SENTENÇA ESTRANGEIRA EXEQUÍVEL? REQUISITOS PARA HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA NO DIREITO BRASILEIRO



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Transcrição:

SENTENÇA ESTRANGEIRA EXEQUÍVEL? REQUISITOS PARA HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA NO DIREITO BRASILEIRO José Maria Pimenta 1 Kássio Henrique C. Silva 2 Resumo: Este texto trata dos requisitos que devem ser formalmente obedecidos quando se requer perante a justiça brasileira a homologação de sentença prolatada no estrangeiro. Conceituamos o que seja sentença estrangeira e qual o compromisso e relação que o Estado Brasileiro tem com os outros Estados, em se tratando de Direito Internacional Privado. Também apresentamos os requisitos que a Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (LINDB) elenca como formalidades para que o Superior Tribunal de Justiça, órgão do Poder Judiciário Brasileiro responsável por tal procedimento, venha realizá-lo. Visualizamos que o sistema adotado pelo Brasil é de delibação, portanto, não entra no mérito da sentença advinda do estrangeiro. Por fim, relatamos e dissertamos sobre cada um dos requisitos que a lei exige para que o Superior Tribunal de Justiça homologue uma sentença proveniente de outro sistema jurídico. Palavras-chave: Homologação de Sentença Estrangeira; Delibação; Sistemas Jurídicos. 1. INTRODUÇÃO As relações jurídicas entre pessoas de Estados diferentes têm se multiplicado cada vez mais, parte pelo crescimento das relações comerciais entre países, parte pela facilidade que as pessoas atualmente encontram para se deslocarem de uma nação para outra e, assim, formalizarem relações em âmbito jurídico. Como consequência do incremento destas relações, surgem em meio a elas os conflitos entre os atores que delas participam, tais como desacordos comerciais, divórcios, conflitos relacionados a direito de sucessão, a guarda de filhos etc. Em detrimento disto, os sistemas jurídicos dos países enfrentam o desafio de encontrarem em suas legislações elementos de conexões, objetivando a busca de soluções para as questões que emergem no âmbito do Direito Internacional Privado. Tal é a importância do assunto, que a previsão na Constituição Brasileira de 1988, que determinou a princípio que o Supremo Tribunal Federal seria o órgão com competência originária para analisar o 1 Acadêmico do 10º período do curso de Direito da Faculdade de Jussara FAJ. E-mail: josemariapimenta@hotmail.com 2 Acadêmico do 10º período do curso de Direito da Faculdade de Jussara FAJ. 1

processo de homologação de uma sentença provenientede outra nação. Este processo de homologação obedecerá aos requisitos formais elencados no art. 15 da LINDB. O Estado brasileiro adotou o sistema de delibação para proceder a homologação de uma sentença proveniente de um juízo estrangeiro, cabendo ao requerente cumprir os requisitos formais que lei estabelece, além do não constrangimento da ordem pública, dos bons costumes e da soberania nacional. A falta do cumprimento destes requisitos impede o Superior Tribunal de Justiça (que a partir da Emenda Constitucional 45/2004, recebeu a incumbência de analisar as ações com pedidos de homologação de sentenças estrangeiras) deferir a favor da homologação de uma sentença estrangeira. Ao discorrermos sobre cada um dos requisitos contidos na LINDB neste artigo, pretendemos situar o leitor quanto ao significado na prática do processo de homologação de sentença estrangeira adotado pelo Brasil, demonstrando a formalidade destes requisitos. 2. A SENTENÇA ESTRANGEIRA Sentença Estrangeira, também chamada de sentenças alienígena, é a proferida por juiz de nação diversa àquela onde a mesma deverá ser executada. A circulação de julgados por todo o mundo tem obrigado o reconhecimento de sentenças prolatadas em outros países, bem como a execução destas, considerando que o Direito Internacional Privado admite a aplicação da lei estrangeira, há de se reconhecer também a eficácia da sentença estrangeira, para sedimentar a boa convivência na comunidade internacional entre os Estados (ARAÚJO, 2011, p. 326). A globalização tem acelerado de certa maneira o aumento de conflitos privados que envolvem pessoas físicas e/ou jurídicas de Estados diferentes. Desta forma, as relações jurídicas de Direito Internacional Privado têm se tornado cada vez mais comuns, consolidando nos sistemas jurídicos internos os procedimentos de conhecimento de julgados oriundos de outros sistemas jurídicos, com o propósito de atender e efetivar direitos previstos nos ordenamentos internos dos Estados, desde que não firam a soberania destes: É praxe internacional o 2

