SISTEMA DE ALTA EFICIÊNCIA PARA TRATAMENTO DE ESGOTO RESIDENCIAL ESTUDO DE CASO NA LAGOA DA CONCEIÇÃO

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1 GLADSON HOFFMANN DA SILVA SISTEMA DE ALTA EFICIÊNCIA PARA TRATAMENTO DE ESGOTO RESIDENCIAL ESTUDO DE CASO NA LAGOA DA CONCEIÇÃO Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal de Santa Catarina, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Engenheiro Civil. Florianópolis 2004

2 GLADSON HOFFMANN DA SILVA SISTEMA DE ALTA EFICIÊNCIA PARA TRATAMENTO DE ESGOTO RESIDENCIAL ESTUDO DE CASO NA LAGOA DA CONCEIÇÃO Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal de Santa Catarina, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Engenheiro Civil. Área de concentração: Construção Civil Orientador: ENEDIR GHISI, PhD. Co-orientador: PABLO HELENO SEZERINO, M. Eng. Florianópolis 2004

3 SISTEMA DE ALTA EFICIÊNCIA PARA TRATAMENTO DE ESGOTO RESIDENCIAL ESTUDO DE CASO NA LAGOA DA CONCEIÇÃO GLADSON HOFFMANN DA SILVA Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado com requisito para a obtenção do título de ENGENHEIRO CIVIL Área de concentração CONSTRUÇÃO CIVIL, aprovada em sua forma final pelo Programa de Graduação em Engenharia Civil. Prof. Enedir Ghisi, PhD Orientador (UFSC) Prof. Lia Caetano Bastos Coordenadora do TCC (UFSC) Banca Examinadora: Eng. Fernando Simon Westphal, M. Eng. (UFSC) Eng. Pablo Heleno Sezerino, M. Eng (UFSC)

4 Aos que considero minha família... 4

5 AGRADECIMENTOS Ao meu grande pai, pelo incentivo durante toda a minha vida. Aos meus irmãos Robson e Alisson pelo apoio. A Aline, pela paciência e dedicação. Ao pessoal do LabEEE, em especial ao amigo Fernando Simon Westphal, com os quais convivi em grande parte da minha graduação. Ao meu orientador Enedir Ghisi e ao meu co-orientador Pablo Heleno Sezerino, que permitiram a realização deste trabalho. Aos engenheiros da vigilância sanitária, pela atenção. À RGA Engenharia, pela contribuição em minha formação. A todos amigos presentes em minha vida, em especial ao casal Nei e Lorete. Ao meu grande amigo Kiko, por todo apoio nos momentos difíceis.

6 SUMÁRIO LISTA DE TABELAS...vii LISTA DE FIGURAS...viii RESUMO...ix 1. INTRODUÇÃO JUSTIFICATIVA DO ESTUDO OBJETIVOS Objetivos específicos ESTRUTURA DO TRABALHO REVISÃO BIBLIOGRÁFICA INTRODUÇÃO Esgotos Sanitários Esgotos Industriais CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DOS ESGOTOS Coloração Turbidez Odor Matéria sólida Temperatura CARACTERÍSTICAS QUÍMICAS DOS ESGOTOS Matéria orgânica Proteínas Carboidratos Gorduras e óleos Matéria Inorgânica Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) Nitrogênio Demanda Química de Oxigênio (DQO) Demanda Total de Oxigênio (DTO) Demanda Teórica de Oxigênio (DTeO) DBO e DQO Solúvel ph CARACTERÍSTICAS BIOLÓGICAS DOS ESGOTOS Algas Bactérias Crescimento bacteriano e floculação Doenças associadas COMPOSIÇÕES TÍPICAS E RELAÇÕES PROPOSTAS PRINCÍPIOS DO TRATAMENTO DE ESGOTOS Processos metabólicos Oxidação Aeróbia da matéria orgânica Digestão Anaeróbia Nitrificação e Desnitrificação...21

7 2.7 TIPOS DE TRATAMENTO Classificação das etapas de tratamento Tanque Séptico (TS) Princípios de funcionamento Projeto do Tanque Séptico Eficiência Operação e manutenção Observações gerais Filtro Biológico Anaeróbio (FAN) Princípios de funcionamento Projeto do Filtro Anaeróbio Eficiência Operação e manutenção Observações gerais Filtro Aerado Princípios de funcionamento Projeto do Filtro Aeróbio Eficiência Operação e Manutenação Observações gerais Tanque de Sedimentação Princípios de funcionamento Projeto do Tanque de Sedimentação Operação e Manutenação Observações gerais Clorador Princípios de funcionamento Projeto do Clorador Eficiênica Operação e manutenção Observações gerais Sumidouro Princípios de funcionamento Projeto do Sumidouro Operação e manutenção Observações gerais METODOLOGIA ESCOLHA DO SISTEMA TANQUE SÉPTICO Parâmetros de projeto Dimensionamento FILTRO ANAERÓBIO Parâmetros de projeto Dimensionamento

8 3.4 FILTRO AERÓBIO Parâmetros de projeto Dimensionamento TANQUE DE SEDIMENTAÇÃO Parâmetros de projeto Dimensionamento CLORADOR Parâmetros de projeto Dimensionamento SUMIDOURO Parâmetros de projeto Dimensionamento RESULTADOS TANQUE SÉPTICO FILTRO ANAERÓBIO FILTRO AERÓBIO TANQUE DE SEDIMENTAÇÃO CLORADOR SUMIDOURO IMPLANTAÇÃO SISTEMA COMPLETO CONCLUSÕES CONSIDERAÇÕES INICIAIS ANÁLISE DOS RESULTADOS CONSIDERAÇÕES FINAIS SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...68 ANEXOS...70 ANEXO A Sentença da Ação Civil Pública nº ANEXO B Normativa Interna nº 001/2003 da Vigilância Sanitária de Florianópolis

9 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Concentração em termos de DBO5 e DQO (SILVA, 1979, p.4)...16 Tabela 2: Composição típica de esgotos sanitários (GONÇALVES, 1997, p.23)...17 Tabela 3: Valores típicos de parâmetros de carga orgânica (mg/l) no esgoto JORDÃO, 1995 p.37)...18

