ESTUDOS ESPELEOLÓGICOS DAS CAVIDADES NATURAIS NA ÁREA DA UHE - ESTREITO - MA/TO: PROSPECÇÃO E DOCUMENTAÇÃO BÁSICA

Documentos relacionados
Geologia e relevo. Bases geológicas e Classificação do relevo

ANAIS XXVII Congresso Brasileiro de Espeleologia Januária MG, de julho de Sociedade Brasileira de Espeleologia

ESTUDOS ESPELEOLÓGICOS DE CAVIDADES NATURAIS NO MUNICÍPIO DE MARABÁ/PA

ESTRUTURAS E FORMAS DE RELEVO

Relevo da Bacia do Rio das Antas (GO): Revisão Bibliográfica

ESTRUTURAS E FORMAS DE RELEVO

Orogênese (formação de montanhas): o choque entre placas tectônicas forma as cordilheiras.

O relevo e suas formas MÓDULO 12

Edição Número 176 de 13/09/2004

FICHA DE CARACTERIZAÇÃO DE CAVIDADES

O que é tempo geológico

Atividade 14 Exercícios Complementares de Revisão sobre Geologia Brasileira

7. o ANO FUNDAMENTAL. Prof. a Andreza Xavier Prof. o Walace Vinente

CAVIDADES E MINERAÇÃO: QUESTÕES CONTROVERTIDAS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. Ricardo Carneiro

Formas de relevo. Professora: Jordana Costa

A OCORRÊNCIA DE CAVERNAS EM MINÉRIO DE FERRO E CANGA: A EVOLUÇÃO DOS ESTUDOS GEOESPELEOLÓGICOS NO QUADRILÁTERO FERRÍFERO, MINAS GERAIS.

ANAIS do XXX Congresso Brasileiro de Espeleologia Montes Claros MG, de julho de Sociedade Brasileira de Espeleologia

ESCALA GEOLÓGICA

SUMIDOURO DO LAJEADO DO SOBRADO, MUNICÍPIO DE PALMEIRA, CAMPOS GERAIS DO PARANÁ: IMPORTANTE GEOSSÍTIO DO SISTEMA CÁRSTICO DA FORMAÇÃO FURNAS

CLASSIFICAÇÃO DO RELEVO BRASILEIRO. Prof.º Elves Alves

ANAIS do XXX Congresso Brasileiro de Espeleologia Montes Claros MG, de julho de Sociedade Brasileira de Espeleologia

A NATUREZA DO BRASIL: RELEVO E HIDROGRAFIA

BRASIL: RELEVO, HIDROGRAFIA E LITORAL

A presente Nota Técnica vem consolidar as informações e recomendações dispostas no Parecer n 102/2009 COEND/CGENE/DILIC/IBAMA e no Relatório de

RELEVO BRASILEIRO: Continental e submarino. Prof. Esp. Franciane Borges

GEOFÍSICA APLICADA À CARACTERIZAÇÃO DO CARSTE DE LAGOA DA CONFUSÃO TO

Geologia do Brasil. Página 1 com Prof. Giba

BRASIL: RELEVO, HIDROGRAFIA E LITORAL

GEOLOGIA GERAL E DO BRASIL Profº Gustavo Silva de Souza

Geografia. Estrutura Geológica do Brasil. Professor Luciano Teixeira.

ÁREAS DE RISCO AO USO/OCUPAÇÃO DO SOLO NA SUB-BACIA DO CÓRREGO DO SEMINÁRIO, MUNICÍPIO DE MARIANA MG. COSTA, R. F. 1 PAULO J. R. 2

A GÊNESE DO RELEVO. GEOMORFOLOGIA (estudo do relevo) FORMAÇÃO DA TERRA (1) FORMAÇÃO DA TERRA (3) FORMAÇÃO DA TERRA (2) ORIGEM DO UNIVERSO

GEOGRAFIA - 1 o ANO MÓDULO 07 ESTRUTURA GEOLÓGICA BRASILEIRA

VOLUME IV. Plano de Acompanhamento Geológico/Geotécnico e de Recursos Minerais Plano de Gestão de Recursos Hídricos

Estrutura Geológica e o Relevo Brasileiro

Divisão Ambiental Prazer em servir melhor!