reconhecimento de sentença estrangeira pelos Estados, desde que condizente com a ordem jurídica interna (NEVES, 2009, p. 251). Desta forma, uma sentença prolatada em um determinado país poderá ser executada em outro. Com relação aos demais atos processuais não poderão ser homologados, porém, serão submetidos à apreciação de autoridade competente no direito interno, cabendo nos casos de pedidos de medida cautelar, oitiva de testemunha, extradição etc., ser processados através de carta rogatória, que, para que tenha eficácia no Brasil, dependerá do exequatur expedido pelo STJ. Segundo o art. 109, inciso X da Constituição Federal de 1988, a carta será cumprida em primeira instância de juízo federal. Para que uma sentença alienígena tenha eficácia no Brasil, esta deverá obedecer aos critérios estabelecidos pelo ordenamento jurídico brasileiro e, como qualquer processo judicial, deverá ser requisitada por meio de petição assinada por advogado constituído com registro profissional na Ordem dos Advogados do Brasil. Além disso, é necessário o conteúdo de documentos da sentença legalizados pelo consulado brasileiro, sem a necessidade de reconhecimento de firma ou autenticação dos mesmos. O ajuizamento do pedido se dará por meio de petição inicial, obedecendo aos requisitos do art. 282 do Código de Processo Civil, endereçada ao vice-presidente do STJ, conforme Ato nº 15 de 16 de fevereiro de 2005, publicado no Diário da Justiça de 18 de fevereiro de 2005. A petição inicial conterá cópia da sentença com o texto integral autenticado, acompanhada dos demais documentos exigidos, sendo dirigida ao Presidente do STJ. No que tange aos pressupostos processuais da ação homologatória, nos quesitos relativos à competência, inexistência de fatos impeditivos, capacidade das partes, citação e a formulação do pedido observam às regras da teoria geral, salvo o caso da Convenção de Nova York sobre a cobrança extraterritorial de alimentos que atribui a capacidade para propor a homologatória à Procuradoria-Geral da República, em nome do credor dos alimentos, sendo um caso de representação legal (LEITE, 2005, p. 7). O Brasil, como signatário de vários tratados e convenções internacionais, está compromissado, dentro dos requisitos do direito interno, ao conhecimento, homologação ou não, e no caso de ser a sentença homologada, a execução de sentença estrangeira em solo pátrio: 3

