Violência de Estado no Brasil: Um estudo dos Crimes de Maio de 2006 na perspectiva da Antropologia Forense e da Justiça de Transição

Transcrição

1 Violência de Estado no Brasil: Um estudo dos Crimes de Maio de 2006 na perspectiva da Antropologia Forense e da Justiça de Transição Apresentação de resultados preliminares

2 Equipe responsável - Unifesp Professores: Prof. Dr. Javier Amadeo Profa. Dra. Ana Nemi Prof. Dr. Bruno Comparato Profa. Dra. Raiane Severino Assumpção Profa. Dra. Claudia Plens Profa. Dra. Elizete Kunkel Prof. Dr. Rimarcs Ferreira Pesquisadores: Marina Figueiredo Rebeca Padrão Juliana Magalhaes Carrapeiro Edson Barbosa da Rocha Débora Maria da Silva Aline Lúcia Gomes Rocco Valéria Aparecida de Oliveira Thabata Ganga Delphine Denise Lacroix Lorrane Rodrigues 2

3 Equipe responsável Universidade de Oxford Professores e pesquisadores: Profa. Dra. Leigh A. Payne Dra. Francesca Lessa Dr. Gabriel Pereira Dra. Laura Bernal-Bermudez 3

4 Introdução O presente projeto é resultado de uma proposta de colaboração institucional entre o Centro de Arqueologia e Antropologia Forense (CAAF) da Universidade Federal de São Paulo e o Centro Latino-americano. Escola de Estudos Interdisciplinares e de Área da Universidade de Oxford O principal objetivo do projeto é consolidar duas áreas de conhecimento no interior do campo dos Direitos Humanos: a Antropologia Forense e a Justiça de Transição Pressuposto do projeto: a cultura da impunidade é responsável pela perpetuação do autoritarismo e as graves consequências em termos violência policial e falta de respeito em relação aos direitos humanos A proposta busca criar protocolos que possam ser implementados pelo Estado com o objetivo de melhorar a qualidade da democracia no Brasil na perspectiva colocada pela Justiça de Transição e pela Antropologia Forense 4

5 Introdução O projeto Violência de Estado no Brasil conta com financiamento do Newton Fund, iniciativa do governo britânico que visa promover o desenvolvimento social e econômico dos países parceiros A presente proposta foi a provada na Chamada Institutional Links Secretaria de Direitos Humanos edital 2015 Esta chamada tem sido a contrapartida oferecida pelo Newton Fund aos recursos disponibilizados pela Secretaria de Direitos Humanos do governo federal para o desenvolvimento da Antropologia Forense, em particular no processo de identificação de desaparecidos políticos conduzido pelo Grupo de Trabalho Perus (GTP) Busca-se entender com esses dois casos emblemáticos os elementos do autoritarismo que se perpetuaram na estrutura do Estado e suas políticas de segurança 5

6 Introdução O Centro de Arqueologia e Antropologia Forense (CAAF) foi estabelecido em 2014 com o objetivo de colaborar com o processo de identificação de mortos e desaparecidos políticos da época da ditadura Neste processo foi observado que a violência cometida pela agentes do Estado durante a ditadura civilmilitar continua operativa, especialmente nas áreas periféricas das grandes cidades habitadas por pessoas pobres e de cor A proposta busca desenvolver um conjunto de estudos e ações que fortaleçam essas comunidades que são regularmente hostilizadas pela violência dos agentes de Estado em ações similares as da época da ditadura civil-militar A pesquisa está focada na análise de 71 casos de pessoas assassinadas por arma de fogo na região da Baixada Santista (de um total de mais de 500 no Estado de São Paulo) entre 12 e 20 de maio de 2006 Apesar da luta dos familiares e as manifestações de organizações de direitos humanos, os episódios envolvendo mortes de civis não foram elucidados e os principais suspeitos (agentes do Estado) não foram investigados O projeto busca mostrar a existência de um conjunto substantivo de indícios que apontam que as pessoas assassinadas nesses episódios foram mortos como resultado da violência do Estado 6

