Emprego de geossintéticos para recomposição de talude com recuperação da geometria original e uso de solo local

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Transcrição:

Emprego de geossintéticos para recomposição de talude com recuperação da geometria original e uso de solo local Fagner Alexandre Nunes de França Universidade Estadual Paulista, Ilha Solteira, Brasil, franca@dec.feis.unesp.br Vinícius Rocha Gomes Pereira GeoSoluções Engenharia Geotécnia e Ambiental Ltda., São Paulo, Brasil, vinicius.rocha@geosolucoes.com RESUMO: Os geossintéticos são materiais bastante versáteis que podem ser empregados em obras de Engenharia Geotécnica com diversas funções. Este artigo apresenta um caso de obra onde os geossintéticos foram utilizados para a recomposição de um talude após a sua ruptura. Trata-se de uma obra peculiar devido, principalmente, à utilização de diferentes geossintéticos em um mesmo caso. A recomposição do talude foi executada por meio da técnica de solo envelopado com geotêxtil tecido. Adicionalmente, geocompostos drenantes foram posicionados entre o solo compactado e o solo natural para promover a drenagem da água do interior do maciço. Outro sistema de drenagem foi previsto na base do talude (trincheira drenante), composto por um geotubo envolvido por material granular e um geotêxtil não-tecido. Por fim, o revestimento de face foi executado com geocélulas preenchidas com solo e coberttas com placas de grama. Assim, cinco geossintéticos diferentes foram empregados nessa obra, com funções distintas. Tecnicamente, destacam-se a flexibilidade e rapidez de execução da obra como parâmetros necessários para este caso. A vantagem econômica gerada pela solução proposta também pode ser evidenciada, uma vez que foi empregado o solo do próprio talude para recompô-lo e, portanto, não foram necessárias medidas como aquisição e transporte de material e os procedimentos utilizados para execução de estruturas de concreto armado. PALAVRAS-CHAVE: Geossintéticos, Recomposição de talude, Solo envelopado, Sistemas de drenagem, Revestimento de face. 1 INTRODUÇÃO A versatilidade e variedade apresentadas pelos geossintéticos continuam a impulsionar sua utilização em diversos projetos de Engenharia Geotécnica. Neles, esses materiais assumem, comumente, funções relacionadas a características mecânicas (e.g. reforço, proteção, controle de erosão e confinamento) e a propriedades hidráulicas (e.g. impermeabilização, drenagem e filtração) de maciços de solo. Destaca-se ainda a função de separação, na qual os geossintéticos impedem a mistura ou interação entre materiais adjacentes. Um mesmo tipo de geossintético pode desempenhar diferentes funções. Os geotêxteis são um exemplo clássico para sustentar essa afirmação. Essa classe de materiais, formada por produtos têxteis bidimensionais permeáveis, pode ser mencionada como a mais versátil entre os geossintéticos. Eles podem desempenhar desde a função de reforço até a de filtração e drenagem. Em alguns casos, quando impregnados com material asfáltico, podem, ainda, ser empregados como camada de impermeabilização. Outros geossintéticos também podem ser empregados com diferentes funções (e.g. geocélulas para proteção, controle de erosão e reforço). Por outro lado, alguns geossintéticos são comumente utilizados para uma única função (e.g. geotubos para drenagem e geocompostos argilosos para impermeabilização de superfícies). A Tabela 1 indica as classes de geossintéticos e as principais funções que podem desempenhar. Outras funções podem ser relacionadas a alguns tipos de geossintéticos. Bueno e Vilar (2004) e Koerner (2005) destacam, por exemplo, o uso de geotêxteis impregnados com material betuminoso para uso como barreira imper-