Citaremos a seguir alguns acordos garantidores do reconhecimento e da execução mútua das decisões judiciárias, todos ratificados pelo Brasil: a) Convenção de Nova Iorque sobre a Proteção de Alimentos no Estrangeiro (1956); b) Convenção Interamericana sobre Eficácia Extraterritorial das Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros (1979); c) Protocolo de Las Leñas sobre Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa (1992); d) Acordo de Cooperação em Matéria Civil (1996), entre Brasil e França (NEVES, 2009, p. 252). Para que uma sentença estrangeira possa produzir efeitos no Brasil, deverá ser homologada pelo Poder Judiciário brasileiro, mais precisamente pelo STJ, conforme expressa a Constituição Federal de 1988 (art. 105, i, acrescentada pela Emenda Constitucional nº 45 de 31 de dezembro de 2004), que transferiu do STF para o STJ a competência origináriapara homologação e execução de sentenças estrangeiras, e ainda o Código de Processo Civil (arts. 483 e 484); a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (art. 15); e o Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. Nessa mesma data, no intuito de garantir a segurança jurídica, antecipando-se em suas novas responsabilidades, a Presidência do STJ editou a Resolução n. 22, que sujeitou tais feitos, transitoriamente, aos ritos previstos nos artigos 215 a 224 para homologação e execução de sentença estrangeira do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal RISTF. Por meio de seu art. 1º, parágrafo único, a Resolução n. 22/2004 conferiu, à Corte Especial do STJ, as competências atribuídas anteriormente ao Plenário do STF, enumeradas nos artigos 219, parágrafo único, 223 e 228, parágrafo único do RISTF (VALÉRIO, 2006, p. 1). Nesse mesmo sentido, como assevera Sílvio de Salvo Venosa (2006), a LINDB não é simplesmente uma introdução ao Código Civil, mas a todo ordenamento jurídico brasileiro. A LINDB em seu artigo 17 vincula a homologação da sentença estrangeira, para que esta não venha alterar a ordem pública, ou seja, não afronte o ordenamento interno, como por exemplo, nos casos de arbitragem, quando estas devem se sujeitar à Lei de Arbitragem brasileira, não contrariar jurisprudência interna. Não sendo, assim, constrangedora a costume brasileiro, bem como não causando conflito de soberania. E no artigo 15 da referida lei, destaca-se a necessidade da citação da parte domiciliada no Brasil, dentro do princípio constitucional do contraditório. Portanto, ainda que trate de questão decidida em tribunal estrangeiro, o ordenamento interno não poderá ser desrespeitado, cabendo ao 4

STJ, quando do processo de homologação de sentença estrangeira, a verificação da presença dos requisitos estabelecidos na LINDB. A homologação de sentença estrangeira no Brasil apresenta as seguintes características para Gustavo Bergralda Neves (2009): a) Perante o nosso ordenamento tem como objetivo o reconhecimento da eficácia jurídica da decisão; b) As sentenças podem ser de natureza declaratória, condenatória, constitutiva, laudo arbitral ou em processo cautelar e de jurisdição voluntária; c) É de natureza jurisdicional, é ação homologatória que se processa em rito especial; d) São legitimadas para a interposição da ação as partes interessadas, cabendo também à participação de terceiros juridicamente interessados; e) Caso ofenda a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes, como prevê o artigo 17 da LINDB, não terá eficácia no Brasil; f) O artigo 15 da LINDB, diz ser essencial a citação da parte domiciliada no Brasil, em processo instaurado no exterior; g) A sua tradução será feita por tradutor oficial ou juramentado; h) Deverá se sujeitar a Lei nº 9.307/1996, Lei de Arbitragem. Por fim, cabe salientar, que são cinco os sistemas utilizados no Direito Internacional Privado para o reconhecimento de sentença estrangeira: a) o sistema de revisão do mérito da sentença, refazendo o julgamento, depois disto ratifica-se a sentença ou não; b) sistema de revisão parcial de mérito, onde serão revistos os aspectos relacionados à lei do Estado em que se almeja a homologação da sentença; c) sistema de reciprocidade diplomática, neste caso a homologação dependerá da existência de tratado entre os Estados envolvidos, do contrário não ocorrerá a homologação da sentença estrangeira; d) sistema da reciprocidade de fato, neste caso a homologação se concretizará se o Estado de onde provem a sentença reconhecer sentença do Estado onde se busca a homologação da sentença; e) sistema da delibação, é o sistema utilizado pelo Brasil, o órgão que processa a homologação não entra no mérito 5

