POTENCIAL LIBERAÇÃO DE METAIS EM ÁGUAS DE CHUVA ARMAZENADAS EM CISTERNAS UTILIZADAS PARA CONSUMO HUMANO.

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1 CAPTAÇÃO E MANEJO DE ÁGUA DE CHUVA PARA SUSTENTABILIDADE DE ÁREAS RURAIS E URBANAS TECNOLOGIAS E CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA TERESINA, PI, DE 11 A 14 DE JULHO DE 2005 POTENCIAL LIBERAÇÃO DE METAIS EM ÁGUAS DE CHUVA ARMAZENADAS EM CISTERNAS UTILIZADAS PARA CONSUMO HUMANO. Carolina Ventura da Silva (1) Nutricionista formada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Estudante de mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Manuelle Prado Cardoso Estudante do último período de graduação em Engenheira Civil pela Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Luiz Rafael Palmier Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em Recursos Hídricos pela COPPE/UFRJ. Doutor em Hidrologia pela Imperial College, Universidade de Londres. Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Hidráulica e Recursos Hídricos. Valter Lúcio de Pádua Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre e Doutor em Hidráulica e Saneamento pela Escola de Engenharia de São Carlos Universidade de São Paulo (EESC - USP). Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG. Endereço (1) : Avenida Coronel Aristides Bittencourt, 02/101. Bairro: Silvestre. Viçosa MG CEP: carolventurasilva@yahoo.com.br RESUMO A construção de cisternas de placas destinadas ao armazenamento de água de chuva é uma técnica que tem se destacado amplamente nos últimos anos no Brasil como forma de minimizar a escassez de água destinada ao consumo humano na região semi-ária. Para muitas famílias, essa é praticamente a única disponível para consumo. Porém, pouco se sabe acerca da qualidade desta água após longos períodos de armazenagem. O objetivo deste trabalho é verificar a potencial 5º Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva,Teresina, PI, 11-14/07/2005 1

2 liberação excessiva de metais presentes no cimento utilizado na construção dessas durante o armazenamento da água de chuva. PALAVRAS-CHAVE: Cisterna de placas, Semi-árido, Metais, Qualidade de água, Água de chuva, Vale de Jequitinhonha. INTRODUÇÃO A utilização do sistema de captação de água de chuva em cisternas é uma técnica amplamente difundida em regiões semi-áridas devido à escassez hídrica que ocorre nestes locais, atingindo principalmente a zona rural. Este sistema consiste em uma superfície de captação e uma calha para o transporte da água até o local de armazenagem, no caso, as cisternas (Figura 1). Figura 1 Layout do Sistema de Captação de água de chuva em cisternas. Essas são construídas em mutirões, compostos pela população local, utilizando, principalmente, a técnica de placas pré-moldadas de cimento envolvidas por anéis de arame e revestidas interna e externamente com argamassa de cimento (Figuras 2 e 3). 5º Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva,Teresina, PI, 11-14/07/2005 2

3 Figura 2. Cisterna de placas pré-moldadas Figura 3. Cisterna envolvida por arame,.....revestida com argamassa de cimento. Várias cisternas têm sido construídas pelo Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semi-Árido: Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC), e pela atuação de ONG s. Este programa está sendo coordenado pela Articulação no Semi-Árido (ASA) e possui como meta a construção de um milhão de cisternas em um período de cinco anos. As cisternas domiciliares construídas pelo P1MC possuem, normalmente, um volume de 16 mil litros, quantidade suficiente para o consumo de água para beber e cozinhar de uma família com aproximadamente cinco pessoas, durante os meses de seca. Aparentemente, a qualidade da água captada é superior às de outras fontes disponíveis, no que se refere a turbidez, cor e sabor. Contudo, ainda pouco se sabe a respeito da qualidade química desta após certo período de armazenamento. Tendo em vista o ph relativamente baixo da água de chuva, esta pode ser agressiva ao concreto e potencializar a liberação de metais, comprometendo a qualidade da água consumida pela população. Em estudo realizado com cisternas na zona rural do oeste da Pensilvânia, foram encontradas elevadas concentrações de chumbo em água armazenadas em cisternas (50μg/L) (SHARPE & YOUNG, 1982). Considerando o padrão de potabilidade brasileiro Portaria 518/2004 (BRASIL, 2004), cujo Valor Máximo Permitido (VMP) é de 10μg/L (0,01mg/L), esta amostra estaria inaceitável para o consumo humano, pois o valor é 5 vezes superior ao desejado. Em Auckland, Nova Zelândia, Simmons et al.(2000) analisaram alguns metais de 125 cisternas localizadas na zona rural de quatro distritos da região, onde esta era a única fonte de água disponível. Das amostras analisadas, 14,4% apresentaram valores de chumbo superiores ao Valor Máximo Aceitável pela legislação local (0,01mg/L) e as amostras de 3 cisternas ultrapassaram o valor máximo recomendado para cobre (2,0mg/L). Os metais podem, ao longo do tempo, sedimentar juntamente com outros materiais particulados presentes na água. Segundo estudo realizado por Young e Sharpe (1984) em cisternas localizadas na zona rural de Clarion e Indiana, 70% destas apresentaram concentrações de chumbo ou cádmio no sedimento em quantidades superiores aos padrões de potabilidade locais (50μg/L e 10μg/L, respectivamente). 5º Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva,Teresina, PI, 11-14/07/2005 3