GEOGRAFIA DO BRASIL Relevo e Solo

CARACTERÍSTICAS CONSTRUTIVAS E HIDRÁULICAS DOS POÇOS TUBULARES DA APA CARSTE LAGOA SANTA E ENTORNO, MG

Informativo Diário - William Freire Advogados Associados Ano II 1

Estrutura Geológica e o Relevo Brasileiro

Caracterização da Ecorregião do Planalto Central

ANÁLISE GEOMORFOLÓGICA DO MUNICÍPIO DE JARDIM OLINDA - PR

UNIDADES DO RELEVO E CLASSIFICAÇÃO DO RELEVO BRASILEIRO. Módulos 29 e 30 Livro 2 paginas 122 a 124 / 127 a 129

CAPÍTULO 02 Estrutura Geológica, Relevo e Hidrografia.

DISCIPLINA: GEOMORFOLOGIA ESCULTURAL E APLICADA - GB 060. PROF. DR. LEONARDO JOSÉ CORDEIRO SANTOS

UHE CASTANHEIRA. Estudo de Impacto Ambiental - EIA. Juara, Setembro de 2015

APLICAÇÃO DO ÍNDICE MORFOMÉTRICO (RELAÇÃO PROFUNDIDADE/DIAMETRO) PARA ESTUDO DE DOLINA NO BAIRRO DE CRUZ DAS ARMAS, JOÃO PESSOA, PARAÍBA, BRASIL

Relevo Brasileiro. Professora: Jordana Costa

NOTA DE AULA CURVAS DE NÍVEL e REPRESENTAÇÃO DO RELEVO

TOMBAMENTO DA APA DA ESCARPA DEVONIANA: ANÁLISE DE REQUERIMENTOS MINERARIOS NO MUNICÍPIO DE BALSA NOVA, PR

Estruturas geológicas e formas do relevo Brasileiro. Professora: Jordana Costa

Estrutura Geológica do Planeta

TERMO DE REFERÊNCIA RELATÓRIO AMBIENTAL SIMPLIFICADO (RAS) PARA EMPREENDIMENTOS DESTINADOS À CONSTRUÇÃO DE HABITAÇÕES DE INTERESSE SOCIAL

Capítulo 3 Morfologia de uma bacia de drenagem. Introdução a Hidrologia de Florestas

5. ÁREA DE INFLUÊNCIA DO PROJETO 5.1. DEFINIÇÃO DA ÁREA DE INFLUÊNCIA DO PROJETO

MODELADO CÁRSICO OU KÁRSTICO

1. (UEL) De acordo com a classificação do relevo brasileiro proposta por Jurandyr Ross, o estado do Paraná apresenta, grosso modo, três unidades de

A GÊNESE DO RELEVO. GEOMORFOLOGIA (estudo do relevo) FORMAÇÃO DA TERRA (1) FORMAÇÃO DA TERRA (2) FORMAÇÃO DA TERRA (3) ORIGEM DO UNIVERSO

Inventário bibliográfico: espeleologia do estado do Rio Grande do Sul

Arqueologia e Patrimônio

Conceito de Relevo. Internas ou endógenas: constroem o relevo. Externas ou exógenas: desgastam, modificam e modelam o relevo.

INSTRUÇÃO NORMATIVA MMA Nº 02, DE

O relevo terrestre e seus agentes. - Relevo: diversas configurações da crosta terrestre (montanhas, planícies, depressões etc).

GEOLOGIA GERAL DO BRASIL E BACIAS HIDROGRÁFICAS Prof ª Gustavo Silva de Souza

GEOLOGIA E GEOMORFOLOGIA: AGENTES EXTERNOS MÓDULO 07

Geomorfologia do relevo brasileiro. Prof. Vanessa Cristina de Sousa

Forças exógenas na elaboração do relevo

FORMAS DO RELEVO NA PORÇÃO NOROESTE DE ANÁPOLIS-GO. Lidiane Ribeiro dos Santos 1 ; Homero Lacerda 2

GEOGRAFIA PROF. CARLOS 1ª SÉRIE ENSINO MÉDIO

Estrutura geológica e formas de relevo. Professora: Jordana Costa

CARACTERIZAÇÃO DO MEIO ABIÓTICO DA REGIÃO DE PIRAÍ DA SERRA - PARANÁ

O que é tempo geológico

é a herança para os nossos filhos e netos com a sua atmosfera rica em oxigénio, permite-nos respirar com a camada de ozono, protege-nos das radiações