10 LISTA DE FIGURAS Figura 1: Planta baixa do Tanque Séptico...46 Figura 2: Tanque Séptico Corte AA...47 Figura 3: Planta baixa do Filtro Anaeróbio Corte DD...49 Figura 4: Filtro Anaeróbio Corte AA...50 Figura 5: Filtro Anaeróbio Corte BB...51 Figura 6: Filtro Anaeróbio Corte CC...52 Figura 7: Planta baixa do Filtro Aeróbio Corte BB...54 Figura 8: Planta baixa do Filtro Aeróbio Corte CC...54 Figura 9: Filtro Aeróbio Corte AA...55 Figura 10: Detalhe fundo falso...55 Figura 11: Planta baixa do Tanque de Sedimentação...57 Figura 12: Tanque de Sedimentação Corte AA...57 Figura 13: Planta baixa do Clorador...59 Figura 14: Clorador Corte AA...59 Figura 15: Planta baixa do Sumidouro...61 Figura 16: Sumidouro Corte AA...62 Figura 17: Implantação Sistema Completo

11 RESUMO Tendo em vista a atual situação da bacia da Lagoa da Conceição e as novas exigências impostas pela Vigilância Sanitária de Florianópolis, surgiu a necessidade de se projetar novos sistemas de tratamento de esgoto com alta eficência, objetivo deste trabalho. O sistema teria que atender as novas necessidades impostas pela Vigilância Sanitária, que exige remoção de no mínimo 90% de Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO), nitrificação total, máximo de 500 coliformes fecais totais por 100 ml, entre outros. O sistema de tratamento de esgoto aqui proposto refere-se a um caso hipotético de uma residência com 200 m 2, contendo 4 quartos. A residência recebeu um sistema composto por 6 unidades, sendo elas: Tanque Séptico, Filtro Anaeróbio, Filtro Aeróbio, Tanque de Decantação, Tanque de Desinfecção e Sumidouro, montadas conforme a seqüência descrita. A alta exigência do órgão fiscalizador relativa à qualidade do efluente final implicou na adoção de várias etapas no tratamento dos despejos. A escolha dos processos de estabilização de esgotos dentro do sistema foi feita em função do estudo das normas e publicações relacionadas com o tratamento de despejos domésticos, além das recomendações e exigências da vigilância sanitária de Florianópolis. O trabalho apresenta como resultado o projeto do sistema de tratamento conforme a exigência do órgão responsável pelo saneamento no município de Florianópolis. É mostrado também o detalhe de cada unidade adotada separadamente, e ao final, o projeto de implantação composto por todo o sistema. O processo aqui adotado refere-se a um caso e local específicos. Entretanto, nada impede que se possa utilizar o referente tratamento de esgotos em outras localidades, a fim de tratar de forma eficaz despejos de origem doméstica. Sistemas para contribuições de esgotos distintas das adotadas aqui neste caso também podem seguir a mesma metodologia. 11

12 1. INTRODUÇÃO À medida que os sinais de poluição começam a aparecer e a causar impacto, a necessidade em se tratar esgotos torna-se mais evidente. Atualmente, muitos corpos receptores de esgotos, como lagoas, lagos e até mares já demonstram sinais de degradação devido à grande carga recebida de despejos. É o caso da Lagoa da Conceição, localizada no município de Florianópolis, onde estes sinais já podem ser observados. O aumento desordenado da população que habita a bacia da Lagoa da Conceição tem causado conseqüências negativas no seu equilíbrio. Nos últimos anos, a proliferação desordenada de algas tem chamado a atenção de alguns ambientalistas e da população em geral. O forte odor que o apodrecimento destas algas gera em algumas épocas do ano já é um grande problema para muitos que habitam às margens da lagoa. Atualmente, o serviço de coleta de esgoto na região é oferecido para um pequeno número de moradores. Grande parte das edificações possuem o seu próprio sistema de tratamento individual. O grande problema é que na maioria das vezes o sistema de tratamento individual não é eficiente. A predominância é por sistemas simples, como tanque séptico seguido de sumidouro, que em alguns casos possuem erros graves em sua execução e projeto. Outros ainda adotam práticas ilegais, como jogar o esgoto na rede pluvial ou até mesmo diretamente na lagoa, piorando ainda mais a situação. Associando um grande número de moradores com sistemas de tratamento deficientes, tem-se por conseqüência uma grande carga de poluentes inseridas na Lagoa da Conceição. À medida que a carga de esgotos que chega na lagoa é maior que o potencial de degradação da mesma, e que assim se mantenha, caminha-se para uma sintuação de degradação total. A condição da Lagoa da Conceição, já rumo a uma situação caótica, em conjunto com a sentença referente à Ação Civil Pública nº , apresentada no Anexo A, fez com que a vigilância sanitária de Florianópolis órgão 1

13 responsável pela fiscalização dos serviços sanitários nesta cidade intervisse. Atualmente, a Vigilância Sanitária é rigorosa no que diz respeito ao projeto de sistemas de tratamento de esgoto na bacia da lagoa. 1.1 Justificativa do estudo A situação atual na Lagoa da Conceição exige que se realizem estudos que possam amenizar a problemática que hoje ocorre. Um dos trabalhos a se fazer é a proposição de um sistema de tratamento de esgoto residencial com alta eficiência, enquanto não existe uma rede pública de esgoto. O órgão responsável pelo saneamento em Florianópolis exige, na bacia da lagoa, os seguintes requisitos, conforme consulta realizada em janeiro de 2003 (VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2003): a) Remoção de Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) em no mínimo 90% (noventa por cento); b) Garantia de nitrificação total do nitrogênio contido nos efluentes; c) Nível positivo de oxigênio no efluente final; d) Garantia de no máximo 500 coliformes fecais totais por 100 ml de amostra. A simples utilização de tanque séptico como processo de tratamento em conjunto com o sumidouro como disposição final do efluente certamente não irá atender a estas exigências. Neste sistema, o sumidouro pouco contribui na eficiência do sistema, tendo como função a infiltração do efluente no solo. A estabilização do esgoto fica principalmente por conta do tanque séptico. Neto (1997 apud Além Sobrinho, 1991) relata um caso de monitoramento de um decanto-digestor (tanque séptico) dimensionado de acordo com a NBR 7229, que obteve eficiência média na remoção de DBO em torno de 65%. Os valores de concentração de DBO para este caso são de 230 a 290 mg/l para o afluente e em torno de 90 mg/l para o efluente do tanque séptico. A normalização brasileira já é bem mais conservadora, e apresenta valores de remoção de DBO situados entre 40 e 75%, para a utilização de 2

