DANOS DE GEADA EM TRIGO; AVALIAÇÃO PRELIMINAR DE CULTIVARES 1

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Transcrição:

DANOS DE GEADA EM TRIGO; AVALIAÇÃO PRELIMINAR DE CULTIVARES 1 PEDRO LUIZ SCHEEREN 2 RESUMO - Foi avaliada a formação de grãos (fertilidade) em 31 genótipos de trigo (Triticum ae:tivum L.) submetidos a danos de geada sob condições naturais, em três estádios de desenvolvimento. Foi verificado que: a) as etpigas que foram atingidas pela geada no emborrachamento resistiram mais do que aquelas que receberam o choque de frio durante o espigamento; b) nas plantas cujas espigas se encontravam em antese durante a geada, não houve formação de grãos; c) houve variabilidade, quanto à reação à geada, entre genótipos num mesmo estádio de desenvolvimento; d) também houve diferente comportamento frente à incidência de geada em diversos estádios de desenvolvimento de um mesmo genótipo. - Termos para indexação: resfriamento, congelamento, estádios, espigas. FROST INJURY IN WHEAT:PRELIMINARY VARIEi"? EVALUATION ABSTRACT - The grain setting (flower fertility) of 31 wheat genotypes (Triticumeestivum Lj, exposed to frost, at three growth stages, was evaluated. It was observed: a) Iess frost injury during booting stage than at heading stage; b) there was no seed setting in plants injured by frost during anthesis; cl there was genetic variability among genotypes at the sarne growth stage, regarding their reaction to frost; and d) the behavior of a given genotype at different growth stages was also variable. Index terrns: cooling, freezing, growth, stages INTRODUÇÃO A incidência de danos causados pela geada tem sido significante nas últimas safras de trigo no Brasil. Estes danos, em 1975, determinaram a perda de aproximadamente 1.000.000 de hectares da cultura nos Estados de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária 1979). Em 1979 e 1980, severas geadas atingiram o trigo no Rio Grande do Sul, quando grande parte das cultivares precoces já se encontravam nas fases de espigamento e antese, determinando drásticas perdas em várias regiões do Estado. Visando minimizar este problema, o Centro Nacional de Pesquisa de Trigo - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (CNPT.EMBRAPA) - vem realizando estudos para identificação de genótipos que evidenciam maior resistência à geada e que possam ser usados no programa de melhoramento genético. Alguns trabalhos, que vêm sendo conduzidos sob condições controladas, permitem a Aceito para publicação em 15 de fevereiro de 1982. Eng? Agr?, MSc., Centro Nacional de Pesquisa de Trigo (CNPT) - EMBRAPA, Caixa Postal 569, CEP 99100 - Passo Fundo, RS. realização de testes somente em Pequeno número de plantas, em função do reduzido espaço físico onde é aplicado o tratamento de frio (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária 1979). Por outro lado, em condições de campo, vêm sendo realizadas seleções em germoplasma mais variado. Paralelamente a estes estudos, a geada de 17 de setembro de 1980 proporcionou a realização de um trabalho sob condições naturais, a campo, no qual o objetivo fixado foi a observação do efeito da geada sobre a formação dos grãos (fertilidade), em diversas cultivares de trigo. ANTECEDENTES Principais sintomas e danos de geada Além da queima de folhas e estrangulamento dos colmos, um dos mais graves danos que a geada pode causar às plantas Lie trigo é atingindo os primórdios frutíferos, impedindo a formação dos grãos. O fato ocorre em virtude da cristalização dos líquidos intra e intercelulares, provocando o rompimento das paredes celulares do ovário. Estes danos tomam diferentes formas, dependendo do estádio de desenvolvimento da planta e da temperatura registrada durante a geada. Se o frio atingir o interior da espiga antes da abertura da bainha da Pesq. agropec. bras., Brasilia, 17(6): 853-858,jun. 1982.

