INFLUÊNCIA DA UMIDADE NA DIGESTÃO ANAERÓBIA DE RESÍDUOS SÓLIDOS
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1 INFLUÊNCIA DA UMIDADE NA DIGESTÃO ANAERÓBIA DE RESÍDUOS SÓLIDOS Wilton Silva Lopes (1) Mestre em Saneamento Ambiental pelo PRODEMA - UFPB/UEPB. Professor do Departamento de Química da Universidade Estadual da Paraíba. Valderi Duarte Leite Doutor em Hidráulica e Saneamento pela EESC/USP. Professor do Departamento de Química da Universidade Estadual da Paraíba. José Tavares de Sousa Doutor em Hidráulica e Saneamento pela EESC/USP. Professor do Departamento de Química. Universidade Estadual da Paraíba Gilson Barbosa Athayde Júnior Doutor em Hidráulica e Saneamento pela Universidade de Leeds Inglaterra. Professor da UNIVALE Salomão Anselmo Silva Doutor em Engenharia Sanitária. Professor do Departamento de Engenharia Civil. Universidade Federal da Paraíba Marcos Aparecido de Sousa Aluno do Curso de Química Industrial da Universidade Estadual da Paraíba Endereço para correspondência (*) Rua: Papa João Paulo I, 325 Bairro: Nova Brasília Campina Grande Paraíba CEP: Brasil. Telefone: (83) wslopes@hotmail.com RESUMO Este trabalho teve a finalidade de investigar a influência do teor de umidade na performance da digestão anaeróbia de resíduos sólidos orgânicos tratados em reatores de batelada operando com alta concentração de sólidos. O trabalho foi realizado nas dependências do Laboratório de Saneamento Ambiental do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual da Paraíba, localizado na cidade de Campina Grande, PB, Brasil. O sistema experimental era constituído por quatro reatores anaeróbios de batelada, durante o período de janeiro/outubro de O substrato tratado anaerobiamente era constituído pela fração orgânica putrescível dos resíduos sólidos urbanos (80%) juntamente com lodo de esgoto sanitário (20%). Dois reatores foram alimentados com teor de umidade de 70% e dois com teor de umidade de 80%. Com base nos dados obtidos, constatou-se que os reatores alimentados com 80% de umidade apresentaram uma melhor performance quando comparados aos reatores alimentados com 70% de umidade. Isto pode estar relacionado a alguns fatores como: limitação no transporte de massa, pouca penetração e distribuição dos microrganismos em toda a massa do substrato. A água tem importância fundamental no desenvolvimento desses fatores, ficando assim evidenciada a sua influência durante o tratamento anaeróbio desse tipo de material. Palavras Chave: teor de umidade, resíduos sólidos orgânicos, bioestabilização anaeróbia, reator de batelada, biogás. INTRODUÇÃO A água é um fator de extrema importância na digestão anaeróbia, haja vista, ser este um processo biológico e que todo organismo vivo necessita de água para sobreviver. Segundo PELCZAR et al. (1996) a água representa cerca de 80 a 90% do peso da célula, o restante é constituído por uma combinação de outros compostos químicos. A água ainda funciona como um meio fluído onde ocorre a maioria das reações bioquímicas celulares. Além disso, a água fornece o substrato e nutrientes requeridos pelos microrganismos, sendo agente condutor de enzimas e de outros metabólitos microbianos importantes no processo de decomposição anaeróbia. A umidade, portanto, contribui decisivamente para o metabolismo dos microrganismos. 1