14 tanque séptico em conjunto com filtro anaeróbio (NBR 13969, 1997). Caso a norma apresentasse valores de eficiência somente do Tanque Séptico, certamente estes valores seriam menores que o intervalo apresentado quando o Tanque Séptico estiver em conjunto com o Filtro Anaeróbio (40 a 75%). Vale ressaltar que além de remoção de DBO, as outras exigências ainda devem ser cumpridas. A necessidade de se projetar sistemas de tratamento de esgotos com alta eficiência deu origem a este trabalho, que se refere a um caso hipotético de uma residência com 200 m 2 de área e com população teórica de 8 pessoas, contendo 4 quartos. Considerou-se como plano o terreno onde será implantado o sistema de tratamento, e o lençol freático a 3 metros abaixo do nível do terreno. 1.2 Objetivos Este trabalho tem como objetivo principal apresentar uma alternativa de um sistema de tratamento de esgotos domésticos que atenda as novas exigências da Vigilância Sanitária na área abrangida pela bacia da Lagoa da Conceição Objetivos específicos Como objetivos específicos, pode-se citar: a) Criação de um sistema de tratamento com viabilidade de implantação em um terreno que não possua muita área disponível (em torno de 50 m 2 ); b) Criação de um sistema que não produza fortes odores ao seu redor; c) Criação de um sistema com alta eficiência que além de atender as exigências da vigilância sanitária, promova uma redução na degradação da lagoa. 1.3 Estrutura do trabalho 3

15 O trabalho está estruturado em 5 capítulos. No capítulo 1 foi apresentada uma introdução ao trabalho, na qual se fez uma descrição breve da problemática em estudo e se apresentou justificativas e objetivos do estudo. O segundo capítulo consiste em uma revisão da literatura correspondente. Apresenta-se algumas definições essenciais ao entendimento de um sistema de tratamento de esgoto. Em seguida, fala-se sobre os princípios de tratamento de esgotos, e são relacionados os tipos de tratamento. No capítulo 3 é apresentada a metodologia, que demonstra como o sitema de tratamento foi escolhido e relata os métodos adotados para o seu dimensionamento. No capítulo 4 mostra-se os resultados obtidos no estudo, é mostrado o sistema de tratamento de esgoto adotado e é apresentado o resultado do dimensionamento de cada unidade apresentada na metodologia. O capítulo 5 apresenta as conclusões e sugestões para trabalhos futuros. 4

16 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 Introdução A palavra esgoto é comumente utilizada para referenciar despejos em geral, sendo estes de origem doméstica, industrial, comercial, de áreas agrícolas, entre outros. Alguns autores também utilizam a denominação de águas residuárias, que é a tradução literal de wastewater, muito utilizada no inglês. Os esgotos, segundo Jordão e Pessôa (1995) podem ser classificados em dois grupos principais: sanitários e industriais Esgotos Sanitários São predominantemente constituídos de despejos domésticos. Basicamente, são compostos por urina, fezes, restos de comida, papel, sabão, detergente, águas de banho e de lavagem em geral Esgotos Industriais As características deste tipo de despejo são extremamente variáveis de acordo com sua origem e, portanto, este tipo de esgoto necessita de estudos e tratamento específicos. O objetivo deste trabalho é tratar exclusivamente de esgotos de origem doméstica. A revisão bibliográfica apresentada a seguir tratará exclusivamente de despejos sanitários, não sendo válida, em grande parte, para esgotos de origem industrial. 5

17 2.2 Características físicas dos esgotos As principais características físicas que representam o estado em que se encontram águas residuárias são: coloração, turbidez, odor, matéria sólida e temperatura Coloração A coloração indica o estado de decomposição do esgoto, e fornece dados que podem caracterizar o estado do despejo. Como exemplo, a cor preta é típica do esgoto velho e de uma decomposição parcial, enquanto a tonalidade acinzentada já indica um esgoto fresco (JORDÃO, PESSÔA, 1995) Turbidez Assim como a coloração, a turbidez também indica o estado em que o esgoto se encontra. Este parâmetro está relacionado com a concentração dos sólidos em suspensão Odor Durante o processo de decomposição, alguns odores característicos de esgotos podem ser gerados. Jordão e Pessôa (1995) citam três odores como sendo os principais: a) odor de mofo, razoavelmente suportável, típico do esgoto fresco; b) odor de ovo podre, insuportável, típico do esgoto velho ou séptico, que provém da formação de gás sulfídrico oriundo da decomposição do lodo contido nos despejos; e c) odores variados, de produtos podres como de repolho, peixe, legumes; de fezes; de produtos rançosos; de acordo com a predominância de produtos sulfurosos, nitrogenados, ácidos 6

18 orgânicos, etc. A matéria orgânica e o lodo retidos em alguma fase do tratamento de esgoto podem ocasionar maus odores em uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE). Além disto, as reações que ocorrem no decorrer do tratamento produzem subprodutos que causam mau cheiro (H 2 S e outros polienxofres, NH 3 e outras aminas). A temperatura também tem influência na emissão de odores. Segundo Belli (1999 apud SCHOLTENS e DEMMERS 1990 e MARTIN e LAFFORT 1991), as emissões gasosas compostas de nitrogênio, enxofre, solventes e outros compostos orgânicos voláteis podem ser tratadas por diversos processos, tais como absorção por oxidantes, combustão, adsorção, biodesodorização (tratamento biológico dos maus odores) em biofiltros (meio suporte: turfa, composto orgânico ou solo), biolavagem e biopercolação Matéria sólida Jordão e Pessôa (1995) classificam a matéria sólida presente nas águas residuárias segundo a nomenclatura exposta abaixo: a) em função das dimensões das partículas: sólidos em suspensão, sólidos coloidais ou sólidos dissolvidos; b) em função da sedimentabilidade: sólidos sedimentáveis, sólidos flutuantes ou flotáveis ou sólidos não sedimentáveis; c) em função da secagem, a alta temperatura (550 a 600ºC): sólidos fixos ou sólidos voláteis; d) em função da secagem em temperatura média (103 a 105ºC): sólidos totais, sólidos em suspensão ou sólidos dissolvidos. Um dos parâmetros de grande utilização em sistemas de esgotos é a quantidade total de sólidos. Seu módulo é o somatório de todos os sólidos dissolvidos e dos não dissolvidos em um líquido. A sua determinação é normatizada, e consiste na 7