meabilizante e geocélulas empregadas com a função de controle de erosão superficial e reforço. Assim, percebe-se que, além das funções clássicas descritas para cada geossintético, podem ser encontrados novos usos para esses materiais, a depender da situação a ser solucionada com o respectivo projeto. Tabela 1. Principais geossintéticos e suas funções em obras de Engenharia Geotécnia (Associação Brasileira de Geossintéticos, 2012). Geossintético E D F B P R S C Geotêxtil x x x - x x x x Geomembranas - - - x - - x - Geogrelhas, Geotiras, e - - - - - x - - Geobarras Georredes, Geotubos e - x - - - - - - Geoespaçadores Geomantas x - - - - - - - Geocélulas - - - - - - - x Nota: E Controle de erosão superficial; D Drenagem; F Filtração; B Barreira impermeabilizante; P Proteção; R Reforço; S Separação; C Confinamento. Este artigo apresenta um caso de obra no qual a versatilidade dos geossintéticos se sobressai. Trata-se da recomposição de um talude após a ocorrência de deslizamento de solo. Foram empregados cinco tipos diferentes de geossintéticos neste projeto (geotêxtil tecido, geotêxtil não-tecido, geocomposto drenante, geocélula e geotubo), desenvolvido para atender ao principal requisito exigido pelo proprietário da obra: recuperação da geometria original. Adicionalmente, foi proposta uma solução que possibilitasse a manutenção do mesmo revestimento de face (grama) onde possível. 2 CARACTERÍSTICAS DA OBRA 2.1 Designação e localização O caso de obra apresentado neste artigo foi designado como Recuperação de talude na unidade da U.S. Pharmacopéia Barueri/SP. Trata-se da recuperação de um talude localizado na divisa entre os lotes do proprietário da obra (filial brasileira do U.S. Pharmacopeial Convention) e da Escola Prefeito Nestor de Camargo, no município de Barueri/SP, bairro Jardim Mutinga. A Figura 1 apresenta uma imagem aérea com a localização da obra. 20 m Proprietário Figura 1. Vista aérea com a localização da obra em estudo (Google Maps, 2012). 2.2 Apresentação do problema de engenharia O referido talude possui dois lances, cada qual com cerca de 6 m de altura, e sofreu um processo de instabilização, que resultou na ocorrência de deslizamento de solo. A Figura 2 ilustra o estado do talude de divisa após esse incidente, encontrado em visita técnica ao local no dia 01/06/2011. Reservatório Muro de divisa Estacionamento Local da obra Escola Prefeito Nestor de Camargo Norte Figura 2. Aparência do talude de divisa após ocorrência do deslizamento de solo. O referido deslizamento teve uma proporção significativa e movimentou um volume de solo estimado em cerca de 400 m³. Percebeu-se que maior parte do solo deslocado foi originária do lance superior do talude, o que poderia comprometer as estruturas adjacentes, visíveis na Figura 2 (e.g. reservatório, o muro de divisa, um dos prédios da escola ao fundo, à direita, e o

estacionamento) e a segurança dos seus usuários. Um volume de solo menos significativo foi movimentado do lance inferior do talude. Em princípio, as causas do deslizamento de solo não foram detectadas. Contudo, suspeitouse da ocorrência de algum vazamento no sistema de abastecimento do reservatório da escola, situado no topo do talude. Essa hipótese foi confirmada nas primeiras operações para o reparo do talude, quando da remoção do solo deslocado para limpeza do terreno. Verificou-se que a tubulação que abastece o referido reservatório apresentava vazamento em um trecho próximo ao talude em questão. Assim, existem evidências que apontam esse dano no sistema de abastecimento do reservatório da escola adjacente ao talude como causa principal do deslizamento de solo apresentado neste artigo. Podese, portanto, inferir que a infiltração de água no subsolo decorrente desse vazamento ocasionou uma elevação no grau de saturação do solo e redução da sua resistência ao cisalhamento, juntamente com elevação do peso específico. O resultado desse processo foi a ruptura do talude. 