ALGUNS ASPECTOS DA INTERAÇÃO DA MARÉ E PRECIPITAÇÃO NA VARIAÇÃO SAZONAL DA TEMPERATURA DO SOLO EM UM MANGUEZAL TROPICAL.

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1 ALGUNS ASPECTOS DA INTERAÇÃO DA MARÉ E PRECIPITAÇÃO NA VARIAÇÃO SAZONAL DA TEMPERATURA DO SOLO EM UM MANGUEZAL TROPICAL. MOURA, M. A. L.; QUERINO, C. A. S.; LYRA, R. F. F.;MARIANO, G.L.; NASCIMENTO FILHO, M.F. Instituto de Ciências Atmosféricas Universidade Federal de Alagoas BR 104 km 14 Tabuleiro Maceió AL malm@ccen.ufal.br RESUMO O estudo foi realizado com a coleta de dados durante o período de outubro/2004 a outubro/2005 no sítio experimental ( S e W) de uma floresta de manguezal localizado dentro do Complexo Estuarino Lagunar Mundaú-Mangaba pertencente a Área de Proteção Ambiental (APA) da Ilha de Santa Rita no Estado de Alagoas no intuito de conhecer as características sazonais da Temperatura do Solo(TS). Para isso foi erguida uma torre de 14m, na qual foram instalados diversos sensores (radiação solar global, difusa e refletida, temperatura e umidade do ar, vento, etc) e a uma distancia de 2,5m ao sul da base (para evitar sombreamento extra pela torre) foram coletados permanentemente os perfis de temperatura do solo com termopares do tipo T (Cobre-Constantan) (Campbell Sci., EUA) nas profundidades de 5, 15 e 30cm. Observou-se que as maiores TS médias nas profundidades estudadas (5, 15 e 30cm) ocorreram nos meses do período seco local (Janeiro até abril) variando entre 27 e 29 C, enquanto as menores nos meses do período chuvoso (Maio até Agosto) variando entre 24 e 25 C. Já o regime térmico do solo é regido pelos fenômenos da precipitação e fluxo e refluxo das marés. ABSTRACT This study has been realized with data collected during the period from October/2004 to October/2005, in an experimental site ( S e W) inside a mangrove swamp forest located in the Estuarine Lagoon Complex Mundaú-Manguaba, pertaining to the Environment Protection Area (EPA) of Santa Rita s Island in Alagoas state, Brazil, with the aim to know the seasons soils temperature characteristics (TS). To execute this experiment, a tower (14m) was raised, that which was installed several sensors (solar global, diffuse and reflected radiation, air temperature and humidity, wind, etc) 2,5m faraway to tower south base (to avoid extra shadow from tower) and there were collected in a soil temperature permanent profiles, with thermocouples type T (Copper-Constantan) (Campbell Sci., EUA) in 5, 15 and 30cm of depth. Observed that the biggest average TS on the studied depths (5,15 e 30cm) happened in the dry local period months (January to April) oscillating between 24 and 25 ºC. The thermic soil regime it is controlled by precipitation, flux and reflux from tides phenomena. Palavras-chave: manguezal, temperatura do solo, maré, precipitação INTRODUÇÃO Manguezais são importantes componentes dos ecossistemas tropicais (Vance et al., 1990), que desenvolvem-se em zonas litorâneas associadas a cursos d água, em áreas encharcadas, salobras e calmas, com influência das marés, porém, não atingidos pela ação direta das ondas. Geralmente são sistemas jovens que seguindo a dinâmica das marés nas áreas onde se localizam produzem a modificação na topografia desses terrenos, resultando numa seqüência de recuos e avanços da cobertura vegetal (Schaeffer-Novelli, 1999). No Brasil, é ampla a extensão ocupada por manguezais, ocorrendo em quase toda a orla marinha, de forma mais ou menos contínua, dependendo das características fisiológicas, desde o extremo norte (rio Oiapoque, aos N) até Santa Catarina (Laguna, aos S) (Shaeffer-Novelli, 1995). Apesar da grande importância do estudo dos manguezais sob vários aspectos da ciência, pouco se conhece a respeito dos processos de trocas de massa, energia, momentum e parâmetros