19 determinação da matéria que permanece como resíduo após sofrer uma evaporação a 103ºC Temperatura A temperatura influi diretamente na taxa de qualquer reação química, que aumenta com sua elevação, salvo os casos onde a alta temperatura produza alterações no catalisador ou nos reagentes. Em se tratando de reações de natureza biológica, Jordão e Pessôa (1995) afirmam que a velocidade de decomposição do esgoto aumenta de acordo com a temperatura, sendo a faixa ideal para atividade biológica contida entre 25 e 35ºC, sendo ainda 15ºC a temperatura abaixo da qual as bactérias formadoras do metano se tornam inativas na digestão anaeróbia. Dentro dos tanques sépticos (fossas), por exemplo, ocorre a digestão anaeróbia. 2.3 Características químicas dos esgotos Jordão e Pessôa (1995) acreditam que, levando em consideração a origem dos esgotos, estes podem ser classificados em dois grandes grupos: da matéria orgânica e da matéria inorgânica Matéria orgânica Cerca de 70% dos sólidos no esgoto médio são de origem orgânica. Estes compostos são constituídos principalmente por compostos de proteínas, carboidratos, gordura e óleos, e em menor parte, por uréia, surfartantes, fenóis, pesticidas (típicos de despejos industriais, em quantidade), etc. (JORDÃO, PESSÔA, 1995). Von Sperling (1996) ainda divide o material orgânico seguindo o critério de biodegradabilidade, classificando-os em inerte ou biodegradável. 8

20 Proteínas Produzem nitrogênio e contêm carbono, hidrogênio, nitrogênio, oxigênio, e podem conter fósforo, enxofre e ferro. São basicamente de origem animal, mas ocorrem em vegetais também. O enxofre fornecido pelas proteínas é responsável pela produção do gás sulfídrico presente nos despejos Carboidratos Contêm carbono, hidrogênio e oxigênio, e são as primeiras substâncias a serem atacadas pelas bactérias. Estão presentes principalmente nos açúcares, amido, celulose, etc. A ação bacteriana nos carboidratos produz ácidos orgânicos, que geram um aumento na acidez do esgoto Gorduras e óleos Também designados como matéria graxa, as gorduras e os óleos se encontram presentes nos despejos domésticos e sua origem, em geral, se dá pelo uso de manteiga, óleos vegetais, carnes, etc. Além disso, podem estar presentes nos despejos produtos não tão comuns, como querosene, óleo lubrificante e afins, proveniente de garagens. São indesejáveis em um sistema de tratamento de esgotos, pois formam uma camada de escuma e podem vir a entupir os filtros, além de prejudicar a vida biológica Matéria Inorgânica A matéria inorgânica existente nos esgotos é constituída, em geral, de areia e outras substância minerais dissolvidas, provenientes de águas de lavagens. Não é usual a remoção deste tipo de material, que pouco influenciará em um sistema de tratamento de esgotos pelo fato de ser um material inerte. Entretanto, deve-se estar atento às possibilidades de entupimento e saturação de filtros e tanques, quando há grande quantidade deste material. 9

21 2.3.3 Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) Também conhecida como BOD (Biochemical Oxygen Demand), a DBO é um dos parâmetros mais utilizados no que se refere ao tratamento de esgotos. Segundo Netto (1977), a DBO mede a quantidade de matéria orgânica oxidável por ação de bactéria. Macintyre (1996) caracteriza a DBO como avidez de oxigênio para atender ao metabolismo das bactérias e a transformação da matéria orgânica. Na verdade, as duas definições, aparentemente um pouco distintas, significam a mesma coisa. A DBO é utilizada para indicar o grau de poluição de um esgoto, ou seja, um índice de concentração de matéria orgânica por uma unidade de volume de água residuária. A medição da DBO é padronizada, segundo Jordão e Pessôa (1995) pelo Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater que adota tempo de 5 dias e uma temperatura padrão de 20ºC. Vale ressaltar que a DBO 5 não representa a demanda total de oxigênio, pois a demanda total ocorre em período muito superior. Netto (1977) acredita que a DBO total é igual a 1,46 x DBO 5 a 20ºC. A DBO 5 a 20ºC, chamada simplificadamente em alguns casos de DBO, varia no esgoto doméstico bruto, segundo Jordão e Pessôa (1995) e Macintyre (1996), entre 100 e 300 mg/l. Já Netto (1977) afirma que, para esgoto sanitário, a média atinge 300 mgo 2 /litro. A DBO ocorre em dois estágios: primeiramente a matéria carbonácea é oxidada, e em seguida ocorre uma nitrificação. A DBO de 5 dias trabalha na faixa carbonácea (JORDÃO, PESSÔA, 1995). A temperatura é fator relevante na determinação da duração de cada faixa. A duração tende a diminuir com o aumento da temperatura Nitrogênio É possível conhecer as concentrações de matéria orgânica através da forma que os compostos nitrogenados se apresentam nos esgotos. Contudo, este tipo de teste para caracterização de matéria orgânica está em desuso. Para tal caracterização, atualmente 10

22 determina-se a DBO, discutida em Entretanto, os testes com nitrogênio possuem um papel fundamental na indicação da carga de nutrientes lançados ou presentes num corpo d água, além de indicar a disponibilidade de nitrogênio para a manutenção da atividade biológica nos processos de tratamento. O nitrogênio, assim como todo o nutriente, pode causar problemas de superprodução de algas (consumidoras) nos corpos receptores de estações de tratamento (rios, lagos, lagoas, etc). A superprodução de algas é resultado de sistemas de tratamento de esgotos mau projetados e executados, onde estes não são capazes de retirar a quantidade necessária de nutrientes. Von Sperling (1996) divide a matéria nitrogenada em inorgânica e orgânica. O primeiro grupo é composto pela amônia, tanto na forma livre quanto na forma ionizada (respectivamente, NH 3 e NH + 4 ). A matéria nitrogenada orgânica tem divisão semelhante à matéria carbonácea Demanda Química de Oxigênio (DQO) Também conhecida como COD (Chemical Oxygen Demand), a Demanda Química de Oxigênio mede a quantidade de oxigênio necessária para oxidação da parte orgânica de uma amostra que seja oxidável pelo permanganato ou dicromato de potássio em solução ácida. A medição da DQO é padronizada Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater. A DQO leva em consideração qualquer fonte que necessite de oxigênio, seja esta mineral ou orgânica. Já a DBO considera somente a demanda da parte orgânica. Quando se trata de esgotos domésticos, a consideração pertinente fica ao redor da DBO, pois os esgotos domésticos possuem poucos sais minerais solúveis. 11

