VI.2. Parábola do Credor Incompassivo (ou do Servo Mau) (Mt 18:23-35) Por isso o reino dos céus é semelhante a um rei, que resolveu ajustar contas com os seus servos. E passando a fazê-lo, trouxeram-lhe um que lhe devia dez mil talentos. Não tendo ele, porém, com que pagar, ordenou o senhor que fosse vendido ele, a mulher, os filhos, e tudo quanto possuía, e que a dívida fosse paga. Então o servo, prostrando-se reverente, rogou: Sê paciente comigo e tudo te pagarei. E o senhor daquele servo, compadecendo-se, mandou-o embora, e perdoou-lhe a dívida. Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos que lhe devia cem denários; e, agarrando-o, o sufocava, dizendo: Paga-me o que me deves. Então o seu conservo, caindo-lhe aos pés, lhe implorava: Sé paciente comigo e te pagarei. Ele, entretanto, não quis; antes, indo-se, o lançou na prisão, até que saldasse a dívida. Vendo os seus companheiros o que se havia passado, entristeceram-se muito, e foram relatar ao seu senhor tudo o que acontecera. Então o seu senhor, chamando-o, lhe disse: Servo malvado, perdoei-te aquela dívida toda porque me suplicaste; não de- vias, tu, igualmente, compadecer-te do teu conservo, como também eu me compadeci de ti? E, indignando-se, o seu senhor o entregou aos verdugos, até que lhe pagasse toda a dívida. Assim também meu Pai celeste vos fará, se do íntimo não perdoardes cada um a seu irmão." Incompassivo significa sem compaixão"; portanto, a parábola trata das pessoas que não têm piedade, dó, das demais. Conservo significa que era servo juntamente com o outro. Esta é uma das parábolas da classificação Assuntos Domésticos e de Família. Naqueles tempos era permitido ao credor mandar o devedor para a prisão, onde este teria que trabalhar para pagar a dívida (até o último centavo, como diz Jesus em Mt 5:26). Era também permitido ao credor vender o devedor, para receber seu crédito; se a quantia apurada não fosse suficiente para resgatar a dívida, era-lhe permitido vender também a mulher e os filhos do devedor.
Naqueles tempos da pregação de Jesus, um talento de prata equivalia a 6000 dracmas (moeda grega) ou 6000 denários (moeda romana), ambas também de prata. Conforme se vê em Mt 20:2, um denário correspondia ao salário de um dia de trabalho. Com uma dracma podia-se comprar uma ovelha; e com cinco dracmas, um boi. Na historieta que Jesus contou, o primeiro servo era devedor, ao seu senhor, de dez mil talentos, uma quantia portanto, fabulosa. E não tendo com que pagar, o credor mandou que ele, sua mulher e filhos fossem vendidos. Porém, pediu clemência e o credor, generoso, perdoou-o. Porém, mal tinha obtido tal bênção, encontrou um companheiro, servo como ele, e que lhe devia cem denários, uma quantia ínfima; e exigiu do devedor, violentamente, o seu dinheiro; e surdo aos rogos do pobre homem, mandou encerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida. Os demais servos, entristecidos, foram relatar o acontecido ao senhor deles. Este, após repreender o servo impiedoso, entregou-o aos verdugos, até que lhe pagasse tudo quanto lhe devia. E Jesus termina a parábola, dizendo: Assim também meu Pai celestial vos fará, se do íntimo do coração não perdoardes a vosso irmão. A parábola põe em destaque o ensinamento de que é necessário perdoar aos devedores, para também merecermos perdão de nossas faltas. E para estimular-nos na conquista desta virtude, o Pai celestial nos favorece com sua bondade e misericórdia, concedendo-nos oportunidades de quitação, em cada reencarnação. Todavia, não se pode esquecer que não é Deus quem castiga; as Leis de Deus se exercem com rigor e precisão, e cada qual colhe o que semeou. Assim, não há propriamente perdão das faltas cometidas; mas, o ressarcimento delas pela prática de atos meritórios. E é por isso que o Senhor ensinou que é preciso perdoar os desafetos, enquanto se está a caminho com eles (conforme se lê em Mt 5:25) o que significa que se deve perdoar os ofensores enquanto se está convivendo com eles aqui na Terra, que é o local dos reajustes, provas e expiações. E o perdão precisa ser amplo, geral e incondicional. É este o ensinamento que se lê em Mt 18:21-22, quando, respondendo a uma indagação de Simão Pedro, Jesus disse que Não deveis perdoar sete, mas setenta vezes sete vezes. Para que isto se torne possível, para facilitar a decisão de perdoar continuamente, é preciso ter sempre presente que as pessoas não são propriamente más, mas frágeis; é por causa da fragilidade do caráter, da fraqueza da vontade que as pessoas são arrastadas pelo orgulho, egoísmo, prepotência, incivilidade, e se tornam presunçosas; daí resulta que o vizinho age como mau vizinho, o companheiro de trabalho como mau companheiro, o patrão como mau patrão, o empregado como mau empregado.
