ESTABILIZAÇÃO SAZONAL DA OFERTA DE ENERGIA ATRAVÉS DA COMPLEMENTARIDADE ENTRE OS REGIMES HIDROLÓGICO E EÓLICO

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Transcrição:

GPL/17 17 à 22 de outubro de 1999 Foz do Iguaçu Paraná - Brasil GRUPO VII GRUPO DE PLANEJAMENTO DE SISTEMAS ELÉTRICOS (GPL) ESTABILIZAÇÃO SAZONAL DA OFERTA DE ENERGIA ATRAVÉS DA COMPLEMENTARIDADE ENTRE OS REGIMES HIDROLÓGICO E EÓLICO Nelson de Andrade Rocha* Odilon Camargo do Amarante Promon Engenharia Ltda. Camargo Schubert Energia Eólica Ltda. Dario Jackson Schultz e Martha V. B. Sugai Rogério Motta Bittencourt COPEL CHESF RESUMO Com o predomínio da geração hidrelétrica no Brasil, superior a 9%, a estabilização sazonal da oferta de energia tem sido um desafio histórico ao planejamento da operação dos sistemas interligados, pois os regimes hidrológicos têm caráter estocástico com flutuações sazonais de amplitude significativa. Na última década, o aproveitamento eólio-elétrico mundial demonstrou aptidão às escalas de gigawatts, necessárias a uma contribuição efetiva a sistemas elétricos. Este trabalho demonstra, a partir de dados existentes, a viabilidade de estabilização sazonal da oferta de energia através da complementaridade entre os regimes naturais eólico e hidrológico, aproveitando-se os amplos recursos naturais disponíveis no país. PALAVRAS-CHAVE Hidrologia, eólica, energias renováveis, sazonalidade natural apresenta flutuações sazonais com amplitude significativa. Os períodos secos requerem estratégias de otimização da gestão dos reservatórios, para evitar racionamentos de energia. A experiência mundial nesta última década demonstrou que as usinas eólio-elétricas (UEE) são adequadas a aproveitamentos na escala de gigawatts, necessários a uma contribuição efetiva ao sistema elétrico. Apesar de não apresentarem capacidade firme, devido à intermitência do vento, este trabalho mostra, através dos dados existentes, referentes aos regimes hidrológicos de algumas das nossas bacias hidrográficas e dos dados ainda preliminares do nosso inventário eólico, que há uma grande complementaridade sazonal entre estes dois regimes. Adicionalmente, as flutuações interanuais dos principais regimes eólicos no Brasil são bastante inferiores àquelas dos regimes hídricos. O aproveitamento deste potencial de sinergia natural pode trazer benefícios a todo o sistema elétrico, aliado a externalidades que os autores julgam importantes sob a ótica macro-econômica e social do país. 1. INTRODUÇÃO Sob o ponto de vista estratégico, o setor elétrico brasileiro construiu, ao longo das últimas décadas, um modelo exemplar: utilização predominante (>9%) de recursos energéticos renováveis e disponíveis internamente, associados a uma malha de transmissão interligada em grandes blocos regionais - com tendência à integração em escala nacional. A capacidade de armazenamento de energia nos reservatórios das usinas hidrelétricas (UHE) é da ordem de meses; entretanto, a disponibilidade hídrica 2. HISTÓRICO Os autores consideram necessário este breve histórico, para desmistificar a noção ainda corrente de que a energia eólica é uma linha de pesquisa acadêmica ou uma fonte destinada a pequenos sistemas isolados. 2.1 Origem, evolução e consolidação Quando do descobrimento do Brasil (15) até o surgimento de máquinas a vapor, a Europa já utilizava dezenas de milhares de moinhos de vento para variadas tarefas mecânicas. Os autores julgam que * Promon Engenharia Ltda. Praia do Flamengo 154 CEP 2227-9 Rio de Janeiro RJ Tel. (21) 555-2349 Fax (21) 285-7549 e-mail: "Rocha_Nelson/rjo_eg"@promon.com.br