2.2 Solução proposta A proximidade da região afetada pelo deslizamento de solo em relação às estruturas pertencentes à escola situada no topo do talude e ao estacionamento na base do mesmo exigiu a escolha de uma solução de engenharia que permitisse uma rápida execução. Associado a este aspecto, destaca-se também a necessidade de utilizar o solo do próprio talude para a sua recomposição e manter a geometria original. Foi sugerido também, quando possível, manter o mesmo revestimento de face encontrado no talude. Assim, com base na flexibilidade de utilização dos geossintéticos e nas características executivas da técnica de solo envelopado, a proposta sugerida pela empresa contratada (GeoSoluções Engenharia Geotécnia e Ambiental Ltda.) consistiu na recomposição do talude a partir dessa técnica construtiva. Essa empresa também foi responsável pela execução da obra. A ruptura do talude também ocorreu em seu lance inferior. A geometria desse trecho foi recomposta por meio da técnica de solo grampeado, uma vez que o maciço de solo original apresentou-se pouco perturbado pelo deslizamento de solo. Salienta-se, portanto, que a recomposição total do talude foi realizada com uma solução mista, enfatizando a flexibilidade dos geossintéticos relacionada à sua utilização com outras técnicas consagradas na Engenharia Geotécnica. Outro aspecto de destaque na solução proposta para este caso de obra refere-se ao emprego de geossintéticos com funções diferentes para atingir os objetivos exigidos pelo proprietário. Assim, além do material empregado para execução do solo envelopado (geotêxtil tecido), foram utilizados outros quatro tipos de geossintéticos. A Tabela 2 apresenta os geossintéticos empregados neste caso de obra, juntamente com suas funções e respectivos fornecedores. Tabela 2. Geossintéticos empregados para recomposição do talude após ruptura. G Função Identificação Fornecedor Propex Propex do Brasil GTW R 50/10 Ltda. GeoFort GTN F Ober S.A. GCD GL D C GF 10/200 MacDrain 2L FortCell FC 04/30 GP D Kananet 4 Maccaferri do Brasil Ltda. Ober S.A. Kanaflex Indústria de Plásticos S.A. Nota: G Geossintético; GTW Geotêxtil tecido; GTN - Geotêxtil não-tecido; GCD Geocomposto drenante; GL Geocélula; GP Geotubo; R Reforço; F Filtração; D Drenagem; C Confinamento. 3 DESCRIÇÃO DA SOLUÇÃO COM UTILIZAÇÃO DE GEOSSINTÉTICOS O objetivo principal da solução adotada neste caso de obra é promover a recomposição do talude, de modo a obter a geometria original do mesmo. Assim, optou-se pelo emprego das técnicas de solo envelopado e solo grampeado para reforçar o maciço de solo nos lances superior e inferior do talude, respectivamente. A Figura 3 apresenta a seção tranversal esquemática da solução adotada para recomposição do talude apresentado neste artigo. O lance superior do talude (solo envelopado) foi reconstituído com o emprego de um geotêxtil tecido unidirecional, com resistência à tração no sentido longitudinal de fabricação igual a 50 kn/m (valor nominal). O solo envelopado

foi executado com a utilização de sacaria na face, preenchida com o solo do talude. A escolha dessa opção (solo envelopado e sacaria) permitiu, portanto, que fosse utilizado o solo do próprio talude na sua recomposição. 4 EXECUÇÃO DA OBRA A obra para recomposição do talude foi executada entre os meses de Julho e Setembro de 2011 e envolveu deferentes etapas. 4.1 Limpeza e correção do terreno Detalhe da trincheira drenante Geocomposto drenante Geotubo Geotêxtil não-tecido A primeira etapa da obra refere-se à limpeza mecanizada de toda a área afetada pelo deslizamento. Esse procedimento foi realizado para remover entulhos e vegetação presentes no local. Adicionalmente, foram executados cortes no terreno adjacente para obter a área necessária para a disposição dos elementos de reforço (geotêxtil tecido). Assim, procedeu-se a escavação mecanizada do talude para iniciar os serviços de recomposição do mesmo com a solução proposta (Figura 4). Figura 3. Seção tranversal esquemática da solução adotada para recomposição do talude apresentado neste artigo. Empregaram-se dois sistemas de drenagem da água do interior do maciço de solo. Um geocomposto drenante (geomanta com 10 mm de espessura entre dois geotêxteis não-tecido) foi aplicado na interface entre o solo compactado e o solo natural para direcionar o fluxo de água do interior do