HORTAS COMUNITÁRIAS E A UTILIZAÇÃO DE PLANTAS MEDICINAIS GT25 Interdisciplinaridade em CTS Klismam Marques dos Santos Maria Laura Martins Paulo Vitor de Sousa Silva Lúcia Helena Almeida Gratão Giuliana Paola Hoeppner Rondelli Geshica Soares Souza Guilherme Nobre L. do Nascimento
INTRODUÇÃO O Tocantins e sua capital Palmas, foram criadas em 1989, e atualmente pertence à Amazônia Legal localizado em uma região de transição entre os biomas do cerrado, caatinga e a floresta amazônica (Câmara e Leite, 2005; Nascimento et al., 2009). Região de ampla biodiversidade (Silva et al., 2006) com perspectivas para busca de novas moléculas com interesse farmacológico de origem vegetal. A crescente procura por métodos terapêuticos alternativos, fez com que se desenvolvessem no país projetos de farmácia viva e hortas comunitárias (Monteiro & Monteiro, 2006), bem como a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterapia (Brasil, 2006) que incentivam o uso de plantas medicinais (PM). Por meio do Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, e a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, o Ministério da Saúde busca ampliar as alternativas terapêuticas com o objetivo de melhorar a atenção à saúde dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) e garantir à população acesso seguro e uso racional de plantas medicinais. Na capital do estado do Tocantins, desde o ano de 1992 o governo municipal criou áreas destinadas a hortas comunitárias em diferentes localidades do município, e que tem como finalidade promover a melhoria na qualidade da alimentação e fornecer fonte de renda extra para a população em vulnerabilidade socioeconômica (Freitas, 2012). Porém além das hortaliças comumente observadas nestas hortas tem-se verificado o cultivo e consumo de plantas medicinais (PM). Portanto o objetivo deste trabalho foi realizar o levantamento da presença de PM nas hortas comunitárias, e o consumo das mesmas pela população que vive em torno das mesmas. MATERIAL E MÉTODOS A cidade de Palmas, no estado do Tocantins, é a capital mais nova do país e que possui atualmente 228.332 habitantes e área total de 2.218,9 km2, com densidade demográfica de 102,90 habitantes por Km 2. Até a data da coleta dos dados deste trabalho a capital somava um total de 17 hortas comunitárias sendo que 15 estavam ativas. Elas estão dispostas nas diferentes regiões da cidade, como o Plano Diretor Norte (5 hortas) e Sul (3 hortas), bairros Aurenys (2 hortas), Taquari (1 horta), Bela Vista (1 horta), Sol Nascente (1 horta) (Figura 1) e Taquaruçu.(2 hortas). 2
FIGURA 1. Distribuição geográfica das hortas comunitárias na cidade de Palmas, nas regiões do Plano Diretor Norte (1) e Sul (2), Aureny IV (3), Aureny III (4), Taquari (5), Bela Vista (6) e Sol Nascente (7) (Gratão et al., 2015). Foram realizadas visitas a todas as hortas e entrevistas com a população adjacente de 8 hortas comunitárias a fim de verificar o uso de plantas medicinais, sua finalidade e características da população. Portanto foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com os indivíduos nas hortas, e o roteiro de entrevista compreendeu 3 etapas: 1. questões socioeconômicas como idade, gênero, procedência (rural/urbana), nível de escolaridade, renda familiar; 2. questões referentes as hortas: tipo de adubo utilizado, suporte da prefeitura, uso de agrotóxicos, comercialização dos produtos das hortas; 3. questões sobre as principais PM utilizadas e sua finalidade. RESULTADOS E DISCUSSÃO O uso de plantas para fins medicinais está intimamente ligado à história humana, por muito tempo este foi o principal meio terapêutico que o homem usufruiu (FRANÇA et al., 2008; VILA VERDE et al., 2003). Entretanto, o surgimento dos medicamentos alopáticos 3
alterou essa perspectiva, fazendo com que este fosse mais procurado e estudado que aquelas, assim o interesse por plantas de uso medicamentoso foi diminuído (VEIGA-JUNIOR, 2008). Atualmente a utilização de plantas medicinais é difundida principalmente entre a população que vive longe dos centros de saúde ou que não possuem recursos para adquirirem os medicamentos convencionais (VEIGA-JUNIOR, 2008). Os que residem em zona urbana ainda retém algum entendimento sobre a terapêutica com plantas, porém esta prática tem-se perdido e vem se tornando gradualmente mais escassa (AMOROZO e GÉLY, 1988; AMOROZO, 2002). O conhecimento popular é uma importante ferramenta para a descoberta de novos fármacos e tem crescido cada vez mais o interesse em se comprovar este saber (FRANÇA et al., 2008). Com o desenvolvimento da tecnologia e ciência um maior número de pesquisas nessa área está sendo realizada, e as propriedades terapêuticas das plantas medicinais têm sido proporcionalmente reafirmadas (ARNOUS et al., 2005). O consumo de plantas medicinais é interessante devido a sua eficácia, baixo custo e por ser menos agressivo que os medicamentos alopáticos. Todavia, o uso de plantas para tratamento e prevenção de enfermidades deve ser orientado para que a planta seja aproveitada de uma melhor forma, sem que seus princípios ativos sejam perdidos (ARNOUS et al., 2005; ALBURQUEQUE e HANAZAKI, 2006). Vale ressaltar, que como qualquer medicamento estas possuem efeitos colaterais e tóxicos e devem ser consumidas de forma consciente e moderadas (VEIGA-JUNIOR, 2005). Este estudo foi realizado nas proximidades de oito hortas comunitárias da cidade de Palmas TO, estas foram escolhidas devido ao tamanho, localização e relevância para a comunidade. Foram aplicados 120 questionários, onde 88,3% dos entrevistados afirmaram fazer uso de plantas medicinais e/ou fitoterápicos (Fig.1), destes, 65,3% têm preferência pelo uso da planta in natura, sendo estas preparadas na forma de chá, infusão, sumo, xarope, cocção para banho e uso tópico (Tab.1). 4