2 moinhos de vento não foram utilizados no Brasil devido ao nosso modelo de colonização, baseado em mão de obra escrava, fator inibidor de tecnologia. Nos Estados Unidos, a abolição da escravatura ocorreu em 1863, e a primeira patente de catavento multipá para bombeamento d'água, foi registrada em 1864. Mais de 1. unidades/ano chegaram a ser fabricadas, gerando uma importante indústria na época. Cataventos multipá também foram amplamente utilizados no meio rural brasileiro, o que é uma possível causa da freqüente associação da energia eólica ao bombeamento d'água e pequenas aplicações isoladas. Após a primeira crise do petróleo, na década de 7, os governos investiram em projetos de pesquisa e demonstração de conceitos técnicos. Na época, ao participar do projeto "DEBRA 1 kw" junto com a Alemanha, o Brasil chegou a possuir posição de ponta no domínio desta tecnologia, a qual foi perdida pela descontinuidade no suporte governamental ao setor. A partir de meados da década de 8, surgiram as políticas de estímulo ao mercado - que se mostraram as mais acertadas. Iniciadas na Califórnia, produziram rápida expansão de usinas eólicas em passos e desertos, atingindo-se a escala de 1,8 GW instalados até o final do ano de 199. Ficaram demonstradas as principais características desta forma de geração: aptidão às escalas de GW, modularidade, rapidez de expansão, baixo impacto ambiental, uso suplementar da terra, custos decrescentes com a escala de produção industrial em série, geração de empregos diretos e indiretos e benefícios econômicos regionais através do arrendamento das áreas de instalação das máquinas. Grande exportadora para o mercado da Califórnia, a Dinamarca consolidou uma indústria eólica que gradualmente assumiu importância em sua economia nacional. Na década de 9, os governos da Dinamarca e Alemanha iniciaram políticas de incentivo aos respectivos mercados, que rápidamente suplantaram os resultados da California, em escala de implantação e desenvolvimento tecnológico. Mais tarde, os demais países europeus, e também a Índia, iniciavam políticas próprias de incentivo ao setor. As turbinas eólicas produzidas nestes países são reconhecidas como as que possibilitam os projetos eólicos mais competitivos no mercado. A energia eólica é considerada como a melhor opção para os europeus obterem os objetivos compromissados no Protocolo de Kyoto, de redução de emissão de gases. 2.2 Status atual Observe-se na Tabela 1 a tendência de crescimento da taxa de expansão anual da capacidade eólio-elétrica mundial, ultrapassando 2 GW/ano em 1998. TABELA 1 - STATUS ATUAL DA CAPACIDADE EÓLICA INSTALADA (MW) Dez/96 Dez/97 Dez/98 EUROPA 352 4768 6468 Alemanha 1545 282 2875 Dinamarca 857 1116 145 Espanha 249 512 834 Holanda 299 325 363 Reino Unido 27 32 334 Suécia 15 117 15 Itália 71 1 18 Irlanda 6 51 63 Portugal 2 38 6 Grécia 29 29 39 Áustria 3 2 3 França 1 1 19 Finlândia 8 12 17 Outros 3 36 54 AMÉRICAS 1643 1648 287 Estados Unidos 1591 159 1952 Canadá 21 21 83 Costa Rica 2 2 26 Argentina 3 9 12 Brasil 2.3 2.3 7* México 2 2 3 Ilhas do Caribe 4 4 4 ÁSIA 895 1116 1194 Índia 816 95 968 China 79 166 224 Coréia do Sul 2 ÁREA DO PACÍFICO 28 33 63 Japão 14 18 41 Austrália 1 11 17 Nova Zelândia 4 4 5 ORIENTE MÉDIO e ÁFRICA 24 24 26 Irã 9 9 11 Israel 6 6 6 Egito 5 5 5 Jordânia 1 1 1 Outros - África 3 3 3 Total Mundial 692 7589 9838 no ano 1497 2249 * 2 MW instalados no Brasil até abril de 1999. 3. EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS EM INTERAÇÃO HIDRO/EÓLICA Em 1997/98 foi realizado um estudo com simulações em resolução horária (Ref.[3]) para dois cenários de inserção de energia eólica no sistema dinamarquês, interligado ao sistema elétrico europeu. Tais estudos foram realizados na Universidade de Roskilde na Dinamarca, com contribuições de concessionárias de energia e transmissão da Dinamarca, Suécia e Noruega. No primeiro cenário, uma inserção eólica de 37% em consumo (54% da demanda) na Dinamarca encontraria complementaridade no sistema hidráulico da Suécia e Noruega, firmando a oferta de energia nos meses "secos" daqueles países, sem prejuizo aos níveis de segurança na estabilidade de fornecimento regional.

