Parte III - Modos de atuação: pesquisa e intervenção

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Transcrição:

Parte III - Modos de atuação: pesquisa e intervenção 10 - Abordagens da magnitude e dos sentidos da violência Maria Cecília de Souza Minayo SciELO Books / SciELO Livros / SciELO Libros MINAYO, MCS. Abordagens da magnitude e dos sentidos da violência. In: Violência e saúde [online]. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2006. Temas em Saúde collection, pp. 110-116. ISBN 978-85-7541-380-7. Available from SciELO Books <http://books.scielo.org>. All the contents of this work, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International license. Todo o conteúdo deste trabalho, exceto quando houver ressalva, é publicado sob a licença Creative Commons Atribição 4.0. Todo el contenido de esta obra, excepto donde se indique lo contrario, está bajo licencia de la licencia Creative Commons Reconocimento 4.0.

PARTE III MODOS DE ATUAÇÃO: PESQUISA E INTERVENÇÃO [ 109

10 ABORDAGENS DA MAGNITUDE E DOS SENTIDOS DA VIOLÊNCIA O Relatório da OMS propõe um modelo ecológico de explicação das raízes da violência (OMS, 2002). Em primeiro lugar, busca identificar os fatores biológicos que cada indivíduo apresenta em seu comportamento, concentrando-se nas características que aumentam a possibilidade da pessoa ser vítima ou perpetradora de violência. Em segundo, são nomeados os fatores relacionais, evidenciando-se as interações sociais, nos âmbitos mais próximos dos companheiros, dos colegas, dos parceiros íntimos, dos membros da família, e sua influência na vitimização ou na perpetração da violência. No caso dos jovens, o documento reafirma a importância dos amigos como incentivadores de atividades delinqüenciais e criminosas. Em terceiro, são colocados os fatores comunitários e sua influência na dinâmica da violência. Nesses contextos comunitários são nomeados os locais de trabalho, a escola e a vizinhança e, como problemas, os altos níveis de desemprego, a presença de tráfico de drogas e de armas e componentes de ordem relacional, como o isolamento social em que vivem determinadas famílias. Em quarto, o modelo ecológico enfatiza os fatores sociais mais amplos que contextualizam os índices de violência. Dentre eles podem-se citar: normas culturais que justificam a violência como forma de resolver conflitos; atitudes que consideram a opção pelo [ 111

112] suicídio como um direito de escolha individual; machismo e cultura adultocêntrica; normas que validam o uso abusivo da força pela polícia; normas que apóiam conflitos políticos. No texto da OMS, discutem-se ainda as políticas econômicas e sociais, de educação, de saúde que contribuem para manter desigualdades, ou seja, para perpetuar as formas mais perversas de violência estrutural, e lembra que, dentro de uma perspectiva de desenvolvimento humano, são diferentes os elementos que influenciam a vitimização ou a perpetração de violência nas várias faixas etárias. Assumindo a proposta ecológica, darei ênfase ao sentido dinâmico da produção da violência, cuja interpretação se adequa à teoria da causalidade complexa em que todas as coisas são causadas e causadoras e em que se evidenciam a retroalimentação entre os fatores e a reflexividade dos fenômenos. Por isso, a tônica reflexiva e metodológica proposta é a articulação dos âmbitos biológico, subjetivo e social. Desta forma, para se conseguir dimensionar e compreender o impacto da violência sobre a saúde, fazem-se imprescindíveis abordagens inter e transdisciplinares que incluam uma visão quantitativa e qualitativa do fenômeno. Não basta quantificar os mortos, os feridos, as vítimas e os agressores. Essas pessoas fazem parte de uma realidade histórica e cultural e possuem razões subjetivas, como extensamente já se mencionou anteriormente. Saber a magnitude do fenômeno, mas também os seus sentidos é pré-requisito para a formulação de programas de promoção e de prevenção propostos pelo setor saúde. Do ponto de vista quantitativo é importante produzir conhecimento sobre:

a magnitude dos fenômenos em suas dimensões, traduzida em dados sobre morbidade e mortalidade; as diferenciações internas e as circunstâncias das fatalidades, dos traumas e das lesões que constituem as conseqüências da violência; os fatores que aumentam o risco de vitimização; os fatores que contribuem para a perpetração dos crimes e agressões; a especificação demográfica e ambiental dos eventos; as configurações de cunho local das expressões de violências que permitam a atuação por prioridades; a triangulação de dados epidemiológicos com informações históricas, culturais e subjetivas de cunho qualitativo. Do ponto de vista qualitativo é fundamental desenvolver: a compreensão do momento histórico vivido pelo país e pelas regiões dentro do país, uma vez que a violência costuma ser um termômetro muito importante para medir as expressões dos conflitos, dos projetos, das crises e das expectativas sociais. Embora a violência seja um fenômeno permanente na história da humanidade, suas formas de manifestação são diferentes no tempo e no espaço; a compreensão da dinâmica dos contextos locais, culturais e das razões subjetivas com que as tipologias de violência se expressam; a articulação das informações compreensivas com dados quantitativos sobre os fenômenos, buscando responder a questões da prática; a integração da multiplicidade de atores cidadãos e institucionais na busca de formulação de políticas que afetem direta ou indiretamente a promoção de políticas e propostas e ação. [ 113

