Revista Educação Agrícola Superior Associação Brasileira de Educação Agrícola Superior - ABEAS - v.25, n.2, p.87-92, 2010.

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E S P E C I F I C A Ç Õ E S T É C N I C A S

Transcrição:

Revista Educação Agrícola Superior Associação Brasileira de Educação Agrícola Superior - ABEAS - v.25, n.2, p.87-92, 2010. PRODUÇÃO DE TELHAS COM RESÍDUOS INDUSTRIAIS E FIBRAS Elvis A. Soares¹;Antonio F. Leal² & Felipe N. M. Costa³ ¹ Eng. Civil. Banco do Nordeste do Brasil. Fone 85 3299 5335. elvisas@bnb.gov.br ² Prof. Unidade Acadêmica de Eng. Agricola.83 2101 1490. leal@deag.ufcg.edu.br ³ Pibic UFCG/CNPq. Graduando em Eng.Civil INTRODUÇÃO Existem inúmeras pesquisas que estudam a reciclagem dos mais diversos resíduos originados dos setores industriais. Devido à complexidade com que estas pesquisas se desenvolvem e pela necessidade de integrar conhecimentos característicos de diferentes especificações, há um envolvimento de profissionais de várias áreas, como engenharia de materiais, química, biologia, saneamento, marketing, etc. Esses profissionais estão cada vez mais envolvidos e fazendo relevantes descobertas quanto ao potencial que certos resíduos industriais possuem como material de construção civil. São trabalhos que enriquecem e contribuem de forma significante os workshops, congressos e seminários sobre reciclagem. Baseado neste preceito, este projeto de pesquisa procura mostrar a viabilidade da utilização de resíduos industriais como materiais de construção alternativos aos convencionais. Pretende-se confeccionar telhas com resíduos gerados em indústrias de Campina Grande PB, utilizando fibras naturais e artificiais como reforço estrutural. Espera-se um produto inovador que resulte em melhoria da qualidade da obra, e que reduza o impacto ambiental causado pela incorreta destinação desses resíduos. Já é tempo de despertar a consciência dos geradores dos resíduos para as vantagens do investimento em programas de reciclagem/reaproveitamento que poderão ser uma nova fonte de receita. O desconhecimento sobre as possibilidades de reaproveitamento dos seus próprios resíduos é um problema tão grave quanto o da falta de espaço para depositá-los adequadamente. Este projeto busca soluções que assegurem destinos finais sem risco aos futuros usuários dos produtos com resíduos incorporados. Portanto, esta pesquisa propõe a reciclagem de resíduos industriais, utilizando-os na produção de telhas.