7 Objetivos O principal objetivo do projeto é contribuir para o desenvolvimento da Antropologia Forense e da Justiça de Transição como áreas especificas de conhecimento acadêmico Objetivos específicos: 1. Executar a pesquisa científica com relação aos Crimes de Maio de 2006 na Baixada Santista 2. Construir um conjunto de documentos e dados científicos que analise e discuta o papel do Estado e das forças de segurança pública em relação a população civil e particularmente às populações com vulnerabilidade social 3. Criar e implementar um jornal eletrônico para divulgar os resultados da pesquisa 4. Organizar e implementar um Curso de Especialização em Antropologia Forense e Direitos Humanos para treinar peritos nas áreas de conhecimento relacionadas à temática com a participação de especialistas internacionais 5. Organizar seminários internacionais em conjunto com a instituição parceira para intercâmbio de experiências acadêmicas 6. Organizar um Curso de extensão sobre o legado da ditadura civil-militar e os desafios da justiça de transição 7

8 Resultados esperados Resultados: 1. Criar uma base de dados sobre as vitimas de Maio de 2006 na Baixada Santista construída a partir dos documentos oficiais (Boletins de Ocorrência, Laudos Necroscópicos e Inquéritos Policiais), outros registros documentais, das entrevistas com as famílias das vitimas e mapas georreferenciados com dados relevantes dos eventos 2. Estabelecer evidencias científicas sobre os assassinatos de cidadãos pelo agentes do Estado com o objetivo de estabelecer protocolos científicos para o esclarecimentos baseados nas técnicas da Antropologia Forense e ancorados dos debates da Justiça de Transição e dos Direitos Humanos 3. Discutir o estabelecimento de protocolos com o objetivo de criar forma de registro de reporte de mortos em morgues e hospitais buscando o processo de identificação 4. Criar uma certificação institucional para profissionais na área de Antropologia Forense e Direitos Humanos 5. Contribuir com o desenvolvimentos de pesquisas acadêmicos, conferências científicas e eventos internacionais nas áreas de Justiça de Transição, Antropologia Forense e Direitos Humanos 6. Colaborar com a criação de publicações especializadas e divulgação de pesquisas nas áreas de Antropologia Forense, Justiça de Transição e Direitos Humanos 8

9 Resultados Atores interessados e potenciais beneficiários dos resultados da pesquisa: 1. Famílias de pessoas assassinadas ou desaparecidas durante a ditadura civil-militar ou de vítimas dos crimes cometidos por agentes do Estado hoje 2. Grupos e movimentos sociais articulados para investigar, denunciar e eventualmente prevenir esse tipo de crimes (ex. Movimento Mães de Maio, criado como resultados dos crimes de Maio de 2006) 3. Profissionais e pesquisadores interessados em programas de especialização em Antropologia Forense (peritos, antropólogos, dentistas e outros especialistas) como os profissionais contratados pela Secretaria de Direitos Humanos que já participam do Grupo de Trabalho Perus 4. Formuladores de políticas públicas nas áreas de Direitos Humanos, Segurança Pública e Saúde Pública com possibilidade de implementar processo de formação, procedimentos e protocolos que diminuam a ocorrência de crimes violentos resultado da violência de Estado 5. População em geral, que poderia ser beneficiada com o aumento da transparência e controle civil das forças de segurança pública com efeitos positivos na consolidação democrática e no fortalecimento efetivo dos direitos humanos da população 9

