Associação Os Montanheiros Boletim Informativo n.º 37 Dezembro 2013

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Transcrição:

L A I C E P ES S O N A 50 13 0 2 / 3 196 ~ O NASCIMENTO DOS MONTANHEIROS UMA EXPERIÊNCIA GRATIFICANTE NUMA COLECTIVIDADE EXEMPLAR O CURRICULUM DE UMA EXISTÊNCIA (1963-1980) ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS ILHAS DE VULCÕES E DE GEODIVERSIDADE A VINHA DA ILHA DO PICO ASPETOS GERAIS DOS SOLOS DOS AÇORES FLORESTA NATURAL DOS AÇORES BIODIVERSIDADE MARINHA BIODIVERSIDADE DOS ARTRÓPODES BICHOS E OUTRAS CRIATURAS DAS PROFUNDEZAS A AVIFAUNA AÇORIANA CARACÓIS E LESMAS DOS AÇORES LÍQUENES: PEQUENAS OBRAS DE ARTE 13 IDEIAS SOBRE MUSGOS VIDA MICROBIANA NAS GRUTAS Associação Os Montanheiros Boletim Informativo n.º 37 Dezembro 2013

04 06 O Nascimento dos Montanheiros Américo de Lemos Silveira Luiz Uma experiência gratificante Numa colectividade exemplar Luís Conde Pimentel 04 06 09 09 O curriculum de uma existência (1963-1980) Paulo J. M. Barcelos & João Moniz 24 Alterações climáticas e seus impactos nos recursos hídricos dos Açores Eduardo M. V. Brito de Azevedo 24 27 27 35 Arquipélago dos Açores: ilhas de vulcões e de geodiversidade João Carlos Nunes Solos dos Açores: aspectos gerais Jorge Pinheiro, João Madruga & Manuel Madeira 35 38 38 Paisagem da cultura da vinha da ilha do Pico Património Mundial Manuel Paulino Soares Ribeiro da Costa 40 43 Biodiversidade marinha dos Açores João Pedro Barreiros Floresta natural dos Açores Rui Bento Elias 40 43 46 52 Biodiversidade dos artrópodes dos Açores Paulo A. V. Borges & Grupo BALA Bichos e outras criaturas das profundezas habitats subterrâneos dos Açores Isabel R. Amorim, Fernando Pereira, Rosalina Gabriel & Paulo A.V. Borges índice 57 60 Caracóis e lesmas dos Açores: uma riqueza escondida António M. de Frias Martins A avifauna açoriana: um património a preservar Carlos Pereira & Cecília Melo 46 52 63 Líquenes: estas pequenas obras de arte naturais que nos indicam a qualidade do ar Félix Rodrigues 69 Vida microbiana nas grutas dos Açores Maria de Lurdes Nunes Enes Dapkevicius & Cristina Riquelme Gabriel 57 60 63 76 Musgos!? 13 ideias sobre musgos e outras plantas dos Açores Rosalina Gabriel, Nídia Homem, Silvia Calvo Aranda, Márcia C. M. Coelho, Débora Henriques & Fernando Pereira 86 Ficha técnica 69 76 3

PAULO A. V. BORGES 1 & GRUPO BALA * BIODIVERSIDADE DOS ARTRÓPODES DOS AÇORES Pisaura acoreensis. Foto: Paulo A. V. Borges *ISABEL R. AMORIM 1, GENAGE ANDRÉ 2, PEDRO CARDOSO 1,3, LUIS CARLOS CRESPO 1, CLARA GASPAR 1, JOAQUÍN HORTAL 1,4, CATARINA MELO 1, FERNANDO PEREIRA 1, JOSÉ A. QUARTAU 2, CARLA REGO 1, SÉRVIO P. RIBEIRO 5, FRANÇOIS RIGAL 1, ANA M.C. SANTOS 1.4, ARTUR R.M. SERRANO 2, ANTÓNIO O. SOARES 1, ANTÓNIO A.B. SOUSA 6, KOSTAS A. TRIANTIS 1,7, VIRGÍLIO VIEIRA 1 46 OS ARTRÓPODES SÃO O GRUPO MAIS DIVERSO DE ORGANISMOS VIVOS no nosso planeta (Imagem 1). Por exemplo, para os insectos (o grupo mais diverso de artrópodes) existem actualmente cerca de 1.000.000 espécies descritas, o que corresponde a cerca de dois terços do número total de espécies de organismos vivos conhecidos. Os artrópodes, que incluem não só os insectos mas também os aracnídeos (aranhas, ácaros, opiliões, pseudoescorpiões e escorpiões), crustáceos, quilópodes (centopeias) e diplópodes são considerados como as formas de vida dominante no planeta Terra. Em 1987, Edward Wilson referiu-se a estes