854 P.L. SCI-IEEREN folha bandeira (emborrachamento), aquele órgão estará morto (Single 1971). Contudo, após geadas em estádios posteriores, foi comum encontrar espigas em que somente algumas secções foram injuriadas. O fato ocorreu com maior freqüência na base da espiga, onde as espiguetas afetadas tornaram-se brancas, falhando no enchimento dos grãos. Enquanto isto, houve uma tendência de grupos completos de espiguetas permanecerem férteis, especialmente aquelas localizadas na metade superior da espiga (Single & Marceilos 1974). Também considerando os danos sobre a espiga, Toda (1962) relatou que, à temperatura foliar de 00 a 30C, ocorre esterilidade em trigo, quando o pólen se encontrar no estádio da primeira divisão nuclear. Outro tipo de injúria, descrito por Banath & Single (1976), é aquele causado pela morte de alguns afilhos, resultando em acamamento e redução do número de grãos. Este dano está associado aos tecidos jovens e poderá ser maior se a temperatura cair rapidamente (Single 1971). Da mesma forma, Olien et ai. (1968) observaram que a formação de gelo intracelular provocou a ruptura das membranas celulares, levando a célula à morte. O problema resultante é a desidratação, que acontece principalmente no pedúnculo, podendo ocorrer também nos entrenós inferiores ou na região imediatamente superior a cada nó, uma vez que é ali que se processa a elongação da planta, pela rápida multiplicação das células. Nos colmos atingidos verifica- -se um estrangulamento, que impede a circulação de seiva. Todavia, estes sinais só serão visíveis alguns dias após o dano, quando surge um escurecimento dos tecidos mais atingidos e posterior ressecamento da parte aérea acima daquele ponto. Segundo Single (1971), há casos em que o colmo é afetado e a espiga permanece ilesa, mas raramente são encontradas espigas danificadas sem alguma iiijúria evidente no colmo. Além dos danos causados pelo rápido resfria. mento, existem ainda, segundo Olien et al (1968), as injúrias causadas por longas exposições às baixas temperaturas, que também podem ser letais, mesmo que o resfriamento se tenha dado de forma lenta. Segundo Single & Marcellos (1974), até o presente, pouco é sabido sobre como se inicia e se desenvolve o congelamento das plantas de trigo no campo. Mason (1971) citado por Single & Marcellos (1974), ressaltou que os processos de cristalização da água sobre tecidos de plantas ou outras superfícies ao nível do solo são pouco compreendidos, apesar do grande conhecimento de processos similares na atmosfera superior àquele ponto. Controle dos danos e fontes de tolerância à geada Três maneiras foram apontadas por Single (1971) para diminuir os riscos ou escapar das geadas: a) pelo retardamento da época de semeadura; b) pela utilização de cultivares próprias para pastoreio; e c) pelo uso de cultivares de ciclo tardio, sendo que a escolha da cultivar e a data de semeadura seriam influenciadas pelo local. Por outro lado, um método mais seguro de controlar os danos por geada consistiria na criação de cultivares tolerantes. Com os testes realizados no CNPT, foram obtidos resultados que evidenciaram o genótipo lute, originário da Austrália, como portador de boa tolerância à geada, o que já havia sido referido pela pesquisa daquele país (Fernandes 1978). A partir daquele ponto, foram feitos alguns cruzamentos entre aquele genótipo e cultivares nacionais, visando incorporar o caráter. Paralelamente, em condições de laboratório, estão sendo conduzidos novos testes, na hipótese de que existam diferenças genéticas quanto à tolerância à geada, em material nacionaljá adaptado (Wendt & Rosa) 3. Mecanismos de resistência ou tolerância à geada Em trigo, a variabilidade que ocorre entre genótipos, para a tolerância aos danos de geada, pode ocorrer em função de diversos fatores, alguns dos quais ainda não comprovados. Dentre estes fatores devem ser considerados:a) a resistência do ráquis e da ráquila ao congelamento dos líquidos inter e intracelulares; e b) a habilidade hidrofóbica das superfícies da lema, pálea e gluma em prevenir o contato entre núcleos atmosféricos de congelamento e o conteúdo interno de umidade (Single & Marcellos 1974). Ainda, discutindo o mecanismo de proteção das estruturas fio- 3 WENDT, W. & ROSA, O.S. Passo Fundo, 1981 (Informação pessoal). Pesq. agropec. bras., Brasília, 17(6): 853-85& jun. 1982.