A ESPELEOLOGIA E AS CAVERNAS DE MINAS GERAIS NO CONTEXTO DA PROTEÇÃO E CONSERVAÇÃO AMBIENTAL

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA SEDIMENTAR E AMBIENTAL GEOMORFOLOGIA E FOTOGEOLOGIA FORMAS DE RELEVO

Universidade Metodista de Angola Faculdade de Engenharia Departamento de Construção Civil

UNIDADES GEOMORFOLÓGICAS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO CÓRREGO SALOBRA - SUDOESTE DE MATO GROSSO

Figura 07: Arenito Fluvial na baixa vertente formando lajeado Fonte: Corrêa, L. da S. L. trabalho de campo dia

9. Domínios de Dissecação

Nome: Nº: Turma: Este caderno contém questões de: Português Matemática História Geografia Ciências - Inglês

Caracterização dos processos evolutivos e da dinâmica erosiva em Rondon do Pará, com ênfase na prevenção de desastres.

é a herança para os nossos filhos e netos com a sua atmosfera rica em oxigénio, permite-nos respirar com a camada de ozono, protege-nos das radiações

Hidrografia. É uma parte da geografia física que classifica e. Seu estudo abrange portanto oceanos, mares, geleiras, água do subsolo, lagos, água da

USO DE GEOTECNOLOGIAS NA ESTRUTURAÇÃO DA BASE CARTOGRÁFICA DO PARQUE ESTADUAL DO BACANGA, SÃO LUÍS-MA RESUMO

MAPEAMENTO DAS FORMAS E DA DISSECAÇÃO DO RELEVO

QUADRO RESUMO DA LEI /12 ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

ESTRUTURA INTERNA DA TERRA CROSTA

PROCESSOS EROSIVOS NOS ARENITOS DA FORMAÇÃO FURNAS EVIDÊNCIAS DE SISTEMA CÁRSTICO NA REGIÃO DOS CAMPOS GERAIS DO PARANÁ

ESTUDO DAS ANOMALIAS DE DRENAGEM COMO INDICADOR DE NEOTECTÔNICA NA BACIA DO RIO DOURADINHO, MUNICÍPIO DE LAGOA DA CONFUSÃO TO.

INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº2, DE 20 DE AGOSTO DE 2009

ANÁLISE DOS FLUXOS HÍDRICOS SUBTERRÂNEOS NO ENTORNO DA LAGOA DA CONFUSÃO TO.

6ºano 3º período matutino 8 de agosto de 2014

FENDA DA FREIRA, PONTA GROSSA PR. CAVIDADE SUBTERRÂNEA EM ARENITOS DA FORMAÇÃO FURNAS

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS DA TERRA DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA GEOMORFOLOGIA BÁSICA E ESTRUTURAL - GB 128 TEMA 1

Patrimônio Ambiental nos Geossistemas Ferruginosos no Brasil. Flávio Fonseca do Carmo Biólogo - UFMG

Conceito de Relevo. Internas ou endógenas: constroem o relevo. Externas ou exógenas: desgastam, modificam e modelam o relevo.

. a d iza r to u a ia p ó C II

GEOLOGIA GERAL E DO BRASIL Profº Gustavo Silva de Souza

UTILIZAÇÃO DO SIG NO CONTOLE DE EROSÃO EM ÁREAS SUCPTÍVEIS A INSTABILIDADE DE ENCOSTAS: BARRAGEM SERRO AZUL PALMARES (PE)

Transcrição:

ESTUDOS ESPELEOLÓGICOS DAS CAVIDADES NATURAIS NA ÁREA DA UHE - ESTREITO - MA/TO: PROSPECÇÃO E DOCUMENTAÇÃO BÁSICA SPELEOLOGICAL STUDIES OF NATURAL CAVITIES IN THE AREA OF UHE - ESTREITO - MA /TO: EXPLORATION AND BASIC DOCUMENTATION Noé von Atingen (1), Bruno dos Santos Scherer (2) & Adriana Marcia Varão (2) (1) Fundação Casa da Cultura de Marabá. (2) Grupo Espeleológico de Marabá. Contatos: Resumo fccmmaraba@hotmail.com; scherer_bruno@hotmail.com; drika_neve@hotmail.com. Este artigo aborda os levantamentos espeleológicos de prospecção e documentação básica de 98 cavidades naturais encontradas na área da UHE Estreito. Estes levantamentos foram realizados através do convênio firmado entre o Consórcio Estreito Energias (CESTE) e a Fundação Casa da Cultura de Marabá (FCCM), com o objetivo de atender a legislação de Proteção Cultural e Ambiental e compor os estudos vinculados ao EIA/RIMA para obtenção da Licença Ambiental da hidrelétrica do Estreito/MA. Palavras-Chave: Cavidades naturais, UHE Estreito e potencial espeleológico. Abstract This article discusses withdrawals Speleological survey and basic documentation of 98 natural cavities found in the area of UHE Estreito.These surveys were conducted through an agreement signed between the Consortium Estreito Energies (CESTE) and the Foundation House of culture of Marabá (FCCM), aiming to fulfill the law of Cultural and Environmental Protection and compose studies linked to the EIA/RIMA for obtaining environmental permit hydroelectric Estreito/MA. Key-words: natural cavities, UHE Estreito and speleological potencial. 1. INTRODUÇÃO Em 2001, o Grupo Espeleológico de Marabá (GEM) e a Fundação Casa da Cultura de Marabá (FCCM) realizaram seus primeiros levantamentos espeleológicos no Estado do Maranhão, especificamente no município de Tasso Fragoso, onde foram identificadas e documentadas cavidades em arenito. Em abril de 2009, através do convênio firmado entre o Consórcio Estreito Energia (CESTE) e a FCCM, foram iniciados os levantamentos de prospecção espeleológica de cavidades naturais na área da UHE-Estreito, visando atender à legislação de Proteção ao Patrimônio Cultural Nacional e Ambiental. Existem hoje diversos instrumentos legais pertinentes à questão, podendo-se citar o decreto nº 6.640, de 7/11/2008, as Resoluções CONAMA nº 237/97 e nº 347/04, além da Instrução Normativa nº 100, de 2006. O decreto 6.640 dispõe sobre a proteção das cavidades naturais subterrâneas existentes no território nacional, objetivando permitir estudos e pesquisas de ordem técnico-científica, bem como atividades de cunho espeleológico, étnico-cultural, turístico, recreativo e educativo. É definido como cavidade natural subterrânea todo e qualquer espaço subterrâneo acessível pelo ser humano, com ou sem abertura identificada, popularmente conhecida como caverna, gruta, lapa, toca, abismo, furna ou buraco, incluindo seu ambiente, conteúdo mineral e hídrico, a fauna e a flora ali encontrados e o corpo rochoso onde os mesmos se inserem desde que tenham sido formados por processos naturais, independentemente de suas dimensões ou tipo de rocha encaixante. Os objetivos deste estudo incluem além do atendimento à legislação, investigar a importância científica, cultural e turística que o patrimônio espeleológico local representa. O trabalho proposto abrange a Área Diretamente Afetada (ADA) e a Área de Influência Indireta (AII) da UHE - Estreito e teve como base o termo de referência para elaboração de estudos espeleológicos vinculados ao EIA/RIMA, do CECAV/IBAMA (Centro Nacional de Estudo, Proteção e Manejo de Cavernas), de 2004. ------------------------------------------------------------------------------------ 601 --------------------------------------------------------------------------------------

