A PERCEPÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA NA ESFERA DO RGPS E AS IMPLICAÇÕES FRENTE À INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL

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1 UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC CURSO DE DIREITO KARLA RABELO CREMA A PERCEPÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA NA ESFERA DO RGPS E AS IMPLICAÇÕES FRENTE À INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL CRICIÚMA, DEZEMBRO DE 2009

2 KARLA RABELO CREMA A PERCEPÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA NA ESFERA DO RGPS E AS IMPLICAÇÕES FRENTE À INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL Monografia apresentada ao curso de Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador(a): Geralda Magella de Faria Rossetto CRICIÚMA, DEZEMBRO DE 2009.

3 2 KARLA RABELO CREMA A PERCEPÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA NA ESFERA DO RGPS E AS IMPLICAÇÕES FRENTE À INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL Monografia apresentada ao curso de Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Criciuma, 09/12/2009 Banca Examinadora Profª Geralda Magella de Faria Rossetto - Especialista UNESC - Orientadora Profª Lurdes Rosa Spiazzi Fabris - Especialista - UNESC Profª Renise Terezinha Melilo Zaniboni - Especialista- UNESC

4 3 Dedico este trabalho aos meus pais; à minha mãe pela tolerância e compreensão nos momentos de dificuldade e ao meu pai que não mediu esforços para me dar as bases para me tornar a pessoa que sou hoje

5 4 AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus pelo dom da vida e pelo privilégio de desfrutar estes intensos momentos de aprendizado. Aos meus pais, que são a minha vida, a quem eu amo incondicionalmente e sou grata pelo empenho e dedicação para que eu chegasse até aqui, pois eles são a razão pela qual pude concluir este trabalho, sempre me dando força para que não desistisse e ao meu amado Mateus por ter se mostrado um excelente companheiro, ter sido paciente e por ter compreendido as ausências freqüentes em função deste estudo. Em especial, a minha orientadora Profª Geralda Magella de Faria Rossetto, pelo auxílio e presteza na normatização e discussões sobre o andamento do trabalho sempre de forma extremamente amiga e competente afim de não deixar dúvida sobre o tema estudado. As minhas amigas Elen e Ana Paula, por terem ajudado na correção metodológica e gramatical e às amigas Lidiani, Liliani e Regiani, amigas de sala que sinto saudades, pois já se formaram, que sempre estiveram presentes me incentivando e apoiando constantemente. As Galáticas, minhas amigas do coração, por terem entendido o meu mau humor, cansaço e desespero nas vezes que nos encontramos. Aos demais colegas de curso, pela grande experiência vivida. E a todas as demais pessoas que de forma direta ou indireta, contribuíram para que este trabalho tomasse este corpo.

6 5 A regra da igualdade não consiste se não em aquinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que sejam desiguais. Nessa desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. Tratar como desiguais a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. (Rui Barbosa)

7 6 RESUMO O presente estudo objetiva examinar a percepção do auxílio-doença na esfera do RGPS e suas implicações frente à inexistência de contribuição social. Utilizou-se para este fim o método dedutivo, abrangendo a pesquisa de livros, artigos, doutrinas legislação e jurisprudências, na qual se chegou à conclusão de que, a hermenêutica jurídica entende que o período de recebimento do auxílio-doença independentemente da não contribuição previdenciária, a de ser considerado como tempo de contribuição. O posicionamento jurisprudencial a respeito da matéria é divergente de tal forma que os Tribunais pátrios consideram (ou não) esse período para efeito de carência. Palavras chave: Percepção. Auxílio-doença. Implicações. Não contribuição social. Tempo de contribuição.

8 7 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Alterações da Emenda Constitucional nº. 20 de 1998 na Constituição da República Federativa do Brasil de Quadro 2 - Carência por tempo de serviço para aposentadoria por idade

9 8 LISTA DE SIGLAS CAP - Caixa de Aposentadoria CCIR - Certificado de Cadastro de Imóvel Rural CNIS- Cadastro Nacional de Informações Sociais CPF - Cadastro de Pessoa Física CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas CRFB/88 - Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CTPS - Carteira de Trabalho de Previdência Social DAP - Declaração Anual de Produtor DNOCS Departamento Nacional de Obras Contra as Secas FGTS- Fundo de Garantia por tempo de serviço FUNAI - Fundação Nacional do Índio FUNRURAL - Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural IAPAS - Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social IAPB - Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Bancários IAPC - Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Comerciários IAPETC - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Empregados em Transportes de Cargas IAPI - Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Industriários IAPM - Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Marítimos IBAMA- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis IGP-M - Índice Geral de Preços do Mercado INAMPS - Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INPS - Instituto Nacional de Previdência Social ITR - Comprovante de Cadastro do Instituto Territorial LBA - Legião Brasileira de Assistência LOPS - Lei Orgânica da Previdência Social NIT - Número de Identificação do trabalhador OGMO - Órgão Gestor da mão-de-obra do Trabalho OIT - Organização Internacional do Trabalho ONU - Organização das Nações Unidas

10 9 RPS - Regulamento da Previdência Social RGPS - Regime Geral de Previdência Social SINPAS - Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social SUDEPE - Superintendência do Desenvolvimento da Pesca STF- Supremo Tribunal Federal TST Tribunal Superior do Trabalho TNU - Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais

11 10 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO DA SEGURIDADE SOCIAL: CONSIDERAÇÕES E DESDOBRAMENTO HISTÓRICO Surgimento da Previdência Social: expansão geográfica Surgimento da Previdência Social: expansão nacional Constituição Política do Império do Brazil de Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de Constituição dos Estados Unidos do Brasil de Constituição dos Estados Unidos do Brasil de Constituição da República Federativa do Brasil de Emenda constitucional nº. 1 de Constituição da República Federativa do Brasil de Da seguridade social DOS PRINCÍPIOS, DOS BENEFICIÁRIOS SEGURADOS E DAS PRESTAÇÕES NA DIMENSÃO DO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL Princípios Dos beneficiários segurados do RGPS Dos segurados obrigatórios Dos segurados facultativos Das prestações do RGPS Dos benefícios Do serviço social Quanto à habilitação e reabilitação profissional A PERCEPÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA NA ESFERA DO RGPS E AS IMPLICAÇÕES FRENTE À INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL Requisitos Da repercussão do auxílio-doença no contrato de trabalho Do cálculo do benefício Da contribuição dos segurados