DANOS DE GEADA EM TRIGO 855 rais, os mesmos autores salientaram a possibilidade de que a presença de uma camada de cera mais espessa ou a maior área superficial das peças de proteção (gluma, lema e pálea) poderiam oferecer maior resistência aos danos de geada. Também podem ser consideradas as diferenças de desenvolvimento entre as espigas de genótipos distintos, entre espiguetas de uma espiga e entre flores de uma espigueta, na mesma planta. Se houver momentos críticos de sensibilidade ao frio, TABELA 1. Valores médios observados para a percentagem de formação de grãos em espigas de plantas de cultivares submetidas à geada na fase de emborrachamento. CNPT, Passo Fundo, 1980. Cultivar Percentagem de grifos formados CNT9 90,94a 1 CNT8 85,18ab CNT 10 82,08abc 1AS64 81,22abcd Aceguá 71,17 abcde BR 4 73,54 abcdef Mascarenhas 73,36 abcdef IAS 63 64,81 abcdefg BA 3 62,56 abcdefgh Cotiporã 59,03 bcdefghi PAT 7392 55,19 cdefghij Glória 54,37 cdefghij CNT 1 52,80 cdefghij Nhu-pori 52,02 defghij Frontana 50,04 efghij PAT 7219 48,51 efghij Charrua 48,49 efghij Santiago 46,77 fghij C 33 45,15f91h1jI BR 5 44,06 fghijl CNT 2 41,59 ghijlm Nobre 40,93 ghijlm Jacuí 39,87 ghijlm Peladinho 37,38 ghijlm IAS 54 36.99 ghijlrn PAT 19 33,42 hijlm IAC 5-Maringá 31,81 hijlm IAS 55 31,23 ijlrn Candiota 28,14jlm Vacaria 15,45 Im CNT7 13,12ni Duncan 5% - Médias acompanhadas de letras iguais não têm diferença significativa. como já foi demonstrado para a ação do calor (Bayliss & Riley 1972), pode ser difícil distinguir entre a resistência e o escape (Fernandes) 4. MATERIAL E MÉTODOS Coleta de material e observações O experimento foi executado utilizando-se plantas das cultivares componentes do Ensaio Estadual de Cultivares de Trigo (EECT), conduzido no CNPT-EMBRAPA, em Passo Fundo, no ano de 1980 (Tabela 1). O ensaio, semeado em três épocas, foi constituído por 32 genótipos, em blocos ao acaso, com quatro repetições, o que permitiu a observação de danos de geada em cada cultivar em diferentes estádios de desenvolvimento. Para este trabalho, foram consideradas apenas três repetições. Em cada repetição, foram marcadas dez plantas na fase de emborrachamento (antes da abertura da bainha da folha bandeira, estádio 9 da escala de Feekes & Large) (Large 1954), dez plantas no espigamento (quando mais de dois terços da espiga estava fora da bainha da folha, estádio 10,1 de Feekes & Large) e dez plantas na fase de antese (até o final da floração, estádio 10,5 da escala Feekes & Large), totalizando 30 plantas por estádio. A amostragem foi obtida ao acaso pela marcação das plantas, individualmente, em diversos pontos das bordaduras das parcelas, no dia em que ocorreu a geada. Durante a colheita do EECT, foram também colhidos os colmos com as espigas marcadas, propiciando, desta maneira, condições para que houvesse um desenvolvimento vegetativo e reprodutivo semelhante às demais plantas da parcela. Contudo, foram perdidos os dados dos genótipos Tifton e IAS 64, no emborrachamento e espigamento, respectívamente, o que reduziu o número de cultivares para 31 nestes estádios, enquanto na antese foi considerado o número total de cultivares (32). Após a colheita, foi feita a contagem do número de grãos formados por espiga, que ao serem transformados para percentagem, representam o índice de fertilidade. Para esta determinação foram consideradas somente as duas flores laterais (externas) de cada espigueta, uma vez que é esperado que estas, sob condições normais, formem grãos. Não foram consideradas as espiguetas inferiores que, por natureza genética ou ambiental, apresentavam- -se estéreis. Por ocasião da geada, foi observada também incidôndia de danos de estrangulamento ou enrugamento do calmo nos pontos de rápida multiplicação celular. Estes pontos estavam situados nos entrenós, imediatamente acima de cada nó. FERNANDES, M.I.B. de. M. Passo Fundo, 1981 (Informação pessoal). Pesq. agropec. bras., Brasilia, 17(6): 853-858, jun. 1982.

