RETEXTUALIZAÇÃO E CONCEPÇÕES DE LÍNGUA(GENS) NA FORMAÇÃO DO SUJEITO-AUTOR

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1 RETEXTUALIZAÇÃO E CONCEPÇÕES DE LÍNGUA(GENS) NA FORMAÇÃO DO SUJEITO-AUTOR NICOLA, Rosane de Mello Santo PUCPR rnconsultoria@brturbo.com.br Resumo Eixo Temático: Formação de professores e profissionalização docente Agência Financiadora: não contou com financiamento Nesta pesquisa, focaliza-se o processo da retextualização envolvido na formação do sujeitoautor. A retextualização é aqui concebida como um processo que envolve operações complexas, tanto micro como macroestruturais, e compreende a passagem de uma ordem textual adequada a uma situação interativa para outra ( Marcuschi, 2001). O tema insere-se na área de Linguística Textual aplicada, representando importante estratégia para a metodologia de ensino de produção textual. Para tanto, relacionam-se as etapas de planejamento necessárias à passagem do texto de uma situação interativa para outra, valorizando-se o ato consciente e intencional da prática de produção escrita. Também se reflete sobre a dificuldade de muitos sujeitos-autores com formação superior em transformar seus textos científicos em textos didáticos ou de divulgação científica. Analisando as respostas de 29 participantes de uma oficina de formação de autores universitários desenvolvida por esta pesquisadora, é possível apontar uma das prováveis causas dessa carência como sendo a concepção de língua em que foram formados, pois o modo como o sujeito concebe a língua interfere nos usos que ele faz dela, influenciando sua formação como leitor e autor. Conclui-se que a maioria dos participantes percebe a língua como expressão do pensamento (41,4%) ou como instrumento de comunicação ( 58,6%), duas concepções de linguagem que comprometem a percepção de que a enunciação é afetada pelo outro e pelas circunstâncias em que acontece a situação interativa. Portanto, considera-se a necessidade de, primeiramente, conscientizar-se o sujeitoautor sobre sua concepção de língua/linguagem para, então, orientá-lo sobre as práticas de intervenção textual. Cabe considerar, primeiramente, a complexidade do trabalho que envolve a produção textual, que, como atividade cultural e dinâmica, não se limita a operações identificáveis pelas teorias, mas sua efetiva apropriação está ligada à própria reconstrução do sujeito-autor. Palavras-chave: Retextualização. Concepção de língua. Sujeito-autor Introdução Mesmo com o avanço das ciências da linguagem e a profusão de publicação de textos nos mais diferentes suportes ( livros, revistas, jornais, internet ), escrever continua sendo uma

2 5295 atividade humana que desafia até os mais brilhantes profissionais e em todas as esferas do conhecimento humano. Constantemente, ouvem-se queixas de acadêmicos quanto à falta de ensino sistematizado dos principais gêneros acadêmicos, já que, muitas vezes, são requeridos a produzir o que nunca lhes foi ensinado ou sequer consumido por eles. Entretanto, entre os professores, seja da educação básica, seja do ensino superior, a atividade de escrever também se revela um desafio, parecendo agravar-se à medida que esses profissionais pertençam a áreas de atuação que priorizam outras formas de linguagem, desarticulando-se a linguagem verbal de seu contexto de produção. Embora haja farta literatura voltada a descobrir as causas das dificuldades em produzir textos por parte de alunos, vestibulandos e acadêmicos, há ainda pouca pesquisa sobre as dificuldades dos docentes de ensino superior, mestres e doutores, em publicar seus trabalhos de pesquisa, transformando-os em materiais didáticos e textos de divulgação científica. Assim, considerou-se viável desenvolver uma reflexão sobre as expectativas de um grupo de docentes de diferentes áreas de conhecimento que se inscreveram em uma oficina de formação de autores universitários promovida pela editora de uma universidade privada. Nesse contexto situacional, ouviram-se 29 profissionais no primeiro encontro, convidando-os a exporem o que os movia a participar daquela proposta de formação. Também foi solicitado que escrevessem o que entendiam ser o ato de escrever. É com base nesses dados orais, coletados coletivamente, por meio de síntese construída durante o evento, e em dados escritos, recolhidos individualmente, que se pretende, brevemente, refletir sobre duas questões: a importância da retextualização como processo consciente do sujeito-autor e a(s) concepção(ões) de linguagem verbal subjacente(s) às conceituações de escrita dos docentes. Para subsidiar a pesquisa, selecionaram-se como base teórica autores que abordam o assunto, dentro da perspectiva interacionista, por se acreditar que a constituição (ou reconstituição) do sujeito-autor só se efetiva, quando se oportuniza ao usuário interagir pela linguagem em situações significativas e, neste caso, autênticas de produção. E, interagir pela linguagem significa realizar uma atividade discursiva, dizer alguma coisa a alguém de uma determinada forma, num determinado contexto histórico e em determinadas circunstâncias de interlocução (BRASIL, 1998: 20-21).

