LAVAGEM DE DINHEIRO EM INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: DA OBRIGAÇÃO DE COMUNICAR A RESPONSABILIDADE SOCIAL.



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Transcrição:

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO LATU-SENSU LAVAGEM DE DINHEIRO EM INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: DA OBRIGAÇÃO DE COMUNICAR A RESPONSABILIDADE SOCIAL. Prof. Jorge Tadeu Vieira Lourenço Rio de Janeiro 2009

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO LATU-SENSU LAVAGEM DE DINHEIRO EM INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: DA OBRIGAÇÃO DE COMUNICAR A RESPONSABILIDADE SOCIAL. OBJETIVOS: Esta publicação atende a complementação didático-pedagógica de metodologia da pesquisa e a produção e desenvolvimento de monografia, para o curso de pós-graduação latu-sensu em Finanças e Gestão Corporativa. Por Altamiro Rocha da Silveira.

AGRADECIMENTOS Ao Professor Jorge Tadeu Vieira Lourenço pelas considerações sobre o trabalho. A minha mulher Rita que sempre procurou aveludar os difíceis caminhos por onde passei.

RESUMO O presente trabalho tem como objetivo principal um panorama das cinco maiores instituições financeiras que atuam no mercado brasileiro, quanto a sua política corporativa na implementação de sistemas de controle interno para combate ao crime de lavagem de dinheiro e outros especificados na Lei 9.613/1998, que dispõe sobre os crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei, como também, a preocupação institucional no tocante a responsabilidade social no combate a esse ilícito, além de, apurar a efetividade do programa de combate a lavagem de dinheiro implementado em uma das instituições financeiras pesquisadas. Para a realização desse breve estudo foi apresentado uma discussão bibliográfica sobre o tema, algumas políticas adotadas pelas instituições financeiras e a apresentação de textos legais.

SUMÁRIO INTRODUÇÃO 05 1 CONCEITO DE LAVAGEM DE DINHEIRO 07 1.1 Principais fases do processo de lavagem de dinheiro 08 1.2 Medidas para combater a lavagem de dinheiro em âmbito internacional 09 1.3 A lavagem de dinheiro no contexto do mundo globalizado 10 2. A TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO NO BRASIL 12 2.1 A relação de algumas atividades econômicas no crime de lavagem de dinheiro 17 2.2 Formas de punição no Brasil 21 3 A CONTRIBUIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: A OBRIGAÇÃO DE COMUNICAR 24 3.1 Da identificação dos clientes e manutenção de registros 28 3.2 A obrigação de comunicar 31 4. O SISTEMA ANTI-LD NAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: UMA ABORDAGEM CRÍTICA 33 4.1 Perspectivas do setor bancário para o combate à lavagem de dinheiro 34 4.2 Investigação de delitos: notícias veiculadas ao crime de lavagem de dinheiro 38 CONCLUSÃO 40 BIBLIOGRAFIA 42 ANEXO 45

INTRODUÇÃO O tema lavagem de dinheiro é de grande relevância. Atividades do tipo necessariamente vêm acompanhadas de outros crimes de gravidade considerável para quase todos os países Ocidentais. Assim, a celeridade e efetividade na repressão da lavagem do dinheiro resultam em uma maior eficácia no combate a delitos ligados ao terrorismo, narcotráfico, dentre outros. Diante desse fato, os países que mais se destacam em termos econômicos ocuparam-se com uma série de regulamentações com o objetivo de combater a lavagem do dinheiro concomitantemente à repressão das atividades ilegais de abrangência internacional. Explicita-se, dessa forma, a inquestionável necessidade dos profissionais de contabilidade de refletir sobre esse assunto, sobretudo no Brasil, país em que regularmente se observa a figuração de fraudes dessa natureza. O trabalho que se segue objetiva justamente tecer considerações acerca desse tema. Tal tarefa será realizada mediante a análise de uma gama heterogênea de documentos, tais como os de natureza legislativa que regulam as movimentações financeiras. Utilizar-se-á também uma bibliografia sobre o assunto, redigida por especialistas de áreas diversas, como advogados e contadores. Desta forma, se buscará apresentar as convergências e divergências, concernentes à matéria, presentes nesses escritos. Para tanto, será aplicado o método comparativo. As notícias veiculadas pela imprensa também deverão ser analisadas com o objetivo de vislumbrar o impacto efetivo das deliberações legislativas que se ocupam da repressão à lavagem de dinheiro em termos socialmente pragmáticos, ou seja, tais deliberações de fato arrefecem os delitos? O enfoque do trabalho será na análise dos mecanismos utilizados no combate aos crimes de lavagem de dinheiro no âmbito institucional financeiro com ênfase no Brasil. Não obstante, tratar-se-á da sua obrigação em comunicar à responsabilidade social sobre delitos dessa natureza. O trabalho está organizado em quatro capítulos. O primeiro apresentará o tema de acordo com seu desenvolvimento histórico. Nessa parte serão discutidas as ações que visam arrefecer os crimes de lavagem de

dinheiro no decorrer da história, em especial a partir do incremento da globalização. Sabe-se que a globalização, a velocidade das mudanças no sistema financeiro, acelerou a sofisticação dos métodos de lavagem de dinheiro, despertando, por conseguinte, a atenção internacional. O segundo capítulo localizará o lugar do Brasil no quadro internacional de combate aos crimes de lavagem de dinheiro. Para tanto, será necessário se concentrar na tipificação desses delitos de acordo com a legislação brasileira. Em seguida, realizar-se-á uma comparação entre o Direito nacional e algumas diretrizes internacionais que versam sobre o nosso tema. Desta forma, será possível observar em que medida o Brasil se insere na conjuntura internacional, que cada vez mais tende a tomar medidas mais eficazes a fim de combater os crimes de lavagem de dinheiro. O terceiro capítulo dedicar-se-á à contribuição das instituições financeiras no que diz respeito à obrigação de comunicar indícios de operações ilegais de branqueamento de capital. Serão cotejadas, também, algumas notícias veiculadas pela imprensa, exemplificando desta forma a participação das instituições financeiras no processo de combate desses crimes, assim como a ação dos órgãos responsáveis pela investigação dos delitos. O quarto capítulo, por sua vez, estudará os sistemas anti-lavagem de dinheiro nas instituições financeiras mediante uma perspectiva crítica. As perguntas que irão permear esse capítulo serão: como se caracterizam esses sistemas? Eles são eficazes? Há celeridade no combate a esses delitos? Todas essas questões serão respondidas mediante considerações consistentes baseadas na confrontação da legislação com a realidade nessas instituições. Por fim, serão apresentadas as conclusões resultantes dessas reflexões e a bibliografia que auxiliou este trabalho. É preciso ressaltar que no mundo atual, em que cada vez mais a velocidade nas trocas de informação e movimentações financeiras facilitam a lavagem de dinheiro, 1 é de pleno interesse dos profissionais da contabilidade todo e qualquer esforço de se manter ciente sobre esses delitos e os mecanismos que se ocupam em combatê-los. O principal objetivo desse trabalho é contribuir com tal tarefa. 1 A globalização e os crimes de lavagem de dinheiro. In: In verbi. P.415-416.

