O NOVO É ANTIGO? A NOVA GERAÇÃO PASTORAL E AS ANTIGAS PRÁTICAS PATRIMONIALISTAS NAS ASSEMBLEIAS DE DEUS NO BRASIL.

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Anais do V Congresso da ANPTECRE Religião, Direitos Humanos e Laicidade ISSN:2175-9685 Licenciado sob uma Licença Creative Commons O NOVO É ANTIGO? A NOVA GERAÇÃO PASTORAL E AS ANTIGAS PRÁTICAS PATRIMONIALISTAS NAS ASSEMBLEIAS DE DEUS NO BRASIL. Marina Aparecida Oliveira dos Santos Correa Pós-doutoranda em Ciências da Religião pela Universidade Federal de Sergipe marinasantoscorrea@gmail.com PNPD/CAPES/CNPQ ST 05 PROTESTANTISMO E PENTECOSTALISMO Resumo: A presente comunicação pretende apontar a importância dos pastores-presidente, seus Ministérios e a sucessão familiar. As ADs, com o passar dos tempos, transformaramse, devido à grande facilidade na adesão de novas ideias e valores religiosos por parte dos indivíduos, com práticas mais capitalistas. Começaram a surgir inúmeras fragmentações em seu meio, gerando diferentes igrejas com vínculos administrativos cada vez mais independentes, mas conservando o nome Assembleias de Deus, assemelhando-se com o sistema de franquia, como forma de sustentação da tradição e do sucesso no âmbito religioso atual. Outra prática bem atual apontada pelas pesquisas empíricas, a sucessão dos pastores-presidente está ligada diretamente aos familiares, a perpetuação do poder ocorre de modo hereditário e masculino, filhos, genros, netos. A pesquisa aponta um caso interessante: o pastor-presidente de um ministério em Juiz de Fora, Valter Resende de Carvalho, que não tem sucessores masculinos, consagrou a sua filha Elienai de Oliveira Carvalho Castellano ao cargo de pastora. Dessa forma, a escalada para alcançar o cargo de pastor-presidente levantado na pesquisa é via cisão ou acordos entre os pastores. Palavras-chave: Pentecostalismo; Assembleias de Deus; Ministérios; Pastores-presidente; sucessão familiar. 1

Introdução Atualmente, à linha de sucessão dos pastores-presidente assembleianos está ligada diretamente aos familiares, a perpetuação do poder ocorre de modo hereditário e masculino, filhos, genros e netos, talvez, gerada pelas condições de estabilidade financeira alcançada pelos pastores-presidente em seus Ministérios, beneficiando não somente a estes, mas, a todos os seus descendentes. Dessa forma, a escalada para alcançar o cargo de pastor-presidente levantado na pesquisa é via cisão ou acordos entre os pastores. Diferentemente das eleições mais antigas para escolher os pastores das igrejas ADs e as sucessões mais recentes ocorrem entre os pastores assembleianos e não passam mais por eleições e sim por sucessões hereditárias masculinas. Porém, algumas perguntas me inquietam: É possível verificar-se do ponto de vista jurídico, social e administrativo, a existência de fatores que recomendam o vínculo empregatício nas relações do pastor com sua igreja? O tema da sucessão é importante para discutir em uma comunicação pentecostal, sabendo de tantas diversidades dentro das igrejas? Como podemos discutir esse tema dentro dos diversos perfis administrativos apresentados no meio assembleiano, sabendo que essa denominação possui conforme o Censo de 2010 cerca de 12.314.410 milhões de adeptos representando 6,46% da população brasileira? Ministérios, Pastores-presidente e a sucessão familiar Na década dos anos 40, as igrejas ADs criaram as Igrejas-sede e/ou Ministérios, e os batizaram com a nomenclatura interna de Campo. 