12 Efeitos da inexistência de contribuição no período de gozo de auxíliodoença Da contagem do período de recebimento de auxílio-doença como tempo de contribuição Exame jurisprudencial CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS ANEXOS ANEXO A Carência por tempo de serviço para aposentadoria por idade Lei nº 8.213/

13 12 1 INTRODUÇÃO Este trabalho tem por objetivo identificar quais são os beneficiários do Regime Geral da Previdência Social que tem direito a receber o benefício auxíliodoença, bem como estudar a sua percepção, seus efeitos jurídicos e suas implicações no que tange a não contribuição previdenciária quando se está em gozo deste benefício. Isso porque, quando o beneficiário segurado está recebendo este benefício não está vertendo contribuição social para a Previdência Social. A partir deste viés, se faz necessário estudar este benefício com mais profundidade, utilizando-se para isso, de vasto acervo bibliográfico como: a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, legislação atual vigente que especifica a matéria a ser tratada, os ensinamentos trazidos pelos mais diversos doutrinadores, súmulas e por fim jurisprudências. A Previdência Social é um ramo da Seguridade Social que visa amparar seus beneficiários quando encontrarem-se frente a situações que os tornem incapazes para o trabalho. Assim sendo, ao iniciar este estudo é imprescindível que se faça um breve relato sobre o desdobramento da Seguridade Social a partir de sua expansão geográfica em países alienígenas e Brasil, trazendo em seu bojo a sua evolução frente às Constituições que vigeram no país e a atual vigente, pois como será observado, a Seguridade Social foi a mola propulsora para diversas manifestações com o intuito principal de criar a Previdência Social. Destarte, serão observados os beneficiários, que de acordo com as disposições da lei, são àqueles que podem auferir o benefício auxílio-doença, além de uma exposição sucinta dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social e suas peculiaridades. Por fim será dada ênfase ao benefício auxílio-doença, na qual serão apresentados com base na legislação e doutrina: seu conceito, requisitos para a sua concessão cominada com demais peculiaridades bem como as implicações geradas pela não contribuição previdenciária quando se está gozando deste benefício, este último também será abordado por meio de análise de decisões jurisprudências.

14 13 Diante do exposto, o problema da pesquisa fica assim configurado: Quais são os efeitos jurídicos para quem está recebendo auxílio-doença e, portanto não está a verter contribuições sociais? O Objetivo geral deste trabalho é examinar a percepção do auxílio-doença do RGPS face às implicações da inexistência de contribuição social. Quanto aos objetivos específicos, tem-se: estudar o desenvolvimento histórico da Previdência Social na dimensão das Constituições Brasileiras; identificar quais os beneficiários da Previdência Social juntamente com os benefícios e serviços a eles conferidos, em especial o auxílio-doença, destacando os requisitos exigidos e suas implicações; analisar o auxílio-doença frente à inexistência de contribuição social e seus efeitos jurídicos.

15 14 2 DA SEGURIDADE SOCIAL: CONSIDERAÇÕES E DESDOBRAMENTO HISTÓRICO A seguridade social é composta por normas e instituições que visam em conjunto planejar formas de proteção social contra eventos fáticos da vida que coloquem o indivíduo e sua família em situação de risco por não conseguir prover a satisfação das suas necessidades básicas. Neste sentido Martins (2003) preleciona que a Seguridade Social é movida por iniciativa dos Poderes Públicos e de toda a sociedade, que tem por objetivo garantir os direitos à saúde, à previdência e à assistência social. A proteção social nada mais é do que meios utilizados para proteger o ser humano de danos provenientes de riscos. Martinez (2001, p. 51) define que Proteção quer dizer prevenção, cuidado, defesa, atuação conducente a evitar danos à pessoa, mas também o atendimento de necessidades de variada gama, sendo a proteção social resultado de uma ação entre pessoas que movidas pela solidariedade se sentem motivadas pelo resultado de tamanha generosidade. Os eventos fáticos são acontecimentos que trazem risco ao ser humano. Coimbra (2001) assevera como um acontecimento imprevisível e distante cuja identificação não depende do desejo do segurado. Assim sendo, o ser humano está condicionado ao evento risco, cuja variante é o fato de ocorrer ou não o evento capaz de fazer o mesmo sofrer um dano que pode vir a ser reparável ou não. Reparável, pois existem danos capazes de serem ressarcidos por ato humano aplicado a uma conduta em que o direito reprove, mas também existem eventos que causam danos dos quais o próprio direito não admite reparação. Um evento que traz como conseqüência a perda da sua renda que é importante para sua mantença, é considerado um evento reparável. Portanto, como alude Coimbra (2001), nem todo infortúnio é considerado um evento reparável, quando se trata de amparo, devido ao fato de o dano, instrumento da proteção social, advir de perda total ou parcial de renda familiar, o que gera a necessidade, podendo ser reparado por ação estatal. Sendo assim, quando a pessoa sofre um prejuízo cuja causa não é relativa à perda total ou em parte de sua renda, fato gerador da necessidade, não