CAPÍTULO I CONCEITO DE LAVAGEM DE DINHEIRO O estudo de qualquer tema exige uma delimitação do conceito principal. O conceito que norteia esse trabalho é o de Lavagem de Dinheiro, e um dos nossos primeiros passos será compreender o significado dessa expressão. Cabe ressaltar, inicialmente, que nem em todos os países os crimes dessa natureza recebem essa alcunha. Na Argentina, por exemplo, chama-se lavado de diñero; na Espanha, por sua vez, blanqueo de diñero, em Portugal fala-se em branqueamento de dinheiro; na França e Bélgica recebe o nome de blanchiment d argent e na Itália de riciclaggio (PINHEIRO, 2001). A despeito das várias nomenclaturas, o crime é reconhecido por um ato específico. A expressão lavagem de dinheiro advém das organizações criminosas estadunidenses da década de 1920 que costumavam montar lavanderias para ocultar os valores de origem ilícita. A rápida entrada e saída de dinheiro nesse tipo de negócio facilitavam a inserção dos valores obtidos de forma ilícita nos valores lícitos oriundos das lavanderias. Todavia, a emergência de sistemas financeiros mais complexos exigiu a sofisticação das técnicas para lavar o dinheiro, conforme se observará no decorrer desse texto (SILVA, 2002). No que concerne ao significado da expressão, conforme Ziegler, a lavagem de dinheiro consiste em transformar um capital adquirido por via obtusa, portanto ilegal, em um capital legal (ZIEGLER, 2001). Por esse caminho, um criminoso ou uma organização criminosa transforma recursos gerados em atividades ilegais em um capital limpo, aparentemente adquirido por atividades legais (BARROS, 1998). As operações dessa natureza exigem um amplo conhecimento acerca dos sistemas financeiros e de técnicas para fazer uso destes a fim de evitar a descoberta por parte das autoridades das atividades ilegais realizadas. Em contrapartida, com a cada vez maior especialização dos criminosos, as autoridades devem também conhecer muito bem o sistema financeiro, descobrir as vias de remessa de capital e as formas mais usuais de lavagem de dinheiro.

1.1 Principais fases do processo de lavagem de dinheiro: Conforme Silva (2002), o esquema internacional de lavagem de dinheiro segue três fases, a saber: A primeira fase consiste no envio ilegal do dinheiro para fora do país. Comumente essa remessa é enviada mediante o transporte do dinheiro para o exterior realizado por carregadores (ou mulas ). Utiliza-se também o correio ou outras formas de contrabando. Todavia, a técnica mais rápida e segura é a transferência eletrônica dos fundos, geralmente para paraísos fiscais. Muitas vezes, essa primeira etapa pode ser realizada mediante a transformação do dinheiro em bens materiais, como jóias, obras de arte, conversões em casas de câmbio, cassinos, etc. A segunda fase corresponde à realização de operações com o fim de dificultar o rastreamento contábil do dinheiro enviado para o exterior. Envolve o controle ou mascaramento da ilegalidade do dinheiro. É comum, nessa etapa, a superposição de transações financeira para que seja dificultada qualquer tentativa de ligar os bens ou ativos ilícitos do criminoso que iniciou o processo. Silva (2002) salienta que: Essa operação pode ser realizada através da conversão de dinheiro em instrumentos financeiros, investimentos imobiliários, superfaturamento em exportações, etc. A terceira fase conhecida como integração ou, propriamente, lavagem do dinheiro sujo. Nesta etapa, os criminosos se concentram na repatriação do ativo. Assim como na segunda etapa, todo o processo realizado na terceira fase intenta dificultar o estabelecimento do vínculo entre os criminosos e o dinheiro ou bens materiais mediante o rastreamento contábil. Essa terceira fase finaliza toda a operação de lavagem, já tendo sido apagada a origem ilícita do dinheiro, cabe aos criminosos retomarem os ativos, desta vez por vias legais. Dentre os mecanismos legais utilizados para essa etapa, salientam-se:

Empréstimos de bancos ou empresas estrangeiras, pagamento de cartas de crédito, taxas de consultoria, arrendamento ou serviços fictícios e superfaturamento. (SILVA, 2002). Embora estas três fases exemplifiquem bem o esquema de lavagem de dinheiro em sua forma de realização, cabe ressaltar que estas técnicas não são as únicas utilizadas. Cada vez mais novas maneiras de limpar ativos ilícitos têm sido criadas e esquematizadas, e isto ocorre de maneira tão sofisticada que se torna efetivamente difícil detectar a fraude. Como é possível perceber, as autoridades lidam com um complexo sistema que exige um esforço extenuante para ser reprimido. 1.2 Medidas para combater a lavagem de dinheiro em âmbito internacional: Dentre as atitudes tomadas para impedir a lavagem de dinheiro foi fundamental a Convenção de Viena, realizada em 1988. Este Encontro objetivou estabelecer diretrizes para o combate do narcotráfico e, por conseguinte, reconheceu a importância da lavagem de dinheiro para sustentar tal delito. Desta forma, dentre os assuntos discutidos na Convenção, efetivamente o tema da lavagem de dinheiro ganhou destaque. Esta Convenção teve desdobramentos importantes para a repressão à lavagem de dinheiro. Dentre os citados desdobramentos, destacamos a criação do FATF-GAFI, sigla que significa Financial Action Task Force on Money Laundering. O FATF-GAFI é um dos principais agentes internacionais que coordenam as operações contra a lavagem de dinheiro. Foi criado em 1989 por iniciativa do então G7, 2 o grupo dos sete países mais ricos do mundo (BARBOSA et PERRICONE, 1999). O Brasil não esteve alheio à tendência internacional de combate à lavagem de dinheiro. Em 1998 foi criada a lei 9.613 que dispõe sobre os crimes de lavagem e ocultação de bens, direitos e valores (BARBOSA et PERRICONE, 1999). Ainda em 2 Atual G-8.