3 5296 Partindo, então, desse pressuposto, esta pesquisa está assim organizada: primeiramente, apresentam-se os pressupostos teóricos que servem de suporte para a observação de análise do corpus coletado; em seguida, aponta-se o caminho da pesquisa, descrevendo-se os passos metodológicos que orientam esse caminho, os cenários, os sujeitos envolvidos e o corpus coletado; faz-se, então, a análise das expectativas e dos conceitos de escrita coletados. Tais reflexões baseiam-se em propostas fundamentais da Análise do Discurso, que caracterizam o sujeito, apontando as possíveis posições que ocupa numa determinada Formação Discursiva, para delas poder enunciar. Por fim, fazem-se as considerações finais, retomando as questões levantadas nesta pesquisa. A importância da retextualização como processo consciente B. d Andrea e Ribeiro (2010) apresentam interessante revisão sobre o conceito de retextualização, alertando para o fato de que parece não haver consenso entre os linguistas sobre as ações desse processo em diferentes contextos. Explicam que Marcuschi (2001), provavelmente o autor mais citado quando se trata desse conceito, retomou a ideia original proposta por Travaglia (2003), que usou esse termo para caracterizar o processo de tradução de um texto de uma língua para outra. Marcuschi (2001:48), por sua vez, ressignificou o termo, afirmando que aqui [na retextualização] também se trata de uma tradução, mas de uma modalidade para outra, permanecendo-se, no entanto, na mesma língua. As modalidades a que o autor se refere são oralidade e escrita. Os pesquisadores concluem que a retextualização é uma modificação mais ampla do texto, inclusive podendo-se alterar o meio em que ele é produzido/veiculado, de entrevista oral para notícia escrita, por exemplo, ou do texto impresso para a notícia do rádio. A reescrita, diferentemente, só poderia ocorrer do escrito para o escrito, sendo também uma refacção em que se atua sobre um mesmo texto. Dell Isola (2007: 10), citada por d Andrea e Ribeiro (2010), define a retextualização como um processo de transformação de uma modalidade textual em outra, ou seja, trata-se de uma refacção e uma reescrita de um texto para outro, processo que envolve operações que evidenciam o funcionamento social da linguagem.os autores consideram que a autora toma como sinônimos os conceitos de retextualização, refacção e reescrita, mas sinalizam que as características operacionais das duas últimas atividades têm na retextualização uma finalidade diferente, que é a passagem de um texto para outro em modalidades diferentes.

4 5297 Finalmente, esses autores refletem sobre os conceitos propostos por Matencio (2002), que aponta melhor distinção entre reescrita e retextualização, ou seja, para essa autora, retextualizar é produzir um novo texto, e explica que toda e qualquer atividade propriamente de retextualização irá implicar, necessariamente, mudança de propósito. A reescrita, por outro lado, é atividade na qual, através do refinamento dos parâmetros discursivos, textuais e linguísticos que norteiam a produção original, materializa-se uma nova versão do texto. Os autores inferem, então, que há um caráter de mudança estrutural na retextualização e a criação de uma nova versão do texto, já que ocorre mudança de propósito a partir da reformulação; em contrapartida, na reescrita, há um caráter de mudança não estrutural, pois ocorre um aperfeiçoamento interno do texto (um refinamento ). Citando outro trabalho de Matencio (2003:1), d Andrea e Ribeiro (2010) explicitam que a retextualização é a produção de um novo texto a partir de um ou mais textos-base, dando ênfase à condição derivada do segundo texto, produto executado a partir de outros utilizados como fontes ou como macros. Caracteriza-se aí a principal característica do pensamento de Bakhtin / Volochinov (1929:112): A expressão comporta, portanto, duas facetas: o conteúdo (interior) e sua objetivação exterior para outrem ou também para si mesmo). Ou seja, a fala externa, para o outro, é a matriz de significações da fala para si, a qual está a serviço da orientação mental, da compreensão consciente e permite o desenvolvimento da imaginação, organização, memória, vontade. Portanto, a partir da revisão conceitual de d Andrea e Ribeiro, é possível deduzir que a importância do ato de retextualização reside no fato de que provoca o diálogo do sujeitoautor com um produto-criado, possibilitando sua adequação a uma nova situação interativa. Isso requer maior racionalização sobre o texto materializado e ativação de conhecimentos pragmáticos para a tomada de decisões linguísticas, textuais e discursivas. Conforme Bakhtin ( 1929:332), é um acontecimento novo, irreproduzível na vida do texto, é um novo elo na cadeia histórica da comunicação verbal.. Portanto, quanto mais o ato de retextualização ocorrer, mais o sujeito-autor se constituirá, percebendo que todo o texto poderá ser modificado, pois não é um produto de dimensões significativas acabadas, mas um texto terminal, conforme se diz na esfera editorial. Desse modo, o sujeito-autor se constitui à medida que adquire essa consciência de texto como processo, vinculado a condições situadas e autênticas de produção textual. É quando o próprio autor retorna sobre o dizer dele