3 No segundo cenário, foi analisada uma inserção eólica próxima a 1% do consumo no sistema elétrico dinamarquês, interligado ao sistema elétrico nórdico, incluindo Alemanha, Finlândia e Holanda. Segundo as simulações, este cenário seria técnicamente viável, sem prejuizos aos níveis de segurança do fornecimento regional, desde que realizados investimentos suplementares em reforço ao sistema de transmissão Dinamarca/Suécia. 4. ESTUDOS DE INSERÇÃO EÓLICA NO SISTEMA ELÉTRICO BRASILEIRO Este trabalho apresenta dois estudos de cenários viáveis de inserção de usinas eólicas no sistema elétrico, realizados para regiões com potencial já melhor inventariado através de medições específicas (Sul e Nordeste). Estes estudos abrangem os dois principais sistemas elétricos interligados: S-SE-CO e N-NE, sendo portanto representativos dos aspectos gerais da implementação eólica em nível nacional. Nos dois casos, são apresentadas as evidências da complementaridade sazonal entre os regimes hídricos e eólicos, e a conseqüente tendência à estabilização sazonal da oferta de energia caso o aproveitamento eólio-elétrico venha a atingir escalas adequadas. Os estudos sobre a interação hidro/eólica foram realizados na COPEL e na CHESF, onde já existem informações suficientes para indicar um potencial de complementaridade. Nestas regiões o potencial hidrelétrico já está próximo de ser esgotado, e as alternativas imediatas consideradas para atender ao crescimento da demanda tem sido a inserção da geração térmica ou a importação de energia de regiões remotas, independentemente do impacto ambiental e macroeconômico. 4.1 Região Sul (COPEL) Durante o estudo de previabilidade da usina eólica de 2 MW em Palmas, no Paraná, a COPEL realizou estudos e simulações da inserção da usina no sistema interligado (Ref.[8]). Foi analisada a disponibilidade energética da usina eólica de Palmas, com potências instaladas de 5 e 2 MW. Um dos objetivos do estudo era avaliar a complementaridade entre a geração da usina eólica e a hidráulica dos subsistemas Sul e Sudeste. Foi utilizada uma série histórica de energias eólicas mensais para o período de 1972 a 1993, além das séries de vazões naturais hidráulicas mensais para os subsistemas S-SE, com a configuração final do programa decenal de geração do ciclo de 1996; a série de dados eólicos foi obtida através da correlação entre os dados efetivamente medidos em Palmas desde 1995, com os dados da estação do Instituto Agronômico do Paraná IAPAR, em Clevelândia, a cerca de 5 km do local da usina eólica, que dispõe de registros anemométricos para este período. Os cenários foram elaborados com o modelo de simulação a subsistemas equivalentes - MSSSE. A Figura 1 mostra o resultado das simulações: Hidráulica (MWmês) 15 12 9 6 3 Energias naturais hidráulicas (subsistema Sul) e Energias eólicas em Palmas - período 1979-1992 SS-Sul EÓL-5MW FIGURA 1 - REGIMES SAZONAIS: VENTO EM PALMAS (PR) E HIDRÁULICA NO SUL Pode-se observar que o comportamento sazonal da geração eólica é semelhante ao da geração hidráulica no subsistema Sul: o coeficiente de correlação obtido foi de,226. Um dado relevante pode ser visto na comparação das médias mensais de velocidade do vento e da vazão natural do rio Iguaçu, no período de 1983 a 1994, mostrados na Figura 2. Observe-se que, apesar da velocidade do vento ser muito mais variável na escala de minutos ou horas, a sua variação em termos de médias mensais é muito menor do que a hídrica. Em termos estatísticos, a série de velocidades médias do vento tem média de 3,8 m/s e,43 m/s de desvio padrão, já a série de vazões médias mensais tem média de 863 m³/s e 725 m³/s de desvio padrão. Médias mensais da velocidade do vento em Clevelandia e da vazão do rio Iguaçu na usina hidrelétrica Segredo 8 7 6 5 4 3 2 1 Velocidades do Vento Vazões Médias M ensais fontes: IAPAR, COPEL/CCH FIGURA 2 - MÉDIAS MENSAIS: VENTO E VAZÃO 4.1.1 Relação geração eólica x geração hidráulica no subsistema Sudeste O subsistema sudeste é de maior peso com relação ao sistema elétrico brasileiro e a relação da geração eólica em Palmas com esse subsistema hidráulico pode ser vista na Figura 3: 25 2 15 1 5 Eólica (MWmês)