1998 criou-se também o COAF Conselho de Controle de Atividades Financeiras órgão do governo federal concentrado exclusivamente ao combate de lavagem de dinheiro. Todavia, tanto a sofisticação das técnicas de lavagem de dinheiro quanto às medidas tomadas em âmbito internacional e nacional para combater essas atividades ilícitas, devem ser entendidas, tendo em vista um fenômeno mais amplo que se impõe em todas as sociedades modernas, e que portanto, deve ser melhor compreendido. Fala-se aqui da globalização. 1.3 A lavagem de dinheiro no contexto do mundo globalizado: De acordo com Celso Furtado, a globalização deve ser entendida por duas vias. A primeira consiste em entender a globalização como um processo antigo decorrente da evolução gradativa da tecnologia, a este movimento denomina-se globalização abrangente das atividades produtivas. A segunda via recebe a alcunha de globalização dos fluxos financeiros e monetários, que ocorrem tendo por centro as maiores potências econômicas, como os Estados Unidos, alguns países Europeus e o Japão (FURTADO, 1999). Deste segundo conceito de globalização presume-se também que as barreiras que arrefecem os fluxos de capitais são cada vez menos efetivas. De fato, dentre as conseqüências da globalização, impera a concepção de um sistema financeiro globalizado, onde as empresas se destacam no controle econômico em detrimento ao Estado. Nessa conjuntura, em que a entrada e saída de capital é extremamente facilitada, residem alguns problemas, como a lavagem de dinheiro. Efetivamente a globalização redundou em uma maior complexidade dos sistemas financeiros. No que se refere ao trabalho aqui realizado, essa maior complexidade resultou em uma ampla utilização por parte dos criminosos das barreiras pouco rígidas entre os sistemas financeiros. Por outro lado, suscitou medidas coordenadas entre os países para combater o volume imenso de remessas ilegais de ativos que circulam pelas instituições financeiras dos países mais

propícios a facilitar a ocultação da origem dos bens, ou seja, os chamados paraísos fiscais. Em um cenário econômico globalizado, é de interesse dos centros financeiros, que controlam os fluxos monetários, como salientou Furtado (1999), que as transgressões sejam combatidas para a manutenção da harmonia dos fluxos financeiros. Todavia, a própria tendência da globalização dificulta a fiscalização das movimentações financeiras uma vez que: Hoje passou a dominar a idéia de que o Estado é um trambolho. Mas, sem o Estado o que fica? O mercado. E qual a lei do mercado? É a lei do mais forte, a dos mais poderosos, a do grande capital. (FURTADO, 1999) Sabe-se que o papel fiscalizador do Estado no que concerne às movimentações financeiras é deveras importante. Com a diminuição cada vez maior do poder de ação do Estado em detrimento às grandes corporações cria-se um cenário de movimentação financeira livre de fiscalizações eficazes, algo muito propício e seguro para a aplicação de quantias altas e ilícitas. Feitas essas considerações, fica evidente a importância de pensar nos crimes de lavagem de dinheiro em uma perspectiva ampla que privilegie o papel facilitador que a globalização representa para esses atos obtusos. Nunca é demais ressaltar que a lavagem de dinheiro não é um crime por si só, a essas atividades vêm atrelados outros crimes de natureza grave, como o terrorismo e o narcotráfico, os mesmos delitos que tanto incomodam as grandes potências que dominam a globalização.

CAPITULO II A TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO NO BRASIL As últimas duas décadas do século XX representam momentos de grande avanço para a institucionalização de um sistema internacional destinado ao combate ao crime de lavagem de dinheiro e bens. A Convenção da Organização das Nações Unidas, realizada em 1988, na cidade de Viena, discutiu o combate ao trafico ilícito de entorpecentes e substâncias psicotrópicas, por meio da prevenção e repressão à lavagem de dinheiro e bens. Era o primeiro passo para a elaboração de uma série de mecanismos internacionais, que obrigassem os países signatários do tratado a reprimir o crime de lavagem de dinheiro 3. No Brasil, a Convenção de Viena foi ratificada pelo Decreto nº 154, de 26 de junho de 1991, marcando assim o início do processo que culminou com a criação da Lei nº 9.613, de 03 de março de 1998, que dispõe sobre a lavagem de dinheiro e ocultação de bens, direitos e valores. No processo que antecedeu a promulgação da Lei nº 9.613, o Senador Romeu Tuma, em um dos seus pronunciamentos acerca da lavagem de dinheiro, afirmava que não havia instrumentos que permitam à Polícia Federal, à Receita Federal, ao Ministério Público ou à Justiça alcançarem à lavagem de dinheiro (Discusro, 30/01/1998). A mesma preocupação pode ser percebida na fala do Senador Francelino Pereira, que faz um alerta aos legisladores e lembra que 3 Nos anos de 1990, vários foram os encontros internacionais em que o Brasil participou e confirmou a seu compromisso no combate ao crime de lavagem de dinheiro. Em maio de 1992, o Brasil foi um dos países que aprovaram o "Regulamento Modelo sobre Delitos de Lavagem Relacionados com o Tráfico Ilícito de Drogas e Delitos Conexos", criado no âmbito da Vigésima Segunda Assembléia-Geral da Organização dos Estados Americanos. Em dezembro de 1995, em Conferência Ministerial sobre Lavagem de Dinheiro e Instrumento do Crime, realizada em Buenos Aires, o Brasil firmou Declaração de Princípios relativa ao tema, inclusive quanto à tipificação do delito e sobre regras processuais especiais. E em 1997, durante a Sexagésima Sexta Assembléia Geral da Interpol, realizada em Nova Délhi, na Índia, a lavagem de dinheiro foi objeto das preocupações da entidade, que definiu esse crime como "qualquer tentativa ou atividade de ocultação ou disfarce de fundos obtidos ilegalmente, com o objetivo de fazê-los parecer de origem legal." (PEREIRA, Discurso. 12/11/1997)