organimos como as pequenas coisas que governam o mundo (Wilson 1987), dando assim ênfase ao seu papel de primordial importância nos ecossistemas. Por exemplo, os decompositores (e.g. crustáceos terrestres, parte dos ácaros, diplópodes, colêmbolos e alguns grupos de insectos como as larvas de muitos dípteros) consomem quantidades significativas de plantas mortas, excrementos e carcaças, desempenhando um papel importante na reciclagem de nutrientes. Os predadores (e.g. quilópodes, aranhas, pseudoescorpiões, opiliões, parte dos ácaros e vários grupos de insectos como os carabídeos, estafilinídeos, larvas de crisopas, formicídeos, hi- 1 Grupo da Biodiversidade dos Açores(CITA-A) e Plataforma de Pesquisa em Ecologia e Sustentabilidade em Portugal (PEERS), Departamento de Ciências Agrárias, Universidade dos Açores, 9700-042 Angra do Heroísmo, Terceira, Azores, Portugal. 2 Centro de Biologia Ambiental (DZA), Faculdade de Ciências de Lisboa, e Plataforma de Pesquisa em Ecologia e Sustentabilidade em Portugal (PEERS), R. Ernesto de Vasconcelos, Ed. C2, 3º Piso, Campo Grande, P-1749-016 Lisboa. 3 Finnish Museum of Natural History, University of Helsinki, Pohjoinen Rautatiekatu 13, P.O.Box 17, 00014 Helsinki, Finland. 4 Departamento de Biogeografía y Cambio Global, Museo Nacional de Ciencias Naturales (CSIC), C/José Gutiérrez Abascal 2, 28006 Madrid, Spain. 5 Universidade Federal de Ouro Preto, Instituto de Ciências Exatas e Biológicas, DECBI, Laboratório de Ecologia Evolutiva de Herbívoros de Dossel. Campus Morro do Cruzeiro, 35400-000, Ouro Preto, MG, Brazil. 6 SPEN Sociedade Portuguesa de Entomologia, Apartado 8221, P-1803-001 Lisboa, Portugal. 7 Department of Ecology and Taxonomy, Faculty of Biology, National and Kapodistrian University of Athens, Athens GR-15784, Greece.

BIODIVERSIDAE DOS ARTRÓPODES DOS AÇORES A B C D E F G IMAGEM 1 Alguns exemplos de espécies de artrópodes dos Açores: A. Escaravelho-dos-troncos (Acanthoderes jaspidea); B. Gorgulho-do-azevinho (Calacalles subcarinatus); C. Traça-do-cedro-do-mato (Cyclophora azorensis); D. cigarra-das-árvores (Cyphopterum adcendens); E. Aranha-saltadora-das-copas (Macaroeris diligens); F. Aranha-do-cedro-do-mato (Savigniorrhipis acoreensis); G. Escaravelho-cascudo-da-mata (Tarphius azoricus); H. Mosca (Scathophaga stercoraria). Fotos: Paulo A. V. Borges (Azorean Biodiversity Group, CITA-A) H 47

ESPECIAL 50 ANOS menópteros parasitóides) e os fitófagos (parte dos ácaros, vários grupos de insectos como os ortópteros, tisanópteros, maioria dos hemípteros, lepidópteros e muitos grupos de coleópteros) têm um papel fundamental nas cadeias tróficas terrestres, alimentando-se, respectivamente, de uma grande quantidade de outros artrópodes e de plantas. Por sua vez, todos estes grupos, em maior ou menor escala, integram as cadeias alimentares de numerosos grupos de vertebrados (anfíbios, répteis, aves e mamíferos) e até de algumas plantas, designadas genéricamente por carnívoras ou insectívoras. Os polinizadores, tais como os himenópteros apídeos (vulgo abelhas e abelhões) e vespídeos (vulgo vespas) e ainda certos grupos de coleópteros, dípteros e lepidópteros (respectivamente vulgo besouros, moscas e borboletas) contribuem ainda para a reprodução cruzada das plantas com flor (angiospérmicas). Nas ilhas dos Açores, à semelhança de outras regiões no mundo, os artrópodes terrestres também são o grupo mais diverso de animais (Fig. 1). Foram registadas até à data (ver Borges et al. 2010 actualizado) 2316 espécies e subespécies de artrópodes terrestres nos Açores, pertencendo a 51 ordens e 412 famílias. A partir da informação contida no Quadro 1 pode-se verificar que os insectos são o grupo mais diverso, com 1757 espécies e subespécies, correspondendo a 76% do número total dos artrópodes registados para os Açores. As ordens mais diversas a nível mundial também o são nos Açores, nomeadamente: os Coleoptera (escaravelhos e besouros) com 541 taxa; os Diptera (moscas e mosquitos) com 419 taxa; os Lepidoptera (mariposas e borboletas) com 151 taxa e os Hymenoptera (vespas, abelhas e formigas) com 140 taxa; A diversidade dos Hemiptera (percevejos) com 329 taxa neste arquipélago é igualmente notável. Outros dois grupos de artrópodes também estão presentes, sendo representados por um grande número de espécies: os Araneae (aranhas) com 131 taxa, e os Acari (ácaros) com 203 taxa (ver Quadro 1). A análise da distribuição das espécies e subespécies pelas várias ilhas mostra claramente que a ilha de São Miguel é a mais rica, apresentando cerca de 1592 espécies e subespécies conhecidas, seguindo-se a Terceira (1224) e o Faial (947) (ver Quadro 1). QUADRO 1. DIVERSIDADE DOS DIVERSOS GRUPOS DE ARTRÓPODES NOS AÇORES (ACTUALIZADO DE BORGES ET AL. 2010). Grandes grupos Taxonómicos Nome comum AZ COR FLO FAI PIC SJG GRA TER SMG SMR TOTAL Phylum Arthropoda Artrópodes Subphylum Chelicerata 5 33 96 137 121 82 81 200 202 118 327 Classe Arachnida Subclasse Dromopoda Ordem Pseudoscorpiones Pseudoscorpiões 2 3 3 4 4 4 5 5 3 10 Opiliones Opiliões 2 2 2 1 1 2 3 1 3 Subclasse Micrura Ordem Araneae Aranhas 31 69 73 71 61 55 97 97 76 131 Subclasse Acari Ácaros Ordem Astigmata 4 8 4 4 10 10 16 Oribatida 3 14 33 23 8 21 60 56 36 113 Prostigmata 1 8 7 3 14 10 19 Ixodida 1 1 1 5 8 6 2 11 Mesostigmata 1 2 9 5 1 4 15 24 Subphylum Crustacea Crustáceos 46 3 15 28 21 2 9 19 34 18 92 Classe Ostracoda Ostracodes 14 14 Classe Maxillopoda Copépodos 20 20 Classe Malacostraca Bichos de conta 1 3 15 28 21 2 9 19 34 18 47 Classe Branchiopoda Branquiópodes 11 11 Subphylum Myriapoda Miriápodes 1 11 20 20 21 11 14 23 33 25 40 48 Classe Symphyla Sinfilos 1 2 1 2 1 1 3 3 Classe Pauropoda Paurópodes 1 1 Classe Diplopoda Bichos carta 6 12 12 11 7 7 12 21 15 22

BIODIVERSIDAE DOS ARTRÓPODES DOS AÇORES Grandes grupos Taxonómicos Nome comum AZ COR FLO FAI PIC SJG GRA TER SMG SMR TOTAL Classe Chilopoda Centopeias 1 4 5 7 8 4 7 10 11 7 14 Subphylum Hexapoda Hexápodes Classe Collembola Colêmbolos 1 24 34 31 13 6 26 79 20 95 Classe Diplura Dipluros 2 1 1 1 1 2 3 Classe Protura Proturos 1 1 1 Classe Insecta Insectos 54 215 642 726 612 510 366 955 1242 611 1757 Ordem Microcoryphia Peixinhos de prata da floresta 1 1 2 4 2 1 2 2 2 4 Zygentoma Peixinhos de prata 1 1 2 3 3 3 3 Ephemeroptera Efémeras 1 1 1 1 1 1 1 1 Odonata Libélulas 4 4 4 4 4 2 4 4 4 4 Blattodea Baratas 1 1 2 3 2 2 1 4 6 4 7 Orthoptera Gafanhotos, grilos 4 3 7 7 2 3 8 14 11 16 Isoptera Térmitas 3 1 3 2 1 4 Phasmatodea Bicho-Pau 2 1 2 1 2 Dermaptera Bichas-cadela 2 3 4 3 4 4 4 5 3 5 Psocoptera Psocópteros 6 8 12 9 8 8 18 33 16 36 Phthiraptera Piolhos 3 3 2 8 2 10 19 Hemiptera Percervejos, cigarras, etc. 21 39 132 104 80 61 54 168 241 112 329 Thysanoptera Tripes 5 27 22 22 6 34 32 28 49 Neuroptera Neurópteros 4 6 6 5 3 7 7 4 7 Coleoptera Escaravelhos, besouros 5 42 198 244 184 146 141 