23 A rapidez das respostas de DQO também pode ser citada como uma grande vantagem com relação à DBO. Alguns aparelhos, segundo Jordão (1995), conseguem realizar esta determinação em cerca de 2 minutos. O método do dicromato leva duas horas para determinar a DQO do material. Como desvantagens, pode-se apresentar a falta de especificação da velocidade com que a bio-oxidação possa ocorrer Demanda Total de Oxigênio (DTO) Também conhecida como TOD (Total Oxygen Demand), a Demanda Total de Oxigênio consiste em uma determinação instrumental capaz de não ser afetada por certos poluentes que interferem mesmo no teste da DQO (por exemplo, amônia e benzeno), sendo o teste realizado em três minutos (JORDÃO, PESSÔA, 1995) As nomenclaturas aqui apresentadas devem ser utilizadas com cautela, pois alguns autores utilizam a mesma sigla com significados diferentes. É o caso de Silva (1979), que em seu livro caracteriza a DTO como Demanda Teórica de Oxigênio. Neste trabalho, a Demanda Teórica de Oxigênio foi tratada como DTeO, para diferenciá-la da Demanda Total de Oxigênio Demanda Teórica de Oxigênio (DTeO) Também conhecida como TEOD (Theoretical Oxygen Demand), a Demanda Teórica de Oxigênio é a quantidade teórica de oxigênio necessária para oxidação completa da parte orgânica de uma amostra, produzindo gás carbônico - CO 2 - e gás sulfídrico - H 2 S. Como exemplo, pode-se citar uma simples reação (oxidação da glucose). C 6 H 12 O 6 + 6O 2 6CO 2 + 6H 2 O A equação balanceada mostra que são necessárias 192 unidades de massa de 6O 2 12

24 para oxidar 180 unidades de massa de C 6 H 12 O 6. Obtendo-se a massa do composto orgânico, pode-se encontrar a quantidade necessária de oxigênio para oxidação completa do material. Contudo, a complexidade dos compostos existentes nos esgotos inviabiliza este processo teórico. Analisando os conceitos acima, pode-se concluir que: DTeO > DTO > DQO > DBO total > DBO DBO e DQO Solúvel São parâmetros que surgiram para caracterizar o estado em que a matéria orgânica se encontra. A indicação de fase solúvel ou particulada está diretamente ligada a taxas de sedimentação, adsorção, reações química, entre outros ph Fator determinante no sucesso de alguns sistemas de tratamento de esgotos, a existência do ph deve ser considerada. Pode-se chegar ao seu valor utilizando a equação 1: ph = log 10 1/H + (Eq.1) 2.4 Características biológicas dos esgotos Os principais microorganismos presentes em despejos são protozoários, fungos, algas, grupos de plantas e de animais e as bactérias, sendo que os mais importantes para este trabalho serão discutidos nos itens que seguem. 13

25 2.4.1 Algas Apresentam grande variedade de formas e dimensões. No caso de lagos e lagoas, a reprodução de algas é estimulada com o lançamento de efluentes de estações de tratamento ricos em nutrientes (nitratos e fosfatos). Este lançamento é indesejável quando o seu crescimento é demasiado também conhecido como floração e deve ser restringido. O excessivo enriquecimento de nutrientes do corpo receptor, seja ele um lago ou lagoa é denominado de eutrofização, que nada mais é do que a superprodução de algas em floração Bactérias Constituem o grupo de maior importância em sistemas de tratamento biológico. As principais bactérias responsáveis na remoção da DBO são as heterotróficas. Este grupo, segundo Von Sperling (1996) é sub-dividido em outros dois: a) Organismos quimioautótrofos: Utilizam a matéria inorgânica como fonte de energia e o CO 2 como fonte de carbono. Estão ligados à nitrificação. b) Organismos quimioheterótrofos: Utilizam a matéria orgânica como fonte de energia e fonte de carbono. São responsáveis pela maior parte das reações ocorridas no tratamento biológico. Nos despejos domésticos, podem ser encontradas bactérias aeróbias, anaeróbias e facultativas, assunto dos itens a seguir: a) Bactérias aeróbias: São as que retiram o oxigênio contido no ar, oriundo diretamente da atmosfera ou do ar dissolvido na água para seu metabolismo. Essa ação bacteriana é denominada de oxidação ou decomposição aeróbia. b) Bactérias anaeróbias: São as que retiram o oxigênio através de ações sobre os compostos orgânicos ou inorgânicos que contêm oxigênio para seu 14

26 metabolismo, ao invés de retirá-lo do ar. Este processo bacteriano é denominado de putrefação ou decomposição anaeróbia. c) Bactérias facultativas: São as que possuem a capacidade de ora retirar o oxigênio contido no ar, ora retirar o oxigênio através de ações sobre outros compostos Crescimento bacteriano e floculação A reprodução bacteriana ocorre, basicamente, por fissão binária, onde cada célula, ao atingir um certo tamanho, divide-se em duas novas células. Admitindo-se um tempo de geração típico de 20 minutos, um crescimento sem fatores limitantes iria possibilitar a existência de bactérias após 48 horas. Tal corresponderia a um peso aproximadamente vezes superior ao peso da terra (La Riviére, 1980). Na prática, naturalmente, o crescimento é logo restringido devido à exaustão de nutrientes no meio. (VON SPERLING, 1996, p. 107). Além das características metabólicas, as bactérias possuem a capacidade de flocular (se aglutinam e formam flocos), quando entram na fase de declínio em seu crescimento Doenças associadas O número de bactérias contidas nos esgotos é muito grande. As bactérias coliformes típicas do intestino de mamíferos não constituem, sozinhas, um perigo, mas sendo êntero-bactérias, são associadas a microorganismos patogênicos, provenientes das necessidades fisiológicas humanas. O esgoto pode conter bactérias agentes de cólera, das febres tifóides e paratifóides, salmonelas causadores de gastro-enterites, leptospiras, bacilo da turbeculose, enterovírus causadores da poliomelite, vírus de hepatite, dentre muitos outros. Contudo, não é possível proceder com um gerenciamento individual de cada um dos agentes citados acima, sendo adotado somente o coliforme como o indicativo de contaminação. O número de coliformes varia entre 100 a 400 bilhões de coliformes por habitante por 15

27 dia (PAGANINI, 1997; JORDÃO, PESSÔA, 1995). Todavia, Silva (1979) apud Geldreich (1966) acredita que esta concentração seja de 2 bilhões de coliformes por dia para um adulto médio. Nota-se aqui uma grande discrepância entre os valores propostos. 2.5 Composições típicas e relações propostas Nesta seção serão apresentados valores típicos de parâmetros de carga orgânica e relações propostas pelos autores. Silva (1979) afirma que a matéria sólida representa apenas 0,1% dos esgotos sanitários, sendo que a água é responsável pelos 99,9% restantes. A contribuição per capita diária de DBO 5 no Brasil (São Paulo) é de 50 g. Indo além, o autor indica as seguintes relações aproximadas: DBO 5 / DQO = 0,5; DBO total / DBO 5 = 1,5 A tabela 1 apresenta as concentrações em termos de DBO 5 e DQO (SILVA, 1979, p.4). Tabela 1: Concentração em termos de DBO 5 e DQO (SILVA, 1979, p. 4). Concentração Fraca Média Grande Muito Grande DBO 5 (mg/l) DQO (mg/l) Gonçalves (1997) e Jordão e Pessoa (1995) afirmam que a matéria sólida representa apenas 0,08% dos esgotos sanitários, sendo que a água é responsável pelos 99,92% restantes. A diferença da composição em relação à proposta por Silva (1979) 99,9% e 0,1% - não é significativa. A tabela 2 contém a composição típica que Gonçalves (1997) considera ser aplicável a esgotos sanitários. 16