maciço de solo reforçado com geossintético. O outro sistema é formado por uma trincheira drenante situada na base do lance inferior do talude (geotubo com diâmetro de 100 mm, envolvido por material granular e geotêxtil não-tecido com 200 g/m² e resistência à tração nominal de 10 kn/m) e é responsável por conduzir, logitudinalmente, a água advinda do geocomposto drenante inferior. Inicialmente, foi especificado o revestimento da face do talude com a utilização de geocélulas (altura nominal de 100 mm e abertura nominal de 300 x 300 mm) preenchidas com solo e cobertas com placas de grama. Assim, esperava-se recuperar a cobertura de face original do talude. Contudo, verificaram-se instabilidades superficias localizadas no lance inferior do talude com o uso dessa alternativa. Optou-se, portanto, em revestir a face do lance inferior do talude com sacaria preenchida com solo local, seguido por concreto projetado. Figura 4. Escavação mecanizada do talude para limpeza e terraplenagem do solo de fundação. 4.2 Solo envelopado A superfície do solo de fundação foi devidamente regularizada e compactada (Figura 5), com o intuito de melhorar as suas propriedades de resistência e deformabilidade. A primeira camada de reforço foi lançada sobre a superfície regularizada, seguida por uma camada de solo compactado (Figura 6). Na sequência, camadas de reforço e solo compactado foram intercaladas até atingir a altura desejada (cota do topo do talude). O solo foi compactado com alturas de 300 e 400 mm. A Figura 7 apresenta uma camada de solo compactado concluída e os geocompostos drenantes instalados com a função

de conduzir a água do interior do maciço de solo compactado para a face. A Figura 8, por sua vez, apresenta a vista frontal do aterro reforçado após a execução do solo envelopado. Figura 8. Vista frontal do aterro reforçado após a conclusão da etapa de instalação dos reforços e compactação do solo em camadas. Figura 5. Regularização do solo de fundação do aterro reforçado. 4.3 Solo grampeado A execução do solo grampeado no lance inferior do talude foi iniciada após a recomposição do seu trecho superior. Foram instaladas três linhas de chumbadores metálicos, totalizando 18 chumbadores, com comprimento de 4,0 m e diâmetro do furo de 75 mm. A Figura 9 ilustra a execução do reforço em solo grampeado, com a localização de três chumbadores. Figura 6. Lançamento da primeira camada de reforço (geotêxtil tecido). Geocomposto drenante Chumbadores Figura 9. Execução de chumbadores metálicos na porção inferior do talude. Figura 7. Vista de uma camada intermediária concluída e da face do aterro reforçado. Destaque para a visualização do geocomposto drenante. A perfuração para instalação dos chumbadores provocou a saída de água do interior do maciço de solo pelos furos adjacentes, já executados. Esse fato foi mais um indicativo de que a elevação do grau de saturação do solo devido a um vazamento na tubulação de abastecimento do reservatório tenha sido a causa principal da ruptura do talude. Diante desse novo aspecto, optou-se pela execução de drenos horizontais profundos (DHP) no lance inferior do talude,

com o propósito de facilitar a drenagem da água nessa região e, consequentemente, garantir a eficiência da técnica de solo grampeado. Foram instalados seis DHP s com 6,00 m de comprimento ao longo da extensão do talude inferior. Cinco deles promoveram a drenagem contínua de água do maciço por cerca de quatro dias após a sua instalação, indicando a presença de um volume significativo de água no solo. 4.4 Revestimento de face A última etapa para conclusão da obra refere-se à execução do revestimento de face. O projeto previu a utilização de geocélulas preenchidas com solo do próprio talude e a instalação de placas de grama. A Figura 10 ilustra a disposição de geocélulas sobre a face do lance superior do talude. As Figuras 11 e 12 apresentam o talude parcialmente recoberto com placas de grama e o aspecto final após a conclusão desse serviço. Figura 12. Vista frontal