da decisão, apenas examina se foram observados os requisitos formais para a homologação da sentença estrangeira. 3. REQUISITOS PARA A HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA Segundo o art. 4º da Resolução nº 9/STJ de 4 de maio de 2005, homologação de sentença estrangeira é um processo que visa conferir eficácia a um ato judicial estrangeiro. Qualquer provimento, inclusive não judicial, proveniente de uma autoridade estrangeira só terá eficácia no Brasil após sua homologação pelo Superior Tribunal de Justiça, portanto, é o meio pelo qual uma sentença alienígena, ou seja, proferida por juiz de Estado estrangeiro, produzirá efeitos no Brasil. Serão homologadas pelo STJ sentenças que tenham sido prolatadas por juízo monocrático, colegiados ou ainda por tribunais superiores, sendo aceitas, sem qualquer restrição, decisões proferidas por órgãos que não fazem parte do Poder Judiciário, mas que tenham a função de expedir determinações com eficácia sentencial (ARAUJO, 2011, p. 332). Não cabe ao STJ realizar um novo julgamento da lide já julgada, porém, analisar se estão presentes os requisitos para que esta seja homologada e executada em solo pátrio. A homologação de sentença estrangeira é denominada pela doutrina de juízo de delibação, quando se verificará a regularidade desta quanto à forma, à autenticidade, à competência do órgão prolator estrangeiro, bem como se adentra a substância da sentença para se verificar se, face ao Direito nacional, não houve ofensa à ordem pública e aos bons costumes (LEITE, 2005, p. 2). Impondo-se a este ato que estejam presentes os requisitos elencados no artigo 15 do Decreto Lei nº 4.657 de 4 de setembro de 1942 (LINDB), que são: a) Haver sido proferida por juiz competente; b) Terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado à revelia; c) Ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a execução no lugar em que foi proferida; d) Estar traduzida por intérprete autorizado; 6

e) Ter sido homologada pelo Supremo Tribunal Federal 3. 3.1 Haver sido proferida por juiz competente A Constituição Federal de 1988 em seu art. 5º, inciso LIII, dispõe que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente. Este é o princípio do juiz natural, princípio que visa garantir ao julgador em suas decisões a imparcialidade e independência necessárias em seus julgamentos. O propósito é de evitar possíveis desmandos por parte da autoridade julgadora, sendo aplicado tanto no direito civil quanto no direito penal. É norma no direito interno e, portanto, nenhum processo no Brasil será julgado por autoridade incompetente, pois tal sentença será nula de direito, aliás, nem existirá por assim dizer. Segundo Víctor Nunes Carvalho (2005), o princípio do juiz natural surgiu na Idade Média e no Brasil na Constituição do Império de 1824, que o consagrou em seu art. 179, inciso X, in verbis: ninguem será sentenciado, senão pela Autoridade competente, por virtude de Lei anterior, e na fórma por ellaprescripta. Desta forma, nota-se que a ideia do princípio do juiz natural não é nova e que fora incorporada no direito interno desde os tempos do Império. Nesse sentido, para que o STJ possa homologar uma sentença alienígena, há que se analisar se a mesma observou todo o processo legal contido nas normas do direito interno do Estado de origem do julgado. Como já mencionado, não cabe ao órgão brasileiro o julgamento do mérito, mas apenas se as regras atributivas de competência internacional daquele país permitiam que fosse ali julgada a causa (ARAUJO, 2011, p. 334), pois o sistema de análise brasileiro é de contenciosidade limitada. 3.2 Terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado à revelia Este requisito é primordial para que a sentença seja homologada, pois a parte requerida no processo deverá ter seu direito ao contraditório respeitado, 3 Competência originaria transferida ao Superior Tribunal de Justiça pela Emenda Constitucional nº 45/2002. 7

sendo esta uma previsão constitucional no Brasil, art. 5º, inciso LV da CF/88, in verbis: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditórioe ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Muitos processos tiveram a homologação indeferida pelo STF por falta de citação do réu, que deve ser feita por meio de carta rogatória. O STJ vem se manifestando da mesma forma. A falta deste requisito contraria a ordem pública e causa insegurança jurídica, não sendo apenas uma questão de mera formalidade, pois, se a parte comparecesse espontaneamente ao juízo estrangeiro, estaria suprida a questão (ARAUJO, 2011, p.337). E caso seja cumprido o requisito de citação do réu através de carta rogatória, e o mesmo não se manifestar em juízo, o processo poderá correr a revelia do réu. 3.3 Ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a execução no lugar em que foi proferida Considerando que até que se esgotem todas as instâncias recursais, uma sentença prolatada está sujeita a sofrer algum tipo de mudança, dentro deste critério, é que o direito interno dá ao sucumbente a prerrogativa de buscar o seu interesse até a última instância recursal. Tal fato impede que a mesma seja executada enquanto não se esgotarem as possibilidades de recurso, o trânsito em julgado de uma sentença alienígena é, sem dúvida, um dos requisitos mais importantes para que o pedido de homologação seja deferido pelo STJ. Cabe dizer que está inserido no princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório. Restando, porém, que tal requisito seja comprovado pela parte requerente, observando-se e respeitando-se as regras do direito interno do Estado onde a sentença tenha sido prolatada. Toda documentação deverá conter a chancela do consulado brasileiro, pois cabe ao cônsul brasileiro no exterior dar ao documento o valor probante necessário no território brasileiro. Este requisito somente será dispensado nos casos de sentença tramitada por via diplomática, ou, ainda, nos casos de Convenções bilaterais, quando estas contenham normas de dispensa da autenticação consular. 8