1 Campo, nas Assembleias de Deus, refere-se à área de atuação de um Ministério ou Igreja-sede 2 (chamada também de igreja-mãe), e mantém suas congregações e pontos de pregação agrupados em um determinado local. Essas congregações e os pontos de pregação pertencentes a um Ministério são desterritorializados, construídos em bairros, cidades em um ou mais estados. Constituem uma rede de congregaçõessatélite, dependentes de um Ministério, liderado por um pastor-presidente que conta com um 1 Campo é uma expressão de uso interno das igrejas assembleianas. Campo não é empregado no sentido camponês ou geográfico, que diz respeito à posse de terra, mas no sentido político de poder, isto é, posse de espaço religioso. O campo tratado no texto não está relacionado com o conceito de campo de Pierre BOURDIEU como... o conjunto das transformações tecnológicas, econômicas e sociais correlatas ao nascimento e ao desenvolvimento das cidades e, em particular, aos progressos da divisão do trabalho e à aparição da separação do trabalho intelectual e do trabalho material. P. BOURDIEU, A economia das trocas simbólicas, p. 35. 2 Igreja-sede e/ou Ministério tem a mesma conotação, alguns dizem Ministérios e outros dizem igrejas-sede. Nesse trabalho, o termo usado será Ministério. 2

forte vínculo administrativo, doutrinário e litúrgico, entre ele, as congregações e os pontos de pregação. O pastor-presidente das ADs recebe a configuração de senhor patriarcal, com o processo de institucionalização denominado pela rotinização do carisma, 3 quando o carisma se tradicionaliza. Se a dominação carismática é de caráter extracotidiano e representa uma relação social estritamente pessoal, a rotinização acontece quando ocorre uma relação contínua, permanente, entre o pastor das ADs e os seus servidores, seus obreiros, seus presbíteros e seus evangelistas, que vão obedecê-lo em virtude da crença na sua santidade, nas ordenações e nos seus poderes senhoriais. Diante dessa realidade, as sedes dos ministérios são de última geração, top de linha. As congregações dependentes, porém, são em sua maioria desprovidas de infraestrutura, e periféricas. As ADs são consideradas uma das organizações religiosas pentecostais mais ricas do Brasil, com um poder econômico centralizado nas mãos de poucos. A liderança dirigente é uma elite rica, em contraste com a membresia pobre. Na esfera nacional, sua riqueza concentra-se principalmente nas convenções nacionais, que têm como uma das principais fontes financeiras as editoras, cuja arrecadação assemelha-se a de grandes editoras não-religiosas; no âmbito regional, o poder econômico é distribuído, favorecendo os pastores-presidente responsáveis pelos ministérios e pelas convenções estaduais/ regionais, servindo de apoio às convenções nacionais. A gestão dos ministérios reproduz a administração regional, com centralização do poder e do dinheiro das igrejas. Ao analisar o modelo de funcionamento atual dos Ministérios ADs vinculados às convenções, e comparando-os ao modelo de franquia, não há como negar que existe uma semelhança entre eles. O termo franquia é utilizado para definir uma parceria empresarial, porém a franquia não é apenas o imóvel com uma identidade visual, logomarca, uniformes e produtos. Sabe-se que a franquia também é uma forma de atendimento, baseada no ambiente, na filosofia de trabalho e no espírito de equipe, que torna determinado negócio conhecido e respeitado pelo consumidor. 4 3 M. WEBER, Economia e Sociedade, p. 161. 4 Cf. http://www.feiradoempreendedoronline.sebrae.com.br/oportunidade.aspx/. Acesso em: 06 abril 2011. 3