10 Crimes de Maio de 2006 na perspectiva da Antropologia Forense e da Justiça de Transição Resultados preliminares 10

11 Objetivos O objetivo é desenvolver um estudo sobre os crimes de maio de 2006, para evidenciar a forma de atuação das polícias e os procedimentos e instrumentos jurídicos adotados pelo Estado Foram destacados os episódios de mortes por armas de fogo (execução de civis e de agentes do Estado) ocorridos no mês de maio de 2006, na região metropolitana da Baixada Santista Para realização da pesquisa foram coletadas informações antemortem, perimortem e pósmortem, com identificação da distribuição geográfica desses crimes e os caminhos burocráticos de consecução de laudos periciais e necroscópicos Busca-se apresentar dados que permitam evidenciar a situação de violação de Direitos Humanos vigente, considerando que foram registrados inúmeros casos de morte sem a devida investigação, identificação e punição de seus responsáveis, apesar das constantes manifestações dos familiares das vítimas e de organismos de defesa dos Direitos Humanos Busca-se fortalecer as pautas dos movimentos das comunidades que são, atualmente e de forma sistemática, constrangidas pela violência de agentes do Estado com ações muito semelhantes àquelas cometidas durante a Ditadura militar no Brasil. Neste sentido, esta proposta pretende organizar um conjunto de protocolos que possam ser reconhecidos e implementados pelo Estado, com o objetivo de promover e desenvolver a democracia brasileira. 11

12 Metodologia 1. Análise bibliográfico e documental Levantamento e estudo de artigos relevantes e atuais sobre os Crimes de Maio 2006 Estudo antemortem e perimortem a partir do cruzamento de informações de familiares e sobreviventes, de testemunhas e de documentação produzida nos Institutos de Criminalística Protocolos de análise post-mortem na literatura internacional Técnicas de análise forense em casos de arma de fogo partir de reconstrução 3D de imagens médicas (balística) Processos judiciais movidos por familiares 12

13 Referências Estudos sobre os Crimes de Maio de 2006 LAV/UERJ. Análise dos Impactos dos ataques do PCC em São Paulo em maio de IHRC/ Justiça Global. São Paulo sob achaque: Corrupção, Crime organizado e Violência institucional em maio de CREMESP. Relatório de Análise de Laudos Necroscópicos dos IMLs do Estado de São Paulo, CONDEPE. Crimes de maio, Movimento Mães de Maio. Mães de maio: do luto à luta SDH/COMISSÃO ESPECIAL CRIMES DE MAIO. Relatório sobre os crimes de maio de

14 Metodologia 2. Pesquisa para elaboração de mapeamentos e comparações, com o objetivo de informar proposição de protocolos para o trato da violência policial 3. Pesquisa do material midiático Levantamento nos arquivos dos meios de comunicação (jornal local e nacional) sobre os crimes de maio e análise de conteúdo das reportagens. 4. Depoimento de familiares das vítimas (mortos e/ou desaparecidos) de maio de 2006 construção de narrativas, contendo o contexto social, a história de vida, circunstância da morte, procedimentos após a morte e informações sobre as respostas obtidas. 14

15 Resultados preliminares Delimitação do universo de pessoas assassinadas durante os Crimes de Maio de 2006 Construção do Banco de Dados Narrativas dos familiares das vítimas dos Crimes de maio de 2006 Geoprocessamento e mapas Modelagem 3D 15

16 Delimitação do universo de pessoas assassinadas durante os Crimes de Maio de

17 Fontes da Lista de Vítimas Lista do Movimento Mães de Maio CONDEPE (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana) DEINTER (Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior) Denúncia Defensoria Pública Ouvidoria da Polícia Banco de dados do Laboratório de Análise da Violência (LAV/UERJ) 17

18 Lista dos casos Data da ocorrência Nomes Total 13 de Maio Sábado André Fernandes Júnior 13 Braz Gonçalves de Macedo Emerson Godoi Maciel João Marcos Fernandes João Marcos Fernandes Carneiro Marcos Antonio Rodrigues de Melo Maria de Fátima dos Santos Nunes Rafael Dantas da Silva Rafael dos Santos Nunes Robson Damasceno Filgueira DESCONHECIDO DESCONHECIDO DESCONHECIDO 18