16 15 está sujeita a reparação. O artigo 1º da Lei nº /91, instituiu que A Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinado a segurar o direito relativo à saúde, à previdência e à assistência social. Partindo-se do preâmbulo do que significa a seguridade social, temos que a Previdência Social nada mais é do que um ramo dela, cuja finalidade, na lição de Oliveira (2003, p. 27) é [...] assegurar a seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, idade avançada, tempo de serviço, desemprego involuntário, encargos de família e reclusão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente. Entretanto, cuida este ramo da seguridade social, de prover meios para eventos em que o trabalhador não possa mais por intermédio do labor, sustentar a si e a sua família. Castro e Lazzari (2006) arrolam que a previdência visa proteger aquele que labora mediante remuneração, contra riscos que decorram de perda ou redução temporária ou permanente para desempenhar atividades que garantam seu próprio sustento, sendo este um seguro social que se traduz na relação existente entre o segurado da previdência e o ente segurador. Todavia, o fato da pessoa ficar temporariamente incapaz de desenvolver seu trabalho, o tornará beneficiário da Previdência Social. Neste sentido, o artigo 1º da Lei nº /91 traz que: A Previdência Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente. Portanto, a Previdência Social é um campo da seguridade social cuja preocupação fica restrita a situações que por lei, são situações de risco e que por dever obrigam o Estado a amparar o indivíduo e sua família, como sendo um direito desses quando passarem por momentos difíceis na suas vidas. A contribuição mensal para se ter direito a este benefício, é qualidade impreterível, o que difere este benefício dos demais ramos da seguridade social. Entretanto, a previdência social, é um seguro destinado a quem contribui de forma compulsória cujo fim é atender contingentes, bem como a incapacidade,

17 16 desemprego, idade avançada, tempo de contribuição, encargos de contribuição, prisão e morte. (TAVARES, 2005) Os incisos do artigo 201 da CRFB/88 (Constituição de República Federativa do Brasil de 1988) listam os eventos no qual o beneficiário será amparado, são eles: [...] I cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; II proteção à maternidade, especialmente à gestante; III proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; IV salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; V pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no 2º. [...] Ser solidário é qualidade da Previdência Social uma vez que envolve a contribuição vertida por todos e que será destinada àquele que necessite. Neste sentido, Martins (2004, p. 299) cita a Previdência Social como [...] uma forma de assegurar ao trabalhador, com base no princípio da solidariedade, benefícios ou serviços quando seja atingido por uma contingência social. Contudo, em um dado momento todos contribuem, porém, em outro, todos se beneficiam da contribuição coletiva. Destarte, conceitua Gonçales (1993, p. 23), que a solidariedade social [...] retrata a situação das pessoas mais abastadas em relação aos mais empobrecidos; os mais capazes contribuem com parcela maior, em favor daqueles menos capazes [...]. Todavia, contribuir para a Previdência Social não significa apenas contribuir para ser amparado em caso de contingência ocorrida consigo, mas também para eventos maléficos ocorridos com outras pessoas que também vertem contribuição. Ainda neste sentido, o caput do artigo 195 da CRFB/88, registra que: A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais. Todavia, quem verte contribuição fazendo o Estado funcionar, a fim de ser amparado pela Previdência Social, somos todos nós, direta ou indiretamente. (BORGES, 2003) Tendo por vista o significado e objetivo da Previdência Social como ramificação da seguridade social e suas determinações legais, surge o interesse de

18 17 identificar o exato momento em que houve manifestação do homem em se preocupar com a sua proteção e de outrem e as formas que utilizou para este efeito com o passar dos tempos. Neste sentido, cita o ilustre doutrinador Balera (1989 apud PEREIRA JUNIOR, 2004) que Não se tem dúvida que o exame do passado pode fornecer valiosos mecanismos para uma melhor interpretação, ainda que se tenha por exame uma nova ordem jurídica constituída. 2.1 Surgimento da Previdência Social: expansão geográfica Seu surgimento está ligado com o começo e evolução da humanidade, uma vez que, desde seu início, encontram-se indícios de que o homem sempre lutou para garantir o dia de amanhã, seja guardando ou poupando alimento para um momento de escassez, ou se abrigando em cavernas para se proteger da vida selvagem. Especula-se o exato momento em que o homem invocou o primeiro gesto com relação a sua proteção. Martinez (2001) deduz que este momento tenha ocorrido há aproximadamente cinqüenta mil anos atrás, desde os tempos em que o homem se abrigava nas cavernas e usava do artifício de congelar a carne para uma eventual escassez. Portanto, seu início está ligado ao surgimento do homem, pois é da sua natureza invocar meios para que possa garantir a sua sobrevivência e de outrem, sendo para tanto uma preocupação em se ter prudência com um futuro incerto. Seguindo este entendimento, Borges (2003, p. 23) cita que A previdência é uma decorrência da necessidade atávica que o homem possui de se preocupar com o porvir, com o amanhã [...]. As formas que o homem se utilizava para sobreviver em tempos préhistóricos, não trazem verdadeiros mecanismos de proteção social, porém já se evidenciava certa preocupação com o seu estado de bem-estar social. Foram os livros sagrados, como o Talmud e o código de Hamurabi de Manu e Doze Tábuas, as ordenações que deram início aos meios de proteção frente a eventos de risco. (PEREIRA JUNIOR, 2004)

19 18 Entretanto, desde seu surgimento, o ser humano tem se preocupado com o momento em que se torna inútil para o trabalho, sendo impossível sua mantença por si só. Baseado nessa busca constante pelo seu bem-estar que em vários momentos do desenvolvimento da humanidade, é notório o seu envolvimento visando a sua proteção e de seus familiares. Para Borges (2003) as primeiras civilizações com estrutura organizada, com a presença do trabalhador foram a dos arquitetos, artesãos, porém os que mais faziam uso da força para o trabalho eram os escravos. Este último não era considerado igual ao seu senhor, que não só o comprava para ser seu proprietário, mas para trabalhar para ele em troca de miséria. A desigualdade era imensa, o tratamento era desumano, pois trabalhavam em péssimas condições ora vista que sua casa era a senzala junto com os outros escravos. Rocha e Baltazar Junior (2000) asseveram que os escravos, juntamente com os servos e colonos quando atingidos por contingências eram amparados pelos seus proprietários ou seu senhor. Como se não bastasse, eles não eram responsáveis por si, mas seu proprietário que pouco se importava com as condições em que viviam mesmo sabendo que eles representavam à força humana que seu proprietário precisava. A partir de então é notório que ao mesmo tempo em que pessoas se organizavam para se ajudarem através da reciprocidade é evidenciada a desigualdade humana, hoje considerada uma afronta aos direitos humanos. Para Moraes (1984 apud CASTRO e LAZZARI, 2006) são considerados direitos fundamentais, os Direitos Sociais, sendo importante o monitoramento no Estado Social de Direito, uma vez que melhores condições de vida para os hipossuficientes e a igualdade são suas finalidades. Destarte, mesmo sabendo que todos são iguais em direitos e deveres e que a vida é o bem mais valioso que temos, é identificada a mais primitiva forma de desigualdade que ia além da dignidade pessoa humana. Tal afirmativa é traduzida por Rocha e Baltazar Junior (2000, p. 28) ao inscreverem que Em todo esse período histórico, porém, nem todos os homens eram considerados cidadãos.