Para tornar plausível a comparação entre países, a OMS, na Classificação Internacional das Doenças (CID), criou categorias para classificar os eventos violentos e os acidentes a serem notificados. Essa classificação se encontra nos códigos E-800 a E-999, na 9ª revisão da CID e nos V01 a Y98 na 10ª revisão. Cada vez que ocorre um evento violento no país, seu registro passa ou deveria passar, basicamente, pelas instituições e serviços mostrados na Figura 1. Figura 1 Fluxograma de notificação e esclarecimento de eventos violentos EVENTO VIOLENTO DELEGACIA DE POLÍCIA Boletim de Ocorrência Policial SERVIÇO DE SAÚDE Estatísticas (hospitalar/ambulatorial) Declaração de Óbito (DO) OUTRAS ESTATÍSTICAS Instituições governamentais, nãogovernamentais e imprensa INSTITUTO MÉDICO-LEGAL Laudo médico e DO POLÍCIA CIVIL Estatísticas POLÍCIA MILITAR Estatísticas G. BOMBEIROS Estatísticas SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA Estatísticas oficiais SECRETARIAS ESTADUAL E MUNICIPAL DE SAÚDE Estatísticas oficiais Fonte: Souza ( 2002: 259). 114]

Como se pode constatar, até chegar a se constituir em estatística oficial (é preciso não esquecer que muitos fatos não alcançam o conhecimento público), a informação de um evento violento passa por várias mãos e percorre diversas instituições. Está, pois, condicionada a problemas de idiossincrasias e finalidades dessas entidades, a questões ideológicas das pessoas que notificam e aos que procedem à notificação e às dificuldades ou facilidades tecnológicas e operacionais dos vários sistemas e fontes. Tendo em vista que toda informação científica veiculada sobre o assunto não está isenta de problemas ideológicos e de dificuldades operacionais, pode-se dizer que os dados existentes no Ministério da Saúde e que são também repassados à OMS, para serem consolidados e comparados internacionalmente, não constituem uma verdade absoluta, mas são, acima de tudo, uma construção social. Embora exista, por parte do Ministério e da maior parte das secretarias estaduais e municipais, uma busca insistente de melhorar a qualidade dos dados, do ponto de vista acadêmico, sua validade e confiabilidade são temas problemáticos. Na medida em que os pesquisadores operam no campo teórico e empírico, devem estar sempre atentos a como são geradas, coletadas, tratadas, organizadas, armazenadas, interpretadas e disseminadas as informações. Não basta, pois, ter um banco de dados e produzir análises estatísticas tecnicamente perfeitas a partir dele; é necessário perguntar-se sobre a qualidade dos processos que deram origem ao que está armazenado ou tecnicamente tratado. O primeiro problema de fidedignidade surge no ato de apreensão e de compreensão do fenômeno da violência. Aí se cruzam elementos ideológicos com sistemáticas operacionais. Ideologicamente, a própria sociedade dá ênfase a determinados tipos de [ 115

116] violência, ao passo que outros são deixados de lado ou são quase invisíveis, Por exemplo, os roubos, as lesões corporais, os homicídios são muito mais evidenciados do que as violências que ocorrem na família, que as discriminações raciais, contra deficientes físicos e mentais, de gênero e que os crimes de trânsito. A violência psicológica é muito difícil de ser dimensionada. Igualmente, no Brasil e no mundo, tabus e preconceitos explicam por que muitos suicídios e tentativas de cometê-los sejam intensamente subnotificados. E nas próprias unidades de saúde, os profissionais tendem a produzir informações apenas sobre as lesões e traumas dos quais tratam, sem se perguntarem pelo fato ou pela razão básica que os causou. Por outro lado, é preciso ressaltar que, embora imperfeitos, o conjunto de fontes de informação e os esforços importantes que têm sido realizados para sua compatibilização são muito importantes para dar elementos no processo de produção de políticas de âmbito nacional. Eles apresentam indicadores de magnitude, de fatores de risco, de distinção de grupos mais vulneráveis e de tendências, ainda que imperfeitos. Um grande passo operacional deveria ser dado por todos os que atuam na área, no sentido de investir nos estudos operacionais que dão a dimensão e a compreensão das violências nos espaços locais, pois, as violências não são abstrações. É necessário conhecer com profundidade os contextos que as geram e sua dinâmica para que se possam estabelecer prioridades e agir intersetorialmente com apoio da sociedade civil, tendo em vista sua superação ou redução.