Ciências Estatísticas, Rio de Janeiro-RJ, 2004. 118 p. HELLER, L. Saúde e saneamento. OPAS/OMS, Brasília, 1997. IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Contagem da População 2007. IBGE: Rio de Janeiro. MACEDO, H.S. Prevalência de parasitos e comensais intestinais em crianças de escolas da rede pública municipal de Paracatu (MG). Revista Brasileira de Análises Clínicas, v. 37, n. 04, p. 209-213, 2005. MALTA, R. C. G. Estudo Epidemiológico dos Parasitas Intestinais em Crianças no Município de Votuporanga - S.P. Dissertação (Mestrado), UNICAMP, 2005. 124 p. PEREIRA C. W.; SANTOS, F. N. Prevalência de geo-helmintíases em crianças atendidas na rede pública de saúde de Neópolis, município do estado de Sergipe. Revista Brasileira de Análises Clínicas, v.37, n. 2, p. 11-114, 2005. 70
PEZZI, N. C.; TAVARES, R. G. Relação de aspectos sócio-econômicos e ambientais com parasitoses intestinais e eosinofilia em crianças da ENCA, Caxias do Sul-RS. Estudos, v. 34, n.11/12, p. 1041-1055, nov./dez. 2007. RIBEIRO JUNIOR, A. G. M. Epidemiologia das parasitoses intestinais e toxocaríase no município de Pedro de Toledo SP. Dissertação (Mestrado), UNICAMP, 2002. 86 p. SANTOS, D. E., WIEBBELLING, A. M. P.; MEZZARI, A. Parasitoses intestinais: aspectos gerais e prevalência em uma escola de periferia de Porto Alegre RS. News Lab, ed. 60, p. 118-134, 2003. SANTOS JÚNIOR, G. O.; SILVA, M. M.; SANTOS, F. L. N. Prevalência de enteroparasitoses em crianças do sertão baiano pelo método de sedimentação espontânea. Revista de Patologia Tropical, v. 35, n. 3, p. 233-240, set./dez., 2006. SATURNINO, A. C. R. D. et al. Enteroparasitoses em escolares de 1ºgrau da rede pública da cidade de Natal, RN. Revista Brasileira de Análises Clínicas, v. 37, n. 2, p. 85-87, 2005. TEIXEIRA, J. C.; HELLER, L. Fatores Ambientais Associados às Helmintoses Intestinais em Áreas de Assentamento Subnormal, Juiz de Fora, MG. Eng. sanit. Ambient., v. 9, n. 4, p. 301-305, out./dez. 2004. 71