GESTÃO DE SUBPRODUTOS DE UMA FECULARIA DO NOROESTE DO PARANÁ L.N. Santos 1, E. D. G. Danesi 2, B.C. Bolanho 1 1 Departamento de Tecnologia - Universidade Estadual de Maringá, Campus Regional de Umuarama CEP: 87506-370 Umuarama PR Brasil, Telefone: +55 (44) 36219341 e-mail: ( beatrizbolanho@yahoo.com.br, eng.ambiental.lununes@gmail.com). 1 Departamento de Engenharia de Alimentos - Universidade Estadual de Ponta Grossa, Campus Uvaranas CEP: 87030-900 Ponta Grossa PR Brasil, Telefone: +55 (42) 32203000 e-mail: (edgodoy@uepg.br). RESUMO No processamento industrial da mandioca são gerados resíduos sólidos e líquidos que poderão se tornar contaminantes ambientais devendo assim ter destinação adequada. O objetivo desta pesquisa foi avaliar o como vem sendo realizada a gestão dos subprodutos gerados em uma fecularia do noroeste do Paraná. Por meio de um questionário foram levantadas informações referentes à geração e descarte dos principais resíduos gerados no processo produtivo: casca, farelo e manipueira. Os resultados revelaram que são gerados 4 ton/mês de casca da raiz de mandioca, 70 ton/dia de farelo e 85 m³/h de manipueira. Quanto à destinação, os subprodutos sólidos são encaminhados à alimentação animal. A manipueira é tratada em lagoas anaeróbicas e facultativas. Ademais, no local foi implantado um biodigestor. Portanto, é importante que sejam realizadas pesquisas que busquem propor novos usos para os subprodutos de forma que as empresas possam obter vantagens econômicas e eficiência na gestão dos resíduos. ABSTRACT In the industrial processing of cassava solid and liquid wastes are generated. When these wastes are improperly destined they can become an environmental contaminant. The aim of this research was to evaluate the management of byproducts generated in a starch factory located in northwest Paraná. Through a questionnaire was collected information regarding the generation and disposal of the main waste generated in the production process: rind, bran and manipueira. Results showed that are generated 4 ton/day of rind, 70 ton/day of bran and 85m³/hour of manipueira. The solid by-products are intended for animal feeding. Already the manipueira is treated in anaerobic and facultative ponds. In addition, at local was implanted a biodigestor. Therefore, it is important to carry out research that seeks to propose new uses for by-products so that companies can obtain economic advantages and less difficulties in waste management. PALAVRAS-CHAVE: resíudos; mandioca; gerenciamento. KEYWORDS: residues, cassava, management. 1. INTRODUÇÃO A mandioca, principal fonte de carboidratos para milhares de pessoas no mundo, destaca-se como uma planta de múltiplos usos, utilizada desde a alimentação humana e animal ao uso industrial (Souza et al., 2005). Embora produzida em todo o território brasileiro, é na região Sul que se
encontram as principais indústrias de processamento das raízes, as quais produzem farinha, polvilho doce e azedo (Lamaison, 2009). O Estado do Paraná é o principal produtor de fécula de mandioca do país e contribui com 70% da produção nacional (SEAA, 2016). O Estado possuía 42 fecularias ativas no ano de 2016, com capacidade instalada para 13.790,00 ton/dia/fécula - 71% da nacional. A mesorregião Noroeste do estado é a principal produtora de fécula, com 40,6% da produção nacional do ano de 2015 (Cepea, 2017). O processamento industrial da mandioca gera grandes quantidades de resíduos sólidos e líquidos. Segundo André e Santos (2012) esses resíduos são subprodutos obtidos através de suas raízes, por meio do processamento da extração da fécula ou farinha, que se não destinados de maneira adequada poderão se tornar contaminantes ambientais. Os principais tipos de resíduos líquidos gerados nas fecularias são a água de lavagem das raízes e a manipueira (líquido obtido com a prensagem da mandioca). Esta possui elevada concentração de Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO), Demanda Química de Oxigênio (DQO) e substâncias tóxicas, como o ácido cianídrico (HCN). Quanto aos resíduos sólidos têm-se as cascas, entrecascas e uma massa fibrosa conhecida como farelo. É importante destacar que os resíduos sólidos podem ser considerados menos