do talude recuperado após execução do revestimento de face com placas de grama. Conforme mencionado anteriormente, o lance inferior do talude apresentou rupturas superficiais localizadas (Figura 13). Em visita ao local no mesmo dia do acontecimento, verificou-se um elevado teor de umidade do solo e a vazão expressiva de água em cinco DHP s. A elevação no teor de umidade do solo superficial pôde ser atribuída à elevada precipitação incidente na região nos dias anteriores. Por outro lado, a vazão significativa pelos DHP s poderia indicar a existência de infiltração de água no subsolo por, possivelmente, algum dano existente em instalações próximas ao local. Figura 10. Disposição de geocélulas sobre a face do lance superior do talude. Figura 13. Vista frontal do lance inferior do talude afetado após deslizamento superficial de solo. Figura 11. Recobrimento parcial da face do lance superior do talude com placas de grama. Optou-se por remover todo o solo deslocado com o propósito de identificar a magnitude do deslizamento. Esse procedimento foi acompanhado continuamente por engenheiro geotécnico, que determinou o encerramento da operação quando a condição do solo foi adequada. Devido à vazão expressiva de água nos DHP s, um sistema de trincheira drenante foi associado aos DHP s como alternativa para drenagem da água do maciço de solo. Adicionalmente, um geo-

composto drenante foi posicionado sobre o talude para interceptar possíveis fluxos de água advindos do maciço de solo e conduzi-los à trincheira drenante (Figura 14). O passo seguinte foi promover a recomposição da geometria original do talude com utilização de sacaria preenchida com solo local. As Figuras 15 e 16 apresentam uma etapa parcial do posicionamento da sacaria e o aspecto final após o término do serviço, respectivamente. Geocomposto drenante Diante das incertezas sobre as possíveis causas da recorrência do deslizamento de solo, optou-se por revestir a face do trecho com uma solução que minimizasse a infiltração de águas superficiais no maciço. Essa alternativa teve o objetivo de evitar uma elevação no grau de saturação do solo devido a causas externas. Assim, foi adotado o revestimento de face em concreto projetado. A Figura 17 apresenta o aspecto final do lance inferior do talude após a conclusão desse serviço. Figura 14. Detalhe do geocomposto drenante disposto na face do talude com a função de conduzir a água advinda do interior do maciço de solo para a trincheira drenante. Figura 15. Recomposição do lance inferior do talude com utilização de sacaria preenchida com solo local. Figura 16. Aparência do lance inferior do talude após conclusão do serviço de instalação de sacaria. Figura 17. Detalhe do revestimento de face com concreto projetado executado no lance inferior do talude. 5 VANTAGENS TÉCNICAS E ECONÔMICAS OBTIDAS Este caso de obra destaca-se como um exemplo da versatilidade de aplicação dos geossintéticos. Foram empregados cinco tipos diferentes de geossintéticos com funções diferentes (reforço, filtração, drenagem e confinamento). As principais vantagens técnicas que podem ser destacadas nesta obra devido à utilização de geossintéticos referem-se, principalmente, à flexibilidade e à rapidez da construção. Em relação à flexibilidade, a técnica de solo envelopado permitiu reproduzir a geometria original do talude através da compactação das camadas conforme o necessário. Salienta-se que o talude apresenta altura variável, percebida pela superfície inclinada no topo do mesmo (Figura 8). Essa inclinação pôde ser reproduzida com a técnica utilizada. A flexibilidade da técnica de solo envelopado também é ilustrada pela possibilidade de preenchimento das laterais irregulares resultantes do processo de escavação para remoção do solo após o deslizamento inicial (Figura 4). A compactação de solo nessas regiões com o uso de outras técnicas consagra-