não há mecanismos coibidores das práticas ilegais que envolvam o sistema financeiro, sobretudo no tocante à lavagem de dinheiro. O mais grave,(...) é que o País não dispõe ainda de uma legislação rigorosa para punir o crime de "lavagem" de dinheiro. Se a autoridade monetária é informada de que um "laranja" realiza operações ilegais de câmbio em algum ponto da fronteira, a única providência que pode ser tomada é determinar ao banco o encerramento da conta. Nem mesmo uma medida mais punitiva ao gerente ou ao funcionário que aceitou fazer a operação pode ser tomada. No entanto, desde dezembro de 1995 tramita na Câmara projeto de iniciativa do então Deputado José Fortunati, dispondo sobre "a repressão ao ingresso, no sistema financeiro, de dinheiro oriundo de atividades ilícitas". (...) Mais recentemente, em dezembro do ano passado, o Poder Executivo enviou projeto ao Congresso tratando da mesma matéria e chamando-a pelo nome apropriado: "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores. (PEREIRA, Discurso, 12/11/1997) Após alguns debates no Congresso Nacional a lei de combate ao crime de lavagem de dinheiro, finalmente entra em vigor em 1998. Além de tipificar o crime de lavagem de dinheiro, a lei define quais os crimes que caracterizam essa prática e estabelece a criação do COAF, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, órgão responsável por disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas nesta Lei (BRASIL, DOU, 04/03/1998). Com base na noção de lavagem de dinheiro como um processo de ocultação ou dissimulação da origem criminosa de bens, incorporando-os à economia, com aparência de terem proveniência ilícita, tal processo pode ser entendido como um crime acessório ou derivado, ou seja, só ocorre se houver crime anterior. Segundo a Exposição de Motivos da Lei 9.613, de 03 de março de 1998, há três gerações de legislação no tocante aos crimes antecedentes. A primeira diz respeito à lavagem de dinheiro aos bens provenientes do tráfico ilícito de entorpecentes. A segunda geração corresponde à fase em que, posteriormente, alguns países aumentaram as hipóteses de crimes antecedentes, incluindo outras infrações penais em um grupo taxativo. Já a terceira geração corresponde aos outros sistemas jurídicos que optaram por conectar a lavagem de dinheiro a toda a

espécie de infração penal precedente. Desse modo, a legislação brasileira seria de segunda geração. Na realidade, o legislador brasileiro efetuou uma mistura entre a segunda e a terceira geração. Ao mesmo tempo em que previu um conjunto de crimes antecedentes (Lei 9.613/1998, art. 1, I a VI e VIII), permitiu também que qualquer crime fosse precursor da lavagem de dinheiro, desde que praticado por organização criminosa (art. 1, VII). Dessa forma, só existe necessidade de se enquadrar o crime especificamente se ele não for praticado por intermédio de crime organizado. A ordenação taxativa dos crimes relativos à lavagem de dinheiro levou em consideração a especial gravidade destes e sua relação direta com as grandes somas movimentadas. Assim, a principal característica desses delitos é uma macrolesividade, uma vez que atinge muitas vezes interesses sociais e quase sempre geram uma enorme quantidade de dinheiro ilícito. O critério adotado pela lei requer freqüentes atualizações, visto que novas modalidades de crimes podem se tornar lucrativas o suficiente para requererem a lavagem de seus ativos. Nesse sentido, a enumeração legal já foi atualizada pela Lei 10.467, de 11.6.2002, que incluiu os crimes cometidos por particulares contra a administração pública estrangeira, e, pela Lei 10.701, de 9.7.2003, que acrescentou o financiamento ao terrorismo. Levando em consideração o fato de que a lavagem de dinheiro é um delito de reconhecida transnacionalidade, os Estados identificaram a necessidade de se combater de forma uniforme esse processo. Assim, foram criados diversos normativos internacionais, que influenciaram diretamente a legislação brasileira. Por isso, a solução de qualquer questão referente ao tema deve passar, primordialmente, pelo ordenamento jurídico internacional. As Recomendações do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI) são de grande relevância, visto que este organismo visa combater a lavagem de dinheiro. As recomendações, como o próprio nome indica, não possuem caráter obrigatório, porém são seguidas como uma ferramenta modelo para as ações internacionais.

Já na primeira recomendação, elaborada em 1993, ficou estabelecido que esse tipo de delito deve ter a maior abrangência possível, abarcando todos os denominados crimes graves. Foram propostas duas formas para conceituar um crime como grave. A primeira é listar uma categoria de crimes graves ou definir um limiar. Os parâmetros sugeridos para esse limiar foram: a pena máxima (superior a um ano) ou a pena mínima (superior a seis meses), podendo até mesmo ser realizada também uma combinação de ambas. Além do crime de lavagem de dinheiro, podem ser destacados os seguintes tipos de crimes graves: o tráfico de bens roubados e de outros bens, o tráfico de seres humanos e o tráfico ilícito de migrantes e as explorações sexuais, incluindo a exploração sexual de crianças. Também é disposto que cada Estado deveria tipificar as condutas nos termos de seu direito interno. Observa-se, a seguir, a relevância de uma enumeração taxativa de crimes antecedentes à lavagem de dinheiro. A Exposição de Motivos da Lei 9.613, de 1998, confirma esse critério mostrando que, sem ele, haveria uma massificação da criminalização para abranger uma ilimitada quantidade de crimes como antecedentes do tipo de lavagem ou de ocultação. Dessa forma, o autor do furto de pequeno valor estaria efetuando um dos tipos previstos no projeto se ocultasse o valor ou o convertesse em outro bem. No entanto, a posição adotada pela lei e por parte da doutrina apresenta graves inconvenientes, dentre os quais podem ser destacados os seguintes: A criminalidade é um processo dinâmico, e várias condutas que, à época da lei, não acarretavam macrolesividade, atualmente passam a ter esse caráter. Do mesmo modo, um dado crime pode, com o decorrer do tempo, deixar de ser caracterizado como grave ou até mesmo ser abolido. O legislador teria de contar, então, com excepcional atenção para realizar constantemente a atualização da lei. Outra questão grave é a habitual falta de técnica por parte do legislador. Na própria Lei 9.613, de 1998, existem exemplos disso: apesar de previsto como crime antecedente, não há o tipo penal do terrorismo, muito menos o de seu financiamento. Assim, a segurança jurídica desestrutura-se de fato com esse tipo de procedimento.