A UHE - Estreito está inserida em uma área de planaltos e planícies formados por rochas sedimentares. Os planaltos são constituídos por paredões interligados, com encostas íngremes de superfície levemente ondulada. Suas altitudes variam de 100 a 400 m e são sujeitos a intensa erosão. Nas unidades com rochas predominantemente pelíticas (cujos grãos são indistintos a olho nu, porque resultam do endurecimento de massas lodosas), os sedimentos impermeáveis são intensamente trabalhados e moderadamente desgastados pela ação erosiva das águas superficiais. Nestas condições, intensifica-se o ravinamento, tendendo a rede de drenagem ao tipo dedrítico denso, enquanto as saliências topográficas são gradualmente arrasadas. Como consequência, as formações locais ocorrem preferencialmente em áreas rebaixadas, apresentando habitualmente um relevo colinoso, caracterizado por formas abauladas, o qual muitas vezes evolui para planícies suavemente onduladas. Tais planícies localizam-se em baixas altitudes, em torno de 100 m, e sofrem processo de sedimentação constante. Na porção norte da área distingue-se dois patamares ou superfícies de aplainamentos, cujo contraste se traduz em uma paisagem particular da região. O patamar inferior varia entre 200 e 250 m, sendo em parte preservado pela presença de leitos de sílex ou pela silicificação do arenito basal. No patamar superior, com cotas de 500 m aproximadamente, ocorrem morros de topos aplainados denominados de mesetas ou morros testemunhos. Na porção sul da área, a grande quantidade de drenagens caracteriza um relevo mais arrasado, com morros abaulados com cotas médias de 150 m. 2. METODOLOGIA O trabalho de prospecção, identificação e documentação na área da UHE - Estreito ocorreu durante nove etapas de campo, no período de 20 de maio de 2009 a 07 de março de 2010. Foi realizado em 9 municípios localizados na área de abrangência do reservatório, sendo eles: Aguiarnópolis, Palmeiras do Tocantins, Darcinópolis, Babaçulândia, Filadélfia, Palmeirante, Estreito, Carolina e Barra do Ouro. Os levantamentos espeleológicos foram divididos em duas ações principais, a prospecção espeleológica e a documentação das cavidades. A metodologia utilizada consiste das seguintes etapas: 1. Levantamento bibliográfico; 2. Elaboração de mapas cartográficos e planialtimétricos, utilizando documento cartográfico da área, composto da reconstituição aerofotogramétrica datada de 2008 fornecida pela CESTE; 3. Análise preliminar dos aspectos geomorfológicos da região; 4. Prospecção para identificação de cavidades naturais subterrâneas e outras formas pseudocársticas, através de caminhamentos sistemáticos realizados em linhas paralelas equidistantes variando de 10 a 100 m. Os caminhamentos foram feitos de forma terrestre ou fluvial em escarpas, morros, vales e bordas de drenagens (Figura 1), considerando o entorno de 7 km que corresponde à Área de Influência Direta (AID) do empreendimento. Para o registro das rotas georreferenciadas foi utilizado o GPS Garmin 60 CSX convencional com precisão de 2 m. Nos terrenos de maior declividade e/ou paredões caracterizados como áreas de alto potencial espeleológico, foi empregada uma maior quantidade de linhas paralelas entre as equipes, com menor espaçamento entre si. Já nas áreas de baixo potencial espeleológico, foi possível realizar um diagnóstico visual apenas com uso de binóculos. No total foi prospectada uma área de 6.072,76 km, sendo que o caminhamento a pé foi de 2.078,26 km e de veículo (terrestre ou fluvial) foi de 3.994,5 km. 5. Documentação básica da cavidade, feita através do preenchimento de uma ficha que contempla todas as informações básicas de Geoespeleologia, Bioespeleologia, Arqueologia e Morfologia. Cada cavidade foi identificada com uma placa metálica que continha o número de cadastro do Grupo Espeleológico de Marabá (GEM). 3. DISCUSSÃO E RESULTADOS Foram encontradas 98 cavidades, inseridas em rochas sedimentares largamente classificadas como arenitos, destacando-se com maior potencial espeleológico os municípios de Carolina e Babaçulândia, com 44% das cavidades identificadas, e Estreito e Aguiarnópolis, também com 44%. Os municípios de Filadélfia, Barra do Ouro e Palmeirantes apresentaram os 12% restantes (Figura 2). É importante destacar que 55 cavidades estão na Área de Influência Indireta (AII), no entorno de 7,0km da área do lago a ser inundado e 43 estão na ------------------------------------------------------------------------------------ 602 --------------------------------------------------------------------------------------