5 5298 mesmo, acionando atos dialógicos carregados de pressupostos, conceitos e concepções sobre texto e discurso. Esse sujeito-autor passa, assim, a internalizar, por exemplo, regras de composição de gêneros textuais, planejamento de adequação à situação interativa etc. e, consequentemente, aperfeiçoa seu desempenho linguístico e discursivo. Concepções de língua( gens) 1 e implicações no sujeito-autor Refletir sobre as concepções de língua / linguagem que pautam o ensino de língua portuguesa podem contribuir para a compreensão do sujeito-autor que se constitui na e pela linguagem, pois a trajetória de ensino que percorreu tem repercussão em sua formação como usuário da língua. O modo como esse usuário vê a linguagem influi em sua constituição de sujeito-leitor e sujeito-autor. Novamente, recorre-se a Bakhtin ( 1929:330) para explicar essa importante relação sujeito linguagem mundo, Tudo o que me diz respeito, a começar por meu nome, e que penetra em minha consciência, vem-me do mundo exterior, da boca dos outros, e me é dado com a entonação, com o tom emotivo dos valores deles. Tomo consciência de mim através dos outros. Há três concepções de linguagem, conforme Travaglia ( 2003), fundamentado em Halliday, Mcintosh e Strevens ( 1974): como expressão de pensamento, como instrumento de comunicação e como processo de interação. A primeira, considerada orientação adequada para o ensino até a década de 60, caracteriza-se como ensino prescritivo de gramática como um manual de regras que deve ser seguido por aqueles que querem falar e escrever corretamente. São essas regras que se constituem na norma do bem falar e escrever estando presentes no chamado ensino tradicional. Nessa abordagem, a enunciação é um ato monológico individual que não é afetado pelo outro nem pelas circunstâncias que constituem a situação social em que a enunciação acontece. Presume-se que existem regras para a organização lógica do pensamento e, consequentemente, da linguagem. A segunda concepção entende a linguagem como meio objetivo para a comunicação ( Travaglia, 1998: 22). Essa concepção baseia-se nos estudos estruturalistas, a partir de 1 Concebe-se linguagem como verbal, ou seja, a palavra, que pode ser oral ou escrita, portanto, as duas modalidades da língua.