28 Tabela 2: Composição típica de esgotos sanitários (GONÇALVES, 1997, p. 23). CONSTITUINTES Concentrações (em mg/l, onde não indicados) Forte Médio Fraco 1 Sólidos Totais Dissolvidos totais Fixos Voláteis Suspensos totais Fixos Voláteis Sólidos sedimentáveis (ml/l) DBO 5, 20ºC Carbono Total (TOC) DQO Nitrogênio Total (como N) Orgânico Amônia livre Nitritos Nitratos Fósforo total Orgânico Inorgânicos Cloretos Alcalinidade (como CaCO 3 ) Graxa Na ausência de determinações diretas, deve-se adotar os valores clássicos determinados por Fair e Geyer, isto é, 54 g.dbo/ hab.dia. Quanto a matéria sólida, adota-se valor de 90 g.ms/ hab.dia (JORDÃO, PESSÔA, 1995). A tabela 3 indica os valores típicos de parâmetros de carga orgânica nos esgotos domésticos, de acordo com Jordão e Pessôa (1995). 17

29 Tabela 3: Valores típicos de parâmetros de carga orgânica (mg/l) no esgoto (JORDÃO, PESSÔA, 1995, p. 37). Condições de Forte Médio Fraco Parâmetros esgoto DBO, 5d, 20ºC Oxigênio Consumido O. C Oxigênio Dissolvido O. D Nitrogênio Total Nitrogênio Orgânico Amônia Livre Nitrito, NO 2 0,10 0,05 0 Nitrato, NO 3 0,40 0,20 0,10 Fósforo Total Orgânico Inorgânico Princípios do tratamento de esgotos Processos metabólicos Segundo Silva (1979, p. 9) o metabolismo nos microorganismos pode ser expresso por: Alimento + microorganismos + oxigênio maior número de microorganismos + resíduos nitrogenados + dióxido de carbono + água Este esquema demonstra, resumidamente, a atividade metabólica, onde o processo respiratório (consumo de oxigênio) fornece energia para os microorganismos se multiplicarem. Esta equação proposta por Silva (1979) pode ser aplicada tanto a organismos aeróbios quanto a anaeróbios. A diferença existente entre estes organismos é somente a fonte de oxigênio, já comentada neste capítulo. A seqüência metabólica para ambos é semelhante. 18

30 2.6.2 Oxidação Aeróbia da matéria orgânica O metabolismo bacteriano não deve ser visto somente da maneira simplificada como exposto no item anterior. Ele é composto por duas partes: anabolismo e catabolismo. Silva (1979) define anabolismo (recomposição) como a parte metabólica utilizada na sintetização de novas células. O catabolismo (decomposição) é a parte metabólica que serve para conseguir energia. Indo além, Silva (1979, p.11) sugere as reações abaixo para os processos comentados, sendo que a Autólise faz parte do Catabolismo. Anabolismo: C x H y O z N + energia C 5 H 7 NO 2 bactérias (células de bactérias) Catabolismo: C x H y O z N + O 2 CO 2 + H 2 O + NH 3 + energia (matéria orgânica) bactérias Autólise: C 5 H 7 NO 2 + 5O 2 5CO H 2 O + NH 3 + energia bactérias Von Sperling (1996) ainda comenta que na etapa inicial anabolismo predominam as etapas de síntese, sendo que a matéria orgânica é utilizada para o metabolismo e crescimento dos microorganismos. O catabolismo predomina quando a quantidade de substrato no meio é pequena. Nesta etapa do processo metabólico, a fonte de alimento passa a ser o próprio material celular (respiração endógena). Pode-se notar, pelas reações apresentadas, que a matéria orgânica, basicamente, está sendo transformada a produtos inertes (como o gás carbônico - CO 2 - e a água - H 2 O), além de energia para seu metabolismo. 19

31 2.6.3 Digestão Anaeróbia Quase a totalidade dos processos biológicos utilizados em tratamento de esgotos domésticos passam por uma fase anaeróbia. O lodo, segundo Silva (1979) é decomposto em dois estágios por grupos de bactérias anaeróbias distintos. Primeiramente ocorre a transformação da matéria orgânica em ácidos graxos, principalmente o ácido acético. Em seqüência, ocorre a transformação destes ácidos em metano. As equações abaixo mostram a decomposição do ácido aminoácido cisteína (SILVA, 1979, p. 12) 4C 3 H 7 O 2 NS + 8H 2 O (cisteína) 4CH 3 COOH + 4CO 2 + 4NH 3 + 4H 2 S + 8H (ácido acético) 4CH 3 COOH + 8H 5CH 4 + 3CO 2 + 2H 2 O (ácido acético) (metano) De maneira um pouco mais simplificada, Von Sperling (1996, p. 98) sugere a seguinte reação para conversão da matéria orgânica por digestão anaeróbia: C 6 H 12 O 6 3CH 4 + 3CO 2 + energia Observa-se que a matéria orgânica é transformada, basicamente em metano (CH 4 ) e gás carbônico (CO 2 ), com liberação de energia (inferior à do processo aeróbio). O simples fato do metano ser transferido para a atmosfera já garante uma remoção da matéria orgânica. Entretanto, o carbono existente no metano encontra-se em seu estado mais reduzido (-4) e pode ser oxidado. Deve-se estar atento a risco como explosão por combustão do metano. Silva (1979, p. 13) ainda acredita que o ph do lodo deve ser mantido maior do que 7; um valor do ph próximo de 6 indica um iminente fracasso do processo. 20