Este sistema tem como meta a expansão empresarial das empresas que possuem o know how, pois, inicialmente, é fundamental verificar se a empresa possui um segredo de negócio, ou seja, um know-how diferenciado ao de sua concorrência, o que já representa uma significativa garantia de sucesso. A segunda verificação deve ter como foco a gestão do negócio, que deve possuir eficiência para gerir, no mínimo, três ou mais unidades, com a mesma estrutura e com uma marca forte reconhecida, além de um histórico de sucesso na venda de determinado produto e/ou serviço. 5 Resumindo, o sistema de franquia é composto por uma parceria administrativa, dedicação, integração, estabelecimento de diretrizes e de regras, comunicação permanente, permitindo que a empresa atue como uma Learning Organization, com comprometimento contínuo no aprendizado através da participação e da colaboração entre franqueador e franqueado. Outra realidade importante observada pelas pesquisas empíricas é sobre a questão da sucessão dos pastores assembleianos em seus ministérios. Antigamente a presidência de uma igreja assembleiana votava em escolher os pastores e estes, não possuíam vínculos familiares. O desafio de um obreiro escolhido para chegar ao cargo de pastor exigia sacrifícios, o sofrimento servia de testemunho para os novos pastores viver a fé, sem remuneração e luxo. No primeiro momento decidi não abordar este tema de maneira mais contundente devido à complexidade dessa temática que deveria ser estudada de maneira mais aprofundada, por se tratar de um assunto delicado e devido a sua complexidade, deixei para aprofundar em estudos futuros. Porém, uma pergunta me inquietava: Como podemos pesquisar sobre este tema tão delicado da sucessão na igreja? Campos nos oferecem vastas pesquisas sobre a profissionalização com análises nesse processo de sucessões hereditárias assembleianas, uma vez que, a hierarquia religiosa ainda não está de certo modo, devidamente explicada e ainda teme por uma mudança na legislação que rege as relações entre pastores e igrejas. Pode-se se pensar que na possibilidade de seus pastores optarem mais pela profissão e pela possibilidade de uma carreira profissional mais promissora do que por razões tidas como origem sagrada ou subjetiva, e isto justificaria de certa maneira a sucessão familiar para resguardar o patrimônio (igrejas) obtido pelos pastores ao longo dos anos. 5 Cf. www.geranegocio.com.br/html/franq/p1.html. Acesso em: 25 mar 2011. 4

Atualmente a sucessão, ao que parece, não passa mais por esses sacrifícios, uma vez que os pastores-presidente vão preparando o caminho para que os seus sucessores não sofram como os de antigamente. Os herdeiros consanguíneos, seja pela linha reta ou pela linha da afinidade, são preparados para herdar a administração e cargos mais importantes dentro dos ministérios. Um caso bem recente ocorre com a família do pastor-presidente da CGADB José Wellington Bezerra da Costa seus filhos. Antes de prosseguir deixo bem claro que as questões apontadas a seguir, retrata exclusivamente ao campo empírico. Os questionamentos buscam aprofundar a discussão sobre as Assembleias de Deus e sucesso familiar. Este caso não é o único, existem várias sucessões familiares nas inúmeras ADs em todo Brasil e no exterior. D epinay em (O Refúgio das Massas,1970 p. 128) nos diz o poder, nas comunidades pentecostais é monopolizado pelos pastores. Porém, que é um pastor no pentecostalismo? Onde é recrutado? Como se prepara? Como alcança o ministério e como exerce? Nas pesquisas empíricas os pastores sempre relataram longas caminhadas até se chegar ao cargo de pastor, porém, não se constatou, como se chega ao cargo de pastor-presidente; como a membresia reage a cada escolha; pôde-se observar que a massa se submente passivamente a uma pequena classe dirigente. Nesse caso, D epinay constatou que as comunidades seriam o fiel reflexo do contexto social no qual se inscrevem, ou seja, um contexto singularizado, nos campos especialmente, comandados por duas classes: minoria dominante e a outra majoritária e dominada. Logo, observa-se ainda uma estrutura dentro das ADs ultrapassada, onde os pastores poderosos agem