4 Alguns metais que poderiam estar presentes na água armazenada em cisternas, constituintes da argamassa do cimento, como sódio e ferro, provavelmente alterem apenas o sabor desta, dependendo da concentração presente, não representando riscos potenciais à saúde. A preocupação existe em relação a presença dos metais pesados que também podem estar presentes na constituição do cimento, na estrutura de captação ou em resíduos depositados na superfície de captação. Dentre estes metais, pode-se citar o alumínio. Já foram realizados vários estudos epidemiológicos relacionando a presença de alumínio na água de abastecimento com o Mal de Alzheimer. Esta é uma doença neurológica responsável por 60% dos casos de demência em idosos e a quarta causa de morte nos mesmos. Essa tem sido mais relacionada ao conteúdo de alumínio presente em alimentos, porém já existem trabalhos comprovando a existência de uma relação entre a presença de alumínio na água e a ocorrência da doença. De 13 destes estudos, 9 apresentaram uma associação positiva entre eles (FLATEN, 2001). Segundo Kawahara et. al (2001), estudos epidemiológicos, neuropatológicos e bioquímicos verificaram que é possível uma ligação entre a neurotoxicidade do alumínio e a patologia Mal de Alzheimer. Em Curaçao, ocorreu a morte de 10 pacientes entre os 27 internados em uma clínica de hemodiálise no ano de A explicação para os óbitos está relacionada ao uso de argamassa de cimento para revestimento interno das tubulações de adução de água. A agressividade da água pode ter provocado a lixiviação da argamassa, havendo uma maior liberação de alumínio e cálcio (BEREND, 2002). Na zona rural de Araçuaí-MG (Médio Vale do Jequitinhonha), está sendo realizado um estudo a respeito da concentração de alumínio encontrada na água das cisternas de placas, onde está sendo verificado a potencial liberação desse elemento em função da idade das cisternas (captaram mais ou menos que dois ciclos de chuva). Segundo Cardoso et al. (2005), foram encontrados teores de alumínio seis vezes superiores aos recomendados pela Portaria 518/04 do Ministério da Saúde, que é 0,2 mg/l, sendo que a maior liberação ocorreu principalmente nas cisternas recémconstruídas (captaram apenas um ciclo de chuva). 5º Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva,Teresina, PI, 11-14/07/2005 4

5 OBJETIVO O objetivo deste trabalho consiste em dar continuidade a estudos relacionados à qualidade química da água de chuva armazenadas em cisternas, considerando-se a possibilidade de liberação excessiva de metais em função da agressividade da água armazenada em reservatórios de concreto. MATERIAIS E MÉTODOS A pesquisa está sendo realizada na região semi-árida de Minas Gerais, na cidade de Araçuaí, localizada no Médio Jequitinhonha. A seleção da cidade fundamentou-se basicamente na presença de várias cisternas destinadas ao armazenamento de água para consumo humano e apoio da prefeitura local, através da disponibilização de um agente sanitário e de um automóvel para a coleta mensal das amostras nas comunidades e envio destas amostras para o Laboratório de Saneamento da Universidade Federal de Minas Gerais. Dentre as várias comunidades visitadas na cidade de Araçuaí, foram escolhidas 2, Curuto e Lagoa dos Patos, por serem estas de fácil acesso. Na primeira comunidade foram selecionadas 6 cisternas antigas, ou seja, que já armazenaram água de mais de 2 ciclos de chuva, e na segunda, 2 cisternas antigas e 8 novas, ou seja, que estão armazenando o primeiro ciclo de chuva no período de estudo. As amostras de 1 a 8 são relativas às cisternas novas e as de 9 a 16 são relativas às cisternas antigas. Objetiva-se com isso comparar a potencial liberação de metais de acordo com o tempo de armazenamento da água. Os metais analisados (ferro, zinco e sódio) são, em sua maioria, constituintes do cimento, exceto o zinco, que está presente na calha de captação. Outras substâncias presentes na constituição do cimento, tais como magnésio, silício, cálcio e enxofre (dentre outras), não foram analisadas por não constarem na Portaria 518/04, do Ministério da Saúde. A determinação da concentração dos metais seguiu a metodologia citada no Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater (APHA, 1998), utilizando-se Espectrofotometria de Absorção Atômica. A coleta foi feita em frasco de polietileno (500mL), onde foi adicionado 1,0mL de ácido nítrico para conservação das amostras. 5º Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva,Teresina, PI, 11-14/07/2005 5