Área Diretamente Afetada (ADA). A figura 3 ilustra algumas das cavidades identificadas. A tabela 1 apresenta informações detalhadas de todas as cavidades encontradas. Foi registrada a presença de espeleotemas em 45%, vertebrados em 74%, invertebrados em 93% e ocorrências arqueológicas em 6% das cavidades. No geral as cavidades são pequenas, apresentando desenvolvimento médio de 9,9 m, com valor máximo de 50,0 m (GEM 1963) e mínimo de 5,0 m nas cavidades GEM 1965, GEM 1971, GEM 1972, GEM 2098, GEM 2108 e GEM 2135. É importante frisar que os dados obtidos durante as campanhas deste estudo são frutos de levantamentos de documentação básica de cavidades, sendo necessária, portanto, a realização futura de estudos complementares específicos de geoespeleologia, bioespeleologia e arqueologia. 3.1 GEOESPELEOLOGIA 3.1.1. Tipologia Das 98 cavidades encontradas, 85 se caracterizam como abrigos e 13 como grutas (Figura 4). A principal diferença está na morfologia interna da cavidade, sendo que os abrigos (Figura 5A) apresentam pequeno desenvolvimento, possuindo apenas zona de entrada e profundidade menor que a altura da entrada, enquanto as grutas (Figura 5B) têm desenvolvimento predominantemente horizontal, linear, maior que a altura da entrada, com apenas um salão, podendo apresentar também zonas de penumbra e afótica. 3.1.2. Hidrologia A maioria das cavidades resulta da erosão e / ou dissolução das rochas a partir da circulação da água sobre e / ou entre elas, formando os chamados abrigos, grutas, cavernas e abismos, que evidenciam feições como dolinas, sumidouros, surgências e clarabóias. No entanto, somente no interior de cavidades que ocorrem nas proximidades de igarapés e rios é que ocorrem processos hidrológicos diretamente associados a cursos d água. Nestes casos, as cavidades podem ser consideradas freáticas quando o curso do rio percorre perene e totalmente o seu interior e vadosas quando a cavidade fica apenas parcialmente alagada. Nestas situações, surgências e canais de drenagem temporários podem também ocorrer, gerados pela concentração do gotejamento ou percolação de águas pluviais infiltradas via canalículos ou juntas (PILÓ & AULER, 2009). Figura 1 - Equipe realizando caminhamentos em diferentes paisagens. ------------------------------------------------------------------------------------ 603 --------------------------------------------------------------------------------------

Figura 2 - Mapa de caminhamento ------------------------------------------------------------------------------------ 604 --------------------------------------------------------------------------------------

A B C D Sequencial Figura 3 Cavidades: A) GEM 1934, B) GEM 1941, C) GEM 1948 e D) GEM 1967 Tabela 1 - Cavidades naturais da área da UHE Estreito. Nº Coordenadas UTM Altitude Desenv. Área de GEM Tipologia E N (m) (m) Influência 1 1891 Gruta 217116 9268278 171 15,5 AII 2 1892 Abrigo 226854 9264770 150 8 ADA 3 1893 Abrigo 226783 9264675 158 5,6 ADA 4 1894 Abrigo 224563 9261078 142 8,8 ADA 5 1895 Abrigo 224551 9261648 134 10 ADA 6 1896 Abrigo 225844 9264470 145 9 ADA 7 1897 Abrigo 226165 9276504 176 6,4 AII 8 1898 Abrigo 225057 9253990 140 5,4 ADA 9 1899 Abrigo 224704 9260968 141 7 ADA 10 1900 Gruta 224704 9260982 142 21,3 ADA 11 1901 Abrigo 224660 9261002 136 7,4 ADA 12 1902 Abrigo 226121 9276544 170 9 AII 13 1903 Gruta 226155 9276502 179 26 AII 14 1904 Abrigo 226258 9276440 179 7 AII 15 1905 Gruta 225254 9258212 140 19,5 ADA 16 1931 Abrigo 225226 9258200 146 6 ADA 17 1932 Abrigo 218966 9267940 138 6 AII 18 1933 Abrigo 224881 9254326 147 8 ADA 19 1934 Gruta 221325 9261165 153 8,5 AII ------------------------------------------------------------------------------------ 605 --------------------------------------------------------------------------------------