856 P.L. SCHEEREN Condições atmosféricas O presente estudo foi feito com base na geada ocorrida na madrugada de 17 de setembro de 1980. As temperaturas observadas durante e após a geada ocorrida na Estação Agrometeorológica do CNPT/8? DISME estão na Tabela 2. Quanto aos demais aspectos decisivos para o ôxito da cultura, poder-se-ia afirmar que as condições atmosféricas, afora os danos causados por geada, foram normais e favoráveis a uma boa safra de trigo. TABELA 2. Condições atmosféricas ocorridas por ocasião da geada de lide setembro de 1980, CNPT, Passo Fundo. Dia Hora No abrigo Temperatura Na relva 16 23h 0 C - 24h 0 C 17 01 h -0,50C - 02 h -0,80C - 03 h 0,70C - 04h -1,0 C - 05h -1,00C - 06h -1,0 C 09 h + 6,0 C 3,1 0c' Temperatura mínima observada durante a madrugada do dia 17, até às 9h. RESULTADOS Significativas diferenças foram observadas quanto ao comportamento das cultivares frente ao frio (Tabelas 1,3 e 4). Na Tabela 1, onde foram incluídos os dados referentes à fase de emborrachamento, o genótipo CNT 9 evidenciou maior percentagem de formação de grãos, com 90,94% de fertilidade. Também as cultivares CNT 8, CNT 10, IAS 64, Aceguá, BR 4, Mascarenhas, IAS 63 e BR 3 revelaram expressiva percentagem de grãos formados. Por outro lado, os gen6tipos CNT 7, Vacaria, Candiota, IAS 55, IAC 5-Maringá, PAT 19, IAS 54, Peladinho,Jacuf, Nobre e CNT 2 parecem ser bastante suscetíveis aos efeitos da geada, pois só pequena percentagem das flores produziu grãos. A análise estat~stica na Tabela 3 comprova estas observações. Na fase de espigamento, o destaque ficou para a cultivar CNT 1, com 34,85% de grãos formados, seguido de PAT 7219 e PAT 7392, com cerca de 13%. As cultivares Aceguá, C 33, Glória, Tifton e Nhu-porã não formaram grão (Tabela 4) Também na Tabela 3 é apresentada a análise de variáncia dos valores de fertilidade obtidos para a fase de espigamento. Devem ser ressaltados ainda os altos valores obtidos para os coeficientes de variação, que foram de 29,95% e 65,68%, para os dados observados nas fases de emborrachamento e espigamento, respectivamente. As espigas marcadas das plantas que estavam em antese não produziram grãos. TABELA 3. Resumo da análise de variância para os valores observados nas fases de emborrachamento e espigamento. Causas de variação Ernborrachamento Espigamento GL QM CL OM Blocos 2 145,22 2 17,87 Tratamentos 30 1.190,13' 30 146,64' Erro experimental 60 238,45 58-16,36 CV. % 29,95 65,68 Média (j) 51,56 6,16 * Significativd (P < 0,01). Pesq. agropec. bras., Brasilia, 17(6): 853-858,jun. 1982.