das na Engenharia Geotécnica poderia ser prejudica ou dificultada pela geometria resultante da escavação. Ainda relacionado à flexibilidade no uso dos geossintéticos, destaca-se a instalação da trincheira drenante para contornar um aspecto negativo percebido após a conclusão da obra. A execução desse sistema depois do término dos serviços de recomposição do talude enfatiza a versatilidade que esses materiais apresentam frente aos problemas comumente encontrados na Engenharia Geotécnica. Outro aspecto importante na escolha da solução para este caso de obra é a rapidez na execução. A primeira etapa da obra, com a execução do revestimento de face com geocélulas preenchidas com solo e placas de grama foi concluída em 12/08/2011, cerca de 40 dias após o início dos serviços. A velocidade de conclusão da obra era um fator preponderante devido à presença de diversas estruturas adjacentes ao talude, algumas delas com implicações negativas em caso de dano ou ruptura (reservatório e edifíco da escola). Assim, a escolha de uma alternativa que não necessitasse de outras etapas construtivas (e.g. instalação de fôrmas, instalação de armaduras, lançamento e cura de concreto) foi um fator importante na escolha dos geossintéticos para a solução deste caso de obra. Apesar de não ter sido realizado um estudo econômico para determinar precisamente a redução dos custos devido à escolha dessa opção, pode-se destacar que foram evitados a aquisição e o transporte de solo para o local, componentes comumente associados a grande porcentagem dos custos em obras de reforço e terraplenagem. Outras técnicas exigiriam a aquisição e o transporte de materiais como solos granulares e blocos de rocha (rachão). Além disso, pode-se mencionar a ausência de outras etapas no processo construtivo de estruturas de contenção em concreto armado, como dimensionamento dos elementos de concreto armado, instalação de fôrmas e armadura, lançamento e cura do concreto. Dessa forma, pode-se entender a solução com geossintéticos com um grande apelo econômico em relação a outras técnicas consagradas na Engenharia Geotécnica. 6 CONCLUSÃO Este artigo apresentou um caso de obra referente à recomposição de um talude de divisa após a ocorrência de deslizamento de solo. Diversas estruturas podem ser encontradas nas adjacências do talude, o que aumentou a urgência em solucionar o problema. Adicionalmente, a solução proposta deveria refazer a geometria original do talude. Assim, uma solução em solo envelopado foi empregrada, juntamente com outros tipos de geossintéticos desempenhando funções diferentes. Neste caso, foram empregados cinco tipos diferentes de geossintéticos (geotêxtil tecido, geotêxtil não tecido, geocomposto drenante, geocélula e geotubo). Esses materiais foram utilizados para desempenhar funções diferentes (reforço, filtração, drenagem e confinamento). Este caso de obra mostra-se interessante para demonstrar a versatilidade dos geossintéticos, que podem assumir diferentes funções dentro de obras de Engenharia Geotécnica. Além disso, os apelos técnico e econômico obtidos com obras como a apresentada neste artigo impulsionam a utilização destes materiais. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a GeoSoluções Engenharia Geotécnia e Ambiental Ltda. pela disponibilização dos dados referentes ao caso de obra descrito neste artigo e ao Departamento de Engenharia Civil da Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira da Universidade Estadual Paulista pelo suporte técnico a sua elaboração. REFERÊNCIAS Associação Brasileira de Geossintéticos (2012) Os geossintéticos e suas funções. Disponível em: <http://www.igsbrasil.org.br/geo.htm>. Acesso em: 28 maio 2012. Bueno, B. S. e Vilar, O.M. (2004) Propriedades, ensaios e normas, In: VERTEMATTI, J.C. Manual brasileiro de geossintéticos. São Paulo: Edgard Blücher. p. 27-62. Google Maps (2012) Imagem aérea das adjacências da filial brasileira da U.S. Pharmacopeial. Disponível em: <http://maps.google.com.br/maps?hl=pt- BR&tab=wl>. Acesso em: 28 maio 2012. Koerner, R.M. (2005) Designing with geosynthetics, 5th ed., Prentice Hall, Upper Saddle River, NJ, USA, 796 p.