19 Lista dos casos Data da ocorrência Nomes Total 14 de Maio Domingo André Hamilton Guedes dos Santos 13 (Dia das Mães) Carlos Mitsuru Horikawa Douglas Fontes Martins Felipe Barbosa do Bonfim Hércules Santos da Purificação Israel Claudiomiro dos Santos Juliana Alexandre da Silva Kauê Andrews Leite Marcelo Aparecido Sponchiado Marcos Rebello Filho Paulo Vitor da Conceição Silva Rodnei de Santana Costa Thiago Roberto Soares 19

20 Lista dos casos Data da ocorrência Nomes Nomes Total 15 de Maio Adilson Pinto da Silva Jackson Roberto Santos 22 Segunda Aldo Petrozoli da Silva João Carlos Correa Ana Paula Gonzaga Santos Juracy dos Santos Smith Antonio Carlos dos Santos Marcos Welbert de Figueiredo Silva Antonio Luiz Muniz de Souza Maurilio Melo Daniel Borges Santos Ricardo Souza Monteiro Martins Eddie Joey de Oliveira Lovezares Talita Cristine de Almeida Silva Edson Batista de Paula Wagner Lins dos Santos Edson Rogério da Silva dos Santos Wiliam Pereira Santos Flavio Lopes DESCONHECIDO Igor Mota dos Santos DESCONHECIDO 20

21 Lista dos casos Data da ocorrência Nomes Total 16 de maio Terça Fabiano Ribeiro Barbosa 7 Fernando Alves de Oliveira José Wilson Silva dos Santos Rodrigo Cruz Reis Tiago Santos Francolino Victor Diego Martim DESCONHECIDO 17 de Maio Quarta Bruno da Anunciação 8 Ederson Carneiro Dias Ribeiro João Góes Luiz Carlos da Silva Máximo Márcio Greick Pires dos Santos Mateus Andrade de Freitas Ricardo Porto Noronha DESCONHECIDO 21

22 Lista dos casos Data da ocorrência Nomes Total 18 de Maio Quinta Fernando Espírito Santos Higino* 2 Luiz Fernando Rodrigues Santos 19 de Maio Sexta Marcelo Bernardo da Silva Moraes 2 Roberto César dos Santos 20 de Maio Sábado Henrique dos Santos 4 Jonatan Xavier Silva ou Xavier Matos Natanael Valentin Candido Taís Domingues Gomes TOTALIZANDO 71 CASOS 22

23 Construção do Banco de Dados 23

24 Banco de dados 24

25 Banco de dados 25

26 Banco de dados 26

27 Banco de dados 27

28 Banco de dados 28

29 Banco de dados 29

30 Banco de dados 30

31 Banco de dados 31

32 Banco de dados 32

33 Banco de dados 33

34 Banco de dados 34

35 Banco de dados 35

36 Narrativas dos familiares das vítimas dos Crimes de Maio de

37 A construção da narrativa histórica referente aos crimes de maio de 2006 é, portanto, resultado de uma articulação entre aspectos estruturais e conjunturais da sociedade brasileira, memórias, vidas e visões de mundo Nesse sentido, o cuidado metodológico é para não silenciar ou hierarquizar conteúdos, sentimentos, expressões; como também, de observar os movimentos e os aspectos operados pelo familiar narrador As narrativas construídas a partir das vozes dos familiares das vítimas dos Crimes de maio de 2006 na Baixada Santista constituem em uma das fontes de dados da pesquisa Apresentam informações referente às vítimas: o seu contexto social, a sua história de vida, as circunstâncias da sua morte, os procedimentos de investigação, a tramitação jurídica e as respostas obtidas sobre cada um dos crimes Busca-se continuidades, relações e nexos para a constituição de um quadro explicativo a partir da análise das narrativas em diálogo com o conjunto de dados documentais Os procedimentos metodológicos adotados na construção e interpretação das narrativas implica em uma atuação conjunta entre universidade e movimento social pesquisadores e narradores são reconhecidos como sujeitos na produção de conhecimento sobre a violência policial e o desrespeito aos Direitos Humanos no Brasil na atualidade 37