6 RESULTADOS PARCIAIS O baixo ph da água de chuva aparenta ser um importante contribuinte para acarretar a solubilização de metais presente em altas concentrações nos revestimentos de cimento, elevando o teor desses elementos na água a concentrações que podem ser superiores à permitida na Portaria 518/2004 do Ministério da Saúde (Tabela 1). Tabela 1 Padrão de aceitação para consumo humano, segundo Portaria 518/2004 do Ministério da Saúde. Parâmetro Valor Máximo Permitido (mg/l) Ferro 0.3 Sódio 200 Zinco 5 Pela Portaria 518/2004, estes elementos não apresentam riscos à saúde, pois são citados na tabela de aceitação para consumo humano, ou seja, aqueles que podem afetar as propriedades organolépticas da água. Os resultados parciais das análises de metais nas águas armazenadas em cisternas estão apresentados nas figuras 2 a 4. Concentração de ferro na água captada pelas cisternas Concetração de Fe (mg/l) 0,300 0,250 0,200 0,150 0,100 0,050 0, Amostras 19/abr 4/mai Figura 2- Gráfico da concentração de ferro presente na água captada pelas cisternas. 5º Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva,Teresina, PI, 11-14/07/2005 6

7 Concentração de sódio na água captada pelas cisternas Concentração de Na (mg/l) 5,00 4,00 3,00 2,00 1,00 0, Amostras 19/abr 4/mai Figura 3- Gráfico da concentração de sódio presente na água captada pelas cisternas Concentração de zinco na água captada pelas cisternas 0,035 Concentração de Zn (mg/l) 0,030 0,025 0,020 0,015 0,010 0,005 0, Amostras 19/abr 4/mai Figura 4- Gráfico da Concentração de zinco presente na água captada pelas cisternas Com base nos limites citados na Tabela 1, todos os metais encontram-se abaixo do VMP, enquadrando-se, portanto, nos padrões esperados para água para consumo humano. CONCLUSÕES As análises mostraram que as cisternas tanto antigas quanto novas apresentaram concentrações de ferro, sódio e zinco, inferiores ao VMP da Portaria 518/04, o que indica que a água de chuva em contato com o cimento não foi agressiva a ponto de ocorrer liberação excessiva desses metais. 5º Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva,Teresina, PI, 11-14/07/2005 7

8 Este artigo baseou-se em apenas dois resultados, portanto mais análises serão realizadas ao longo desta pesquisa para verificar o comportamento da água de chuva durante a armazenagem em cisternas de placas. Na continuidade do estudo pretende-se analisar outros metais que possam apresentar riscos à saúde, tais como chumbo. Em uma dissertação de mestrado vinculada a esse trabalho também será avaliada a qualidade microbiológica dessa água, verificando a possível diferença na contaminação durante o tempo de armazenamento. Este trabalho está iniciando uma discussão a respeito da liberação de metais em águas captadas em cisternas. Serão necessários mais estudos a respeito desse assunto, tendo em vista que os resultados aqui apresentados não são conclusivos por se tratar de um curto período de tempo. AGRADECIMENTOS Os resultados apresentados neste trabalho fazem parte do projeto de pesquisa financiado pela FUNASA (Conv. 529/2004) com recursos do SUS. Os autores também manifestam seus agradecimentos ao CNPq pela concessão da bolsa de mestrado à primeira autora deste artigo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. AMERICAN PUBLIC HEALTH ASSOCIATION. Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater. 20ed. Washington BEREND, Kenrick et al. Acute aluminium encephalopathy in a dialysis center caused by a cement mortar water distribution pipe. Kidney International. Curaçao, 18 ago Vol. 59 (2001), pp BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 518, de 23 de março de Estabelece os procedimentos e responsabilidades relativas ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade, e dá outras providências. Disponível em: < Acesso em: 21 mai CARDOSO, M.P., SILVA, C.V., PÁDUA, V.L. Captação de água de chuva em cisternas, verificação da potencial liberação de alumínio e seu efeito sobre a saúde. 23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental ABES, 18 a 23 de setembro de 2005, Campo Grande-MS. 5. FLATEN, T.P. Aluminium as a risk factor in Alzheimer s disease, with emphasis in drinking water. Brain Research Bulletin, 55 (2), º Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva,Teresina, PI, 11-14/07/2005 8

9 6. KAWAHARA, M., KATO,M., KURODA, Y. (2001). Effects of aluminium on the neurotoxicity of primary cultured neurons and on the aggregation of beta-amyloid protein Brain Re. Bull. 55, SHARPE, W.E., YOUNG, E.S. Ocurrence of Selected Heavy Metals in Rural Roof-Catchment Cistern Systems. Proceedings of the First International Conference on Rain Water Cistern Systems, Honolulu, Hawaii. pp , SIMMONS, G., HOPE, V., LEWIS, G., WHITMORE, J., GAO, W. Contamination of potable roof-collected rainwater in Auckland, New Zealand. Water Research, volume 35, número 6. Páginas YOUNG, E.S.; SHARPE, W.E. Atmospheric depositions and roof-catchment water quality. Journal of Environmental Quality. Vol. 13 (1), º Simpósio Brasileiro de Captação e Manejo de Água de Chuva,Teresina, PI, 11-14/07/2005 9