2 bióticos e abióticos, dentro e acima do dossel. A superfície do solo é um dos componentes mais importantes do microclima da planta, (Sediyama & Prates, 1986) que serve não só como suporte para a planta, mas para um meio, através do qual a água e os nutrientes são transferidos para o sistema radicular. Além disso, fisicamente o solo funciona como principal mecanismo de armazenamento de energia. Como em todo o mundo, no estado de Alagoas as áreas de mangue vêm sendo alvos de constantes pressões sócio-econômicas (construção de aterros, recepção de dejetos, esgotos e produtos químicos diversos, etc). A região de manguezais ainda é pouco estudada, sob o aspecto de variáveis meteorológicas, trazendo sempre dúvidas sobre o comportamento dessas variáveis, em áreas naturais e áreas degradadas. Devido o desconhecimento da interação entre o ecossistema de manguezal e os processos físicos na atmosfera, fica difícil identificar possíveis diferenças entre os elementos estudados, ampliando assim o conhecimento sobre as condições micrometeorológicas propícias à sustentabilidade do equilíbrio microclimático nos manguezais. Então, a caracterização da dinâmica térmica do solo dos manguezais constitui valiosa ferramenta no que concerne à resposta desse ecossistema às condições ambientais existentes, bem como aos processos de alteração do meio ambiente, auxiliando, assim, nos estudos e ações que objetivam a conservação desse ecossistema. MATERIAL E MÉTODOS O estudo foi realizado com a coleta de dados durante o período de outubro/2004 a outubro/2005 em um sítio experimental localizado dentro do Complexo Estuarino Lagunar Mundaú-Mangaba (Figura 1) pertencente a Área de Proteção Ambiental (APA) da Ilha de Santa Rita, que abrange concomitantemente um total de 7 municípios do Estado de Alagoas, onde foi detectado que 44% da referida área está degradada (IMA, 1993). O referido sitio apresenta vegetação nativa ( S e W), mais especificamente floresta de manguezal com uma altura média do dossel de 10m, dotado de uma área de aproximadamente 416 mil m 2, que segundo Calado & Sousa (2003) tem uma vegetação arbórea constituída por poucas espécies que apresentam adaptações estruturais e fisiológicas necessárias as condições oferecidas por esse ambiente e é composta por 3(três) tipos predominantes: Avicennia Germinans L., vulgarmente chamada de mangue preto, a Rhizophora Mangle L., também conhecida como gaitera ou mangue vermelho, e a Laguncularia racemosa C. F. Gaertn (conhecida como mangue branco ou tinteira

3 Figura 1 Localização geográfica do Complexo Estuarino Lagunar Mundaú-Mangaba. O solo do manguezal é pobre em oxigênio e rico em matéria orgânica, incompletamente decomposta O fluxo e refluxo das marés promove a circulação dos nutrientes e alimentos. As características físicas do solo do mangue foram determinadas em agosto/2005 pelo Departamento de Solos, Engenharia e Economia Rural da Universidade Federal de Alagoas, sendo a classificação textural definida como Areia-Franca (0-10cm) e Franco-Arenosa(10-30cm). No interior do mangue foi erguida uma torre de 14m, na qual foram instalados diversos sensores (radiação solar global, difusa e refletida, temperatura e umidade do ar, vento, etc) e obviamente a uma distancia de 2,5m ao sul da base (para que não ocorresse sombreamento extra pela torre) foram coletados permanentemente os perfis de temperatura do solo com termopares do tipo T (Cobre-Constantan) (Campbell Sci., EUA) nas profundidades de 5, 15 e 30cm. Todos os termopares estavam conectados a um Datalogger 21X (Campbell Scientific, EUA), que por sua vez tinha um Módulo de Armazenamento do tipo SM716 (Campbell Scientific, EUA), no qual eram armazenados em