6 5299 Saussure, e transformacionalistas, a partir de Chomsky, e vê a língua como código, um conjunto de signos que se combinam segundo regras para a transmissão de uma mensagem de um emissor para um receptor, sendo a gramática um conjunto de regras mediante as quais se podem descrever os fatos da língua. Isso fez com que a lingüística não considerasse os interlocutores e a situação de uso como determinantes das unidades e regras que constituem a língua, afastando o sujeito falante/ escritor do processo de produção, do que é social e histórico na língua. Trata-se de uma visão monológica e imanente da língua, limitando o estudo ao funcionamento interno dela. A terceira concepção percebe a linguagem como processo de interação, defendendo que o sujeito, ao usar a língua, não traduz e/ou exterioriza seu pensamento, nem transmite simplesmente informações. No ato interativo, o sujeito realiza ações, atua sobre o interlocutor, sendo a linguagem um lugar de interação humana em que ocorre produção de efeitos de sentido entre os interlocutores em uma dada situação de comunicação e em um dado contexto sócio-histórico e ideológico. Dominar a língua significa, portanto, não só ter consciência do funcionamento da linguagem, mas saber produzir textos de modo funcional. Tanto a primeira como a segunda concepção são processos naturais que concebem o texto como produto acabado. Koch ( 2003) explica que, na primeira perspectiva, constitui-se um sujeito cartesiano, com consciência individual do uso da linguagem, dono de suas vontades e ações; um ego que quer ser captado pelo interlocutor e se funda na ideologia liberal segundo a qual os sujeitos fazem a história. Já na segunda perspectiva, o resultado é um usuário assujeitado ao código, que não é dono de seu discurso, inconsciente de seu dizer, um id que não controla o que diz, porque é dependente e repetidor da ideologia onde está. Já na terceira concepção, o sujeito é um ser psicossocial, com consciência de que o texto é um espaço dialógico e que sua identidade é construída pela relação dinâmica com a alteridade. Descrição e análise do corpus Esta pesquisa busca refletir sobre dois aspectos envolvidos na constituição ( ou reconstituição) do sujeito-autor de nível superior, que possui suficiente trajetória de pesquisador, docente e orientador de pesquisas, as quais podem ser expressas por meio das seguintes questões:

7 Que expectativas têm sujeitos-autores de nível superior, numa oficina de formação de autores? - Qual (is) a(s) concepção (ões) de língua(gens) que subjazem os conceitos de escrita desses sujeitos-autores? Trata-se de um grupo de 29 participantes de uma oficina de formação de autores universitários ofertada pela editora de uma universidade privada desta capital, onde atuam como docentes nas áreas de engenharia, arquitetura, jornalismo, publicidade e propaganda, análise de sistemas, relações públicas, pedagogia, serviço social etc. A maioria desses professores possui entre dez e quinze anos de atividade na instituição, ainda que houvesse um professor com mais de trinta anos de atuação e outro com apenas seis meses de trabalho na universidade. A coleta dos dados ocorreu no primeiro encontro, sendo esta pesquisadora a ministrante do evento. Na semana anterior, ocorreu uma palestra motivacional feita por profissional da área de literatura que estimulou o público quanto à necessidade de se publicar em diferentes instâncias. Os dados sobre as expectativas do grupo presente no módulo 1 da oficina propriamente dita foram coletados a partir de registro escrito, feito pela ministrante no quadro de giz, selecionado ao longo da apresentação oral de cada participante no próprio momento de sua fala. Essa estratégia, bastante comum nas salas de aula, constitui-se por si própria, uma retextualização do oral para o escrito, que transforma trinta e três apresentações orais em uma lista de expectativas coletivas. As apresentações ocorreram de modo aleatório, tendo sempre a intermediação da ministrante, que buscava não só registrar as expectativas, mas refletir sobre elas com o grupo, a fim de criar vínculos necessários para a continuidade dos encontros e das atividades da oficina. Eis a lista de expectativas coletivas: - produzir textos de divulgação científica a partir das dissertações e teses; - produzir textos didáticos para acadêmicos de seus cursos a partir dos materiais pedagógicos usados para as aulas; - motivar-se e ser orientado para publicar textos; - refletir sobre a prática de produção textual; - produzir projetos de livros coletivos, aprendendo a organizar e coordenar obras;