32 2.6.4 Nitrificação e Desnitrificação Conceitua-se nitrificação quando ocorre a oxidação biológica da matéria nitrogenada, transformando-a em nitrato. A uréia, uma das principais fontes de nitrogênio em despejos domésticos, é rapidamente hidrolizada, e transforma-se em amônia. E é a partir desta amônia que o processo de nitrificação pode ocorrer. Von Sperling (1996, p. 99) afirma que a transformação da amônia em nitritos e destes em nitratos, obedece as reações apresentadas: Nitritação: 2NH 4 + -N + 3O 2 2NO 2 - -N + 4H + + 2H 2 O Nitrosomonas Nitratação: 2NO 2 - -N + O 2 2NO 3 N Nitrobacter Destas reações pode-se concluir que a nitrificação demanda uma quantidade de oxigênio, e em seu processo há uma liberação de H +. Esta liberação do íon H + consome alcalinidade do meio, por conseguinte aumenta a acidez e reduz o ph. Desnitrificar significa converter nitratos a nitrogênio gasoso. Isto ocorre quando não há presença de oxigênio (condição anóxica). Nesta condição, os nitratos são utilizados pelos microorganismos como o aceptor de elétron, ao invés do oxigênio e apresenta a seguinte reação (VON SPERLING, 1996, p.101): 2NO 3 - -N + 2H + N 2 + 2,5O 2 + H 2 O Da reação apresentada, conclui-se que a matéria orgânica pode ser estabilizada utilizando o oxigênio da reação de desnitrificação, às custas do consumo de H +, implicando na diminuição da alcalinidade. 21

33 Em resumo, a seqüência esperada em um sistema de tratamento, no que diz respeito a transformação da amônia e a desnitrificação, quando houver, é a seguinte: Amônia Nitrito Nitrato Nitrogênio gasoso 2.7 Tipos de tratamento Classificação das etapas de tratamento Em estações de tratamento de esgoto sanitário, é comum que se divida as etapas do sistema. Jordão e Pessôa (1995), Gonçalves (1997), Macintyre (1996) e Netto (1977) estes dois últimos com ressalvas, comentadas mais abaixo classificam as etapas em tratamento preliminar, tratamento primário, tratamento secundário e tratamento terciário. Sistemas de tratamento preliminar compreendem as atividades destinadas a remoção de sólidos grosseiros, areias, graxas e óleos. Nesta classe estão situados tanques de retenção, grades e caixas de areia Sistemas de tratamento primário compreendem as atividades de decantação, flotação e digestão de sólidos. Nesta classe situam-se decantadores primários, tanques de flotação e digestores primários do lodo. Sistemas de tratamento secundário compreendem as atividades que visam a diminuição dos contaminates biológicos. Desta caterogia, estão presentes os filtros biológicos, reatores de lodos ativados, decantação secundária e lagoas de estabilização. Sistemas de tratamento terciário compreendem atividades complementares ao tratamento secundário, como remoção de nutrientes, desinfecção e remoção de complexos orgânicos. São previstos em estações que necessitem um alto grau de tratamento de efluente final. Nesta classe, situam-se os cloradores e ozonizadores, 22

34 processos de remoção de nutrientes e lagoas de maturação. Nesta divisão, apresentada (tratamento preliminar, primário, secundário e terciário) pelos autores citados, existem 2 pequenas divergências. Macintyre (1996) acredita que os tratamentos preliminares, como o gradeamento, façam parte de sistemas de tratamento primário. Apesar do autor classificar esta etapa como tratamento preliminar, assim como os demais autores mencionados, ele sugere que este tipo de tratamento esteja englobado nos sistemas primários. Netto (1977) propõe um desmembramento de sistemas de tratamento terciário em: tratamento terciário e desinfecção; sendo que esta última é tratada pelos demais autores como sendo parte integrante de um tratamento terciário. Existe também a classificação dos processos de tratamento em físicos, químicos e biológicos. Processos onde há predominância de atividades de decantação, filtração, incineração, diluição ou homogeneização podem ser classificados como processos físicos. A adição de elementos químicos caracteriza uma etapa química. Quando há necessidade da ação de microorganismos para que os processos possam ocorrer, chamase estes de biológicos Tanque Séptico (TS) Seguindo os padrões da classificação apresentada no item 2.7.1, pode-se dizer que o tanque séptico corresponde a um sistema de tratamento primário e físicobiológico (predominância da sedimentação do material sólido e digestão). Pela simplicidade de construção e manutenção é um sistema muito difundido, e está presente na maioria das estações de tratamento residenciais. Também é conhecido e tratado por alguns autores como Fossa Séptica (CREDER (1991), MACINTYRE (1996) e JORDÃO, PESSÔA (1995)), podendo ser definida como: Fossas Sépticas são câmaras convenientemente construídas para reter os despejos domésticos e/ou indústrias, por um período de tempo especificamente estabelecido, de modo a permitir sedimentação dos sólidos e retenção do material graxo contido nos esgotos, transformando-os, bioquimicamente, em substâncias e compostos mais simples 23

35 e estáveis. (JORDÃO, PESSÔA, 1995, p. 260) Princípios de funcionamento Os dois princípios básicos de funcionamento de um TS envolvem sedimentação e digestão do lodo. Além destes, no TS existem reações anaeróbias de estabilização da parte líquida, não tão importantes. Estas reações existem pois todo TS possui um tempo de detenção, e será durante este tempo que estas reações irão ocorrer. Tanto o lodo resultante da sedimentação das partículas sólidas quanto a escuma (material flutuante, formado por óleos e graxas) são atacados por bactérias predominantemente anaeróbias, oferecendo um melhor grau de tratamento do que um simples processo de sedimentação. Este processo oferece uma redução no volume de lodo, além de sua estabilização. Alguns cuidados devem ser tomados antes do lançamento do afluente no TS. A NBR 8160 (ABNT, 1999) exige o uso de caixas de gordura antes do TS. Muitas vezes, somente o Tanque Séptico não oferece um efluente final com características aceitáveis, que variam de acordo com o corpo receptor e a legislação vigente. A água residuária que sai do TS ainda possui mau cheiro, grande quantidade de sólidos e organismos patogênicos, além de alta quantidade de nutrientes e DBO Projeto do Tanque Séptico O dimensionamento do Tanque Séptico deve atender a disposição da Norma Brasileira NBR 7229 (ABNT, 1993). O TS pode possuir uma única câmara, câmaras em série, ou câmaras sobrepostas. Além disso, sua seção transversal pode ser retangular ou circular. No caso do formato retangular, a sua relação comprimento/largura deve estar compreendida entre 2:1 e 4:1. A altura está relacionada com o volume útil do tanque séptico, sendo que para volumes inferiores a 6000 litros, adota-se uma altura entre 1,2 e 2,2 metros. A normalização brasileira vigente relativa ao projeto de tanque séptico considera os seguintes parâmetros no seu dimensionamento: 24