médias de 5 minutos das medições realizadas a cada 10 segundos e descarregados quinzenalmente para que fossem tratados e posteriormente plotados os gráficos. As marés no complexo estuarino são predominantemente semi-diurnas com uma altura média de 2m, conforme os dados obtidos no site da Diretoria de Hidrografia e Navegação para o porto de Maceó localizado nas seguintes coordenadas: Latitude: 09º41',0S ; Longitude: 035º43',5W. A floresta de mangue é inundada duas vezes ao dia pela maré através dos canais com uma altura máxima de 0,50m, onde estava instalada a torre meteorológica. RESULTADOS E DISCUSSÃO Existem algumas hipóteses que são usadas para explicar a estrutura das florestas, como por exemplo fatores geomorfológicos, climáticos e fisiológicos. A interpretação da relação entre estrutura da comunidade do manguezal e variáveis ambientais aponta na necessidade do melhor entendimento da Temperatura do solo (TS), já que ela é influenciada por inúmeros fatores, isto é,

4 condições meteorológicas (radiação solar e temperatura do ar), topografia, quantidade de água no solo, textura, etc (Paul et al., 2004). Os dados da temperatura do solo (TS) observados demonstraram algumas características importantes no seu ciclo anual. Isso inclui a quantificação do range sazonal da TS, onde na Figura 2 observa-se que as maiores TS médias nas profundidades estudadas (5, 15 e 30cm) ocorreram nos meses do período seco local (Janeiro até abril) variando entre 27 e 29 C, enquanto as menores nos meses do período chuvoso (Maio até Agosto) variando entre 24 e 25 C. Independentemente dos fatores que influenciam o ciclo da TS alguns aspectos devem ser considerados: a) as TS mínimas tem uma defasagem média de aproximadamente uma hora entre as profundidades estudadas; b) as TS máximas ocorrem a partir das 15 horas (local) e também apresentam uma defasagem entre as profundidades de aproximadamente 1,5 horas; c) o nível mais superficial (5 cm) apresentou maior variabilidade como era esperado; d) o nível mais profundo foi quem apresentou menor variabilidade na TS sendo que os meses de fevereiro a abril os de maiores TS e agosto os de menores. Quanto a ocorrência das TS máximas e mínimas é importante ressaltar que em todas as camadas estudadas os meses de maiores TS são março-abril, apesar de incidir mais radiação solar global a superfície na região nos meses de dezembro e janeiro (período em que o Sol se encontra no solstício de verão para o hemisfério sul), assim como as menores TS são julho e agosto, apesar do pico das chuvas locais serem maio-junho. Quando analisamos separadamente os perfis verticais de janeiro e julho notamos de imediato três características: 1) a TS de janeiro é mais variável do que a de julho já que a variação da TS próxima a superfície tende a flutuar em resposta as variações de curto prazo nas condições atmosféricas ambientais e o efeito da inundação da maré., (2) assim como a ocorrência dos mínimos no mês de julho contradiz a lógica, uma vez que enquanto em janeiro nota-se uma defasagem da ocorrência da TS mínima com a profundidade, no mês de julho ocorre o contrário, onde primeiramente as TS mínimas ocorrem em profundidades, para só então ocorrer no nível mais superficial o que significa afirmar que desde cedo os níveis mais profundos fornecem calor aos níveis superficiais, como também é interessante salientar que a diferença entre a TS media máxima e mínima foi de apenas 0,6 C. Por fim, (3) pode-se destacar também o fato de que as temperaturas das camadas mais próximas a superfície foram um pouco mais elevadas do que as mais profundas, no período de estiagem, relação que se inverte substancialmente no período chuvoso, mostrando que nesse caso, as TS das camadas mais profundas passam a ser maiores do que das camadas mais superficiais. Isso estaria relacionado a pluviosidade, pois quando a mesma foi baixa (Janeiro) a TS aumentou e após o início do período chuvoso as TS tiveram grande queda, mas mantiveram-se sem grandes oscilações. É interessante destacar a dinâmica termal do solo quando consideramos a relação entre a TS no mangue e os fenômenos da precipitação e fluxo e refluxo das marés. Para isso, tomamos como