8 adquirir maior autoconfiança linguística. Percebe-se que as duas primeiras expectativas da relação não são textualizações, já que anunciam o uso de textos pré-existentes, ou seja, material já produzido pelos sujeitos-autores em situações interativas específicas de seu percurso profissional. E, pode-se inferir que, embora tenham autonomia quanto à produção desses gêneros acadêmicos, encontram dificuldade para retextualizá-los, tornando-os úteis a novos propósitos, transformando-os em outros gêneros. Também fica evidente a importância de esses sujeitos-autores terem consciência de operações de retextualização de textos longos como dissertações e teses em que não apenas se selecionam capítulos para publicar, mas se faz necessário, por exemplo, fazer um levantamento das condições de produção envolvidas nesse novo texto, seja ele de divulgação científica ou didático, além de se encontrar um contexto de produção viável para a temática de suas pesquisas. As terceira, quarta e quinta expectativas parecem apontar para a visão bahktiniana que destaca as relações dialógicas da linguagem. Os sujeitos-autores têm preocupação em estabelecer interação verbal, caracterizada não apenas como comunicação em voz alta, de pessoas face a face, mas como objeto de discussões ativas sob forma de diálogo; pretendem, conscientemente ou não, construir-se como autores no contexto em que realizam seu processo dialógico. Finalmente, alguns participantes revelaram ter consciência crítica muito rigorosa, impedindo-os de produzir e publicar; de certa forma, travando-os quando colocam o juízo de valor antes de qualquer iniciativa e avaliam os riscos de serem criticados por suas posições, conceitos e proposições; daí a necessidade de se adquirir autoconfiança linguística para escrever e publicar, considerando o texto publicado inacabado, embora terminal, portanto, passível de desconstrução pelos leitores. Sobre a segunda questão desta pesquisa, apresenta-se a seguir um quadro contendo as respostas coletadas sobre a pergunta O que é escrever? e classificadas conforme cada concepção. Quadro 1 Classificação das respostas dos participantes Concepção de língua como expressão do pensamento Concepção de língua como instrumento de comunicação 1. Escrever é o processo de organizar o pensamento no 13.Escrever é registrar graficamente uma ideia,

9 5302 formato de texto. Também significa aparar e reaparar as arestas de um texto para adaptá-lo ao seu possível leitor. 2.É utilizar as palavras para expressar as ideias, as teorias e os conhecimentos para uma sociedade. 3.É colocar no papel as ideias e disseminar o conhecimento. 4.Escrever é fotografar a fala, é manter de forma permanente o que se perderia no tempo. 5.Escrever é mais uma forma de expressar os sentimentos, sensações e cultura. Registrar ideias para a posteridade, mas dentro das limitações impostas para sua forma de expressão. 6.É me expressar, dar vazão à imaginação, à criatividade e ao conhecimento acumulado. É a complementação de um fluxo, a concretização dos pensamentos e ideias. 7.É gostoso colocar no papel ideias, pensamentos, sentimentos. Por meio da palavra escrita expomos, projetamos um pouco de nós e, ao nos ver no papel, nos reorganizamos internamente. É uma forma de construção da consciência e expressão humana. 8.Escrever para mim é contar uma história. É a arte de traduzir ideias com palavras. Fazer com que as pessoas saibam o que você diz. 9.Escrever é transpor para o papel nossas ideias e pensamentos tendo por finalidade se fazer compreendido por um leitor. A escrita para mim também é uma forma de reflexão e revisão de minhas ações. 10.Expressar as ideias com palavras no papel. Registrar as ideias para outros lerem. Um instrumento para expressar impressões e sentimentos. Uma forma de organizar as ideias e conhecimentos para não esquecêlos. 11.Transmitir através das palavras os pensamentos, os sentimentos. Por meio da escrita, é possível demonstrar a sua visão de mundo. 12.Escrever é expressar um pensamento, um sentimento ou uma mensagem através da escrita. conceito, narrativa, usando um sistema de símbolos codificadores. 14.Expressar através de símbolos o pensamento, que deve estar claro, que os que lêem devem entender, compreender o sentido. Forma de comunicação não presencial. 15.Expressar informações, opiniões, fatos etc. sobre um assunto, situação, criando um fio condutor para o leitor. Transferir sensações, sentimentos para o observador do ambiente, o leitor, compartilhando um instante. 16.Ler é escrever (Demo, 1996). Acredito que escrever é um registro (auxiliar de memória) e uma expressão (comunicação) que possibilita registrar o que penso e tornar público no presente e quem sabe, no futuro. A escrita me possibilita também dialogar com outros tempos e lugares. É comunicar com o outro. 17.É uma forma de comunicação onde você pode colocar no papel as suas ideias, seus pensamentos, suas histórias, suas experiências. 18.Escrever significa comunicar uma ideia, um pensamento, um conhecimento, de forma clara e objetiva, de forma que o leitor possa entender sua mensagem. 19.É uma forma de comunicação e expressão sobre as mais variadas percepções da vida. É deixar um pouco de si. Compartilhar sentimentos, pensamentos, ideias, conhecimentos é a tentativa de comunicar algo para outrem, seja de forma literária, jornalística, científica... contudo a emoção é percebida conforme o destinatário. 21. É transformar as ideias em símbolos compreensíveis que permanecem no tempo. 22.É comunicar uma ideia/ fato a partir de uma linguagem (forma de comunicação). Compartilhar o que você sabe/descobriu sobre algum tema. 23.Escrever é concatenar ideias, fatos e sentimentos por meio de palavras e símbolos gráficos inteligíveis, em regra, destinados a terceiros. 24.Escrever é exercer a minha condição de animal/ser social. Como tal, tenho a necessidade básica de me comunicar. Escrever talvez represente a melhor maneira de divulgar o que penso. Através da escrita sou capaz de dizer o que a minha voz cala. 25.Escrever é uma grande dificuldade na estruturação e na fluência: o texto não acompanha minhas ideias.