4 Hidráulica (MWmês) Energias naturais hidráulicas (subsist. Sudeste) e Energias eólicas em Palmas período 1979-1992 8 6 4 2 SS-Sudeste EÓL-5MW FIGURA 3 - REGIMES SAZONAIS: VENTO EM PALMAS (PR) E HIDRÁULICA NO SUDESTE Neste caso, pode-se observar que os comportamentos das duas fontes são complementares na escala sazonal: o coeficiente de correlação obtido foi de,48. As simulações com potência instalada de 2 MW mostraram resultados qualitativamente semelhantes. Outro aspecto abrangido pelo estudo foi a quantificação da energia garantida da usina eólica, interligada aos subsistemas Sul e Sudeste. Os valores obtidos nas simulações resultaram muito próximos à energia média da usina, que tinha um fator de capacidade estimado da ordem de,3 ou 3%. Dos resultados deste estudo pode-se concluir que a implantação de usinas eólicas em regimes de vento semelhantes aos da região de Palmas traz benefícios ao sistema elétrico interligado, uma vez que se adicionaria mais energia ao sistema justamente na época do ano em que ocorre redução nos regimes hídricos do Sudeste, onde se concentram as maiores cargas. Para o inventário do potencial eólico paranaense, realizado pela COPEL, foram instaladas 25 estações anemométricas em todo o estado. Verificou-se que existe forte correlação entre os regimes de vento de todo o território paranaense, o que induz que usinas eólio-elétricas na região Sul e Sudeste teriam comportamento sazonal semelhante. Outra informação relevante diz respeito à dimensão do potencial eólico estimado para o Estado do Paraná, induzido através de integrações realizadas sobre o mapeamento, calculado na resolução de 2km x 2km, apresentado na Tabela 2: TABELA 2 - POTENCIAL EÓLICO PARANAENSE Aproveitando ventos a partir de (m/s) 6. 6.5 Potência técnicamente instalável (GW) 11. 2.7 Energia técnicamente aproveitável (TWh/ano) 2.5 5.8 4.2 Região nordeste (CHESF) Simulações realizadas pela CHESF (Ref.[4]), apresentam a produção mensal de energia elétrica a partir de turbinas eólicas instaladas em 1% do litoral do Estado do Ceará, limitadas à 5km do mar. Nesse cenário as seguintes considerações foram feitas: utilizaram-se 25 2 15 1 5 Eólica (MWmês) dados de vento do período 1993/95, de cinco estações anemométricas modernas, juntamente com as curvas de potência de aerogeradores de 5/6kW, que serviram de base para a concepção de fazendas eólicas hipotéticas, de cinco diferentes tipos, com uma eficiência de 9%, disponibilidade de 95%, um arranjo com turbinas distanciadas entre si, de 5x7 diâmetros do rotor e uma potência instalada de cerca de 3 MW. Conciliando-se os dados de produção de energia das fazendas eólicas com a vazão natural do rio São Francisco, afluente no reservatório de Sobradinho, referentes a série histórica de 1931/92 (Ref.[5]), (Figuras 4 e 5) e a produtividade (MW/m 3 /s) do conjunto de usinas da CHESF ao longo do rio São Francisco, elaborou-se o presente estudo. Vazão (m3 /s) GWh 14 12 1 8 6 4 2 PARACURU MUCURIPE COFECO BITUPITÁ ACARAU JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ FIGURA 4 - PRODUÇÃO DE PARQUES EÓLICOS EM 1% DO LITORAL DO CEARÁ 5252 568 4817 3997 2489 1698 141 121 162 1188 1946 3487 jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez FIGURA 5 - VAZÃO AFLUENTE NO RESERVATÓRIO DE SOBRADINHO, 1931/92 Inicialmente utilizaram-se os dados mensais da geração elétrica dos parques eólicos (Ref.[4]) e a produtividade acumulada de 2,713 MW/m 3 /s (Ref.[6]) relativa à produção anual das usinas de Sobradinho, Itaparica, Paulo Afonso I, II,III e IV, Apolonio Sales e Xingó, com capacidade de 9.974 MW de potência instalada. Converteu-se, dessa forma, a energia elétrica produzida mensalmente pelas fazendas eólicas em equivalente vazão, posta teoricamente no reservatório regulador de Sobradinho, e correspondendo a produção semelhante de energia através das usinas hidrelétricas situadas à jusante. A Figura 6 mostra a normalização da geração e da vazão onde podemos observar um crescimento em relação ao valor médio, já a partir de julho e com o pico máximo em setembro.