DANOS DE GEADA EM TRIGO 857 TABELA 4. Valores médios observados para a percentagem de formação de grãos em espigas de plantas de cultivares submetidas à geada na fase de espigamento. CNPT, Passo Fundo, 1980. Cultivar Percentagem de gr5os formados CNT 1 34,85 a' PAT7219 13,27b PAT 7392 13,10 bc Nobre 12,88bc Frontana 12,34 bcd IAC 5-Maringá 10,32 bcde Cotiporã 10,10 bcde BR 4 10,08 bcde IAS 63 9,89 bcde CNT 10 9,46 bcdef Jacuf 7,16 bcdefg Charrua 6,25 bcdefg CNT 8 5,99 bcdefg Peladinho 5,48 bcdefg CNT 9 5,21 cdefg Vacaria 4,81 defg BA 3 3,96 efg CNT 2 3,94 efg CNT 7 3,03 efg BR5 2,75efg Santiago 1,59 fg PATI9 1,279 Mascarenhas 1,209 IASS5 1.179 Candiota 0,42g 1AS54 0,209 Aceguá 0,009 C33 0,009 Glória 0,009 Tifton 0,00 g Nhu-porã 0,009 Duncan 5%-Médias acompanhadas de letras iguais não têm diferença significativa. DISCUSSÃO A variabilidade observada dentro de um mesmo genótipo, em diferentes estádios ou entre genótipos no mesmo estádio, provavelmente pode ser explicada pelos diferentes tipos de danos que a geada pode causar na planta e pelos distintos mecanismos de tolerância (ou resistência) envolvidos. É importante evidenciar que genótipos diferentes, visualmente semelhantes quanto ao desenvolvimento, podem apresentar nítidas discrepâncias, dependendo do estádio em que se encontram os primórdios frutíferos, revelando, desta maneira, diferentes comportamentos sob a ação das injúrias de frio (Single 1971). As cultivares CNT 9, CNT 8 e CNT 10, que para a fase de emborrachamento apresentaram cerca de 90, 85 e 82% de grãos formados, respectivamente, caíram para índices inferiores a 10% na fase de espigamento, evidenciando diferentes graus de suscetibilidade ao resfriamento causado pela geada, conforme o estádio em que se encontrava a planta. O mesmo raciocínio pode ser utilizado para explicar o comportamento da cultivar CNT 1, que passou de uma condição intermediária, no emborrachamento, para outra de expressiva superioridade sobre as demais cultivares na fase de espigamento, quanto à tolerância à geada. A inexistência de plantas tolerantes aos danos de resfriamento no estádio de antese demonstrou que, nesta fase, não existe variabilidade genética para o caráter, no material observado para este nível de resfriamento; confirmando o que foi relatado no trabalho de Single & Marcellos (1974), onde temperaturas de -3,9 0C, a campo, causaram severos danos no período de florescimento. Desta forma, os trabalhos visando a tolerância à geada, se baseados nas cultivares aqui estudadas, deverão observar critérios diferentes, dependendo da fase em que forem realizados os testes. Resfriamentos, em estádios adiantados das plantas, deverão ter índices mais flexíveis, em função da maior suscetibilidade ao frio. Outro fator importante a ser observado é aquele que diz respeito à amostragem. Os altos valores observados para os coeficientes de variação (29,95% e 65,68%) indicam que, apesar de as amostras terem dez indivíduos em cada uma das três repetições, estas não foram suficientes para afirmar com certeza se uma cultivar é mais tolerante do que outra. Existem apenas algumas evidências neste sentido (Análise da variáncia, Tabela 3), que, para serem comprovadas, necessitariam de maior amostragem. A transformação dos dados de Pesq. agropec. bras., Brasília, 17(6): 853-858,jun. 1982.