10 Escrever é expressar ideias através de linguagem codificada; manifestação do pensamento, de forma organizada, para que seja inteligível a outro. Fonte: Dados organizados pela autora conforme as concepções de linguagem subjacentes aos conceitos apresentados. Quadro 2 Respostas diferentes Respostas 27. Refletir sobre um fato ou uma ideia a partir de uma problematização ou de uma demanda individual e/ou social. 28. Passar o sentimento, passar a emoção; escrever pouco; exigir e não desenvolver; escrever pensando em fugir; o trauma do ditado ; o resgate em reescrever. 29. Para escrever, é necessário observar ao seu redor e identificar uma máquina aqui denominada computador. Alguns saudosistas, cabe observar, defendem o uso da máquina de escrever, contudo, sendo bastante sincero, um lápis e um pedaço de papel são suficientes. Ah! Um cérebro ajuda bastante! Fonte: Dados organizados pela autora conforme os conceitos apresentados. Comentários O autor delimita o ato de escrever a um único gênero, comumente produzido na academia. O autor evoca as lembranças de escola e as marcas que lhe deixaram. O autor não respondeu à questão solicitada, fazendo apenas alusão ao que considera escrever: pensar. A primeira constatação é que não há participantes cujo conceito de escrita tenha subjacente a concepção de linguagem como processo de interação. O quadro acima mostra que os participantes dividem-se entre a concepção tradicional e prescritiva da linguagem e a concepção de língua como código. Em nenhum deles, há a consciência de que a escrita é uma atividade interacional em que a palavra é dirigida a um interlocutor real, distinto, conforme o grupo social a que pertence, aos laços sociais e a outras circunstâncias a que está exposto. Quando os conceitos apresentam o leitor, trata-se de um leitor universal, atemporal e sem delimitação social: Também significa aparar e reaparar as arestas de um texto para adaptá-lo ao seu possível leitor 2. (Texto 1) Fazer com que as pessoas saibam o que você diz. ( Texto 8)...transpor para o papel nossas ideias e pensamentos tendo por finalidade se fazer compreendido por um leitor. ( Texto 9) Registrar as ideias para outros lerem. ( Texto 10) que os que lêem devem entender, compreender o sentido. (Texto 14) É possível perceber ainda, que, para esses sujeitos-autores, o leitor é passivo, ou seja, ele não participa da produção de sentido, apenas deverá compreender as ideias do autor do texto: 2 Todos os grifos são da autora.

11 5304 Expressar informações, opiniões, fatos etc. sobre um assunto, situação, criando um fio condutor para o leitor. Transferir sensações, sentimentos para o observador do ambiente, o leitor, compartilhando um instante. ( Texto 15) Escrever significa comunicar uma ideia, um pensamento, um conhecimento, de forma clara e objetiva, de forma que o leitor possa entender sua mensagem. (Texto 18) manifestação do pensamento, de forma organizada, para que seja inteligível a outro.(texto 26) Assim, o texto escrito não é um lugar de interação, um espaço dialógico orientado para o outro e por ele determinado. Os conceitos de escrita apresentados revelam uma relação linear de emissor para receptor, tornando-a monológica, individual e isolada. Seria preciso que o sujeito-autor concebesse o ato de escrever como tomada de consciência de si por meio do outro e transformasse seu texto para compreender o mundo e agir sobre ele, intencional e deliberadamente. no texto 7: A noção de sujeito psicológico ( ego que deseja ser captado pelo leitor) evidencia-se Por meio da palavra escrita expomos, projetamos um pouco de nós e, ao nos ver no papel, nos reorganizamos internamente. É uma forma de construção da consciência e expressão humana. O autor descreve o ato da escrita como um movimento para dentro de si, introspectivo, fazendo o contrário da concepção de linguagem como processo de interação, cuja atividade sociocomunicativa se volta para fora, para o outro. Também é possível perceber conceitos de escrita que contêm marcas da primeira e da segunda concepção: Acredito que escrever é um registro (auxiliar de memória) e uma expressão (comunicação) que possibilita registrar o que penso e tornar público no presente e quem sabe, no futuro. A escrita me possibilita também dialogar com outros tempos e lugares. É comunicar com o outro. Na primeira parte desse conceito, o autor ressalta a concepção de língua como representação do pensamento ( auxiliar de memória) e, em seguida, apresenta-se a concepção de língua como instrumento de comunicação. O mesmo acontece com o conceito 17 em que se misturam expressões como forma de comunicação colocar ideias no papel. É uma forma de comunicação onde você pode colocar no papel as suas ideias, seus pensamentos, suas histórias, suas experiências. Outro aspecto relevante da primeira concepção e que se expressa de forma clara é a crença de que as regras do bem falar e do bem escrever são as mesmas, valorizando o ensino