38 Procedimentos Metodológicos Localizar os familiares das vítimas dos crimes de maio de 2006 a partir do Banco de Dados construído durante a pesquisa documental Atualizar o Banco de Dados a partir do contato com os familiares Realizar entrevistas semiestruturadas com familiares obtendo informações antemorten e posmortem Construir as narrativas a partir das vozes dos familiares, reconstruindo a história de vida das vítimas, as informações sobre o crime, seus desdobramentos jurídicos e implicações na vida dos sujeitos envolvidos Analisar as narrativas dos familiares e elaborar, a partir do diálogo com os dados documentais, uma narrativa histórica sobre os crimes de maio de 2006, buscando evidenciar a forma de atuação das polícias e os procedimentos e instrumentos jurídicos adotados pelo Estado. 38

39 Desenvolvimento da pesquisa Contatos com familiares Total de casos levantados na Baixada Santista: 71 casos (incluindo os casos após 2006 que os familiares estão no Movimento Mães de Maio 2007; 2010; 2013 e 2015) Total de casos divididos por município: Santos 5 casos São Vicente 12 casos Guarujá 25 casos (com 27 vítimas) Praia Grande 01 caso Peruíbe 01 caso Bertioga 01 caso 39

40 RESULTADOS LISTA DE CONTATOS DO MOVIMENTO MÃES DE MAIO: 13 FAMÍLIAS 09 NARRATIVAS FALTAM 04 40

41 RESULTADOS SANTOS: Total de endereços na região 05 Total de endereços encontrados 02 Endereço que faltou (PM) 01 Provável retorno narrativas 01 Familiares que não querem contato 0 Endereços de familiares não estavam em casa 01 Familiares não encontrados 02 Narrativas realizadas 01 São Vicente: Total de endereços na região 12 Total de endereços encontrados 11 Endereço que faltou (SEGURANÇA) 01 Provável retorno narrativas 05 Familiares que não querem contato 02 Endereços de familiares não estavam em casa (deixamos contato) 03 Familiares não encontrados 01 Narrativas realizadas 02 41

42 RESULTADOS Guarujá (em andamento): Total de endereços na região 25 (com 27 vítimas) Total de endereços encontrados 17 Endereço que faltou (a confirmar) 07 Provável retorno narrativas 06 Familiares que não querem contato 01 Endereços de familiares que não estavam em casa 02 Familiares não encontrados 08 Narrativas realizadas 02 42

43 Narrativa Vera Lúcia Gonzaga Ana Paula Gonzaga e amigos Ana Paula Gonzaga e a filha Ana Beatriz 43

44 (...) Neste período ela ficou grávida da Bianca, foi uma gravidez programada e muito tranquila, ela continuou indo para os bailes, dançando, uma moça normal para idade dela só 20 anos. Até que chegou o dia 6 de maio de 2006 (...). Pela minha filha eles não pagam mais nada, não tem testemunha, foi como o delegado falou: que precisava de testemunha ocular. Eu falei para ele: Que testemunha ocular moço, precisa disso? O senhor tá vendo ai! Se embrenha no meio da madrugada, sai na rua como eu saio, anda na rua como eu ando, que o senhor vai ver, não precisa de testemunha ocular!. E outra, acho que mãe não precisa de advogado, mãe precisa que acreditem nela. Porque trinta, quarenta pessoas repetiram os mesmos nomes, impossível não ser verdade, impossível!