impactantes para as indústrias em decorrência do seu aproveitamento em diferentes formas, tendo como principal destino a alimentação animal. Algumas fecularias paranaenses vêm encontrando soluções economicamente viáveis para o destino e reutilização de seus subprodutos como a utilização de biodigestores para a produção de biogás, o uso de efluente líquido na fertirrigação e o destino dos resíduos sólidos na alimentação animal (Jesus e Cirani, 2014). Diante disso, o objetivo desta pesquisa foi realizar uma avaliação do sistema de gestão dos subprodutos gerados em uma fecularia do Noroeste do Paraná, visando quantificar os resíduos gerados e identificar as potencialidades e dificuldades em sua gestão. 2. MATERIAL E MÉTODOS A presente pesquisa consiste em um estudo descritivo e exploratório, com a utilização de variáveis qualitativas e quantitativas para o levantamento e análises dos dados. O estudo foi realizado em uma indústria de fécula de mandioca, localizada na região Noroeste do Paraná. A empresa, que se situa na zona rural, possui 30 funcionários e está há 18 anos no mercado. Foi escolhida como objeto de estudo desta pesquisa em decorrência das atividades desenvolvidas na organização, as quais apresentam expressiva geração de subprodutos sólidos e líquidos. O estudo consistiu na quantificação da casca, farelo e efluentes líquidos (manipueira + água de lavagem) gerados, bem como, no levantamento de informações gerais sobre gerenciamento desses subprodutos. O instrumento utilizado foi um questionário, o qual teve o intuito de levantar as principais informações sobre a geração, quantificação, possível tratamento e destinação final, bem como a presença de equipamentos ou tecnologias que minimizem a geração de resíduos. Os dados foram coletados no mês de fevereiro de 2018, após a assinatura do Termo de Livre Esclarecimento e Consentimento da empresa.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO A agroindústria investigada processa uma quantidade diária de 350 toneladas de mandioca para a fabricação de fécula e polvilho azedo industrial, cuja produção é de 100 ton/dia, com um rendimento de 30% de ton/há. Os recursos hídricos utilizados pela empresa são provenientes de fonte subterrânea (poço artesiano) e superficial (curso de água). A quantidade de água utilizada no processo não foi informada. As principais etapas que geram resíduos, segundo a indústria, são: moagem, extração, ensaque, classificação e na geração de calor proveniente da caldeira. Os resultados da quantificação aproximada dos principais subprodutos gerados, durante o processo produtivo, foram dispostos na Tabela 1. Tabela 1 Quantificação aproximada dos principais subprodutos gerados na produção Subproduto Quantidade Destino Custo Casca de mandioca 4 ton/mês Alimentação animal local Sem fins lucrativos Farelo 70 ton/dia Alimentação animal - gado Vendida por caçamba Manipueira + água de lavagem 85m³/h Tratamento de efluentes em lagoas anaeróbias e facultativas R$7.000/mês De acordo com a Tabela 1, as cascas de raízes de mandioca são destinadas a alimentação animal, sem ocasionar custos à empresa pelo seu descarte. Para Cereda (2005) esse subproduto, cuja coloração é morrom-clara ou marrom-escura, consiste em uma camada fina celulósica e pode conter pedaços de entrecasca e amido. Na literatura, há estudos que descrevem o seu uso em formulações de rações para bovinos (Amaral et al., 2007) e o seu emprego como adubo (Cereda, 2005). É importante salientar que o descarte inadequado desse material pode ocasionar a contaminação do solo e das águas (Pieri, 2015). O farelo, gerado em maior quantidade e também destinada à alimentação animal, é vendido, sendo lucro para a empresa. Esse subproduto, também denominado massa fibrosa ou bagaço, é composto por material fibroso da raiz da mandioca e segundo Leonel (2001) é gerado durante o processo de lavagem da massa ralada, e contém parte do amido que não foi extraído no processamento. Há também elevada umidade, fator que contribui para a grande quantidade gerada. Segundo Leonel (2001) algumas fecularias utilizam prensas com o objetivo de diminuir o seu volume. Diante disso, faz-se necessário sua reutilização e descarte ambientalmente correto. Na literatura há diversos estudos sobre o reuso desse material. Cardoso (2005) e Amaral et al. (2007) citam seu uso na alimentação animal de bovinos, suínos e aves; produção de proteína microbiana, fibras dietéticas e bio-produtos fermetados, na produção de vitaminas, como substrato microbiano, verme-compostagem, biofertilizantes e até na fertirrigação. Verificou-se que os resíduos líquidos gerados (manipueira + água de lavagem) são destinados a lagoas de tratamento de efluentes, conforme os dados apresentados na Tabela 1. Segundo Cereda