12 5305 tradicional e homogêneo de língua. O conceito de escrever proposto no texto 4 demonstra isso: Escrever é fotografar a fala, é manter de forma permanente o que se perderia no tempo. Mesmo o conceito que menciona a expressão ser social, toma-a para designar o ato da escrita como processo natural de comunicação, em que o texto é produto acabado: Escrever é exercer a minha condição de animal/ser social. Como tal, tenho a necessidade básica de me comunicar. Escrever talvez represente a melhor maneira de divulgar o que penso. Através da escrita sou capaz de dizer o que a minha voz cala. (Texto 24) Também o conceito de escrita como dificuldade revela a preocupação com o código: Escrever é uma grande dificuldade na estruturação e na fluência: o texto não acompanha minhas ideias. ( Texto 25) Enfim, de modo geral, há muitas semelhanças entre os conceitos, revelando que os sujeitos precisarão se reconstruir enquanto sujeitos-autores, ou seja, precisarão tomar novas posições para afirmação de sua autoria e de seus discursos. Considerações finais Observando-se as expectativas do grupo de participantes da oficina e relacionando-as às concepções tradicionais de linguagem que subjazem seus conceitos de escrita, pode-se afirmar que há necessidade não só de se adotar uma perspectiva interacional na constituição dos sujeitos-autores, mas de se tomar uma postura reflexiva que os conduza a entender seus textos como um ato de efetiva interlocução e de agir comunicativo sobre o outro. Isso implica a atitude consciente de se analisar antes de cada retextualização quem é o interlocutor, para quem cada sujeito-autor está produzindo, qual é o objetivo de seu novo texto, quais os conhecimentos compartilhados que o sujeito-autor tem de seu interlocutor ( condições linguísticas e extralinguísticas), que imagem o interlocutor tem dele, o que ambos sabem sobre o assunto a ser tratado. Entretanto, cabe considerar, primeiramente, a complexidade do trabalho que envolve a produção textual, que, como atividade cultural e dinâmica, não se limita a operações identificáveis pelas teorias, mas sua efetiva apropriação está ligada à própria reconstrução do sujeito-autor.

13 5306 REFERÊNCIAS BAKHTIN, M. M. /VOLOCHINOV, V. N. (1929) Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: língua portuguesa: 5ª a 8ª séries. Brasília: SEF, D ANDREA, Carlos F. B.; RIBEIRO, Ana Elisa. Retextualizar e reescrever, editar e revisar: reflexões sobre a produção de textos e as redes de produção editorial. Veredas on line atemática, 1/2010, p Disponível em Acesso em 06/2011. DELL ISOLA, R. Retextualização de gêneros escritos. Rio de Janeiro: Lucerna, KOCH, Ingedore G Villaça. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez, MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita - atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, MATENCIO, M. L. M. Atividades de retextualização em práticas acadêmicas: um estudo do gênero resumo. Scripta, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p , Referenciação e retextualização de textos acadêmicos: um estudo do resumo e da resenha. Anais do III Congresso Internacional da ABRALIN, março de TRAVAGLIA, L. C. Gramática ensino plural. São Paulo: Cortez, Gramática e interação: uma proposta para o ensino de gramática no 1º e 2º graus. São Paulo: Cortez, 1998.