Um outro inconveniente com relação à verificação do método jurídico de individuação dos crimes primários, traz como conseqüência a restrição do alcance da incriminação que se traduz na dificuldade de apontar os responsáveis pelas operações. Ora, muitas vezes, não são levados em consideração os detalhes dos crimes de que resultaram tais ativos. Em alguns casos, existe até um conhecimento de que se trata de dinheiro sujo, porém há um desconhecimento a respeito da natureza específica do crime-base. Em decorrência disso, este procedimento conduz a intensas dificuldades na fixação da responsabilidade penal. Com base na Convenção de Palermo, promulgada no Brasil pelo Decreto 5.015, de 12 de março de 2004, em seu art. 6º, inciso 2º, alínea a, fica disposto que cada Estado deverá estender o tipo da lavagem de dinheiro a maior gama de infrações penais. Em seguida, estabelece que, no mínimo, devem ser incluídas todas as infrações graves. O termo infração grave foi conceituado pelo seu art. 2º como o ato que constitua infração punível com pena de privação de liberdade, cujo máximo não seja inferior a quatro anos. Nesse sentido, a convenção possui um caráter vinculativo para os países aderentes. O Brasil, sendo um dos signatários, assumiu o compromisso de caracterizar como crimes antecedentes todas as infrações penais cuja pena máxima seja igual ou superior a quatro anos. Ressalta-se que se trata de um critério básico, possibilitando ao país aderente adotar como conduta subjacente à lavagem de dinheiro qualquer infração penal. Partindo dessa premissa, sugerem-se as seguintes redações para o art. 1º da Lei 9.613/98. A primeira delas visa dissimular a natureza, a origem, a localização, a movimentação, a disposição ou a propriedade de bens, direitos ou valores oriundos, indireta ou diretamente, de crime punível com pena privativa de liberdade cujo máximo não seja menor que o período de quatro anos com pena de reclusão de três a dez anos e multa. A segunda é ocultar a natureza, a proveniência, a disposição, a localização, a movimentação ou a propriedade de bens, direitos ou valores originados, direta ou indiretamente, de infração penal com pena de reclusão de três a dez anos e multa.

Com relação a esse assunto, o teórico André Luis Callegari no seu livro Direito Penal Econômico e Lavagem de Dinheiro: aspectos criminológicos, afirma o seguinte: O artigo 1 da Lei 9.613/98, em relação ao tipo subjetivo, utiliza expressões ocultar e dissimular, com referência à origem delitiva dos bens. Em primeiro lugar, cabe dizer que a lei não menciona a modalidade culposa, pois todos os crimes são dolosos. O legislador brasileiro não estabeleceu a figura culposa para o delito de lavagem de dinheiro. Ademais, o Código Penal Brasileiro adota o sistema taxativo (numerus clausus) para a incriminação da culpa, é dizer, os tipos que permitem a comissão culposa estão expressamente previstos na Parte Especial do Código. Assim, ainda que os tipos sobre a lavagem não estejam contidos no Código, seguem as mesmas regras contidas na Parte Geral deste, ou seja, só admitiriam a comissão se houvesse a previsão expressa pelo legislador. (2003, p.163) 2.1 A Relação de algumas atividades econômicas no crime de lavagem de dinheiro: Somente é possível falar em lavagem de dinheiro quando há a passagem desse capital de origem ilícita por algum setor econômico que possibilite transações que o torne capital legitimo. Portanto, aqueles que querem dar uma origem legal para o ganho de capital obtido, geralmente procuram uma instituição financeira, um negócio fraudulento de compra e venda, lojas de jogos, com o objetivo de dar aparência de legalidade ao seu dinheiro. A respeito desse tema Callegari tece o seguinte comentário: O inciso VI tipifica os crimes contra o sistema nacional financeiro nacional, os quais tampouco estão regulados no Código Penal, senão na

Lei 7.492, de 16 de Junho de 1986. De acordo com a Lei da Lavagem, a ocultação ou dissimulação de bens, direitos e valores obtidos em conseqüência de crimes praticados contra o sistema financeiro nacional configura o delito de lavagem. Vale a pena recordar que o sistema financeiro nacional está composto pelo conjunto de atividades executadas pelas instituições financeiras, e estas, por sua definição legal, são as pessoas jurídicas de direito público, ou privado, que tenham como atividade principal ou secundária a captação, mediação, ou aplicação de recursos financeiros de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, ou a administração de valores imobiliários. (2003, p.160) As instituições financeiras são um dos setores mais procurados para essas operações, na medida em que a suas atividades típicas envolvem grande circulação de capital. Particularmente, nas últimas décadas as instituições financeiras fazem operações diárias em várias partes do mundo por meio de simples comandos eletrônicos, que possibilitam a circulação de vultuosas quantias de dinheiro entre os países. A atividade bancária, por exemplo, embora seja regulada por normas e leis pertinentes a cada país, é um dos setores mais visados pelos lavadores de dinheiro, porque com o desenvolvimento tecnológico garantem rápido e seguro movimento de capitais em âmbito internacional. Além disso, as instituições bancárias oferecem uma variedade de serviços financeiros. Assim, considera-se o setor de bancos uma área propícia para operações de branquiamento de capitais e, por isso é um dos setores relacionados na Lei nº 9.613/1998 para criar mecanismos de prevenção e combate a esse crime. A idéia presente na nova lei envolve a obrigação das instituições em lastrear operações suspeitas de lavagem de dinheiro sob pena de responsabilidade administrativa e penal, nos casos omissos ou em que haja a participação de funcionários. Ainda na área financeira observamos a atuação de lavadores de dinheiro nas empresas de factoring que realizam empréstimos de dinheiro, pagamento antecipado de cheques, tendo em contrapartida a cobrança de juros. Nesse negócio, quem quer lavar dinheiro abre uma factoring, possibilita a circulação do dinheiro, acompanha a entrada e a saída das transações financeiras, e recoloca o dinheiro como fruto dessas operações de empréstimo e antecipações de pagamento.

