Direito do Consumidor e Mediação de Conflitos de Consumo. Autor: Bruno de Almeida Lewer Amorim

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Transcrição:

Direito do Consumidor e Mediação de Conflitos de Consumo Autor: Bruno de Almeida Lewer Amorim

DIREITO CONSUMIR O Direito do Consumidor é, sem dúvida, um dos ramos mais importantes do Direito, regulando a maior parte dos contratos e dos contatos sociais que celebramos todos os dias. O Direito do Consumidor está presente quando precisamos nos alimentar, transportar, trabalhar, viajar e divertir. Sua existência e origem se justificam a partir do surgimento da Sociedade de Consumo, cuja característica principal é o risco. Na Sociedade de Consumo, marcada pela produção e pelo consumo em massa, o risco está presente de uma forma muito mais frequente, seus efeitos são muito mais nefastos e sua percepção é muito mais difícil. O risco até o início do Século XX era o risco da natureza. O risco de uma tempestade, de um terremoto, de um maremoto. A percepção desse risco era bastante simples. Um alimento estragado, por exemplo, era facilmente detectado pelo nosso paladar, que prontamente o recusava.

Com a revolução industrial e as transformações tecnológicas que se seguiram, o risco se transforma radicalmente, assumindo as feições de inevitabilidade e perversidade já mencionados. Hoje, o risco não tem cheiro, não tem cor, não tem sabor e, quando tem cheiro, o cheiro é ótimo. O sabor, melhor ainda. Um exemplo clássico é o açúcar, que, embora bastante saboroso, não traz nenhum benefício para organismo humano, a não ser dar um pouco de energia. Em contrapartida, no seu processamento pelo organismo, o açúcar consome vitaminas e sais minerais. Outro exemplo são substâncias químicas utilizadas por algumas empresas de fast food para possibilitar a comercialização de alimentos, como carne, já impróprios para o consumo humano. Por todas essas razões, pode-se dizer que na atual Sociedade de Consumo o risco é real, imprevisível e inevitável. Danos ocorrerão, só não sabemos ainda quando, onde e nem com quem. Atenta a essa circunstância, a Lei n 8.078/90, conhecida como Código de Defesa do Consumidor, inaugura um novo regime, especial, voltado para a defesa da parte mais fraca da relação de consumo: o Consumidor.

O Consumidor é a parte vulnerável da relação de consumo, e o Código de Defesa do Consumidor foi idealizado e construído a partir desse pressuposto. Por essa razão, pode-se dizer que o Código de Defesa do Consumidor é uma Lei parcial, que confere direitos somente ao Consumidor, e deveres apenas ao Fornecedor, com o intuito de reequilibrar a relação de consumo que, na prática, é bastante desequilibrada. Já que na Sociedade de Consumo o risco é real e inevitável, o Código de Defesa do Consumidor procura garantir que a vítima de um incidente ou de um acidente de consumo seja devidamente indenizada e reparada. Essa é a lógica por detrás do Direito do Consumidor. Vale notar que o Direito do Consumidor não é parte do Direito Civil, nem tampouco com esse se confunde. As disposições do Código Civil se aplicam a relações entre iguais, entre particulares, como o caso de um médico que adquire o carro de em engenheiro por meio de um anúncio de jornal. O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, se aplica às relações de consumo, tidas como aquelas celebradas entre partes desiguais, seja faticamente, seja economicamente. Mais especificamente, a relação de consumo é aquela havida entre um consumidor e um fornecedor de produtos e serviços, que poderá ser uma pessoa física ou jurídica. CONSUMIR CONSUMIR CONSUMIR CONSUMIR CONSUMIR