(2001) a água de lavagem é gerada durante o processo de lavagem/descascamento e carrega em suspensão a terra e as cascas, as quais podem ser separadas por meio de decantação e peneiragem. Após esse processo de segregação há basicamente a água captada pela indústria, com baixo teor de matéria orgânica em suspensão ou dissolução. A manipueira consiste em um líquido de aspecto leitoso amarelo-claro, oriundo da prensagem das raízes da mandioca durante a fabricação de farinha ou extração da fécula (Inoue, 2008; Cardoso et al., 2009; Souza et al., 2014). Em sua composição há elevada carga orgânica (DBO e DQO) e glicosídeos cianogênicos tóxicos, além da alta concentração de potássio, nitrogênio, cálcio, fósforo, enxofre, magnésio, ferro e outros micronutrientes (Cardoso et al., 2009). É relevante ressaltar que há uma diluição da composição inicial da manipueira que apresenta elevado teor de material orgânico e por isso necessita de tratamento para que possa ser lançada no ambiente sem causar danos (Inoue, 2008). De acordo com Guimarães et al. (2017) as indústrias tratam os resíduos líquidos, em sua maior parte, em lagoas de estabilização anaeróbica. Nestas lagoas há geração de biogás (gás poluente) que pode ser recuperado por meio de tecnologias de biodigestores e utilizado para alimentar as caldeiras, substituindo as lenhas. A agroindústria estudada afirmou que foi implantado um sistema de utilização de biogás na caldeira e na secagem de produtos, com a utilização de um biodigestor, que propiciou a minimização da geração de resíduos e que o custo-benefício desta tecnologia foi aprovado pela empresa. Um estudo realizado em fecularias do sul do Paraná apontou que há efetiva redução de custos da produção pelo uso do biogás em substituição da lenha, assim como na disseminação de práticas sustentáveis com os resíduos gerados (Jesus e Cirani, 2014) Segundo Cardoso et al. (2009) a manipueira apresenta potencialidade de uso como fertilizante agrícola. Inoue (2008) concluiu em sua pesquisa amostral que o biofertilizante obtido na digestão da manipueira é de boa qualidade, com concentrações elevadas de nitrogênio, fósforo e potássio. Ao ser questionada sobre os aspectos ambientais da produção e os principais impactos no meio ambiente, a empresa informou que a poluição do solo é um dos principais danos decorrentes do processo produtivo. A indústria, que possui licença ambiental vigente, informou que já tivera problema com a comunidade, em seu primeiro ano de funcionamento, decorrente do mau cheiro. Sendo assim, a empresa buscou o tratamento correto dos efluentes. O estado do Paraná possui a Resolução CEMA 070/09 - Anexo 7 que estabelece Condições e Padrões de Lançamento de Efluentes Líquidos Industriais, incluindo as de beneficiamento de mandioca. A devolução do efluente ao corpo hídrico dentro dos parâmetros estabelecidos por essa norma foi citado como um dos maiores desafios ambientais da agroindústria investigada. Por fim, segundo a empresa, as maiores dificuldades enfrentadas no gerenciamento dos resíduos e na gestão ambiental são a redução de custo e alta geração de biogás. 4. CONCLUSÕES À medida que as empresas deste ramo vão se modernizando, os impactos ambientais, gradativamente serão reduzidos em razão do emprego de novos equipamentos e técnicas de tratamento, bem como a reutilização dos subprodutos. É importante salientar que essa minimização tem um caráter econômico, visto que está atrelada à produtividade e à redução de custos no tratamento desses materiais. Ademais, no licenciamento ambiental as agroindústrias necessitam seguir certas condicionantes relacionadas ao descarte dos resíduos e mitigação dos impactos ambientais.