à sua maneira, sem se importar com a grande massa, que continuam sempre passiva obediente e carentes de ações de participação ativas. Seria em nome da antiga tradição? Talvez por isso as escolhas de sucessão são impostas pelos antigos pastores, resta a membresia aceitar as decisões, assim como no princípio da formação das ADs. Alencar (2013, pp. 182-183) apropria-se muito bem dessa realidade quando aponta o mandato de alguns pastores-presidente em seus ministérios: pastor Alfredo Reikdal (ministério Ipiranga), consagrado aos 24 anos, viveu 95 anos ficando 71 anos no poder; Anselmo Silvestre da Silva (BH), consagrado aos 34 anos, viveu 96 anos pastoreou por 59 anos e renunciou o poder aos 93 anos em prol do seu neto; Antonio Lemos (Blumenau SC) consagrado pastor aos 34 5

anos viveu 84 anos, pastoreou por 53 anos e assim sucessivamente existiram outros mandatos com pastores que não foram citados aqui. Na fala de Campos esse ator religioso faz da comunidade e da instituição a qual presta o seu serviço não somente o contexto de sua ação, mas a fonte para o sustento próprio e familiar (Campos, 2000, p. 1) Além desse estudo, Campos (2000, p. 1) aponta as dificuldades existentes na formação de pastores e pastoras protestantes, a uma forte crise na definição dos papeis que a sociedade e a cultura atual lhes reservam. Assim, os pastores-presidente ao preparar a sua sucessão dentro do grupo familiar, de alguma forma, dará continuidade ao arcaico, a tradição tão defendida por muitos, sem resistência direta, afinal, os seus sucessores já sabem como obedecê-los, pois, foram criados dentro das crenças religiosas impostas a estes desde o berço; e, se tornam, de certa maneira, guardiões do patrimônio construído ao longo os tempos, garantindo aos genitores uma estabilidade financeira no futuro. Algumas sucessões na linha hereditária dentro das ADs levantadas recentemente: CGADB: Pr. José Wellington Bezerra da Costa: pastor- presidente da CGADB (Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil) desde 1989 e AD Belém desde 1980; Filhos: Pr. José Wellington Bezerra da Costa Junior: pastor setorial da AD em Guarulhos, vice - presidente do Ministério Belém - SP, da CONFRADESP e possível candidato a presidente da CGADB na próxima eleição; Pr. Paulo Freire da Costa: presidente da AD Belém em Campinas/SP e 1º secretário da CONFRADESP; Pr. Joel Freire da Costa: presidente da AD Belém nos EUA. CONAMAD: Bispo Manoel Ferreira, pastor-presidente vitalício da CONAMAD (Convenção Nacional de Madureira). Filhos: Pr. Samuel Cássio Ferreira: Presidente da AD Brás (Sede estadual de Madureira em São Paulo) e 1º vice-presidente da CONAMAD; Pr. Abner de Cássio Ferreira: Presidente da AD em Madureira/RJ e 3º vice-presidente da CONAMAD; Pr. Magner Ferreira: Presidente do campo da AD Madureira em Marechal Hermes (RJ) Neto: Pr. Manoel Ferreira Neto (Filho do Pr. Samuel Ferreira): Presidente da AD Madureira em Campinas/SP. Concentrando a hereditariedade de poder nos Ministérios regionais: Estado de São Paulo: No Campo de Presidente Prudente: ex-pastor-presidente Carlos Padilha, filho: pastor-presidente atual João Carlos Padilha; No campo de Indaiatuba: Pastorpresidente é Raimundo Soares de Lima, que tem como vice-presidente e sucessor estatutário o próprio filho, pastor Rubeneuton de Lima, conhecido como Newton Lima; No Campo de Araçatuba: Pastor-presidente Emanuel Barbosa Martins e o vice-presidente é seu filho, Emanuel Barbosa Martins Filho; No Campo de Limeira: Ex-pastor-presidente Joel Amâncio de Souza, fez como seu sucessor o seu filho, pastor Levy Ferreira de Souza; No campo de Santos: 6