2 GHOSH & LALL (1988) constataram que um dos problemas da digestão anaeróbia com alta concentração de sólidos pode ser atribuído ao baixo teor de umidade, que limita o transporte de massa, havendo pouca penetração, difusão e distribuição dos microrganismos em toda a massa do substrato. O teor de umidade nos resíduos sólidos depende diretamente das condições climáticas, variando sensivelmente, portanto de um lugar para outro. No Brasil, o valor médio do teor de umidade dos resíduos sólidos domiciliares é da ordem de 60% (LIMA, 1995). Com relação a fração orgânica putrescível dos resíduos sólidos urbanos está apresenta teor de umidade em torno de 80%. O estudo da influência do teor de umidade durante o processo de bioestabilização anaeróbia de resíduos sólidos vem despertando grande interesse, haja vista, ser o teor de umidade, um parâmetro que apresenta forte influência no tratamento biológico de resíduos sólidos. Durante o processo de tratamento anaeróbio de resíduos sólidos, trabalhar-se com baixo teor de umidade, significa aumentar a quantidade de resíduo a ser tratada por cada m 3 de reator, o que faz com que o processo apresente uma relação custo - benefício mais equilibrada. OBJETIVO Este trabalho teve como principal propósito avaliar a influência do teor de umidade no desempenho de reatores anaeróbios de batelada tratando a fração orgânica dos resíduos sólidos urbanos operando com alta concentração de sólidos. MATERIAL E MÉTODOS O sistema experimental foi instalado e monitorado nas do Laboratório de Saneamento Ambiental do Departamento de Química no Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual da Paraíba, localizado na cidade de Campina Grande-PB, Nordeste do Brasil, durante o período de janeiro/outubro de O sistema experimental era constituído por quatro reatores anaeróbios de batelada. Dois reatores foram alimentados com teor de umidade de 70% e dois com 80%. Os reatores foram construídos a partir de baldes plásticos, no qual foram instalados dispositivos para medir o biogás produzido (ponto 1), coletar o biogás para análise (ponto 2), recirculação de água (ponto 3) e coletar percolado (ponto 4). Para cada volume de percolado coletado, igual volume de água era adicionado com a finalidade de se manter a massa de substrato com umidade constante. A Figura 1 mostra a representação esquemática de um dos reatores utilizados durante o trabalho experimental. Figura 1 Representação esquemática de um dos reatores utilizado. 2
3 Os reatores foram alimentados com a fração orgânica putrescível dos resíduos sólidos urbanos e lodo de esgoto sanitário foi utilizado como inóculo na proporção de 20%. Depois de coletados os resíduos foram transportados para o Laboratório onde foram triturados e caracterizados física e quimicamente. Em seguida os substratos foram preparados pela mistura dos tipos de resíduos, fração orgânica dos resíduos sólidos urbanos (80%) e lodo de esgoto sanitário (20%). Os parâmetros operacionais adotados para a realização do trabalho experimental estão apresentados na Tabela 1. TABELA 1. Parâmetros operacionais dos reatores. Reator COA (kg.m -3 ) Volume do Reator (L) Massa de Resíduo (kg) Massa de Lodo (kg) Massa Total (kg) A ,48 3,12 15,60 80 B ,48 3,12 15,60 70 C ,40 3,60 18,00 80 D ,40 3,60 18,00 70 TU (%) O sistema experimental foi monitorado durante o período de Fevereiro de 2001 a outubro de O monitoramento foi realizado nas frações sólida (substrato alimentado aos reatores), líquida (percolado produzido). Na fração líquida foram determinados os seguintes parâmetros: ph, AT (alcalinidade total), AGV (ácidos graxos voláteis), condutividade elétrica, DBO 5 (demanda bioquímica de oxigênio), DQO (demanda química de oxigênio), sólidos totais e suas frações, NTK (nitrogênio total Kjeldahl), N-NH + 4 (nitrogênio amoniacal), SO = 4 (sulfato), S = (sulfeto) e PT (fósforo total). As análises do percolado produzido foram realizadas em consonância com os métodos preconizados por APHA (1995). Na fração sólida, o material orgânico foi digerido em solução ácida, daí então sendo empregado os procedimentos