36 a) Número de pessoas a serem atendidas: é o número de pessoas que habitam o local. Entretanto, há possibilidade de variação do número de ocupantes em qualquer residência. Em virtude disso, a NBR 7229 (ABNT, 1993) adotou os seguintes padrões: i) 2 pessoas por quarto, exceto quarto de empregada; ii) 1 pessoa por dependência destinada à empregada doméstica. b) Contribuição de despejos: é a contribuição diária, por habitante, de esgoto. Está relacionado com o padrão da edificação. A norma (ABNT, 1993) sugere os seguintes padrões: i) Residência padrão baixo: 100 litros/pessoa.dia ii) Residência padrão médio: 130 litros/pessoa.dia iii) Residência padrão alto: 160 litros/pessoa.dia c) Período de detenção de despejos: é o período em que o esgoto fica retido no tanque séptico. Ele varia de acordo com o volume de contribuição diária de despejos: i) Até 1500 litros de contribuição diária: período de detenção de 1 dia; ii) De 1501 a 3000 litros de contribuição diária: período de detenção de 0,92 dias. d) Contribuição de lodo fresco: representa a contribuição de lodo fresco por pessoa em um dia. A NBR 7229 (ABNT, 1993) especifica como sendo igual a 1 litro por pessoa por dia, para ocupantes permanentes (aplicável a qualquer residência). e) Taxa de acumulação total de lodo: representa a taxa de acumulação de lodo em dias, e está relacionada com o intervalo de limpeza do tanque séptico e com a média da temperatura ambiente do mês mais frio, onde o tanque opera. Para Florianópolis, é aconselhável utilizar-se o intervalo situado entre 10 e 20ºC como adequado a representar a média de temperatura do mês mais frio. A normalização brasileira sugere os seguintes valores para taxa de acumulação de lodo: 25

37 i) Intervalo entre limpezas de 1 ano (10ºC t 20ºC):taxa de acumulação de lodo de 65 dias; ii) Intervalo entre limpezas de 2 anos (10ºC t 20ºC):taxa de acumulação de lodo de 105 dias; iii) Intervalo entre limpezas de 3 anos (10ºC t 20ºC):taxa de acumulação de lodo de 145 dias; iv) Intervalo entre limpezas de 4 anos (10ºC t 20ºC):taxa de acumulação de lodo de 185 dias; v) Intervalo entre limpezas de 5 anos (10ºC t 20ºC):taxa de acumulação de lodo de 225 dias Eficiência Em seu livro, Macintyre (1996) sugere, para uma instalação de TS bem projetada e construída, as seguintes eficiências: a) Remoção de sólidos em suspensão 50 a 70% b) Redução de bacilos coliformes 40 a 60% c) Redução da DBO 30 a 60% d) Remoção de graxas e gorduras 70 a 90% Jordão e Pessôa (1995) acreditam que a remoção dos sólidos em suspensão, por sedimentação, está em torno de 60%. Esta sedimentação forma, no fundo do tanque, uma substância semilíquida denominada de lodo. A norma vigente relacionada ao projeto de TS (NBR 7229) sugere a utilização de câmara múltiplas para maior eficiência no tratamento Operação e manutenção A NBR 7229 (ABNT, 1993) estabelece que o tempo de limpeza dos tanques sépticos deve ser o mesmo previsto em projeto, mas faz uma ressalva, permitindo o aumento ou uma diminuição no intervalo caso ocorram variações nas vazões previstas. 26

38 Ela ainda exige que a limpeza do TS, quando necessária, não seja completa; deve-se deixar cerca de 10% do volume de lodo existente. Antes de qualquer operação no interior dos tanques, deve-se deixar sua tampa aberta por no mínimo 5 minutos, prevenindo o risco de explosões e intoxicação proveniente dos gases do TS Observações gerais Seguindo as recomendações encontradas na NBR 7229, deve-se estar atento a algumas informações: a) Respeitar distâncias mínimas de 1,5 metros de construções, limites do terreno, ramal predial de água e sumidouro; b) Respeitar distâncias mínimas de 3 metros de árvores e demais pontos de rede pública de água; c) Respeitar as distâncias mínimas de 15 metros de poços freáticos e corpos d água; d) O tanque séptico deve ser construído de forma que possua resistência mecânica, química e seja impermeável; e) A tubulação de entrada e saída deverão possuir formato de T, sendo que a tubulação de saída deverá estar imersa em um terço da altura útil do tanque. A tubulação de entrada estará imersa 5 centímetros a menos que a tubulação de saída Filtro Biológico Anaeróbio (FAN) O filtro anaeróbio é uma unidade destinada ao tratamento de esgoto, mediante afogamento do meio biológico filtrante (NBR 7229, 1993, p. 2). Seguindo os padrões da classificação apresentada no item 2.7.1, pode-se dizer que o filtro anaeróbio representa um sistema de tratamento secundário e físico-biológico. É de grande utilidade em projetos que requerem um melhor grau de tratamento que o simples uso de tanque séptico seguido de infiltração no solo. 27

39 Princípios de funcionamento O FAN é caracterizado por um tanque preenchido por um material filtrante, geralmente pedra britada. Os microorganismos aderidos às paredes deste material filtrante formam o biofilme que, ao receberem os despejos contendo matéria orgânica, iniciam o processo de digestão anaeróbia. Para tal, agem as bactérias anaeróbias, conforme as reações apresentadas no item Projeto do Filtro Anaeróbio O dimensionamento do filtro anaeróbio deve seguir as recomendações da NBR (ABNT, 1997). No município de Florianópolis, o órgão fiscalizador, a Vigilância Sanitária desta cidade, faz algumas exigências além das descritas na normalização brasileira, conforme normativa interna 001/2003, apresentado no Anexo B deste trabalho. A normalização brasileira (ABNT, 1997) considera como parâmetros para dimensionamento o número de pessoas a serem atendidas, a contribuição de despejos e o período de detenção de despejos. Os dois primeiros seguem o mesmo padrão do apresentado no Tanque Séptico item enquanto o período de detenção de despejos sofre alteração com relação à norma referente a Tanque Séptico (ABNT, 1993). Na NBR (ABNT, 1997), as faixas de temperatura uma variável na determinação do tempo de detenção são diferentes. Alguns dos valores sugeridos são: a) Até 1500 litros de contribuição diária e 15ºC t 25ºC: período de detenção de 1,00 dia b) De 1501 a 3000 litros de contribuição diária e 15ºC t 25º: período de detenção de 0,92 dias; O formato adotado nos tanques retangulares deve seguir a relação 2:1, referenciada na normativa interna nº001/2003, presente no anexo B deste trabalho. A relação 2:1 se refere às dimensões internas, incluindo a canaleta receptora, conforme indicação em consulta a Vigilância Sanitária de Florianópolis (VIGILÂNCIA 28