Mesmo porque cada qual colhe o que semeou; por isso, não precisamos odiar os desafetos, pois a própria vida se encarregará de endireitar-lhes a trajetória; portanto, é certo que mais dias, menos dias, receberão tudo na mesma moeda. Não há, pois, com que se amargurar com as atitudes e ações dos que convivem conosco; é esquecê-los. E, finalmente, na Oração Dominical Jesus ensinou Perdoai nossas dívidas, como perdoamos nossos inimigos. A parábola focaliza, ainda, uma questão importantíssima: não há penas eternas. De fato: diz a narrativa que o senhor entregou o servo incompassivo aos atormentadores, até que pagasse tudo o que devia o que significa que há sempre um limite no pagamento das dívidas. Por maior que seja a dívida de cada qual com a Justiça Divina, ninguém é coagido a ficar pagando eternamente; pode ser que o devedor atravesse longos períodos de dor e sofrimento, muitas existências expiatórias; mas uma vez quitado seu débito, ressarcida sua dívida, ele sobe para os páramos celestiais. E para encerrar o estudo que estamos fazendo desta parábola, lembramos que o rei representa Deus, o Senhor do Universo; e que todos são grandes devedores, dívida, esta, representada pelas muitas faltas e transgressões às Leis Divinas, cometidas através das encarnações. No entanto, o Pai sempre nos acolhe de volta. (É o grande ensinamento da Parábola do Filho Pródigo, Lc 15:11-32). PARÁBOLA DO CREDOR INCOMPASSIVO Mateus 18.23-34 23 Por isso, o Reino dos céus pode comparar-se a um certo rei que quis fazer contas com os seus servos; 24 e, começando a fazer contas, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos. 25 E, não tendo ele com que pagar, o seu senhor mandou que ele, e sua mulher, e seus filhos fossem vendidos, com tudo quanto tinha, para que a dívida se lhe pagasse. 26 Então, aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: Senhor, sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. 27 Então, o senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida. 28 Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos que lhe devia cem dinheiros e, lançando mão dele, sufocava-o, dizendo: Paga-me o que me deves. 29 Então, o seu companheiro, prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: Sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. 30 Ele, porém, não quis; antes, foi encerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida. 31 Vendo, pois, os seus conservos o que acontecia, contristaram-se muito e foram declarar ao seu senhor tudo o que se passara. 32 Então, o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: Servo malvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste. 33 Não devias tu, igualmente, ter compaixão do teu companheiro, como eu também tive misericórdia de ti? 34 E, indignado, o seu senhor o entregou aos atormentadores, até que pagasse tudo o que devia.