Presidida por décadas pelo Pr. João Alves Corrêa (falecido). Hoje dirigida pelo seu filho Pr. Paulo Corrêa. Minas Gerais: Assembleia de Deus em Belo Horizonte: Campo dirigido por décadas pelo Pr. Anselmo Silvestre (que já foi 1ºvice-presidente da CGADB) que alguns anos antes de falecer passou a presidência para seu neto, Pr. Moisés Silvestre; Assembleia de Deus Juiz de Fora ligado a CONAMAD: Campo dirigido pelo Pr. Valter Resende de Carvalho, consagrou a sua filha Elienai de Oliveira Carvalho Castellano como pastora, uma vez que ele não tem sucessores masculinos; seu genro, Ely Soares Castelano, casado com a pastora Elienai ocupa o cargo de pastor-presidente da Convenção Estadual CONEMAD-MG em Juiz de Fora. Rio de Janeiro: Assembleia de Deus Penha: Campo dirigido desde a década de 1960 pelo Pr. José Santos. Ao falecer, a presidência foi transferida para o Pr. Silas Malafaia (seu genro) que a transformou em AD Vitória em Cristo; Assembleia de Deus em Jacarepaguá IADJ: Campo dirigido pelo Pr. Gilberto Malafaia jubila depois de 41 anos no poder passa presidência, ao neto Pr. Silas Malafaia Filho. Belém do Pará: Assembleia de Deus em Belém: Campo dirigido pelo pastor-presidente Samuel Câmara. Seu filho, Pr. André Câmara, preside um campo AD de São José dos Campos/SP; Fortaleza/CE: Assembleia de Deus Ministério Bela Vista: Campo fundado na década de 1960 pelo Pr. Luiz Bezerra da Costa (irmão do Pr. José Wellington), que era genro do Pr. José Teixeira do Rego, então presidente da AD Ministério Templo Central. Hoje o Ministério Bela Vista é dirigido pelo Apóstolo José Teixeira Rego Neto (filho do Pr. Luiz Bezerra, já falecido) os dois ministérios são ligados à CGADB. Goiás: Assembleia de Deus em Caldas Novas: Campo presidido pelo Pr. André Macalão, neto do Pr. Paulo Leivas Macalão. REFERÊNCIAS ALENCAR, G. F. Assembleia de Deus Origem, Implantação e Militância (1911-1946). São Paulo: Arte Editorial, 2010 Matriz Pentecostal Brasileira: assembleias de Deus 1911-2011. Rio de Janeiro, Ed. Novos Diálogos, 201. BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil Ltda, 2010. Economia das Trocas Simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 2004. CAMPOS, Leonildo. Destino pessoal e organização religiosa: um estudo de carreiras pastorais no interior de uma organização religiosa, Dissertação de Mestrado, Umesp, 1986. As mudanças no campo religioso brasileiro e seus reflexos na profissionalização do pastor protestante Universidade Metodista de São Paulo UMESP. Cultura, liderança e recrutamento em organizações religiosas o caso da Igreja Universal do Reino de Deus. Clérigos em contexto de mudanças uma visão sociológica do papel do pastor protestante brasileiro e dos desafios de sua formação em seminários teológicos no início do século XXI 7

CHANLAT, Jean-Françoise. Quais carreiras para qual sociedade?, Revista de Administração de Empresa, FGV, v.35, n.6, dezembro de 1995. CORREA M. A. O. S. Alteração das Características Tradicionais da Igreja Assembleia de Deus: Um estudo a partir do bairro Bom Retiro em São Paulo. 2006. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) - PUC/SP, São Paulo. 2006. A OPERAÇÃO DO CARISMA E O EXERCÍCIO DO PODER: A lógica dos Ministérios das Igrejas das Assembleias de Deus no Brasil. São Paulo. Tese de doutorado em Ciências da Religião PUC/SP. 2012. Assembleia de Deus: Ministérios, Carisma e Exercício de Poder. São Paulo: Fonte Editorial, 2012. D EPINAY, C,L. O Refúgio das Massas, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970. DUTRA, J. S.; VELOSO, E.F.R. (organizadores) Desafios da gestão de carreira. São Paulo: Editora Atlas. GOMES, J.O. Educação Teológica no Pentecostalismo Brasileiro: a política Eclesiástica da Assembleia de Deus com Respeito ao Ensino Formal (1943-1983). São Paulo, Ed. Fonte Editorial, 2013. WEBER, M. Economia e Sociedade. Brasília: UnB, 2003. 8