20 19 Na vida familiar denota-se a preocupação de um pai com o filho, que inicia desde o seu nascimento quando este é amparado por aqueles que os protegem dando abrigo, alimentação e educação. Contudo, foi o mutualismo existente entre os componentes da entidade familiar o marco que deu partida na preocupação da proteção social. (OLIVEIRA, 2006) Assim sendo, o marido e a esposa juntamente com seus filhos providenciavam meios para os que não tinham mais condições de exercer suas funções. Neste sentido Russomano (1979 apud ROCHA; BALTAZAR JUNIOR, 2000) reconhece que o registro do mutualismo ocorreu quando pessoas ligadas pelo mesmo ofício resolveram ajudar seus membros através da ajuda recíproca em ocasiões de relevante necessidade. Todavia, o mutualismo nada mais é do que o sentimento de caridade aflorado em um aglomerado de pessoas que prestam assistência a quem precisa. Borges (2003) assevera que o mutualismo foi evidenciado nas associações da Grécia Antiga, onde estes mantinham uma parte de seu rendimento proveniente de seu esforço, no qual serviria para dar assistência aos velhos e doentes que também estivessem associados. Para este mesmo autor, em Roma, também houve indícios do mutualismo, representado por caixas de pecúlio, que serviam para cobrir os soldados em caso de guerra, sendo que em ambas as sociedades, grega e romana, a contraprestatividade era essencial e o evento no qual o benefício iria cobrir também era pré-definido. Destarte, não é estranha a constante evolução e expansão da mutualidade. Evolução, pois passou do âmbito familiar para os demais campos, como o da classe trabalhadora; expansão, pois a partir da necessidade de ajuda mútua, vários países foram absorvidos por este sistema de solidariedade e caridade de uns para com os outros. Foi a partir de então que o mutualismo expandiu-se por outros países, entre eles destacam-se a Grécia, Roma, Índia e Egito. Russomano (1979 apud MARTINEZ, 2001) deduz a probabilidade de haverem na Índia, associações com finalidades assistenciais, bem como no Egito, entre pastores, soldados, barqueiros e agricultores.

21 20 Com o surgimento da burguesia começaram as trocas de mercadorias e conseqüentemente o comércio, que visava lucro e necessitava da força humana para produzirem suas mercadorias. Coimbra (2001) descreve que, foi na Idade Média, com a circulação de mercadorias devido às trocas de produtos, que surgiu o comércio, tornando as cidades, verdadeiras concentrações urbanas que, por conseqüência enalteceram o trabalho para outros campos diferentes do trabalho servil. Embora o surgimento da burguesia tenha aumentado à civilização, maior deveria ser a preocupação com o bem-estar social, pois maior seria a necessidade de uma melhor qualidade de vida agora que a população se tornava maior, e, como conseqüência desta a acirrada procura por emprego juntamente com um número cada vez maior de pessoas desempregadas. Mas isso não ocorreu, pois naqueles tempos, início do Estado Liberal, a preocupação com o risco não era ainda de relevante importância social, a preocupação era baseada na prevalência das garantias do indivíduo, seja ela a igualdade, propriedade, liberdade e legalidade. (BORGES, 2003) A Igreja Católica, na época medieval já tinha forte influência na política, pois representava os interesses do Estado. Mormente, como preleciona Pereira Junior (2004), com o firmamento dos seus dogmas a Igreja passou a não só acalmar a alma dos cidadãos, mas a influenciar a vida política dos mesmos. Contudo, ainda eram muitas as pessoas inválidas, incapazes para o trabalho sem condições de se manterem, ocasião que resultou um aumento no número de mendigos que ficavam vagando pelas ruas, praticando o roubo e gerando o aumento da criminalidade. Este momento foi muito propício para o surgimento de grandes famílias, ou seja, com muitos filhos, que mais tarde teriam que sustentar seus pais. Mas, como o feudalismo ainda era presente nesta época, foram os senhores feudais que gostaram do surgimento dessas famílias volumosas, visto que, agora todos trabalhariam para uma mão-de-obra barata. (BORGES, 2003) Mediante a constante violação da paz pelos mendigos, foi publicada a Lei dos Pobres, como tentativa de reduzir a criminalidade por intermédio da prática assistencial. Oliveira (2006) menciona que a chamada lei dos pobres, conhecida como Poor Relief Act, editada em 1601, foi o marco em matéria de assistencialismo, dando