Explicação da Parábola do Credor Incompassivo por Caibar Schutel: No capítulo VI do Sermão do Monte, segundo Mateus, versículo 5 a 15, ensinou Jesus a seus discípulos e à multidão que se apinhava para ouvir os seus ensinos, a maneira como se deveria orar; e aproveitou o ensejo para resumir num excelente e substancioso colóquio com Deus, a súplica que ao Poderoso Senhor devemos dirigir cotidianamente. O Mestre renegava as longas e intermináveis rezas que os escribas e fariseus do seu tempo proferiam, de pé nas sinagogas e nos cantos das ruas, para serem vistos pelos homens. Observou a seus ouvintes que tal não fizessem, mas que, fechada a porta do seu quarto, dirigissem, em secreto, a súplica ao Senhor. A fórmula de oração que lhes deu encerra, ao mesmo tempo, pedidos e compromissos que teriam de assumir os suplicantes, e dos quais se destaca o que constitui objeto dos ensinos que se acham contidos na Parábola do Credor Incompassivo: Perdoa as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores. Acontece ainda que o perdão, conforme o Cristo ensinou a Pedro, deve ser perpétuo, e não concedido uma, duas, ou sete vezes. Daí vem a Parábola explicativa da concessão que devemos fazer ao nosso próximo, para podermos receber de Deus o troco na mesma moeda. Vemos que o primeiro servo a chegar foi justamente o que mais devia: 10.000 talentos! Soma fabulosa naquele tempo, para um trabalhador, não só naquele tempo como também hoje, para um servo, que só tinha mulher, filhos e alguns haveres. Jesus escolheu mesmo essa quantia avultada para melhor impressionar seus ouvintes sobre a bondade de Deus e a natureza da doutrina que em nome do Senhor estava transmitindo a todos. Nenhum outro devedor foi lembrado na Parábola, porque só o primeiro era bastante para que se completasse toda a lição. Pois bem, esse devedor, vendo-se ameaçado de ser vendido com ele sua mulher e seus filhos, sem eximir-se do pagamento, pediu moratória, valendo-se da benevolência do rei; este, cheio de compaixão, perdoou-lhe a dívida, isto, suspendeu as ordens que havia dado para que tudo quanto possuía, mulher, filhos e o mesmo servo, fosse vendido para pagamento, visto como ele se propunha a pagar com prazo. Mas, continua a parábola, aquele devedor, que havia recebido o perdão, logo ao sair encontrou um de seus companheiros que lhe devia cem denários, ou seja, uma verdadeira bagatela que para ele, homem devedor de 10.000 talentos, por certo nada representava; e exigiu do devedor, violentamente, o seu dinheiro! Ao desdobrar-se aquela cena, os seus companheiros que haviam presenciado tudo o que se passara, indignaram-se e foram contar ao rei o acontecido. Dai a nova resolução do Senhor:
entregou o servo malvado aos verdugos, a fim de que o fizessem trabalhar à força, até que lhe pagasse tudo o que lhe devia. Esta última condição é também interessante: paga a dívida, recebe o devedor a quitação; o que quer dizer: sublata causa, tolitur effectus. A dívida deve forçosamente constar de um certo número de algarismos; subtraídos estes por outros tantos semelhantes, o resultado há de ser zero. Quem deve 2 e paga 2, nada fica devendo; não pode continuar a ficar pagando a dívida. Isto é mais claro que água cristalina. Termina Jesus a Parábola afirmando: Assim também meu Pai Celestial vos fará, se cada um de vós do íntimo do coração não perdoar a seu irmão. Sem dúvida, é tão difícil a um pecador pagar 10.000 mil pecados, como a um trabalhador pagar 10.000 talentos. Mas, tanto um como o outro têm a Eternidade diante de si; o que não se pode fazer numa existência, far-se-á em duas, vinte, cinquenta, far-se-á na Outra Vida, em que o Espírito não está inativo. Tudo isso está de acordo com a bondade de Deus, aliada à sua justiça; o que não pode ser é o indivíduo pagar eternamente e continuar a pagar, depois de já ter pago. A lei do perdão é inflexível, reina no Céu tal como a prescreveu na Terra o Mestre Nazareno, cujo Espírito, alheio aos princípios sacerdotais, aos dogmas e mistérios das Igrejas, deve ser ouvido, respeitado, amado e servido. Explicação da Parábola do Credor Incompassivo por Rodolfo Calligaris: Esta parábola de Jesus é uma ilustração admirável daquela frase contida na oração dominical, em que Ele nos ensina a rogar ao Pai celestial: "perdoa as nossas dívidas assim como nós perdoamos aos nossos devedores". O primeiro servo era devedor da quantia de dez mil talentos, soma fabulosa. Esse devedor, vendo-se ameaçado de ser vendido, e mais a mulher, os filhos, e tudo quanto possuía, para resgate da dívida, pediu moratória, isto é, um prazo para que pudesse satisfazer a tão vultoso compromisso, e o rei compadecendo-se dele, deferiu-lhe o pedido. Pois bem, mal havia obtido tão generoso atendimento, eis que encontrou um companheiro que lhe devia uma bagatela, ou seja, cem denários, e, para reaver o seu dinheiro, não titubeou em usar de recursos violentos. Lamentavelmente, esta é, ainda em nossos dias, a norma de conduta de grande parte da Humanidade. Reconhece-se pecadora, não nega estar sobrecarregada de dívidas perante Deus, cujas leis transgride a todo instante, mas, ao mesmo tempo que suplica e espera ser perdoada de todas as suas prevaricações, age, com relação ao próximo, de forma diametralmente oposta, negando-se a desculpar e a tolerar quaisquer ofensas, por mínimas que sejam.