Sim Não 0,0 10,0 20,0 30,0 40,0 50,0 60,0 70,0 80,0 90,0100,0 Frequência (%) Figura 1. Uso de plantas medicinais. Mais de 75% dos participantes afirmam que o conhecimento adquirido sobre este tratamento vem dos pais ou familiares, ou seja, grande parte destes não possuem um conhecimento substancial sobre o uso de plantas medicinais, ainda 78,3% acreditam que as plantas medicinais não trazem dano algum, outro dado alarmante, pois como qualquer outro medicamento estas possuem efeitos colaterais e podem ser perigosas se não manipuladas e preparadas da maneira correta. Contudo, apenas 2,8% dos participantes afirmam ter recebido alguma orientação profissional sobre o uso destas plantas. O que nos leva a questionar se a falta dessa informação por parte dos profissionais se dá devido ao pouco interesse ou se os mesmos estão despreparados para lidar com este assunto. Frequência (%) Sim Não 0,0 10,0 20,0 30,0 40,0 50,0 60,0 70,0 80,0 90,0 Figura 2. Acreditam que plantas medicinais são inofensivas 5
Algumas das plantas mais citadas foram: Hortelã (Mentha sp.), Capim Santo (Cymbopogon densiflorus Stapf.), Mastruz (Chenopodium ambrosioides L.), Erva-cidreira (Melissa officinalis) e Algodão (Gossypium herbaceum), apresentadas respectivamente de acordo com o número de citações (Tab.1). Vale ressaltar que foram mencionadas diferentes espécies de hortelã, porém estas foram agrupadas, já que este trabalho não fez o uso de exsicata. É importante destacar que menos de 30% dos entrevistados utilizam as hortas comunitárias para aquisição de plantas medicinais, dessa forma, observamos que para esse fim o retorno destes espaços são ainda muito pequenos para a sociedade. Tabela 1: Principais espécies de interesse medicinal da população que vive em torno das hortas comunitárias. Nome popular Hortelã Nome científico Mentha piperita L. Família Lamiaceae Indicação terapêutica Antiinflamatório, descongesti onante, antigripal e antipirético, apontado também para o tratamento de cólicas infantis. Partes utilizadas Folha, raiz e caule. Preparo Chá, sumo, suco, xarope e infusão. Capim santo Cymbopogo n densiflorus Stapf. Poaceae Antihipertensivo, calmante e antitérmico. Folha Chá, sumo e infusão. Mastruz Chenopodi um ambrosioid es L. Chenopodia ceae Antiinflamatório, antigripal, antiácido, cicatrizante, antivermífu go, antibiótico, indicado ainda para o tratamento Folha, raiz e caule. Chá, sumo, xarope e garrafada. 6
de anemias e traumas. Erva cidreira Melissa officinalis Lamiaceae Descongesti onante, antigripal, antipirético, antihipertensivo e calmante. Folha Chá, sumo e infusão. Algodão Gossypium herbaceum Malvaceae Antiinflamatório, cicatrizante, antibiótico, antisséptica e recomendad o também nos casos de gastrite, pósoperatório e traumas. Folha Sumo, chá, xarope e garrafada. Nome popular Nome científico Família Indicação terapêutica Partes utilizadas Preparo Malva do Reino Malva silvestris L. Malvaceae Antiinflamatório, descongesti onante, calmante, broncodilat ador, antitérmico, indicado também nos casos de má digestão, gastrite. Folha, raiz e caule. Chá, sumo, xarope, infusão e garrafada. Boldo Peumus boldus Monimiace ae Indicado para gastrite, disfunção hepática e má digestão. Folha Chá e sumo Alfavaca Ocimum Lamiaceae Descongesti Folha, caule Chá, cocção 7
basilicum L. onante recomendad o para os casos de gripe, sinusite, dor de cabeça, tosse e pneumonia. e flores. para banho e xarope Vick Mentha arvensis Lamiaceae Antigripal, descongesti onante, calmante e antipirético. Folha e Caule. Chá, xarope e infusão Durante as visitas as hortas foram verificadas que em todas havia a presença e comercio de plantas medicinas, incluindo a venda para gestantes e mães com crianças de colo a procura do uso destas PM. Logo é necessário a realização futura de trabalhos de orientação com esta população para que melhor utilizem tal forma de terapia, sem representar risco para a saúde. Portanto podemos concluir que apesar de em todas as hortas haver o plantio de PM, da maior parcela da população utilizar esta forma de terapia, as pessoas que vivem no entorno das hortas não têm utilizado as mesmas como local de consumo das mesmas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALBUQUERQUE, U. P.; HANAZAKI, N. As pesquisas etnodirigidas na descoberta de novos fármacos de interesse médico e farmacêutico: fragilidades e perspectivas. Rev. Bras. Farmacogn. n.16, Supl, p. 678-689, 2006. AMOROZO, M. C. M. e GÉLY, A. L. Uso de plantas medicinais por caboclos do Baixo Amazonas. Boletim do Museu Paraense Emilio Goeldi, Série Botânica. v. 4, n.1, p.47-131, 1988. 8
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