88 E. A. Soares et al. MATERIAL E MÉTODOS A atividade industrial é uma grande geradora de resíduos. Uma parte considerável desse resíduo é destinada aos lixões das cidades. O aproveitamento desses resíduos, confinados em uma argamassa contribuiria para a solução desse problema ambiental e traria benefícios à construção civil (peso próprio, isolamento térmico e acústico, baixos custos, etc.). Os resíduos sólidos resultantes dos processos industriais ainda não são considerados como matéria-prima nos meios construtivos. Estes resíduos têm um alto potencial de aproveitamento e com os devidos cuidados podem até otimizar os componentes de uma construção. O descarte inapropriado em aterros e o grande volume gerado tornam esses resíduos numa ameaça ambiental, além do descarte inapropriado, a incineração é um dos processos mais utilizados para solucionar o problema desses resíduos. Na Figura 1 podem ser vistos alguns exemplos: a) Resíduos de Cerâmica b) Resíduos de Calçados c) Resíduos de Caulim d) Resíduos de Rochas Figura 1. Resíduos sólidos gerados em indústrias O número ainda reduzido de trabalhos com abordagens práticas sobre o aproveitamento de resíduos industriais na construção civil e o potencial dos grupos de pesquisa da UFCG, somados às questões levantadas anteriormente, encorajaram o desenvolvimento dessa pesquisa. O presente projeto faz parte de uma pesquisa maior intitulada: Materiais Não-convencionais para uma Engenharia Sustentável, sob a coordenação geral da PUC-RIO, envolvendo ainda USP-Pirassununga, UFPB, CEFET-MG e UFCG como co-responsáveis. Os trabalhos foram desenvolvidos nos laboratórios existentes nas diversas unidades acadêmicas do Centro de Ciências e Tecnologia CCT e do Centro de Tecnologia e Recursos Naturais - CTRN, principalmente no Laboratório de Construções Rurais e Ambiência da UA de Engenharia Agrícola e do Laboratório de Caracterização de Materiais da UA de Engenharia de Materiais. Contou-se também com o apoio dos técnicos no desenvolvimento das atividades programadas. Fibras de sisal Utilizou-se a fibra de sisal produzida no município de Pocinhos, PB. No preparo dos compósitos usou-se um teor de fibras igual a 2% em relação ao volume do compósito, cerca de 3,6% da massa do aglomerante presente na mistura. As fibras de sisal foram cortadas através de uma guilhotina manual em comprimentos variando entre 25-30mm, seguindo recomendações de TOLÊDO FILHO (1997). Aglomerante Para produção dos compósitos, utilizou-se cimento Portland tipo CPI. Este cimento não contém material pozolânico incorporado na sua composição, segundo dados do fabricante, que também forneceu a sua análise físico-química. O cimento foi adquirido acondicionado em sacos de papel do tipo Kraft de 50kg. Para evitar a hidratação prematura, o cimento foi acondicionado em sacos plásticos, sendo lacrados e armazenados em estantes de madeira. Agregado miúdo Foi utilizada uma areia originária do leito do rio Paraíba. A granulometria da areia foi determinada segundo a NBR 7217/87 e classificada de acordo com a norma NBR 7211/83, que classifica os agregados para uso em concreto. A massa unitária em estado solto foi determinada de acordo com a NBR 7251/82. Antes do ensaio de granulometria, objetivando conseguir uma maior compacidade da matriz e visando a produção de compósitos

Produção de telhas com resíduos industriais e fibras 89 de pequena espessura (<2,0cm) com um bom acabamento superficial, a areia escolhida foi passada na peneira de 2mm de abertura para retirada de pedregulhos, impurezas e da sua fração grossa. Resíduo cerâmico Foram utilizados resíduos provenientes da Cerâmica Caiongo Ltda., localizada no município de Santa Rita, PB. Esses resíduos foram gerados na produção de blocos cerâmicos, provenientes de peças defeituosas, quebradas ou fora dos padrões comerciais (coloração, riscos, textura, etc.). Os resíduos foram coletados e trazidos ao laboratório, sendo esmiuçados em um moinho de bola até que 100% do material moído passasse na peneira ABNT n o 100 (abertura de malha, #0,15mm), Figuras 2 e 3. O material que passou na peneira ABNT n o 200 (#0,075mm) foi escolhido e uma amostra Figura 2. Resíduos de blocos cerâmicos antes da moagem Figura 3. Resíduos de blocos cerâmicos após moagem foi enviada para o Laboratório da Companhia Paraibana de Cimento Portland CIMEPAR, na cidade de João Pessoa, PB, que realizou a sua análise físico-química. Conforme já descrito, os resíduos foram processados visando à incorporação como matérias-primas alternativas no desenvolvimento das telhas em substituição aos materiais convencionais. Moldagem das Telhas As telhas foram produzidas no traço 1:1,5 (aglomerante:areia), em massa, sendo elaboradas três misturas. A primeira mistura, sem fibras e sem substituição parcial do cimento, serve como matriz de referência. Na segunda mistura também não houve substituição do cimento, porém foi inserido 2% de fibra de sisal, em volume. Já na terceira mistura houve 30% de substituição do cimento Portland pelo material pozolânico proveniente do resíduo moído de blocos cerâmicos e foi utilizado 2% de fibra de sisal, em volume. A Tabela 1 mostra um resumo das misturas produzidas. Mistura M Tabela 1. Misturas desenvolvidas para produção das telhas Traço (massa) Aglomerante Cimento RMBC Agregado (areia) Fibra Foram seguidos os seguintes critérios: teor de fibra de sisal: 2%, em volume, o equivalente a 3,6% da massa do cimento; comprimento das fibras de sisal: 2,5 3,0cm; mistura, moldagem e vibração: manuais; cura imersa durante 3 dias e ao ar até a data dos ensaios. Foi idealizada uma forma simples, produzida em chapa de madeira compensada de 10mm (lastro) e em chapa metálica dobrada em forma de trapézio, formando um ângulo de 45º com a horizontal. As laterais, em madeira maciça, são aparafusadas ao lastro, dando rigidez ao con- (%) 1 0 1,5 0 MS 1:1,5 0,7 0,3 1,5 2 M30S 0,7 0,3 1,5 2 Fator a/agl RMBC resíduo moído de bloco cerâmico; a/agl água/aglomerante 0,45