20 1935 Abrigo 237024 9233304 157 6,2 ADA 21 1936 Abrigo 236992 9233279 158 8 ADA 22 1937 Abrigo 237044 9233368 164 5,5 AII 23 1938 Abrigo 237214 9233447 163 11 ADA 24 1939 Abrigo 237309 9233458 168 6 AII 25 1940 Abrigo 236938 9233222 164 11,6 AII 26 1941 Abrigo 223515 9254352 165 8,2 ADA 27 1942 Abrigo 220049 9268996 168 6 ADA 28 1943 Abrigo 220073 9269020 172 6 ADA 29 1944 Gruta 220057 9269002 176 20 ADA 30 1945 Abrigo 220052 9268931 173 9 ADA 31 1946 Gruta 223774 9237463 173 20 ADA 32 1947 Abrigo 236958 9233238 163 5,3 ADA 33 1948 Abrigo 236798 9233152 175 16 AII 34 1949 Abrigo 236713 9233069 178 10 AII 35 1950 Abrigo 227756 9240759 149 15 ADA 36 1951 Abrigo 227174 9240760 149 6,2 ADA 37 1952 Abrigo 223536 9236664 106 5,3 ADA 38 1953 Abrigo 187355 9204490 310 14 AII 39 1954 Abrigo 193996 9143489 140 9,4 ADA 40 1955 Abrigo 193960 9143458 150 6,1 ADA 41 1956 Abrigo 193879 9143389 160 5,6 ADA 42 1957 Abrigo 193869 9143386 156 6 ADA 43 1958 Gruta 223358 9243149 148 16 ADA 44 1959 Abrigo 223332 9243131 154 9 ADA 45 1960 Abrigo 223933 9237566 136 8 ADA 46 1961 Abrigo 193802 9143331 176 5,5 ADA 47 1962 Abrigo 193644 9143103 154 5,5 ADA 48 1963 Gruta 219113 9230767 152 50 ADA 49 1964 Abrigo 220777 9243557 136 8 ADA 50 1965 Abrigo 220913 9243544 117 5 ADA 51 1966 Abrigo 224154 9258039 154 10,3 ADA 52 1967 Abrigo 219801 9222979 112 12 AII 53 1968 Abrigo 225802 9276887 160 5,1 AII 54 1969 Abrigo 225788 9276899 157 7 AII 55 1970 Abrigo 215412 9257858 157 5,8 AII 56 1971 Abrigo 193604 9143037 158 5 ADA 57 1972 Abrigo 182416 9109202 193 5 AII 58 1973 Abrigo 206076 9215345 230 11 AII 59 1974 Abrigo 221857 9240724 162 6,2 ADA 60 1975 Abrigo 219209 9221434 223 9 AII 61 1976 Abrigo 221935 9240619 160 7 ADA 62 1977 Abrigo 221628 9241004 157 7,4 ADA 63 1978 Abrigo 163500 9119500 164 6 AII 64 1979 Abrigo 219168 9221430 239 17 AII 65 1980 Abrigo 224299 9221678 230 12 AII 66 2085 Abrigo 224329 9221678 231 9 AII 67 2086 Gruta 225091 9224906 209 10 AII 68 2087 Abrigo 225007 9224782 213 7 AII 69 2088 Gruta 221237 9223966 230 25,5 AII 70 2089 Abrigo 223244 9220727 206 7 AII Legenda: ADA - Área Diretamente Afetada AII - Área de Influência Indireta ------------------------------------------------------------------------------------ 606 --------------------------------------------------------------------------------------

Figura 4 - Tipologia das cavidades da região da UHE Estreito Figura 6 - Hidrologia das cavidades na área da UHE - Estreito Na área da UHE Estreito, a grande maioria das cavidades encontradas foram classificadas como secas (Figura 6). Porém, algumas abrigam processos hidrológicos, representadas por 19 cavidades vadosas (Figura 7). É interessante ressaltar que a presença de corpos d água em cavidades favorece a ocorrência de macro e micro fauna. A Figura 7 - Cavidade GEM 1891 B 4.1.3. Espeleotemas Das 98 cavidades naturais documentadas, 44 apresentaram espeleotemas (formações resultantes da sedimentação e cristalização de minerais dissolvidos na água) (Figura 8). Os tipos mais frequentes foram: crosta branca (Figura 9a), pigmentos brancos, crosta negra e crosta cinza. Outros espeleotemas encontrados foram: pop corn (GEM 1942 e GEM 2118) (Figura 9b), microestalactites (GEM 1968) e pigmentos amarelos (GEM 1903). Das cavidades com ocorrência de espeleotemas, 80% apresentaram apenas um tipo de espeleotema; 16%, dois tipos; e 4%, três tipos. Figura 5 - Cavidades: A) Abrigo GEM 2093 e B) Gruta GEM 2088 ------------------------------------------------------------------------------------ 607 --------------------------------------------------------------------------------------