Por causa das dificuldades de se conhecer os trâmites do direito dos outros Estados, a comprovação do trânsito em julgado não é tarefa fácil: A comprovação do trânsito em julgado de sentença estrangeira que se pretenda homologar no Brasil usualmente era realizada no STF de duas formas: (i) através de uma certidão, ou declaração expressa, do tribunal estrangeiro; ou (ii) quando não existisse tal documento, aplicando-se, subsidiariamente, a regra contida no Código Bustamante (artigos 409-411) para comprovar o direito estrangeiro. De notar que o STF, ao se pronunciar sobre a utilização dessas normas do Código Bustamante, entendeu que este deve ser utilizado de maneira ampla (ARAUJO, 2011, p. 338-338). Como o direito estrangeiro é de aplicação ex-ofício, o julgador poderá utilizar outros meios que sejam cabíveis para que o possa conhecer, judiciais, extrajudiciais, documental, pericial, desde que não firam normas do direito interno. Contudo, para o STJ, o requerente deve provar que a sentença proveniente de outro Estado é final, não cabendo qualquer recurso, desta forma haverá o provimento requerido junto ao órgão brasileiro. Em caso de ação no Brasil sobre a mesma causa, esta somente será suspensa quando da homologação da sentença transitada em julgado no Estado estrangeiro, desde que não haja litispendência a nível internacional, o que procrastinaria a homologação da sentença no Brasil, pois, a litispendência internacional cria o impedimento para o reconhecimento da sentença, já que o processo de julgamento não fora concluído em nível internacional, ou seja, ainda persiste uma lide entre as partes.. 3.4. Estar traduzida por intérprete autorizado Como a sentença emana de juízo de língua estrangeira, há que se realizar a tradução para o português, para que a mesma possa ser conhecida pelo o juiz brasileiro. Esse processo de tradução também exige o cumprimento do que requer a legislação pátria, o tradutor deverá ser oficial, juramentado, com registro na junta comercial, pois este tem fé pública. No entanto, em alguns casos o STJ tem aceitado que se utilize um tradutor ad hoc, pois existem idiomas pouco conhecidos dos membros do STJ, carecendo então de um tradutor específico. Em determinados casos as dificuldades de se encontrar tradutor juramentado pode ser grande, pois existem idiomas pouco conhecidos, trazendo ao processo uma dificuldade em se efetivar o processo de 9