90 E. A. Soares et al. junto. As chapas metálicas são colocadas no lastro por deslizamento, através das aberturas nos frontais da forma (Figura 4) e fixadas às laterais com espaçadores de madeira (bitolas). A espessura da telha é de 8mm. O peso do conjunto vazio é cerca de 21kg, e quando cheio, em torno de 36kg, podendo ser manuseado por uma só pessoa e mais facilmente por duas. 20cm 21,4cm Chapa Metálica 15 ou 20cm 3,2cm 110cm 3,2cm 11,0cm 4,0cm 15cm 26,4cm Lateral em madeira 21,4 ou 26,4cm 3,0cm Figura 5. Esquema da forma para moldagens das telhas (sem escala) Figura 4. Molde em madeira e chapa metálica para confecção das telhas Este modelo de telha minimiza o custo do madeiramento de cobertura, dispensando o uso de caibros, ripas, pregos e diminuindo a mãode-obra. Permite um vão livre de 1,0m e requer apenas as terças de apoio nos extremos do vão. Foi utilizada uma tecnologia de produção que pode ser facilmente absorvida na construção popular, onde os usuários podem produzir para o seu próprio consumo. Foram confeccionadas duas formas para realização do experimento, o que permitiu a produção simultânea de quatro telhas. A mistura era lançada sobre a chapa metálica e socada com uma espátula nas laterais entre a madeira e a chapa metálica. Após ser preenchida, a forma era vibrada através de golpes de martelo de borracha por cerca de um minuto, até a retirada das bolhas de ar existentes. O esquema apresentado na Figura 5 mostra alguns detalhes e medidas das formas utilizadas. Uma relação água/cimento igual a 0,45 foi necessária para garantir a homogeneidade dos compósitos durante a mistura, em decorrência do emprego das fibras e de sua absorção de água. Após 24 horas de repouso, as telhas eram retiradas das formas e imersas em água por 72 horas. Após esse período, foram curadas ao ar em ambiente de laboratório até o dia dos ensaios. Após 30 dias de cura ao ar, as telhas foram separadas aleatoriamente em dois lotes para futura realização dos ensaios. RESULTADOS E DISCUSSÃO As propriedades físicas e mecânicas de fibras de sisal produzidas no município de Pocinhos-PB estão apresentadas na Tabela 2. Tabela 2. Propriedades físicas e mecânicas de fibras de sisal Referência f ABS t MOEf fu (mm) (kn/m 3 ) (%) (MPa) (GPa) (%) CEPED (1982) nd 12,7 240 458 15,2 4,2 Mukherjee et al (1984) 0,1-0,3 14,5 Nd 530-630 17-22 4,3 Agopyan (1991) 0,2-0,3 12-13 123-137 374-378 nd 5-5,5 Tolêdo Filho (1996) 0,08-0,3 7,5-11 190-250 227-1002 11-27 2-4,2 nd - não determinado Fonte: (TOLÊDO FILHO, 1997) Areia O resultado do ensaio da composição granulométrica da areia está apresentado na Tabela 3 e a curva granulométrica na Figura 6, apresentando módulo de finura (MF) igual a 1,63 e Tabela 3. Composição granulométrica da areia utilizada Abertura da peneira (mm) % Retida % Retida acumulada 2,0 0 0 100,00 1,2 5,40 5,40 94,60 0,6 7,84 13,24 86,76 0,3 33,83 47,07 52,93 0,15 49,80 96,87 3,13 Resto 3,13 100,00 0,00 % que passa da amostra total