22 21 surgimento à contribuição compulsória com o objetivo principal de amparar pessoas carentes. Para Martins (2003), diante desta lei, os mendigos receberiam assistência da paróquia. Em cada comarca, os juízes poderiam editar leis definindo um imposto que seria vertido por quem usasse terras ou até mesmo as ocupassem além de serem definidos encarregados que iriam não só arrecadar o imposto, mas também aplicá-lo. Evidencia-se a real preocupação da igreja com o ser humano ao impor através da lei dos pobres a arrecadação de parte da renda das pessoas que possuíssem terras ou que simplesmente se ocupassem delas a fim de dirimir os problemas sociais. Quanto à finalidade do valor contribuído, para Pereira Junior (2004), seria destinado a tornar acessível por meio dos ensinamentos, o surgimento de emprego para crianças carentes sendo que, até os 24 anos de idade poderia ser obrigatório para os varões e até os 21 anos de idade para as mulheres, além de ensinarem pessoas que sem especialidade não conhecessem o trabalho, utilizando-se para isso da aprendizagem e por fim atenderia pessoas inválidas. Sua publicação foi de fundamental importância, pois fez impulsionar a lenta evolução do sistema de proteção social diante da criação de benefícios que iriam atender necessidades de pessoas em momento de incapacidade. Diante de todos estes acontecimentos, o homem foi se tornando aos poucos o centro de seu habitat sendo delegado a ele princípios que garantissem seu bem-estar na vida social. Esta centralidade, para Rocha e Baltazar Junior (2000), surgiu com a Revolução Francesa, que foi uma tentativa de minimizar os problemas sociais. Ao ser humano foi denotada a centralidade, porém o Estado ainda não rezava garantia alguma, ficando sujeito à caridade alheia. No entanto, ele ainda estava submisso a um sistema que não eximia a dependência da beneficência alheia. Então, vários meios foram invocados com o objetivo de amenizar os problemas sociais aumentando o campo de cobertura dos benefícios. A Petition of Right de 1628, Hábeas Corpus de 1679 e Bill of Right de 1689 foram métodos que chegaram perto do pensamento liberal em favor dos direitos humanos na época. (PEREIRA JUNIOR, 2004)

23 22 Ocorre que, com a consolidação da economia em favor dos burgueses, explodiu a Revolução Industrial, momento em que o acesso à proteção social que já era restrito foi incapaz para suprir as necessidades que surgiram. (TSUTIYA, 2007) Isso aconteceu porque a Revolução Industrial ajudou a classe burguesa a ficar mais forte, colocando toda a força sobre seus trabalhadores que, eram explorados sem limites. Contudo, esses trabalhadores passaram a se reunir para garantir sua proteção através do seguro privado, sem qualquer movimento estatal. Completando, Oliveira (2006, p. 19) aduz que: Com o incremento das relações sociais, o trabalho, por conta alheia, passou a agregar novos grupos de pessoas que encontraram afinidades nas relações trabalhistas [ ] Estes, por temor e prevenção, desenvolveram um sistema assistencial próprio, pois sabiam que os riscos ergonômicos poderiam fazê-los vítimas de sinistros laborais. Neste caso, essas pessoas unidas por afinidade com relação ao trabalho passaram a trabalhar por conta própria e frente aos problemas sociais criaram um sistema próprio para eles com a finalidade de evitar serem vítimas de riscos laborais. Todavia, mesmo com a ajuda alheia, não houve evolução do sistema de proteção social, havendo muitas pessoas sem emprego e incapazes de manterem a si e a sua família. Persiani (1998 apud PEREIRA JUNIOR, 2004) aduz que, nem o meio de ajuda mútua entre pessoas de determinada classe, deu conta da extrema necessidade surgida naqueles tempos, uma vez que, o número de desempregados aumentou e o salário diminuiu. Com o salário baixo e o aumento do desemprego, somente a classe do proletariado cuja renda fosse alta conseguiria verter contribuição, pois quem não tinha condições nem para se manter jamais conseguiria contribuir para garantir sua proteção. Entretanto, tornou-se escasso o mutualismo, eram crianças e mulheres trabalhando com jornada de trabalho ilimitada e em condições insalubres, o que ocasionou o crescimento dos problemas sociais. (PEREIRA JUNIOR, 2004) Baseado nessa conjectura surge à idéia de que essas pessoas carentes só seriam beneficiadas pela caridade alheia, a não ser, assim como elucida Borges (2003), que as pessoas passassem por um processo da qual se tornassem menos egoístas, mostrando preocupação com a real situação social.

24 23 No meio de toda essa situação, surgem as primeiras Casas de Misericórdias, que incluíam os albergues, hospitais em geral, que ofereciam assistência médica. (MARTINEZ, 2001) A partir de então a classe trabalhadora se uniu para reivindicarem melhores condições de vida e garantia de amparo quando se tornassem incapazes para suas funções enaltecendo a intervenção do Estado na relação entre empregado e empregador. Contudo, Tsutiya (2007) menciona que, o intervencionismo começou a surgir em meio ao liberalismo quando, os trabalhadores em meio a um calvário, sem qualquer proteção passaram a reivindicar por melhores condições enquanto se tornavam presas fáceis do egoísmo dos capitalistas que se tornavam menos merecedores da proteção social. Surge então, o que para os marxistas é o socialismo científico, onde o fim do capitalismo está ligado à luta constante pelo fim da desigualdade entre o proletariado e o burguês. (BORGES, 2003) Todavia, acreditava-se que com o fim do capitalismo, que aumentou as desigualdades sociais, as pessoas se tornariam melhores uma vez que todos se tornariam iguais economicamente. Foi então que a igreja se deu conta da injustiça social e reconheceu que somente a intervenção do Estado nas relações econômicas dariam fim ao abuso que se consolidou com o capitalismo. Destarte, foi em 15 de maio de 1891 a publicação no pontificado do Papa Leão XIII da Encíclica Papal que deu início a profundas mudanças, uma vez que os trabalhadores teriam direito ao descanso, ao salário suficiente para atender suas necessidades e o direito a greve como forma de invocar seus direitos. (CASTRO; LAZZARI, 2006) Diante desta publicação, o trabalhador teria direito a um salário digno, a descanso semanal e a fazer protesto quando se achasse no direito. Porém este não foi o único passo dado com a intenção de maximizar o campo de impacto dos benefícios que iriam proporcionar a segurança social. Antes mesmo de a Encíclica Papal ser publicada, ocorreu o marco em nível mundial que inovou o seguro social. A criação de Otton Von Bismarck, hoje comentada por vários doutrinadores, foi o acontecimento que deu sentido a proteção social, pois além de deixar clara a importância do mutualismo e da intervenção do Estado mostrou que não era dever único do empregado de contribuir para ser