303 350 281 541 Strepsiptera Estrepsípteros 1 1 Siphonaptera Pulgas 5 2 1 2 2 10 12 5 15 Diptera Moscas, mosquitos 12 55 190 181 148 170 59 217 339 40 419 Trichoptera Tricópteros 1 2 3 3 3 2 2 3 4 Lepidoptera Borboletas, traças 50 66 79 96 63 64 108 112 68 151 Hymenoptera Vespas, formigas, abelhas 11 9 17 38 38 15 9 57 72 17 140 TOTAL 106 263 798 947 807 619 476 1224 1592 794 2316 Com base na informação disponível, os artrópodes dos Açores foram classificados em três tipos de estatutos de colonização: endémicas, nativas e introduzidas (ver Borges et al. 2010). As espécies endémicas ocorrem apenas nos Açores em resultado de fenómenos evolutivos de especiação local (neo-endemismos) ou extinção das populações que existiam no continente (paleo-endemismos); espécies nativas são as que chegaram aos Açores pelos seus próprios meios, usando mecanismos de dispersão a longa distância, mas que são conhecidas de outros arquipélagos ou zonas continentais; espécies introduzidas, são aquelas que chegaram aos Açores como resultado das actividades humanas, muitas delas com ampla distribuição mundial. O arquipélago dos Açores possui cerca de 270 espécies e subespécies endémicas registadas. As ordens que, em geral, em outras regiões têm um grande número de espécies endémicas também nos Açores são bastante ricas (Quadro 2): Coleoptera com 73 taxa endémicos (14% de endemismo), Diptera com 51 taxa (12% de endemismo) e Lepidoptera com 37 taxa endémicos (25% de endemismo). Os Arachnida Araneae (aranhas) com 26 endemismos (20%) e os Acari (ácaros) com 27 endemismos (15%) são também grupos particularmente diversos em taxa endémicos. 49

ESPECIAL 50 ANOS QUADRO 2. DIVERSIDADE DE ESPÉCIES E SUBESPÉCIES DE ARTRÓPODES ENDÉMICOS DOS AÇORES POR ORDEM. ORDEM Total Coleoptera 73 Diptera 51 Lepidoptera 37 Acari: Oribatida 27 Araneae 26 Hemiptera, Fulgoromorpha 12 Hymenoptera 11 Amphipoda 4 Hemiptera, Heteroptera 4 Lithobiomorpha 3 Cyclopoida 2 Entomobryomorpha 2 Hemiptera, Cidadomorpha 2 Isopoda 2 Microcoryphia 2 Pseudoscorpiones 2 Psocoptera 2 Hemiptera, Sternorrhyncha 1 Neuroptera 1 Orthoptera 1 Poduromorpha 1 Polydesmida 1 Tetramerocerata 1 Thysanoptera 1 Trichoptera 1 Total 270 A curva de acumulação da descoberta de novas espécies e subespécies de artrópodes endémicas dos Açores (ver imagem 2), ilustra o tempo que foi necessário para atingir o conhecimento que temos hoje acerca deste grupo animal. Em 1950 apenas era conhecida 37% da fauna endémica de artrópodes actual; em 1980, apenas 50% das espécies tinham sido descritas. Para se atingir o patamar dos 90% será então necessário considerar as descrições publicadas até 2004. Existe um aumento notável no número de espécies endémicas descritas após 1960. Houveram, em média, quatro novas espécies descritas por ano desde 1990 (últimos 23 anos)! Este padrão reflecte, por um lado, o crescente interesse pela fauna dos Açores por parte dos entomólogos estrangeiros, mas igualmente o papel da Universidade dos Açores no fomento de projectos de colaboração. No entanto, as 267 espécies de artrópodes endémicos actualmente conhecidas constituem uma estimativa pobre da realidade, estimando-se que o valor real seja muito superior (Lobo & Borges 2010). A DIVERSIDADE DE ESPÉCIES INTRODUZIDAS É PARTICULARMENTE elevada nos Açores, em particular nas Araneae (aranhas), Diplopoda (milípedes) e Aphidoidea (afídeos), enquanto que nos Lepidoptera (borboletas) e nos