Produção de telhas com resíduos industriais e fibras 91 Porcentagem Retida (%) 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 0 0,15 0,30 0,60 1,20 2,00 4,80 Abertura das Peneiras (mm) 9,50 Areia Lim superior Lim inferior Figura 6. Curva granulométrica da areia utilizada 100 dimensão máxima de 0,6mm. A sua massa unitária em estado solto foi igual a 1435kg/m 3. Verifica-se que este agregado enquadra-se nos limites da Zona 1 da NBR 7211/83, sendo classificada como areia muito fina. Esta granulometria irá ajudar na compacidade da matriz, diminuindo a porosidade e melhorando a interface fibramatriz. SAVASTANO JR. (2000) utilizou uma areia com MF=2,12 e dimensão máxima de 2,4mm. Resíduo moído de blocos cerâmicos Os resultados da análise físico-química do resíduo de blocos cerâmicos estão apresentados na Tabela 4. Os óxidos de silício e alumínio totalizam cerca de 81% dos constituintes do resíduo de bloco moído, segundo a ASTM C618/01 essa soma não pode ser inferior a 70% para que um material seja considerado uma pozolana. Esses são os óxidos que reagem com o hidróxido de cálcio formando os silicatos. O teor de óxido de Tabela 4. Caracterização química e física do resíduo de blocos cerâmicos Características Unidade Resultado SiO2 (Dióxido de Silício) % 63,54 Al2O3 (Óxido de Alumínio) % 17,54 Fe2O3 (Óxido de Ferro) % 8,45 CaO (Óxido de Cálcio) % 2,69 MgO (Óxido de Magnésio) % 1,86 K2O (Óxido de Potássio) % 0,60 Na2O (Óxido de Sódio) % 0,07 Perda ao Fogo % 2,36 Massa Específica g/cm 3 2,65 Área Específica (Blaine) cm 2 /g 4060 90 80 70 60 50 40 30 20 10 Porcentagem que Passa (%) ferro, de cerca de 8,45%, fez com que as argamassas produzidas com resíduo moído de bloco cerâmico tivessem um tom avermelhado. REFERÊNCIAS ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Resíduos sólidos - NBR 10004. Rio de Janeiro, 1987.. Agregado em estado solto determinação da massa unitária, NBR 7251. Rio de Janeiro, 1982.. Amostragem de resíduos - NBR 10007. Rio de Janeiro, 1987.. Lixiviação de resíduos - NBR 10005. Rio de Janeiro, 1987.. Solubilização de resíduos - NBR 10006. Rio de Janeiro, 1987.. Agregado para concreto, NBR 7211. Rio de Janeiro, 1983.. Agregados - determinação da composição granulométrica, NBR 7217. Rio de Janeiro, 1987. AGOPYAN, V. Materias reforçados com fibras para construção civil nos países em desenvolvimento: o uso de fibras vegetais. Tese (Livre-Docência). Universidade de São Paulo. São Paulo, 1991. 204p. CEPED - Centro de Pesquisas e Desenvolvimento. Cartilha para fabricação de telhão em argamassa armada. BNH. Rio de Janeiro, 1985. 25p. CEPED - Centro de Pesquisas e Desenvolvimento. Utilização de fibras vegetais no fibrocimento e no concreto. BNH. Rio de Janeiro, 1982. LEAL, A. F. ; NEVES, D. V. A. ; NASCIMEN- TO, R. T.. Utilização de resíduos das industrias de calçados e de cerâmica na obtenção de elementos de construção a base de cimento. Revista Pesquisa, v. 1, p. 37-43, 2007. LIDDLE, B. T. Construction for sustainability and the sustainability of the construction industry. In: CIB TG 16 Sustainable Construction. Tampa, Florida, November 6-9, 1994, p.47-56. (apud JOHN, 2000). MUKHERJEE, K. G., Structure and properties of some vegetable fibres. part 1: sisal fibre, Journal of Materials Science 19, 1984, p.3925-3934. REZENDE, M. L. M.; NASCIMENTO, J. W. B. ; LEAL, A. F.. Utilização do Resíduo de Caulim em Blocos de Vedação. Revista da Escola de Minas, v. 61, p. 285-290, 2008.

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