homologação, geralmente os ministros do STJ recorrem aos tradutores comerciais, que trabalham junto ao Ministério do Comércio Exterior, dado a gama muito grande das relações comerciais do país. 3.5 Ter sido homologada pelo Superior Tribunal de Justiça Neste caso, com a mudança incorporada a Constituição pela Emenda Constitucional nº 45/04, a competência para homologação de sentença estrangeira foi transferida do STF ao STJ. Este requisito diz respeito, na verdade, a requisito para execução de sentença estrangeira no Brasil, já que os requisitos anteriores são necessários para que o STJ, analise o mérito da decisão em estreitos limites, para verificar se não houve violação à ordem pública, à soberania nacional e aos bons costumes (ARAUJO, 2011, p. 343). Desse modo, não sendo descumpridos os outros requisitos, cabe ao órgão responsável homologar a sentença alienígena em análise, o que dará eficácia à mesma no território nacional: A ordem pública é o reflexo da filosofia sociopolítico-jurídica de toda legislação e que representa a moral básica de uma nação, protegendo as necessidades de um Estado, bem como os interesses essenciais dos sujeitos de direito, constituindo princípio que não pode ser desrespeitado pela aplicação de lei estrangeira (MALHEIRO, 2012, p. 53). Sendo competência originária do STJ, somente se admitirá recurso em caso de provimento ou não do pedido de homologação junto ao STF em dois casos, quando a sentença contraria dispositivo da Constituição Federal e/ou declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal. CONSIDERAÇÕES FINAIS A globalização de certa forma contribui para que surjam conflitos entre pessoas de vários lugares do planeta. Torna-se relevante que os sistemas jurídicos dos vários países se adequem a esta realidade, cabendo aos Estados ajustar as suas legislações para garantirem a proteção dos interesses dos seus cidadãos. No caso brasileiro, o processo de homologação visa resolver os 10

conflitos sem entrar no mérito da questão, limitando-se a analisar os requisitos homologatórios previstos na LINDB. Portanto, cabe dizer que o órgão brasileiro ao analisar o procedimento para a homologação de sentença estrangeira, fixará a sua observação nas questões formais elencadas no art. 15 da LINDB, analisando a inteligência da sentença. Devendo o proponente da ação, além de se preocupar com estas questões formais, observar os pressupostos da ação que estão contemplados no Código de Processo Civil e se a sentença prolatada no estrangeiro não ofende a ordem pública e os bons costumes do Brasil. Em se tratando de contestação, caberá à parte adversa versar a respeito da autenticidade dos documentos apresentados no bojo da ação, vedada, neste caso, como já citado, a discussão do mérito da sentença estrangeira, a menos que o mérito da sentença afronte à ordem pública, à soberania nacional ou os bons costumes. Grande parte dos doutrinadores brasileiros entende que o sistema de homologação de sentença estrangeira adotado pelo Brasil configura-se como o melhor sistema, não impondo àqueles que precisam deste tipo de prestação jurisdicional grandes transtornos, como acontece no sistema de revisão do mérito da sentença que, para homologar uma sentença estrangeira, realiza um novo julgamento do mérito. No sistema adotado pelo Brasil poderão surgir maiores dificuldades nos casos de sentenças advindas de Estados cujo sistema jurídico seja, de alguma forma, muito diferenciado do brasileiro. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMORIM, Edgar Carlos de. Direito internacional privado. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. ARAUJO, Nádia de. Direito internacional privado: teoria e prática brasileira. De acordo com a Emenda Constitucional 45/2004. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011. CARVALHO, Victor Nunes. O Princípio do juiz natural e a competência por prerrogativa de função. Disponível em: http://www.jus.com.br/revista/texto/8665. Acesso em 27 set. 2012. 11

GERNANDES, Paulo. Homologação de Sentença Estrangeira. Disponível em http://www.paulogernandesblospot.com.br. Acesso em: 26 set. 2012. BARBOSA JÚNIOR, Márcio Mateus. Homologação de sentenças estrangeiras e o sistema difuso de reconhecimento: a necessidade de mudança na redação do texto constitucional. Elaborado em setembro de 2011. Disponível em: http://www.jus.com.br/revista/texto./20420. Acesso em: 02 out. 2012. LEITE, Gisele. Comentários à homologação de sentença estrangeira. Publicado em 24 de setembro de 2005. Disponível em: http://www.mundojuridico.adv.br. Acesso em: 02 out. 2012. MALHEIRO, Emerson. Direito internacional privado. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2012. NEVES, Gustavo Bregalda. Direito internacional público, direito internacional privado. São Paulo: Atlas, 2009. VALÉRIO, Marco Aurélio Gumieri. Homologação e execução de sentença arbitral estrangeira no STJ. Jus Navegandi, Teresina, ano 11, nº 987, 15 março de 2006. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/8098. Acesso em: 20 set. 2012. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. 12