As casas de câmbio, os transmissores internacionais de dinheiro e agências de viagens também oferecem um grande número de serviços que podem ser utilizados pelos lavadores de dinheiro. Como por exemplo, passagens de companhias aéreas, câmbio de dinheiro estrangeiro em forma de notas ou cheques. Essas operações são atrativas para aqueles que precisam lavar o capital, porque muitas vezes podem ser feitas de forma anônima, o que diminui o risco para o cliente. Há também serviços de transferência de dinheiro por meio de ordem eletrônica, fax, cheque ou courier que podem ser facilmente manuseados por pessoas que não podem utilizar os canais bancários, como ocorre com muitos lavadores. Operações efetuadas na bolsa de valores também são procuradas por quem quer lavar dinheiro, pois oferecem alto índice de liquidez, realização de negócios internacionais, compra e venda de ações de forma rápida, transações intermediadas por corretoras e grande competitividade entre as mesmas, que auferem lucro por meio de comissão (COAF, p. 7). De maneira, há empresas ávidas por clientes que queiram correr risco em operações que envolvam ações e clientes que buscam meios de justificar os seus ganhos ilícitos. O mercado de seguros, capitalização e previdência privada também são suscetíveis a investimentos que visam à lavagem de dinheiro. O Conselho de Controle de Atividades Financeiras, publicou documento sobre lavagem de dinheiro, mostrando que as companhias seguradoras são utilizadas pelos criminosos das seguintes formas: a) os acionistas podem usar seu poder de deliberação realizando investimentos que possibilitem a prática de lavagem de dinheiro; b)os segurados, por sua vez, podem lavar recursos mediante a apresentação de avisos de sinistros falsos ou fraudulentos, o mesmo ocorrendo com os subscritores e participantes, os quais podem, respectivamente, transferir a propriedade de títulos de capitalização sorteados e inscrever pessoas inexistentes ou falecidas em planos de previdência privada aberta; e c)a intermediação, materializada na corretagem, também pode ensejar a malfadada lavagem nas transações envolvendo terceiros ou clientes não residentes. (COAF, p. 7 )

A colaboração das seguradoras também pode acarretar responsabilidade administrativa, com punição determinada na própria Lei nº 9.613/1998. Há de falar ainda dos cassinos e estabelecimentos de jogos, em geral, na medida em que são espaços que servem para os lavadores de dinheiro. As rodadas de jogos são pagas em dinheiro vivo, que pode ser depositado no cassino no lugar das fichas, possibilitando a circulação de grandes quantias de dinheiro em espécie. Após algumas rodadas nas mesas de jogos, o jogador pode trocar as fichas que não usou por dinheiro ou cheque do cassino e declarar que o seu dinheiro foi obtido em jogo permitido. Ainda quanto aos jogos, outra forma conhecida de se lavar dinheiro é a compra de bilhetes premiados de loterias e corridas de cavalo. Após o sorteio, e a identificação do ganhador, quem quer limpar o dinheiro compra o bilhete por determinado valor e diz que foi ele quem ganhou. Assim, o dinheiro que tinha uma origem criminosa é justificado como ganho obtido por meio de aposta em jogo. Negócios que envolvam compra e venda de obras de arte, antiguidades, pedras preciosas e jóias atraem os lavadores de dinheiro por se tratar de objetos de alto valor, que podem ser transportados com facilidade. Leiloeiros e negociantes de artes intermedeiam a compra e a venda desses objetos no mercado internacional e não encontram dificuldades em transitar com esses objetos. De modo geral, aqueles que precisam dar aparência legal ao dinheiro recebido de crimes buscam negócios que envolvam grande movimentação de capitais, sem a necessidade de detalhamento dos faturamento. É o caso também de redes de restaurantes, companhias aéreas, frotas de táxis ou de ônibus, casas de espetáculo, que atendem ao público e movimentam grande volume de dinheiro no varejo. Por fim, o mercado da construção imobiliária apresenta uma série de atrativos para os lavadores de dinheiro. Uma das características desse setor é a falta de fiscalização e a facilidade e rapidez em comprar e vender um imóvel. As práticas mais comuns ocorrem por meio de especulação no valor de negociação de compra e venda do bem, envolvendo de uma só vez valores relativamente altos.

2.2 Formas de punição no Brasil No Brasil, sobretudo recentemente, têm sido criadas várias formas de punição à lavagem de dinheiro. Alguns especialistas fazem críticas à Lei nº 9.613, de 03 de março de 1998, na medida em que acreditam que a norma legal impossibilita a aplicação do aumento da pena nas situações em que o crime antecedente tenha sido praticado por uma organização criminosa. Embora, a lei disponha sobre o aumento da pena em casos de comissão habitual do crime de lavagem de dinheiro. Acontece, porém, que, em casos como esses, haveria a necessidade de uma comprovação da comissão habitual de crime prévio. Semelhante ao ocorrido a respeito da organização criminal, pois o legislador não estabeleceu o que é criminalidade habitual, o que pode ser constatado no trecho da lei abaixo: A pena será aumentada de um ou dois terços, nos casos previstos nos incisos I a VI do caput desse artigo se a ação criminosa for cometida de forma habitual ou por intermédio de organização criminosa. (Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998) Isto acontece porque o legislador brasileiro, de uma maneira geral, (...) não tipificou o que é uma organização criminosa (...) (Callegari 2003) De modo que se constitui uma falha na legislação, porque acaba não permitindo a execução da lei ou, então, o aumento devido à gravidade do ato, como previsto. Dessa maneira, não existe a possibilidade de efetivar o aumento da pena como menciona o artigo acima. Embora, o legislador tenha definido no projeto de Lei 3.515, de 1989, que, segundo os efeitos da Lei, organização criminosa significa aquela que por sua composição, revele a existência de estrutura criminal, atuando de maneira sistematizada, num âmbito regional, nacional ou até mesmo internacional. Tal conceituação não foi mantida na Lei 9.034, de 1995, não havendo, desse jeito, qualquer definição para esse termo organização criminosa. No Código Penal, pode-se perceber que a definição do que seria o bando criminal no artigo 288 também não é clara sobre este tipo de segmento e suas atividades. Isto também acontece no que diz respeito à organização criminosa, uma vez que não existe preceito que determine o que ela representa.