Thysanoptera (tripes) predoniam espécies indígenas (Borges et al. 2005). Por outro lado, no caso dos Coleoptera (escaravelhos), 40% das espécies são indígenas (nativas ou endémicas) (Borges et al. 2005). Como tem sido constatado por vários autores (Cardoso et al. 2009; Meijer et al. 2011), as invasões por espécies de artrópodes constituem um problema actual e com impactos futuros na biodiversidade dos Açores, criando um padrão de uniformização da fauna (ver também Florencio 2013). Tendo em consideração as incertezas que persistem no que concerne a muitos grupos mal estudados (e.g. Acari, Hymenoptera, Diptera, etc.), a verdadeira dimensão da riqueza de espécies de artrópodes dos Açores permanecerá desconhecida durante muitos mais anos, constituindo uma área critíca de investigação em biodiversidade no arquipélago. A destruição da floresta nativa nas ilhas dos Açores e da vida selvagem a ela associada começou há cerca de 550 anos atrás, aquando da colonização humana. Hoje enfrentamos um problema adicional, o das espécies invasoras. Podemos predizer então que a diversidade de espécies de artrópodes conhecidos dos Açores vai continuar a aumentar por duas vias, a descoberta de espécies endémicas e nativas ainda não inventariadas e a entrada de novas espécies trazidas para o arquipélago em consequência das actividades humanas (ver Borges et al. 2013). 50 IMAGEM 2 Diversidade acumulada temporal de espécies e subespécies (S) de artrópodes endémicos dos Açores.

BIODIVERSIDAE DOS ARTRÓPODES DOS AÇORES A agenda para os estudos futuros de biodiversidade dos Açores devem incluir (modificado de Borges et al. 2005, 2010): a) Investimento nos inventários de forma a melhorar o conhecimento da distribuição das espécies dentro das ilhas, tanto em habitats nativos como nos habitats modificados pelo Homem; b) Investimento sério em revisões taxonómicas de grupos muito mal conhecidos, tal como os Diptera e Hymenoptera; c) Tentar responder à questão: estarão as espécies exóticas a seguir os mesmos padrões ecológicos e biogeográficos das espécies indígenas? d) Tentar compreender quais são os factores relacionados com a taxa de especiação nos Arthropoda. Serão os factores históricos realmente importantes? Qual é o papel da área e da diversidade de habitats? e) Investigar se estará a diversidade dos vários taxa terrestres relacionada com os mesmas variáveis ecológicas e biogeográficas, e como é que esses padrões variam em escalas diferentes. f) Investigar o impacto das alterações climáticas, das alterações do uso do solo e da introdução de espécies nas comunidades nativas dos Açores. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Borges, P.A.V., Cunha, R., Gabriel, R., Martins, A. F., Silva, L., Vieira, V., Dinis, F., Lourenço, P. & Pinto, N. (2005). Description of the terrestrial Azorean biodiversity. In: P.A.V. Borges, R. Cunha, R. Gabriel, A.M.F. Martins, L. Silva, & V. Vieira (Eds), A list of the terrestrial fauna (Mollusca and Arthropoda) and flora (Bryophyta, Pteridophyta and Spermatophyta) from the Azores. pp. 21-68. Direcção Regional de Ambiente and Universidade dos Açores, Horta, Angra do Heroísmo and Ponta Delgada. Borges, P.A.V., Vieira, V., Amorim, I.R., Bicudo, N., Fritzén, N., Gaspar, C., Heleno, R., Hortal, J., Lissner, J., Logunov, D., Machado, A., Marcelino, J., Meijer, S.S., Melo, C., Mendonça, E.P., Moniz, J., Pereira, F., Santos, A.S., Simões, A.M., Torrão, E. (2010). List