analíticos adotados para o percolado nas análises de PT, NTK e SO = 4. Os sólidos totais e suas frações foram determinados pelo método gravimétrico convencional, sendo a umidade determinada a 100ºC seguida de ignição a 550ºC para determinação da fração volátil. Na fração gasosa foi realizada a caracterização do biogás produzido com o auxilio de um Aparelho de Orsat, que apesar de suas características rudimentares fornece resultados bastante satisfatórios. O método de caracterização baseia-se na absorção do dióxido de carbono por uma solução fortemente alcalina e o restante do biogás é considerado como sendo metano. Neste fato é onde estão incluídas as maiores partes dos erros do método, visto que o biogás apresenta em sua composição outros gases como NH 3, H 2 S, N 2 e traços de ácidos orgânicos de baixo peso molecular. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na Tabela 2 apresenta-se a caracterização física e química dos substratos alimentados aos reatores durante a alimentação. TABELA 2 - Caracterização física e química dos substratos. Parâmetro ph TU (%) ST (%) STF (%) STV (%) COT (%) NTK (%) P (%) DQO (%) C/N A 6, ,9 68,1 37,8 1,31 0,26 47,8 28,87 B 7, ,8 73,2 40,7 1,43 0,27 45,5 28,40 C 7, ,6 74,4 41,3 1,26 0,23 45,9 32,83 D 8, ,1 75,9 42,2 1,40 0,23 46,8 30,21 Analisando os dados apresentados na Tabela 2, observa-se que os substratos utilizados na alimentação dos reatores apresentaram relação C/N próximo de 30, valor considerado ideal para processos de tratamento biológico de resíduos sólidos orgânicos segundo Tchobanoglous (1993). O ph também se situou na faixa ideal para processos 3
4 anaeróbios, faixa esta que segundo vários autores situa-se entre 6,5 e 7,5 (Brock, 1970; Leveau e Bouix, 1985; Bitton, 1994). Ainda pode-se constatar que o substrato alimentado aos reatores apresentava em média 46,5% de DQO (em base seca). O que fornece uma carga orgânica aplicada de DQO de 75, 106, 83 e 126kg DQO.m -3 reator. A quantidade de percolado produzida durante todo o período de monitoração do sistema experimental foi medida continuamente e os valores atingiram os seguintes patamares: 4,55L, 0,23L e 0,71L para os reatores A, B e C, respectivamente. Com relação ao reator D, o mesmo não produziu percolado durante o período de monitoração do sistema experimental. Este fato está associado a dois principais fatores: alta carga orgânica aplicada, 900 kg.m -3 e baixo teor de umidade, 70%. Esses dois fatores contribuíram decisivamente para dificultar a distribuição da umidade no interior do reator fazendo com que os subprodutos provenientes da hidrólise não atingissem o interior do reator e fossem liberados. Na Figura 1 mostra-se o comportamento da evolução temporal da concentração de DQO nos líquidos percolados dos reatores monitorados. E na Figura 2 mostra-se o comportamento da evolução temporal do ph nos líquidos percolados provenientes dos reatores durante o período de monitoração. 8,0 6,0 ph 4,0 2,0 A B C 0, Tempo de Operação (dias) FIGURA 1 Comportamento do ph. 100,0 80,0 DQO (g/l) 60,0 40,0 20,0 A B C 0, Tempo de Operação (dias) FIGURA 2 Comportamento da DQO. Os valores de DQO nos líquidos percolados dos reatores no início do período de monitoração atingiram o patamar médio de mg.L -1. No final do período de monitoração esses valores decresceram para mg.L -1, para os reatores alimentados com 80% de umidade e mg.L -1, para os reatores alimentados com 70% de umidade. Isto demonstra a influência desse parâmetro durante o tratamento anaeróbio desse tipo de material, visto que, a diminuição da DQO fornece indícios do alcance do estado de equilíbrio do reator. As taxas de redução da massa de 4