Retomando a questão do aumento da pena, esta pode ser ampliada em casos da comissão habitual do crime, ou melhor, na comissão habitual de lavagem de dinheiro. Porém, em casos como esses, haveria a necessidade de uma comprovação da comissão habitual de crime prévio. Semelhante a definição da organização criminal, o legislador não estabeleceu o que é criminalidade habitual. Esse termo acaba ganhando duas interpretações, pode ser compreendido como a repetição constante de um ato, ou ainda interpretado de maneira que determine que um crime habitual corresponde a crimes constituídos por meio de ações reiteradas. Do ponto de vista penal, tais ações constituem um todo, ou seja, um delito único. Nesse sentido, o significado da definição apresentada na Lei de Lavagem não coincide com o conceito de crime habitual empregado pela doutrina. Esta adota, para sua consolidação, uma confirmação das posturas, visto que o fato se circunscreve a um ato apenas. Portanto, não existirá crime habitual. Por outro lado, distinto da definição de crime habitual, embora ocorra apenas um delito, não existirá um ato exclusivo de lavagem, já que ocorrerá este delito, o que não acontece com o delito habitual que pressupõe o processo de reiteração de atos para a ocorrência do delito. Partindo dessa premissa, para que se tenha uma aplicação desse preceito, deve ficar constatado uma determinada constância na postura do indivíduo. Assim, é necessário que haja uma confirmação de que este indivíduo realmente estava inserido na prática de lavagem de dinheiro. Os confiscos impostos aos lavadores de dinheiro determinados pela Lei brasileira são apresentados no artigo 7 da Lei de lavagem. Daí tem-se a seguinte determinação: São efeitos da condenação, além dos previstos no Código Penal: a perda dos bens, valores do objeto do crime e direitos para a União, com exceção do direito lesado ou de terceiro de boa-fé e a suspensão do cargo público de qualquer espécie e de diretor, de componente de conselho de administração ou de gerenciamento de pessoas jurídicas mencionadas no artigo 9, pela quantidade dobrada de tempo da pena privativa de liberdade executada.

Um outro artigo que também apresenta orientações sobre os efeitos da condenação é o artigo 9º do Código Penal Brasileiro. Em seu livro Callegari (2003) destaca as seguintes conseqüências para os resultados genéricos da condenação: Tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime, a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito e do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com prática do fato criminoso. (p. 175) Vale salientar que a perda dos bens, valores ou direitos para o Estado não é instantâneo, uma vez que esta deve ocorre de acordo com a verificação da ocorrência do direito do indivíduo prejudicado ou do agente de boa-fé que deve ser indenizado. Em situações, onde não haja direito de ser reparados, os bens devem ser destinados ao Estado.

CAPÍTULO III RESPONSABILIDADE DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS Em julho de 2007, o Departamento de Recuperação de Ativos do Ministério da Justiça (DRCI), em conjunto com a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Banco do Brasil, inauguraram o Laboratório de Tecnologia contra o Crime de Lavagem de Dinheiro, instalado no Centro Cultural do Banco do Brasil, em Brasília. O objetivo do laboratório é criar soluções para a análise tecnológica de dados, propiciando a elaboração de sistemas que possibilitem aos profissionais que atuam no Sistema Financeiro Nacional e nas instituições da justiça e da policia combater os crimes de lavagem de dinheiro 4. Trata-se, sobretudo, de mais uma medida que visa construir instrumentos de controle de práticas criminosas de lavagem de capital e seus crimes antecedentes. Por outro lado, o Laboratório de Tecnologia contra o Crime de Lavagem de Dinheiro demonstra os esforços das instituições que figuram no pólo de organismos responsáveis em combater a transformação do dinheiro ilícito em dinheiro lícito. Já vimos no primeiro capítulo desse trabalho que há uma verdadeira força-tarefa, envolvendo órgãos nacionais e internacionais, na luta para identificar e rastrear os caminhos seguidos pelo dinheiro advindo de crimes. Interessa-nos mais de perto verificar a participação das instituições financeiras nesse processo. O art. 9º da Lei nº 9.613/1998 cria obrigações para as pessoas jurídicas que tenham atividades que possam contribuir para a pratica de lavagem de dinheiro. As 4 Segundo informações do Ministério da Justiça, o projeto do Laboratório foi destaque do ano na edição 2007 do Prêmio Nacional de Excelência em Informática Pública (CONIP), ocasião em que recebeu o título de melhor inovação tecnológica. Disponível em: http://www.mj.gov.br/data/pages/mj7fabcbfcitemid5079eb5c581f4e598bb9bc5af189b7daptbrie GUEST.htm Acesso em: 03/08/2007.

instituições financeiras públicas e privadas, na medida em que desenvolvem atividades de coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros (Art. 17 da Lei nº 4.595/1964, que dispõe sobre a política e as instituições monetárias, bancárias e creditícias), estão obrigadas a identificar e manter os cadastros dos clientes atualizados, registrar movimentações e transações financeiras e comunicar operações que possam ter indício de lavagem de dinheiro (Arts. 10 e 11 da Lei nº 9.613). É importante salientar ainda que o não cumprimento desses dispositivos legais acarretam responsabilidade administrativa para a instituição. No capítulo primeiro desse estudo, mostramos que a Lei nº 9.613/1998 criou o COAF, seguindo as orientações de organismos internacionais de combate ao crime de lavagem de dinheiro 5. O COAF é a agência nacional, central responsável por receber (requerer), analisar e distribuir às autoridades competentes as denúncias sobre as atividades financeiras com respeito a procedimentos presumidamente criminosos conforme legislação ou normas nacionais para impedir a lavagem de dinheiro.(coaf, 2001. p. 2) Assim, podemos observar que a atuação do COAF está diretamente relacionada às pessoas obrigadas a elaborar mecanismos para o combate ao crime de lavagem de dinheiro. A relação do COAF com as diversas pessoas obrigadas ocorre por intermédio de órgãos que fiscalizam, regulamentam, disciplinam atividades específicas. No caso das instituições financeiras, compete ao BACEN (Banco Central do Brasil) informar ao COAF as comunicações de suspeita de lavagem de dinheiro. É o que podemos conferir por meio da análise do fluxo de recebimento de comunicações de operações suspeitas, elaborado pelo COAF. 5 O Conselho de Controle de Atividades Financeiras é um órgão brasileiro congênere ao FIU (Financial Intelligence Unit), instituição existente em vários países ligados ao FATF-GAFI, e são responsáveis pela política de combate a lavagem de dinheiro nas instituições financeiras.