45 Narrativa Débora Maria da Silva Edson Rogério com o filho Edson Rogério com a mãe 45

46 Então eu fui mãe e pai pra eles, sempre fui (...). O Rogério não teve tanto carinho, porque a segunda gravidez veio em seguida uma à outra (...) Ele sempre chegava na minha frente e pedia colinho, colinho mamãe! (...). Eu acredito que enquanto eu tiver força pra lutar pelos meninos, o Rogério vai continuar vivo e o Rogério estando vivo, eu estarei lutando pelos seus netos, pelos netos deles (...) Eu quero ajudar a deixar um mundo melhor, além de um exemplo que seja multiplicador. 46

47 Narrativa Vera Freitas Mateus Andrade de Freitas Mateus com os pais 47

48 Ele gostava muito de se arrumar, você pode ver nas fotos, ele está sempre de tênis (...) No Natal, ele me enchia o saco: Mãe, vamos comigo na cidade para eu comprar as coisas. Tanto que, nos primeiros dias, eu não conseguia ir na cidade, porque eu olhava para as lojas e lembrava...lembrava das roupas dele, daquela afobação: Mãe, é Natal! vamos comprar roupa (...) A gente tem uma esperança de que algum dia alguma porta vai se abrir, que alguma coisa vai acontecer, ser tudo esclarecido. Eu gostaria, porque a gente fica sempre com a impressão de que nada foi feito, que nada aconteceu. Mataram ele. Simplesmente mataram e acabou. É um nome, um número e mais nada (...). 48

49 Narrativa Ilza Soares Thiago Roberto Soares Thiago com a mãe e primos 49

50 (...) o meu filho nunca deixou nada a desejar. Sempre foi presente na minha vida, sempre sorridente com a família, gostava de preto e de branco... e se ele fizesse alguma coisa, se ele pegasse um lápis, ele dizia mãe, eu peguei esse lápis, ele não negava (...) Hoje o que a gente quer tentar é uma justiça clara e franca pra não continuar havendo mais mortes. Não queremos ver mães e pais chorando. Por que continua tudo isso aí? Eles dizem que parou, cessou, mas isso continua...eu não vejo que parou, que foi só aquilo naquela época...não, continua! Do mesmo modo, das mesmas maneiras, entendeu? E as vezes eles querem oprimir alguma coisa, dizendo que não é uma coisa relevante, mas que se você for puxar lá no fundo, continuam mantendo a mesma rotina deles. 50

51 Geoprocessamento e Mapas 51

52 Objetivos Apresentar, em um primeiro momento, os dados de forma visual e sua organização no espaço Cruzar informações contidas no banco de dados para criar outras análises e verificar a existência ou não de padrões: o o Locais do crime com a tipologia da morte Locais do crime com a hora da morte Inserção dos dados do banco de dados: o o Criação de uma tabela com 39 endereços localizados. Localização a partir das coordenadas dos endereços encontrados. 52

53 Metodologia 53

54 54

55 55

56 56

57 57

58 58

59 59

60 60

61 61

62 62

63 63

64 64

65 Modelagem 3D 65

66 Modelagem 3D Modelagem 3D baseada nos laudos necroscópicos e boletim de ocorrência Visualização da vitima em 3 dimensões Identificação de sinais de execução sumária Uso de software livre 66

67 Fig. 1 - A vítima é reconstruída no software MakeHuman, com base nas informações contidas na documentação. Fig. 2 - O esqueleto é obtido com base nas características antropométricas. 67

68 Fig. 3 - O software Blender é utilizado para posicionamento do corpo, esqueleto e órgão acometido, que servem como referencial para a descrição da trajetória dos tiros. 68

69 Fig. 4 - Após a descrição da trajetória de todos os tiros é possível visualizar as lesões de diversas formas, simplificando a identificação de sinais de execução sumária. 69

70 Fig. 5 O software MakeHuman gera um diagrama cinemático para o avatar, possibilitando movimenta-lo para estimar situações que gerariam no avatar as mesmas lesões descritas no laudo necroscópico da vitima. 70

71 Thiago Roberto Soares Fig. 6 - Vistas anterior, posterior, lateral direita e lateral esquerda das lesões sofridas pela vítima. Tiro à distância Bala alocada 71

72 Edson Rogério Silva dos Santos Não especificado Bala alocada Fig. 7 - Vistas anterior, posterior, lateral direita, lateral esquerda e isométrica das lesões sofridas pela vítima. Esta vítima possui poucas informações no laudo necroscópico. 72