25 24 amparado em caso de incapacidade para o trabalho, mas também dever do seu empregador e do próprio Estado que agora iria gerenciar todo o custeio e aplicação do valor vertido. Relata o ilustre Oliveira (2006) que foi com a criação de Otton Von Bismarck em 1883 na Alemanha que houve a intervenção estatal em proteger o trabalhador da indústria doente, através da participação compulsória não só do empregado, mas também do empregador e do Estado, baseado no sistema tríplice de custeio, que logo foi ampliada para cobrir riscos de velhice, invalidez e acidentes por ocasião da atividade laboral. Entretanto, em um primeiro momento, a criação bismarquiana atenderia empregados da indústria que, por ventura, ficassem doentes e incapazes para exercerem suas funções, porém, junto com a evolução da humanidade e o aumento das necessidades passou a ser vista para atender casos de velhice e invalidez. Tsutiya (2007, p. 06) assevera que Somente os empregados tinham direito à proteção social, desde que contribuíssem para tanto [...] Sem contribuição, não havia direito algum a benefícios. Conseguinte, os empregados e seus empregadores contribuíam para que apenas os empregados tivessem direito a uma ajuda quando se encontrassem desempregados, ou devido à idade ou acidente que os afastassem do trabalho. Mormente, devido a sua rápida aceitação, assim como alude Borges (2003), mais tarde este sistema culminou para outros países, como a Alemanha, França, Bélgica, Holanda e Itália. Os planos de aposentadoria, em um primeiro instante são relativos à periculosidade, ou seja, ao risco que corriam para execução das suas funções. Baseado nesta conjectura foi instituído o Primeiro Plano Formal de Aposentadoria, em 1875 quando um empregador do setor privado deu incentivo para que cocheiros fossem admitidos para fazer viagens para a linha Oeste americano, local bastante violento. Já em 1900, cria-se o Plano de Pensão que foi adotado pela Estrada de Ferro da Pensilvânia, que mais tarde foi utilizado como alternativa para Planos de Empresas e durou até a metade do século XX. (BORGES, 2003) Inicia-se a fase em que inúmeros países começaram a se preocupar com a situação social em termos de proteção, o que logo tornou a proteção social amparada pela constituição destes países.

26 25 Seguindo esta linha, surge uma fase em que as constituições de vários países começam a especular sobre os direitos previdenciários, trabalhistas, sociais e econômicos, sendo a Constituição do México de 1917 a primeira no mundo a usar o termo seguro social. Já a de Weimar em 1919, deixou o Estado encarregado de manter o cidadão alemão quando este não estivesse em condições de trabalhar. Mais a frente a OIT (Organização Internacional do Trabalho) deu importância à existência de um programa que visasse à previdência social, que foi aprovada em (MARTINS, 2003) Todavia, com toda a lenta evolução de um sistema de proteção à sociedade não havia se firmado uma terminologia usual que envolvesse todas as coberturas sociais. Foi então, que em 1935 surgiu à expressão seguridade social, marcada com a publicação da Social Security Act nos Estados Unidos para amparar aquele que por um tempo estivesse sem condições para o trabalho ou devido à idade, estivesse idoso demais para o trabalho. (ROCHA; BALTAZAR JUNIOR, 2000) Esta publicação promoveu auxílio a quem estivesse incapacitado para trabalhar temporariamente, além de auxiliar pessoas com idade avançada. Em 1941, Beveridge no meio da Segunda Guerra Mundial, cria o Sistema Universal de Luta Contra a Pobreza que baseada na conjectura de previdência universal, destinada não somente aos trabalhadores, mas também a quem não trabalhava, propicia atendimento à saúde e aos desempregados. Esta corrente foi bem desenvolvida na Suécia, na Noruega, na Finlândia, na Islândia, na Dinamarca e no Reino-Unido. (BORGES, 2003) A diferença desta corrente para a bismarquiana, se baseia no fato de que enquanto esta norteia formas de custeio do sistema, através da forma tripartite, aquela envolve um maior campo de cobertura. Como era obrigação do Estado dar cobertura ao cidadão, protegendo-o de eventuais contingências, seja ela, incapacidade para o trabalho ou velhice, era o próprio que na visão de Tsutiya (2007) tinha que proteger o cidadão do berço ao túmulo. Não muito distante desta idéia surge o estado de bem-estar social, que assim como afirma Oliveira (2006) nasceu com a Welfare State, onde o Estado estaria intimamente ligado a tudo que se relacionasse a previdência, saúde e assistência social, sendo que no Brasil foi designado o termo seguridade social.

27 26 Contudo, a seguridade social começa a ser aceita por países que se movem, por intermédio de conferências, para torná-la um direito de todos em nível internacional. Desde então, é marcada uma fase, chamada por Coimbra (2001) de terceira fase dos seguros sociais, onde é ampliado para vários países, tendo marco na 1ª Conferência Sul-Americana de Seguridade Social datada em 1942, incluindo também a 26ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho na Filadélfia no ano de 1944 e a Declaração Universal dos Direitos do Homem em Esta última traz em seu bojo os direitos previdenciários como um direito fundamental do homem. O artigo XXV da Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948) mostra que: Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle. Assim sendo, todos tem direito de viver plenamente em condições que garantam o seu bem estar independente de classe, raça, cultura e religião, pois a vida é o maior bem, que jamais será reparável e/ou substituída. 2.2 Surgimento da Previdência Social: expansão nacional No que tange a evolução do sistema de proteção social no Brasil, não há que se negar que muito pouco se difere da evolução ocorrida nos demais países. A caridade, o mutualismo iniciado no âmbito familiar, juntamente com o gerenciamento do Estado e antes disso, a influência cristã, deu partida à evolução lenta do protecionismo social a nível nacional. A preocupação com a segurança social no Brasil vem de Portugal, na época em que aquele era colônia deste. Neste sentido, Borges (2003, p. 35) arrola que: Essas primeiras manifestações de proteção social datam do período colonial, sendo que bem antes, em Portugal já no início do século XIV, a Rainha, Dona Izabel de Aragão, fundou vários hospitais de caridade e orfanatos, e que por volta de 1498, Dona Leonor de Lancastre, regente do trono de Portugal, fundou, em Lisboa, a primeira Irmandade da Misericórdia.