Fonte: COAF. Relatório de Atividades de 2004. p. 7. Como vimos o BACEN é o órgão que recebe as comunicações que foram feitas pelas instituições financeiras. Nessa direção, o BACEN instituiu as diretrizes básicas para as instituições financeiras criarem sistemas de verificação de operações de lavagem de dinheiro, denominadas de anti-lavagem. Logo após a edição da Lei nº 9.613/1998, o BACEN determinou por meio da Circular nº 2.852, de 03 de dezembro de 1998, os procedimentos a serem adotados na prevenção e combate as atividades de lavagem de dinheiro, definindo no art. 1º, incisos I, II e III, que as instituições financeiras devem, sem que sejam avisados os envolvidos: I - manter atualizadas as informações cadastrais dos respectivos clientes, observadas, quando for o caso, as exigências e responsabilidades definidas na Resolução n. 2.025, de 24.11.1993, e modificações posteriores; II - manter controles e registros internos consolidados que permitam verificar, alem da adequada identificação do cliente, a compatibilidade entre as correspondentes movimentações de recursos, atividade econômica e capacidade financeira; III - manter registro, na forma a ser estabelecida pelo Banco Central do Brasil, de operações envolvendo moeda nacional ou estrangeira, títulos e valores mobiliários, metais ou qualquer outro ativo passível de ser convertido em dinheiro. A Circular nº 2.852/1998 determina que devam ser comunicadas as operações de valor igual ou superior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), bem como

Art. 1, 3º, I - as operações que, realizadas com uma mesma pessoa, conglomerado ou grupo, em um mesmo mês calendário, superem, por instituição ou entidade, em seu conjunto, o limite estabelecido no art. 4, inciso I; Art. 2. (...) às operações ou propostas cujas características, no que se referem às partes envolvidas, valores, formas de realização e instrumentos utilizados, ou que, pela falta de fundamento econômico ou legal, possam indicar a existência de crime, conforme previsto na Lei n. 9.613, de 03.03.1998, ou com ele relacionar-se. Uma outra medida normativa criada pelo BACEN, a Carta-Circular nº 2.826, de 04 de dezembro de 1998, enumera a relação de operações e situações que podem configurar indício de ocorrência dos crimes previstos na Lei que tipifica como crime a lavagem de dinheiro. Assim, a operacionalidade das medidas que visam suprimir as praticas de lavagem de dinheiro no sistema financeiro nacional decorre do trabalho desenvolvido em parceria entre o COAF, o BACEN e as instituições financeiras, essas últimas, ponta de lança de todo processo gerado conforme a Lei nº 9.613/1998. Portanto, nos aproximaremos um pouco mais das atribuições destinadas às instituições financeiras. 3.1 Da identificação dos clientes e manutenção de registros: Cabe às instituições financeiras uma particular responsabilidade na questão da lavagem de dinheiro. Sua estrutura contábil e a competência de seus profissionais podem contribuir decisivamente para a redução de manobras ilícitas que comprometem o fluxo regular da economia. Qualquer alteração anormal nos hábitos de pagamento de clientes regulares precisa ser investigada e os "emprestadores" também devem prestar atenção, já que técnicas de lavagem de dinheiro podem envolver uma devolução de um empréstimo de forma mais rápida do que permitem a renda ou os recursos disponíveis.

Geralmente é possível conhecer a renda declarada (ou capacidade financeira) de um cliente no momento do pedido para o empréstimo. Um caso a parte são, obviamente, empresas deste tipo operando em cumplicidade com os criminosos ou dirigidas por eles. A respeito desse tema Callegari (2003) alerta que O inciso VI tipifica os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, os quais, tampouco estão regulados no Código Penal, senão na Lei 7.492, de 16 de Junho de 1986. De acordo com a Lei de Lavagem, a ocultação ou dissimulação de bens, direitos e valores obtidos em conseqüência de crimes praticados contra o Sistema Financeiro Nacional configura o delito de lavagem. (p.160) O emprego abusivo das normas que possibilitam aos bancos e outras atividades financeiras eximirem-se da responsabilidade de identificação de certas atividades ou de determinados tipos de empresas também contribuem para o processo de ocultação de dinheiro. Isso ocorre porque diversas legislações, com o fim de agilizar a informação, concedem aos bancos a possibilidade de se eximirem da responsabilidade de identificação daquelas operações oriundas de movimentações legítimas efetuadas por clientes assíduos ou conhecidos. Com isso, a doutrina comenta que a prática dessa relação ou emprego constante da mesma por parte da instituição bancária contribui para facilitação da ação dos lavadores. Assim, os criminosos utilizam sociedade fantasmas (ou de fachada), ou de comum acordo com funcionários do banco. Desse modo, a criação de sociedades fantasmas isentam a instituição financeira ou seus clientes do regime de supervisão. Isso pode conceder aos lavadores um meio para evitar que sejam identificadas pistas a respeito das transações por eles executadas em dinheiro. Com relação a esse assunto, o teórico Callegari tece o seguinte comentário: As operações de engenharia financeira supõem um desafio para as autoridades detectarem a comissão de delitos econômicos, fundamentalmente pelo enorme volume do mercado financeiro e sua complexidade, que exige um profundo conhecimento da realidade econômica e a regulação jurídica do mundo das finanças. Outros fatores do sistema financeiro também favorecem, como o segredo bancário ou a disparidade de regulamentações que regulam as