5 1,75 1,5 1,25 1,,75,5,25, Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov FIGURA 6 -PRODUÇÃO DE ENERGIA E VAZÃO EM RELAÇÃO AS SUAS MÉDIAS De posse das médias das vazões mensais naturais do rio São Francisco afluente em Sobradinho, foram adicionadas vazões hipotéticas relativas a contribuição anual da geração eólica referente a 1.9 MWh/h, (Ref.[4]), e equivalente a uma vazão média de 4,8 m 3 /s, mostradas na Figura 6, ou seja representando 14,3% da vazão média do rio em Sobradinho que é de 28,5 m 3 /s. Cenários adicionais, de inserção de mais 3% e 6% na vazão média do rio, resultantes do maior incremento na geração eólica, são apresentado na Figura 7. 75 5 25 Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Natural Inserção 14,3% Inserção 3% Inserção 6% FIGURA 7 - INCREMENTOS NA VAZÃO MÉDIA NATURAL (m 3 /s) DEVIDOS À GERAÇÃO EÓLICA Conforme pode ser observado, o perfil da vazão do rio se altera a medida em que passamos a aumentar a participação eólica, especialmente por um acréscimo maior do volume no período seco do rio. De toda a contribuição que a energia eólica possa dar para o aumento do volume em Sobradinho, a que mais interessa é a que ocorre durante o período seco do rio São Francisco, ou seja de maio a outubro. Dessa forma abaixo ilustrou-se o volume possível de se obter nesse período conforme a produção de energia gerada a partir do aproveitamento dos ventos. Na Tabela 6, a primeira coluna mostra a potência elétrica média anual, a partir de fontes eólicas, necessária para um equivalente incremento percentual teórico na vazão média natural do rio, em Sobradinho, como pode ser visto na segunda coluna. A terceira coluna traz o correspondente volume hipotético possível de ser Dez acumulado durante o período seco. E, finalmente a quarta coluna apresenta a potência elétrica média no período molhado produzida por parques eólicos. TABELA 3 - APROVEITAMENTO NOS PERÍODOS SECOS E ÚMIDOS MWh/h Adição na Bilhões de m 3, MWh/h período anual vazão (%) período seco úmido 19. 14,3 7,4 921.4 2286.7 3, 15,5 1933. 4573.4 6, 31, 3866. Como podemos observar, a regularização da vazão do rio São Francisco pode receber uma grande colaboração de forma natural do aproveitamento eólico. Essa contribuição pode ocorrer não só a partir dos ventos do Ceará, mas também de outros estados do Norte e Nordeste onde o maior potencial acontece no segundo semestre do ano por grande influência dos ventos alísios. Adicionalmente, os autores sinalizam que não foram contabilizadas as perdas para o sistema de transmissão que atende a área Norte do sistema da CHESF. Este valor correspondeu para os meses de março e abril/99 a 14,5%, o equivalente a 19 MW.durante o patamar de carga máxima, Ref.[7]), com tendência de se agravar até a entrada de novas obras. Este valor mesmo que subtraído das perdas, bem menores, na transmissão da geração proveniente das fazendas eólicas, constitui um percentual positivo para os recursos eólicos elevando proporcionalmente os resultados apresentados na Tabela 3. 5. BENEFÍCIOS MARGINAIS DA INSERÇÃO DA GERAÇÃO EÓLICA NO MERCADO São indicados a seguir alguns benefícios marginais da inserção da geração eólica no sistema, característicos desta fonte, dos quais destacamos: 5.1 Capacidade de atendimento da demanda Uma característica marcante da geração eólica é a capacidade de atender rapidamente ao aumento real da demanda e na medida exata deste, evitando-se pesados investimentos com base em projeções econômicas de longo prazo, que nem sempre se confirmam. Como a potência das turbinas eólicas se situa na faixa de 1MW e o prazo de implantação de uma planta eólica é inferior a um ano, a expansão do sistema pode ser adequado à conjuntura de curto prazo e não à de longo prazo, como no caso das hidrelétricas. Isto permite o planejamento da expansão do sistema exatamente de acordo com a expansão da demanda, acabando com um dos permanentes desafios do planejamento do setor.