73 Ana Paula Gonzaga dos Santos Não especificado Bala alocada Fig. 8 - Vistas anterior, posterior, lateral direita, lateral esquerda e isométrica das lesões sofridas pela vítima. O feto teve lesões no joelho esquerdo e mão esquerda. 73

74 Mateus Andrade de Freitas Bala alocada Fig. 9 - Vistas anterior, posterior, lateral direita e lateral esquerda das lesões sofridas pela vítima. O laudo carece de muitas informações como altura, etnia e constituição osteomuscular. 74

75 Demanda dos familiares (Denúncia frente a Comissão Interamericana de Direitos Humanos) Diante do exposto, pleiteia-se a esta Honorável Comissão que RECONHEÇA AS VIOLAÇÕES cometidas pelo Estado brasileiro contra as vítimas identificadas e determine a REPARAÇÃO INTEGRAL das suas consequências através, entre outras, das seguintes medidas: a) para efetivação da obrigação de investigar e punir: - o deslocamento da competência para investigar, processar e punir os responsáveis diretos e indiretos pelos assassinatos das vítimas da Justiça Estadual para a Justiça Federal, com a determinação expressa de realização de todos os exames periciais não realizados e de oitiva ou re-oitiva de todas as vítimas e testemunhas mencionadas, garantindo-se a devida proteção àquelas que necessitem; b) para reparação dos danos materiais e imateriais: - pagamento de indenização pelo danos materiais causados, como gastos com funeral, tratamentos médicos, hospitalares, psicológicos e com medicamentos, lucros cessantes etc., além das custas e gastos com a tramitação judicial interna e, agora, externa; - pagamento de indenização por danos imateriais como os sentimentos de dor, sofrimento, angústia, medo, solidão, saudade, espera, injustiça, incompreensão, humilhação e vergonha pública, perda de projeto de vida e alterações nas condições de existência provocados pela perda de entes queridos e a não punição dos responsáveis; 75

76 Demanda dos familiares (Denúncia frente a Comissão Interamericana de Direitos Humanos) c) para reparação do dano moral: - apresentação pelo Estado de um pedido formal e público de desculpas às vítimas, através de ato público e dos meios de comunicação de grande circulação na cidade de Santos e no estado de São Paulo, visando minorar os sentimentos de injustiça, desproteção, medo e vergonha dessas vítimas perante o Estado, responsável pela violência sofrida, não-reconhecida e não-reparada. d) para reabilitação: - disponibilização ou pagamento de assistência psicológica e médica às vítimas que a desejarem e na forma que desejarem; 76

77 Demanda dos familiares (Denúncia frente a Comissão Interamericana de Direitos Humanos) e) de garantia de não repetição: - construção de um monumento em homenagem às vítimas na cidade de Santos, buscando-se também que o erro do Estado não seja simplesmente esquecido e que, ao contrário, a lembrança permanente desse erro possa permitir à sociedade, aos servidores públicos e aos futuros governantes que tenham consciência de que eventos como os narrados nesta denúncia não podem jamais se repetir; - elaboração e aprovação de normas administrativas e legislativas, determinando que casos de execuções sumárias sejam investigados, com prioridade e precedência, por departamento especializado da Polícia Civil e que sejam observados todos procedimentos padrões de investigações de casos de execuções sumárias estabelecidos no Manual das Nações Unidas sobre Prevenção e Investigação Eficaz de Execuções Sumárias, Arbitrárias ou Extrajudiciais, nos diversos relatórios do Relator Especial das Nações Unidas sobre Execuções Sumárias, Arbitrárias ou Extrajudiciais e no estándares sobre o tema estabelecidos por esta Comissão Interamericana e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos; e - capacitação de agentes policiais e membros do Ministério Público para o acompanhamento de investigações de execuções sumárias e o tratamento de vítimas e familiares desses crimes. 77

78