A desigualdade dessa relação vem do fato de o Consumidor ser leigo naquela relação compra e venda de carros, por exemplo e o Fornecedor ser profissional. O fato de o Consumidor leigo estar em uma relação com um profissional, lhe deixa mais vulnerável a manipulações. Assim, o Fornecedor pode, mais facilmente, lhe enganar, dizendo estar presente determinada característica em verdade inexistente, ou omitindo determinada informação relevante. Por essa razão, para tutelar essa parte especial da vida das pessoas as relações de consumo -, onde elas ficam tão vulneráveis, foi criada a Lei n 8.078/90, a qual possui fundamento constitucional (art. 5, XXXII, da CR/88). O Brasil, ao contrário dos países europeus, possui um Código de Defesa do Consumidor, e não um Código de Consumo, como Portugal. A diferença fundamental está justamente no fato de que o Código brasileiro trata o consumidor de forma mais privilegiada do que o Fornecedor, e não igual, como o Código português ou o Código francês.

Quanto ao risco e aos danos próprios das relações de consumo, todo consumidor brasileiro os conhece na prática: cobranças indevidas em faturas de telefone ou cartão de crédito; atrasos e cancelamentos de voo; recusa de cobertura de procedimentos médicos por operadoras de planos de saúde; produtos com defeito; fornecedores que não cumprem a garantia; produtos que não são entregues; supermercados que insistem em fazer vendas casadas ou colocar preços diferentes na gôndola e no caixa; comerciantes que descontam cheques pré-datados antes da data acordada; fornecedores que colocam o nome do consumidor indevidamente no SPC e no SERASA ou cobranças indevidas de pontos-extras de TV por assinatura.

SEJA QUAL FOR O PROBLEMA, TOS JÁ PASSAMOS POR ALGUM DELES. A grande questão é que, muitas vezes, em razão do valor do próprio produto ou do tempo a ser despendido para resolver judicialmente o problema, o consumidor acaba desistindo de reclamar e amargando o prejuízo. O grande problema, todavia, é que essa micro lesões acontecem todos os dias, várias vezes, e acabam impactando significativamente no orçamento do consumidor no final do mês. A grande questão é que muitos consumidores ainda não sabem que existem outros meios de resolver esses problemas. Meios menos custosos e mais rápidos de solução de conflitos.

Dentre esses meios, merece destaque a Mediação de Conflitos. A Mediação nada mais é do que uma forma pacífica de resolução de conflitos, em que um terceiro, imparcial e neutro, possibilita e conduz o diálogo produtivo entre consumidor e fornecedor, de modo a que esses próprios cheguem a uma solução que atenda aos interesses de ambos. A grande questão é que, não raro, o consumidor não deseja uma compensação financeira pelo ocorrido, mas tão somente a retratação da empresa. A Mediação lhe permite deduzir essa pretensão diretamente para o fornecedor. A Mediação é tida como uma forma excepcionalmente adequada de se tratar os conflitos justamente por possibilitar a discussão e a abordagem de questões subjetivas que permeiam o conflito objetivo, material. Nesse sentido, a discussão do conflito não estará necessariamente restrita à questão dos danos materiais sofridos pelo consumidor, podendo abranger questões subjetivas que lhe estejam incomodando como um mau atendimento por parte do fornecedor ou a sua indiferença diante do vício apresentado pelo produto.

Por outro lado, o processo de Mediação é mais leve, voluntário e informal, permitindo que as partes só cheguem a um acordo se assim realmente desejarem, e, caso acordes, que construam o acordo conforme aquilo que realmente desejam. Ao contrário do Juiz ou do Conciliador, o Mediador não decide nem sugere nenhum solução para o caso. A solução deve, necessariamente, vir das partes. A função do Mediador será a de possibilitar o diálogo entre as partes, e a de ajudá-las a refletir sobre quais as formas mais adequadas de se resolver o problema. A solução do problema, todavia, não é obrigatória. As partes somente farão um acordo se assim quiserem. O objetivo da Mediação é promover o diálogo e a discussão de possíveis soluções para o problema, mas a solução será sempre construída pelas partes. A Mediação é um procedimento voluntário, o qual somente se realiza se e enquanto as partes quiserem; e sigiloso, não podendo o Mediador revelar o conteúdo da discussão e do eventual acordo a terceiros.