5 substrato aplicada aos reatores alimentados com 80% de umidade foram 32,2% e 37,8%, enquanto para os reatores alimentados com 70% de umidade os valores alcançados foram de 17,8% e 15%. Na Tabela 3 são apresentadas as eficiências de remoção da massa de substrato aplicada aos reatores. TABELA 3 Eficiência de remoção do substrato aplicado aos reatores. Reator Parâmetro Massa Aplicada (kg) ST (kg) STV (kg) Entrada 15,6 3,1 2,1 A Saída 7,9 2,2 1,3 Removido 7,7 0,9 0,9 % de remoção 49,4 30,0 41,0 Entrada 15,6 4,7 3,4 B Saída 13,0 3,4 2,4 Removido 2,6 1,3 1,0 % de remoção 16,7 27,5 29,4 Entrada 18,0 3,6 2,4 C Saída 11,2 3,1 2,2 Removido 6,8 0,5 0,2 % de remoção 37,3 13,9 8,3 Entrada 18,0 5,4 3,8 D Saída 15,3 4,5 3,2 Removido 2,7 0,9 0,6 % de remoção 15,0 16,7 15,8 Analisando os dados apresentados na Tabela 3, pode-se constatar que os reatores A e C, alimentados com substrato contendo 80% de umidade, apresentaram uma eficiência de remoção da massa de substrato aplicada superior aos reatores B e C, que foram alimentados com substrato contendo 70% de umidade. Comparando os reatores que apresentavam carga orgânica (780kg,m -3 ) similar teor de umidade diferente verifica-se que o reator A apresentou uma eficiência de remoção cerca de três vezes o valor atingido pelo reator B. O mesmo comportamento foi verificado com os reatores que foram alimentados com carga de 900kg,m -3, visto que no reator C a eficiência foi de 37,3%, enquanto no reator D o valor apenas atingiu o patamar de 15,0%. A menor eficiência no desempenho dos reatores alimentados com substrato contendo 70% de umidade pode estar relacionada aos fatores mencionados por GHOSH & LALL em 1988 que dentre os quais pode-se destacar a limitação no transporte de massa o que causa pouca penetração, difusão e distribuição dos microrganismos em toda a massa do substrato. O que traz como conseqüência uma menor taxa de biodegradação do substrato. CONCLUSÕES Com base nos dados obtidos, constatou-se que os reatores alimentados com 80% de umidade apresentaram uma melhor performance quando comparados aos reatores alimentados com 70% de umidade. Isto pode estar relacionado a alguns fatores como: limitação no transporte de massa, pouca penetração e distribuição dos microrganismos em toda a massa do substrato. A água tem importância fundamental no desenvolvimento desses fatores, ficando assim evidenciada a sua influência durante o tratamento anaeróbio desse tipo de material. 5
6 AGRADECIMENTOS Os autores deste trabalho agradecem a FINEP/PROSAB pelo apoio financeiro e ao CNPq pela concessão de bolsas de pesquisa. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS APHA, AWWA, WPCF (1995). Standard methods for examination of water and wastewater. 19 th ed. Washington pp. BITTON, G. Wastewater microbiology. A John Wiley & Sons, inc., publication. New York,1994, p BROCK, T. D. Biology of microorganisms. Prentice-Hall International, inc.. New Jersey, 1970, p GHOSH, S. & LALL, U. Kinetics of anaerobic digestion of solid substrate. In: Fifth international symposium on anaerobic digestion, E. R. Hall and P. M. Hobson, Pergamon Press. 1988, p LEVEAU, J. Y. & BOUIX, M. Cinéticas microbianas. In: SCRIBAN, R. (coord.). Biotecnologia. Tradução de Maria Ermaritina Galvão Gomes Pereira et al.. Editora Monole LTDA, São Paulo, 1985, p LIMA, L. M. Q. Tratamento e biorremediação. 3ª edição. Hemus editora LTDA, São Paulo, 1995, p PELCZAR Jr., M. J. et al. Microbiologia: conceitos e aplicações. Tradução de Sueli Fumie Yamada et al.. Volume 1. 2ª Edição. Editora MAKRON Books. São Paulo, p. TCHOBANOGLUOS, G. T.; THEISEN, H. & VIGIL, S. A. Engineering principles e management issues. Mac Graw-Hill, New York, 1993, p
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