858 P.L. SCHEEREN percentagem para Arcoseno /T também não foi eficiente para uniformizar as variâncias (Dados e cálculos não incluídos no trabalho). Portanto, para que haja homogeneidade das variáncias, há necessidade de aumentar a amostragem por repetição, ou então, aumentar o número de repetições. Banath & Single (1976) também já haviam enfrentado este problema, sobre o qual afirmam que as diferenças entre variedades poderiam ser atribuidas ao acaso, em função do reduzido número de graus de liberdade. Foi constatado, a campo, que todos os afilhos que apresentaram esterilidade total nas espigas mostraram também um estrangulamento e dessecação dos entrenós, logo acima de cada nó, comprovando o que já fora relatado anteriormente por Single (1971). Além disto, havia ainda alguns colmos que, apesar de mostrarem estrangulamento nos entrenós, ainda formaram espigas com grãos cheios. A partir dos dados apresentados e discutidos, há evidências de que o estádio da planta mais sensível ao dano de geada é aquele que vai desde o espigamento até o início da formação de grãos. Esta fase, em que existe uma grande quantidade de líquidos nos tecidos da flor, coincide com a polinização e posterior abertura das flores para extrusão dasantera', favorecendo um rápido resfriamento da câmara floral. Por último, o tempo que as plantas deste ensaio estiveram expostas ao frio pode ser considerado bastante longo e o resfriamento bem abaixo do que a literatura (Toda 1962) considera como possível causador de dano. Este fato, acrescentado a vulnerabilidade das plantas, justifica a nenhuma-.formação de grãos nas espigas que estavam em antese. CONCLUSÕES 1. Na fase de emborrachamento parece existir variabilidade para o caráter resistência à geada, considerando-se a formação de grãos. 2. A única cultivar que se destacou na fase de espigamento foi CNT 1, revelando um índice de 34,85% de fertilidade, que ainda pode ser considerado baixo. 3. Os danos causados pela geada na fase de antese foram totais e irreversíveis. 4. Uma mesma cultivar parece responder de maneira diversa às injúrias causadas pela geada, dependendo do estádio de desenvolvimento em que ela se encontrava, S. O nível de frio registrado foi extremamente drástico e nocivo às plantas que se encontravam nos estádios observados neste experimento. 6. Houve evidências de que a amostragem para estudo destas características deverá ser bastante ampliada, em função da grande influência ambiental. REFERÊNCIAS BANATH, C.L. & SINGLE, W.V. Frost injury to wheat stems and grain production. Aust. J. Ágric. Re&, 27: 749-5 3, 1976. BAYLISS, MW. & RILEY, R. An analysis of temperature-dependent asynapsis in Triticum ae:tivum. Genet. Res, 20:193-200, 1972. EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÃ- RIA. Centro Nacional de Pesquisa de Trigq. Passo Fundo, RS. Relatório técnico anual. Passo Fundo, 1979. 175p. FERNANDES, M.I. B. de M. Seleção de plantas tolerantes a choques dc baixa temperatura. In: REUNIÃO ANUAL CONJUNTA DE PESQUISA DE TRIGO, 10, Porto Alegre, 1978. Melhoramento de trigo, sementes, triticale e cevada. Passo Fundo, EMBRÁPA- CNP'F, 1978. v.1,p.94-8. LARGE, E.C. Growth stages in cereais. Plant Path., London, 3:128-9, 1954. OLIEN, C.R.; MARCIIErrJ, B.L. & CHOWN, E.V. Ice structure haxdened winter barley. Mich. Agr. Exp. Quart. BulI., 50:440-8, 1968. SINGLE, W.V. Frost damage in wheat crops. Apicultural Gazzette N.S. Wales Australia, 82(3):21 1-4, 1971. SINGLE, W.V. & MARCELLOS, H. Studies on frost injury wheat. IV. Freezing of ears after emergence from the leaf sheath. Aust. J. Apic. Ren, 25:679-86, 1974. - TODA, M. Studies on the chilling injury in wheat plants. 1. Some researches on the mechanism of occurrence of the sterile phenomenon caused by the iow temperature. Proc. Crop. ScL Japan, 30241-9, 1962. Pesq. agropec. bras, Brasilia, 17(6): 853-858, jun 1982.