necessários, portanto, estudos posteriores para caracterizar o nível de relevância biológica nas cavidades encontradas. Os animais comumente encontrados em ambientes cavernícolas podem estar estreitamente condicionados ao meio ou apenas utilizando-se dele durante parte do seu ciclo de vida. O reconhecimento dos grupos de vertebrados e invertebrados é importante na identificação destes grupos (Figura 10). Figura 8 - Espeleotemas identificados na área da UHE - Estreito Figura 10 - Ocorrência de invertebrados e vertebrados em cavidades A ocorrência de invertebrados em geral não está condicionada ao tamanho das cavidades e nem à sua zonação. Já entre os vertebrados, particularmente os Chiroptera (Figura 11) costumam concentrar-se nas zonas de penumbra e afótica. Figura 9 Espeleotemas: A) Crosta branca e B) Pop corn. 3.2. BIOESPELEOLOGIA Neste trabalho foram realizados levantamentos superficiais de fauna cavernícola, caracterizando apenas grandes grupos. Serão Figura 11 - Chiroptera, Glossophaginae Em alguns casos há ocorrência de Chiroptera não identificado, isso pode ocorrer pelo fato desses vertebrados estarem em movimento dificultando a identificação dos mesmos. Durante os ------------------------------------------------------------------------------------ 608 --------------------------------------------------------------------------------------

levantamentos nenhuma captura é realizada e nenhum exemplar é coletado, as identificações foram feitas in loco ou através de fotografias. 3.3. ARQUEOLOGIA O reconhecimento arqueológico na área estudada foi feito por observação das superfícies expostas do terreno, principalmente nas zonas de entrada das cavidades, onde o material arqueológico ocorre com maior frequência. Das 98 cavidades documentadas, 6 apresentaram material arqueológico superficial (Figura 12). Em 3 cavidades foram encontradas gravuras rupestres (GEM 1895, 1897 e 1902) (Figura 13), e, em outras 3, fragmentos cerâmicos e gravuras rupestres (GEM 1894, 1896 e GEM 1953) (Figura 14). Cavernas). Os resultados do presente estudo, no entanto, identificaram, surpreendentemente, 98 cavidades, conferindo à área uma significativa importância científica, cultural e turística no âmbito do patrimônio espeleológico. As cavidades que serão impactadas pelo enchimento do reservatório estão inseridas nas rochas areníticas, as quais são frágeis e passiveis de desabamentos o que representa uma perda de informações relevantes (biologia, geologia, arqueologia e etc.), formadas há milhões de anos e que quando estudadas e conhecidas, podem auxiliar no entendimento da história da Terra e seus processos evolutivos. Figura 13 - Gravuras rupestres na cavidade GEM 1895 Figura 12 - Ocorrência de material arqueológico nas cavidades na área da UHE Estreito 4. CONCLUSÕES No início do levantamento bibliográfico de ocorrências espeleológicas na área da UHE-Estreito e da análise das feições rochosas e rochas encaixantes predominantes, houve uma primeira impressão de baixo potencial espeleológico na região, pois até então não existiam dados de cavidades e nem indicação de potencial espeleológico a partir dos mapas dos Estados do Tocantins e Maranhão apresentados pelo CECAV (Centro Nacional de Estudo, Proteção e Manejo de Figura 14 - Fragmento cerâmico na cavidade GEM 1894 BIBLIOGRAFIA AGUIAR G.A. Revisão geológica da bacia paleozóica do Maranhão. In: Congresso Brasileiro de Geologia, 25, São Paulo, Anais... São Paulo, SBG. V.3, 113-22.1971. CECAV/IBAMA, Termo de referência para elaboração de Estudos Espeleológicos vinculados ao EIA/RIMA, 2004. ------------------------------------------------------------------------------------ 609 --------------------------------------------------------------------------------------

GÓES A. M. O.; FEIJÓ F. J. Bacia do Parnaíba. Bol. Geoc. Petrobrás, V.8. 1993. MESNER J.C. & WOOLDRIDGE L.P. Estratigrafia das bacias paleozóica e cretácea da Maranhão. Rio de Janeiro. 1964. PILÓ, Luís B.; AULER, Augusto. Geoespeleologia das cavernas em rocha ferrífera da região de Carajás, PA. In.: SBE. CONGRESSO BRASILEIRO DE ESPELEOLOGIA, 30, Montes Claros. Anais XXX. 2009. SILVA, G.G., LIMA, M.I.C., ANDRADE, A.R.F., ISSLER, R.S., GUIMARÃES, G. Geologia das folhas SB-22 Araguaia e parte da SC22 Tocantins. In: Levantamento de Recursos Minerais, Projeto Radam. Departamento Nacional da Produção Mineral DNPM. 1974. ------------------------------------------------------------------------------------ 610 --------------------------------------------------------------------------------------