Continua a parábola dizendo que o rei, posto a par do que havia acontecido com o segundo servo, mandou vir o primeiro à sua presença e, em nova disposição, após verberarlhe a falta de comiseração para com o seu companheiro, determinou aos verdugos que o prendessem e o fizessem trabalhar à força "até que pagasse tudo quanto lhe devia". Este tópico da narrativa evangélica é de suma importância. Revela, claramente, que há sempre um limite no pagamento das dívidas. Estas podem, algumas vezes, serem realmente muito vultosas, como no caso prefigurado dez mil talentos! - Mas, uma vez pago esse montante, o devedor fica com direito à quitação. Semelhantemente, o pagamento de dez mil pecados pode determinar longos períodos de sofrimento, muitas existências expiatórias, mas, uma vez restabelecido o equilíbrio na balança da Justiça Divina, ninguém pode ser coagido a ficar pagando eternamente aquilo de que já se quitou. Jesus finaliza, afirmando: "Assim também meu Pai celestial vos fará, se cada um de vós, do íntimo do coração, não perdoar a seu irmão". Disto se conclui que a vontade de Deus é que nos adestremos na prática do perdão e da indulgência, e, para estimular-nos à conquista dessas virtudes, a todos favorece com sua longanimidade e inexcedível misericórdia. Àqueles, porém, que se mostram impiedosos e brutais nas atitudes que assumem contra os que os ofendem ou prejudicam, faz que conheçam, a seu turno, o rigor da Providência, a fim de que aprendam, por experiência própria, qual a melhor maneira de tratar seus semelhantes. Página de Emmanuel Livro: Caminho Verdade e Vida lição 20 O Companheiro Não devias tu igualmente ter compaixão do teu companheiro, como eu também tive misericórdia de ti? Jesus. (Mateus, 18:33.) Em qualquer parte, não pode o homem agir isoladamente, em se tratando da obra de Deus, que se aperfeiçoa em todos os lugares. O Pai estabeleceu a cooperação como princípio dos mais nobres, no centro das leis que regem a vida. No recanto mais humilde, encontrarás um companheiro de esforço. Em casa, ele pode chamar-se pai ou filho ; no caminho, pode denominar-se amigo ou camarada de ideal. No fundo, há um só Pai que é Deus e uma grande família que se compõe de irmãos.
Se o Eterno encaminhou ao teu ambiente um companheiro menos desejável, tem compaixão e ensina sempre. Eleva os que te rodeiam. Santifica os laços que Jesus promoveu a bem de tua alma e de todos os que te cercam. Se a tarefa apresenta obstáculos, lembra-te das inúmeras vezes em que o Cristo já aplicou misericórdia ao teu espírito. Isso atenua as sombras do coração. Observa em cada companheiro de luta ou do dia uma bênção e uma oportunidade de atender ao programa divino, acerca de tua existência. Há dificuldades e percalços, incompreensões e desentendimentos? Usa a misericórdia que Jesus já usou contigo, dando-te nova ocasião de santificar e de aprender.