28 27 Como nesta época o Brasil era colônia de Portugal, foram criadas aqui Casas de Misericórdias, assim como nas demais colônias de Portugal. Estas casas tinham a finalidade de não somente auxiliar quem os procurassem como também de prestar assistência médica. Aqui, a primeira Casa de Misericórdia, assim como cita Pereira Junior (2004), foi criada em 1543, por Brás Cubas, que, desde então, marcou o assistencialismo, pelo atendimento hospitalar prestado aos pobres. Estas Casas, assim como aduz Borges (2003), mais tarde tomaram conta das demais províncias brasileiras como conseqüência da chegada dos jesuítas no ano de Foram quase três séculos de acontecimentos que marcaram a transação de um sistema de proteção baseado nos valores moldados pelos movimentos cristãos para o sistema que prestasse assistência pública a população brasileira. A primeira forma de assistência social no Brasil juridicamente falando, foi em 1824, com a primeira Constituição Imperial Constituição Política do Império do Brazil de 1824 Foi à primeira Constituição do Brasil, que embora trouxesse pouco a respeito de proteção social, já procurava demonstrar em seu bojo alguns direitos fundamentais da pessoa humana, como a segurança, liberdade, propriedade e igualdade, que, naquela época, já representavam direitos invioláveis. Este contexto é marcado pelo artigo 179 desta Constituição que preconiza sobre a igualdade no inciso XIII ao mencionar que A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um. Assim sendo, a lei maior define que todos são iguais ao aludir que ela é indiferente para qualquer um, não importando a religião ou a classe a que pertencem, pois se for para proteger, castigar ou até mesmo recompensar, o mesmo será feito independentemente de quem sejam. Já o inciso XXXI do artigo 179 da supracitada Constituição Política do Império do Brazil de 1824, traz em sua íntegra a garantia, traduzida em um direito de

29 28 todos, de atendimento público ao mencionar que A Constituição tambem garante os soccorros publicos. Mais tarde, segundo Tsutiya (2007) em 1835, um Decreto Imperial, criou o Mongeral, conhecido como Montepio Geral dos Servidores do Estado, baseado no mutualismo. Este sistema privado de assistência mútua era baseado na contribuição de servidores do Estado que se uniam para que, quando atingidos por eventos definidos como de risco, fossem amparados. Assevera Tavares (2005) que em 1850 foi publicado o Código Comercial, que trazia em seu contexto, mais precisamente no seu artigo 79 que os empregados em caso de acidentes que não pudessem ser previstos e que não fossem fruto da culpa do mesmo, deveriam receber por três meses consecutivos o salário pago pelo seu empregador. Entretanto era dever de quem contratava o trabalhador, oferecer a este garantia de que em caso de incapacidade para o trabalho, desde que essa incapacidade fosse gerada por fato imprevisível, pudesse receber durante o período estimado de três meses o mesmo valor que recebia enquanto estava a dispor de seu empregador. Segundo Borges (2003), foi com a Lei de 24 de novembro de 1888 que os trabalhadores das estradas de ferro de propriedade do Estado passaram a criar as caixas de socorros. Borges (2003 p. 36) complementa ao aduzir que [...] os funcionários públicos já organizavam caixas de socorros mútuos dotadas de características de securidade e contributividade. Portanto, ainda mantendo o caráter de mútua assistência e de contribuição, agora atendendo aos servidores do Estado que prestavam serviço nas suas estradas de ferro. Complementando os ensinamentos do supracitado autor, foi em 26 de março de 1889, a edição do Decreto nº que passou a dar cobertura aos empregados dos Correios que naqueles tempos quisessem se aposentar devido a sua invalidez e por tempo de serviço, observado que neste último caso deveria o empregado contar com no mínimo sessenta anos de idade. Houve então uma expansão no que se relaciona as coberturas, passando da cobertura em caso de acidente de trabalho para a aposentadoria por tempo de serviço admitida a quem tivesse sessenta anos ou mais.

30 29 Quase um ano depois da edição do Decreto que instituiu a aposentadoria por invalidez e por tempo de serviço, foi editado outro Decreto que beneficiava os empregados da Imprensa Régia. Rocha e Baltazar Junior (2000) descrevem que este Decreto nº de 20 de julho de 1889 estabeleceu pensão para quem trabalhasse em função das oficinas da Imprensa Régia Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891 O período em que vigorou esta constituição foi uma época marcada pelo surgimento da aposentadoria, ora vista voltada para casos em que a invalidez tornasse a pessoa incapaz para trabalhar, sendo integralmente custeada pela nação. Esta Constituição trazia em seu artigo 75 que A aposentadoria só poderá ser dada aos funcionários públicos em caso de invalidez no serviço da Nação. Assim sendo, somente os servidores do Estado que se tornassem inaptos para servir o país seriam beneficiados com a aposentadoria. Tsutiya (2007) registra que Era uma prestação que não necessitava de contrapartida pecuniária. Contudo, os empregados públicos não precisavam contribuir para ter direito a aposentadoria, pois era dever e responsabilidade do Estado manter este sistema de aposentadoria. Mais tarde, com o crescimento das cidades, o surgimento de indústrias e o aumento dos acidentes advindos do trabalho, foi publicada a Lei n de 15 de janeiro de Para Rocha e Baltazar Junior (2000), esta lei foi responsável pela criação do seguro contra acidentes provenientes do trabalho que eram de responsabilidade total das empresas, que ao contratar seus empregados contratavam também o seguro junto à seguradora. Neste caso, como complementa Borges (2003), o empregador em caso de acidente que levasse seu empregado a invalidez permanente ou a óbito tinham que por três anos pagar o salário ao trabalhador ou a sua família. Todavia, a empresa contratava seguro para seus trabalhadores e, em