6 5.2 Criação de nova indústria/empregos A inserção da energia eólica na nossa matriz energética tem o potencial de criação de uma indústria nacional e respectiva criação de empregos, respaldada nas experiências similares no mercado mundial. Os casos da Índia e da Espanha são os exemplos mais marcantes deste histórico. Em ambos países as empresas dinamarquesa e alemãs estabeleceram "jointventures" com empresários locais, possibilitando o nascimento de uma nova indústria e a formação de mão-de-obra especializada. Devido às suas características, os equipamentos de geração eólica são típicamente importados, enquanto o mercado local se situa em um dígito de MW/ano. A partir do momento em que o mercado local passa a demandar mais de dois dígitos de MW/ano, passa a ser mais econômico produzir localmente total ou parcialmente as turbinas, independentemente das condições protecionistas de mercado. No caso brasileiro, já existem indústrias que produzem alguns dos principais componentes de turbinas eólicas: rotores, torres e geradores elétricos. No entanto, os autores são de opinião de que condições de mercado que demandem encomendas de 3 MW/ano ou mais viabilizariam um crescimento significativo de um setor promissor da indústria nacional, podendo recuperar parte do tempo perdido nos últimos anos. Os argumentos acima se aplicam apenas aos empregos diretamente gerados na indústria de produção das turbinas eólicas. Nos trabalhos de infraestrutura, responsáveis por cerca de 1/3 dos custos, é relevante que o dispêndio de recursos é típicamente local. São normalmente contratadas empresas estabelecidas próximas ao local da usina para os serviços de infraestrutura (estradas, fundações, etc.) e de empresas nacionais para o suprimento e montagem (subestações, montagem eletromecânica, guindastes, etc.). Isto via de regra possibilita um aparecimento de um novo mercado, intensivo em mão-de-obra, normalmente local, o que normalmente contribui para o comprometimento local com os empreendimentos. Esta é uma característica marcante da geração eólica, que a diferencia das demais fontes. que a energia eólica é utilizada como energia de base ("base Load") para sua utilização como fonte primária ou para o bombeamento de água de reservatórios inferiores para reservatórios de acumulação superiores. Durante os horários de pico, a água acumulada nestes reservatórios é turbinada, permitindo o seu aproveitamento nos horários de pico, quando o preço da energia é mais atraente. Tais sistemas, sob determinadas condições geográficas, poderiam viabilizar a inserção da energia eólica, independentemente de qualquer apoio governamental. 7. CONCLUSÃO Como conclusão, são sugeridas ações necessárias para agilizar a inserção a curto prazo de grandes blocos de geração eólica, a nível técnico, econômico e institucional (legislação), de forma a viabilizar economicamente esta participação. 8. - BIBLIOGRAFIA (1) WindPower Monthly, Vol. 15, n 4, April 1999, Denmark. (2) DEWI Magazin, Nr. 14. Februar 1999, Deutsches Windenergie-Institut, Germany. (3) WindPower Monthly, Vol 14, n 4, April 1998, pags 45-46, Denmark. (4) Bittencourt, R. et al - Potencial Eólico no Litoral do Ceará e Rio Grande do Norte para Geração de Energia Elétrica. Relatório CHESF - DEFA-EO- RT-2/96. Brasil (5) Relatório de Vazões do Posto 169 - Sobradinho (6) CHESF/DEPG - Divisão de Estudos e Planejamento de Expansão da Geração. (7) Relatório CHESF, SCEL - GTAS - 2/99 de Março e Abril de 1999 (8) Estudos Energéticos para a Usina Eólica de Palmas. COPEL, Relatório CNPG 22/97 6. ARMAZENAMENTO DE ENERGIA É apresentada a seguir mais uma alternativa para a interação entre as duas fontes de geração renovável, hidráulica e eólica. Os autores sugerem que usinas eólicas poderiam transformar esta energia variável em potência/energia de ponta, com o seu potencial para o suprimento de "pumped storage stations", independentemente do regime hidrológico, com grandes benefícios para o sistema. Há estudos {Ref.[4]), em