5 exemplos os meses de Janeiro (Figura 3) e Maio-Junho (Figura 4). Na Figura 15 é possível observar duas influências da maré sobre a TS: a) quando a amplitude diária da maré (diferença entre a maré máxima e mínima) é máxima, a TS nos níveis medidos aumenta em 1-2 C e a amplitude da TS diminui. Isso ocorre porque os solos são expostos, por conta da maré atingir seu ponto mínimo, então o solo recebe diretamente energia solar para aquecer-se, mas não consegue se resfriar totalmente, pois logo em seguida o nível da água volta a subir e, como sabemos a água é mais conservativa em relação ao calor; b) já quando a amplitude diária da maré diminui (popular maré morta), o que significa afirmar que o solo estará sempre submerso, a TS se estabiliza para atingir máximos e mínimos e sua amplitude aumenta, pois segundo Engman & Gurney (1991) a inércia térmica é a medida da resistência térmica de um material as variações da temperatura, sendo que alguns materiais, tais como solo seco, tem baixa inércia térmica enquanto outros, tais como solos úmidos têm alta inércia térmica No caso em questão significa afirmar que a TS é na realidade conduzida pela temperatura da água da maré. Quando analisamos a Figura 4 observa-se claramente que em alguns momentos (ou épocas ) do ano a TS do mangue é fortemente influenciada pela precipitação, pois a mesma despadroniza o ciclo da TS, independente da influencia do ciclo da maré, conforme já relatado anteriormente. AGRADECIMENTOS Gostaria de expressar nossos agradecimentos a Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Alagoas (FAPEAL) por tornar possível a realização deste projeto. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS CALADO, T. C. dos S. & SOUSA, E. C. de. Crustáceos do Complexo Estuarino-Lagunar Mundaú/Manguaba - Alagoas. Maceió: FAPEAL. 116p ENGMAN, E. T. & GURNEY, R. L. Remote sensing in Hydrology. Chapman & Hall, London, UK, p. 225, 1991 IMA (INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE)/GOVERNO DE ALAGOAS. Zoneamento Ambiental da APA de Santa Rita e Reserva Ecológica do Saco da Pedra Vol I. Convênio IMA-GTZ, Maceió, AL, PAUL, K. I.; POLGLASE, P. J.; SMETHURST, P. J.; O CONNELL, A. M.; CARLYLE, C. J.; KHANNAA, P.K. Soil temperature under forests: a simple model for predicting soil temperature under a range of forest types. Agricultural and Forest Meteorology, v.121, p , SCHAEFFER-NOVELLI, Y. Avaliação e ações prioritárias para a conservação da biodiversidade da zona costeira e marinha. São Paulo: USP, Instituto Oceanográfico, p. SCHAEFFER-NOVELLI, Y. Manguezal ecossistema entre a terra e o mar. São Paulo: USP, Instituto Oceanográfico, São Paulo, p. SEDIYAMA, G. C. ; PRATES, J. E.. O microclima: possibilidade de modificação. Inf. Agropecuário, Belo Horizonte, v.12, n.138, p.36-42, VANCE, D. J.; HAYWOOD, M. D. E.; STAPLES, D. J. Use of a mangrove estuary as a nursery area by postlarval and juvenile banana prawns, Penaeus merguiensis de Man, in northern Australia. Estuarine, Coastal and Shelf Scienc, v. 31, p , 990.

6 (a) (a) (b) (b) (c) (c) ( d ) Figura 2 - Variação média horária mensal da Temperatura do Solo no Mangue nas profundidades de 5cm (a), 15cm (b) e 30cm (c). Figura 3 Perfil vertical da TS em janeiro (a) e julho (b) e variação da TS com a precipitação em julho (c) e com a maré em janeiro (d).