31 30 contrapartida, estes eram beneficiados em caso de acidente que tornasse o trabalho uma dificuldade ou no caso da sua morte, beneficiando sua família. Baseado nesta busca constante por um sistema que suprisse as necessidades atuais, que outro Decreto surgiu para criar caixas de aposentadoria e pensões para aqueles que trabalhassem nas ferrovias existentes em todo território nacional. Foi o Decreto nº de 24 de janeiro de 1923, Lei Eloy Chaves, que marcou a história da Previdência Social no Brasil, prevendo não somente a aposentadoria por invalidez como também a assistência médica e a pensão decorrente da morte. (GOES, 2008) Destarte, houve a partir desta lei o efetivo cumprimento das normas que estavam em seu bojo, não ficando apenas no papel. Todavia foi o 29 do artigo 54 da Emenda Constitucional de 1926, que deu ao Congresso Nacional poder para legislar no que tange a aposentadoria e reforma, materializando que ele teria competência para legislar sobre licença, aposentadoria e reformas, não se podendo conceder, nem alterar, por leis especiais. Começou a ampliação da lei Eloy Chaves através dos diversos Decretos que tinham a finalidade de ampliar o campo de atuação dos benefícios que tal lei concedia. Mormente, assim como o Decreto nº de 20 de dezembro de 1926 passou a conceder os benefícios da Lei Eloy Chaves aos trabalhadores portuários e marítimos, o Decreto nº quatro anos depois inovou as Caixas de Aposentadorias (CAP s) levando seus benefícios para os empregados das empresas de serviços telegráficos e radiotelegráficos. Já em 1931 com a edição do Decreto nº , houve uma maior abrangência destes benefícios que passou a atingir outras atividades públicas além das citadas. (MARTINS, 2003) Observa-se que à medida que os anos foram passando, as caixas de aposentadoria foram se estendendo para outros ramos. Passou da caixa de aposentadoria e pensões dos ferroviários e empregados em serviços públicos para outras categorias profissionais, até que na década de 30 quase toda a classe trabalhadora assalariada representava uma dessas categorias. Neste sentido, Tavares (2005, p. 47) preleciona que a partir de então surgiu [...] o Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Marítimos (IAPM) em 1933, o

32 31 Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Comerciários (IAPC) em 1934, o Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Bancários (IAPB) em 1934 [...]. Passou de Caixa para Instituto, quando o governo de Getúlio Vargas suspendeu por seis meses a aquisição de qualquer tipo de aposentadoria que deu início a uma crise previdenciária. (MARTINEZ, 2001) A diferença existente entre as Caixas e os Institutos é simples, pois como já visto, enquanto aquelas abrangiam os funcionários de uma empresa estes abarcavam toda uma categoria profissional de âmbito nacional Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934 Esta Constituição caracteriza-se por mostrar de forma expressa uma maior responsabilidade do Estado e da União para com todas as pessoas. A forma tripartite de custeio intentada em 1883 por Bismarck novamente encontra respaldo nesta Carta. (GOES, 2008) O artigo 5º da supracitada Constituição aduz que Compete privativamente à União [...] legislar sobre [...] normas fundamentais do direito rural, do regime penitenciário, da arbitragem comercial, da assistência social, da assistência judiciária e das estatísticas de interesse coletivo [...]. Todavia, assim como preconiza o artigo de lei, é dever da União, zelar pela assistência social. E no mesmo sentido, de acordo com os incisos do artigo 10 da mesma Constituição é competência também dos Estados [...] cuidar da saúde e assistência pública [...] fiscalizar a aplicação das leis sociais [...]. Entretanto, não deve apenas haver a interação do Estado e da União em oferecer cuidados para que todos vivam saudavelmente, mas para que haja uma fiscalização de forma que a lei seja aplicada a todos sem discriminação. Destarte, a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934 traz em seu bojo um atendimento voltado para que todos possam ingressar na vida profissional, promovendo um melhoramento do sistema de proteção para os mesmos. Neste sentido, o artigo 121 desta Carta menciona que:

33 32 A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País. 1º - A legislação do trabalho observará os seguintes preceitos, além de outros que colimem melhorar as condições do trabalhador: [...] h) assistência médica e sanitária ao trabalhador e à gestante, assegurando a esta descanso antes e depois do parto, sem prejuízo do salário e do emprego, e instituição de previdência, mediante contribuição igual da União, do empregador e do empregado, a favor da velhice, da invalidez, da maternidade e nos casos de acidentes de trabalho ou de morte; [...] Mormente, até mesmo a mulher que viesse a engravidar, teria direito a repouso antes e logo após o parto, podendo perceber o mesmo salário que recebia durante todo o período em que não estivesse exercendo suas funções para a qual foi contratada. Além do mais, aquele que completasse 68 (sessenta e oito) anos de idade teria o direito de se aposentar mesmo não intentando para que isso viesse a ocorrer. É o que aludi o 3º do artigo 170 desta Carta ao descrever que [...] salvo os casos previstos na Constituição, serão aposentados, compulsoriamente os funcionários que atingirei 68 anos de idade [...]. O 4º do artigo 170 aduz sobre a aposentadoria em caso de invalidez para o labor de suas funções. Assim quando o indivíduo estivesse impossibilitado para retornar ao seu trabalho, ou seja, estivesse inválido, este por lei, seria aposentado, aja vista que, os vencimentos integrais só seriam concedidos se ele possuísse mais de 30 (trinta) anos de serviço efetivo. Portanto, se a sua invalidez decorresse de acidente no seu trabalho ou doença que pudesse transmitir aos outros e que fosse incurável, receberia os vencimentos integrais independente do tempo de serviço. (BRASIL, 1934) Foi no preâmbulo desta Constituição que se criou o IAPI (Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Industriários) no ano de Para Martins (2003), aquele que fosse empregado na indústria teria a obrigatoriedade de se segurar a este Instituto, mas seus superiores, ou seja, os empregadores tinham o poder de se segurarem se bem entendessem. Era um sistema, da qual o empregado e o empregador contribuíam mediante desconto na folha de pagamento das empresas, já o Estado pagaria uma taxa referente a cada objeto impostado.