Portanto, é importante que sejam realizadas pesquisas que busquem propor novos usos para os resíduos gerados de forma que as empresas possam obter vantagens econômicas e menores dificuldades na gestão dos resíduos. Por meio do levantamento de informações quali-quantitativas sobre a geração dos resíduos poderão ser discutidos importantes elementos nas estratégias ambientais adotadas pelas diferentes fecularias do estado. 5. AGRADECIMENTOS À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de mestrado concedida. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS André, T.B.; Santos, A.C. (2012). Uso de produtos da cultura da mandioca (Manihot) na produção animal. Encicoplédia Biosfera, 8 (15), 1622-1647. Amaral, L., Jaigobind, A.G.A & Jaisingh, S. (2007). Dossiê técnico do processamento de farinha. Instituto Tecnológico do Paraná. Cardoso, E. (2005). Uso de manipueira como biofertilizante no cultivo de milho: Avaliação do efeito no solo, nas águas subterrâneas e na produtividade do milho. (Dissertação de mestrado). Universidade do Extremo Sul de Santa Catarina, Criciúma, 2005. Cardoso, E., Cardoso, D.C., Cristiano, M.P., Silva, L., Back, A.J., Bernardin, A.M. & Paula, M. M. S. (2009). Use of Manihoteslculenta, crantz processing residue as biofertilizer in corn crops. Research Journal of Agronomy, 3 (1), 1-8. Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada CEPEA. (2017). Desempenho da Indústria de Fécula em 2016 e Perspectivas para 2017. Universidade de São Paulo, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. Cereda, M.P. Caracterização dos Subprodutos da Industrialização da Mandioca. In: Cereda, M.P. (Coord.) Manejo, Uso e Tratamento de Subprodutos da Industrialização da Mandioca. (2001). São Paulo: Fundação Cargill, v.4, cap. 1, p. 14-37. (Culturas de tuberosas amiláceas latino americanas, 4) Cereda, M.P. Produtos e Subprodutos. In: Souza, L.S.; Farias,A.R.N. Mattos, P.L.P. & Fukuda, W.M.G. (ed. técnicos). Processo e Utilização da Mandioca. (2005). Brasília: Embrapa Informação Tecnológica, cap. 1, p.17-56. Guimarães, C.E., Teixeira, C.E., Cirani, C.B.S. & Santos, M.R. (2017) Avaliação do Desempenho Ambiental do Aproveitamento do Biogás em Fecularias de Mandioca no Estado do Paraná. Desenvolvimento em Questão, 14 (39). Inoue, K.R.A. (2008). Produção de biogás, caracterização e aproveitamento agrícola do biofertiizante obtido na digestão da manipueira. (Dissertação magister Scientiae). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa. Jesus, J.S. & Cirani, C.B.S. (2014). Proposta de um fluxo de processo produtivo para a indústria de processamento da mandioca. In: III Simpósio Internacional de Gestão de Projetos. São Paulo. Anais. São Paulo: Uninove. Disponível em http://repositorio.uninove.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/964/288.pdf?sequence=1.
Lamaison, F.C. (2009). Aplicação da água residuária do processamento da mandioca como substrato para a produção de hidrogênio por processo fermentativo. Dissertação (mestrado em Engenharia de Alimentos) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. Leonel, M. O farelo, subproduto da extração de fécula de mandioca. In: Cereda, M.P. (Coord.) Manejo, Uso e Tratamento de Subprodutos da Industrialização da Mandioca. (2001). São Paulo: Fundação Cargill, v.4, cap. 15, p. 211-217. (Culturas de tuberosas amiláceas latino americanas,4) Paraná, Conselho Estadual de Meio Ambiente - CEMA. (2009). Dispõe sobre o licenciamento ambiental, estabelece condições e critérios e dá outras providências, para Empreendimentos Industriais (Resolução nº 70/2009). Pieri, A.P. (2015). Gestão Ambiental: medidas de Produção mais Limpa para uma fecularia localizada no noroeste do Paraná. (Trabalho de Conclusão de Curso). Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campo Mourão. Secretaria De Estado Da Agricultura e do Abastecimento SEAB. (2016). Mandioca Análise da Conjuntura Agropecuária. DERAL: Departamento de Economia Rural, outubro de 2016. Disponível em: http://www.agricultura.pr.gov.br/arquivos/file/deral/prognosticos/2017/mandioca_2016_17.pdf Souza, L.S., Farias, A.R.N., Mattos, P.L.P. & Fukuda, W.M.G. (2005). Processamento e Utilização da Mandioca. Embrapa Informação Tecnológica, Brasília. Souza, S.O., Oliveira, L.C., Cavagis, A.D.M. & Botero, W.G. (2014). Cyanogenic Residues: Environmental Impacts, Complexation with Humic Substances, and Possible Application as Biofertilizer. Water Air Soil Pollut, 1, (12).