of arthropods (Arthropoda). In: P.A.V Borges, A. Costa, R. Cunha, R. Gabriel, V. Gonçalves, A.F. Martins, I Melo, M. Parente, P. Raposeiro, P. Rodrigues, R.S. Santos, L. Silva, P. Vieira & V. Vieira (Eds.) A list of the terrestrial and marine biota from the Azores. pp. 179-246, Princípia, Cascais, 432 pp. Borges, P.A.V., Reut, M., Ponte, N.B., Quartau, J.A., Fletcher, M., Sousa, A.B., Pollet, M., Soares, A.O., Marcelino, J., Rego, C. & Cardoso, P. (2013). New records of exotic spiders and insects to the Azores, and new data on recently introduced species. Arquipélago Life and Marine Sciences, 30: 57-70 Cardoso, P., Lobo, J.M., Aranda, S.C., Dinis, F., Gaspar, C. & Borges, P.A.V. (2009). A spatial scale assessment of habitat effects on arthropod communities of an oceanic island. Acta Oecologica, 35: 590-597. Florencio, M., Cardoso, P., Lobo, J.M., Azevedo, E.B. & Borges, P.A.V. (2013). Arthropod assemblage homogenisation in oceanic islands: the role of exotic and indigenous species under landscape disturbance. Diversity and Distributions (In press). Lobo, J. & Borges, P.A.V. (2010). The provisional status of arthropod inventories in the Macaronesian islands. In A.R.M. Serrano, P.A.V. Borges, M. Boieiro & P. Oromí (Eds.). Terrestrial arthropods of Macaronesia Biodiversity, Ecology and Evolution. pp. 33-47. Sociedade Portuguesa de Entomologia, Lisboa. Meijer, S.S., Whittaker, R.J. & Borges, P.A.V. (2011). The effects of land-use change on arthropod richness and abundance on Santa Maria Island (Azores): unmanaged plantations favour endemic beetles. Journal of Insect Conservation, 15: 505-522. Wilson, E.O. (1987) The little things that run the world (the importance and conservation of invertebrates). Conservation Biology, 1: 344-346. 51

ficha técnica PINGO DE LAVA NÚMERO 37 DEZEMBRO 2013 NAS COMEMORAÇÕES DO 50º ANIVERSÁRIO DA ASSOCIAÇÃO ASSOCIAÇÃO OS MONTANHEIROS CORPOS SOCIAIS BIÉNIO 2013/2014 DIRETOR EXECUTIVO: PAULO J. M. BARCELOS ASSEMBLEIA-GERAL MARIA MARCELINA SILVA ALVES CONSELHO EDITORIAL: JOSÉ MARIA BOTELHO, JOSÉ GABRIEL FICHER, FERNANDO PEREIRA, PAULO HENRIQUE MENDONÇA VICE- JOSÉ DANIEL DE SOUSA DA COSTA JOSÉ ANTÓNIO NÓIA TRIGUEIRO EDIÇÃO E PROPRIEDADE: ASSOCIAÇÃO OS MONTANHEIROS ORGANIZAÇÃO NÃO GOVERNAMENTAL DE AMBIENTE REVISTA OFICIAL REDAÇÃO: RUA DA ROCHA, 8 9700-169 ANGRA DO HEROÍSMO +351 295212992 MONTANHEIROS@MONTANHEIROS.COM PERIODICIDADE: DISTRIBUIÇÃO: ANUAL GRATUITA DIRECÇÃO PAULO JOSÉ MENDES BARCELOS JOSÉ MARIA FERREIRA BOTELHO TESOUREIRO JOSÉ GABRIEL DA ROSA FICHER 1º VOGAL FERNANDO EMANUEL AMARANTE PACHECO PEREIRA 2º VOGAL PAULO HENRIQUE LOPES MENDONÇA CONSELHO FISCAL VICE- ANTÓNIO PAULO VAZ SOARES GIL DA SILVA NAVALHO LUÍS ANTÓNIO NASCIMENTO PARREIRA DESIGN GRÁFICO: IMPRESSÃO: TIRAGEM: DEPÓSITO LEGAL: COPYRIGHT 2013: CECILIA-DESIGNS.COM NOVA GRÁFICA, LDA 800 EXEMPLARES ASSOCIAÇÃO OS MONTANHEIROS PROIBIDA A REPRODUÇÃO DE ARTIGOS, NO TODO OU EM PARTE, POR QUALQUER MEIO, SEM A AUTORIZAÇÃO DOS AUTORES. DIRECÇÃO DE NÚCLEO ILHA DO PICO MARIA JOÃO RAFÔTO LEAL CARLA SUSANA GOULART MARTINS DA SILVA TESOUREIRO VALTER NUNO RODRIGUES MEDEIROS DIRECÇÃO DE NÚCLEO ILHA DE SÃO JORGE RUI CARLOS BRASIL PEREIRA MARCO ANDRÉ SOARES CORDEIRO BETTENCOURT TESOUREIRO RUI NIVALDO DA ROSA ÂNGELO OS ARTIGOS ASSINADOS SÃO DA EXCLUSIVA RESPONSABILIDADE DOS SEUS AUTORES A autoria das fotografias iniciais dos artigos das páginas 35, 43, 52, 57, 60, 63 e 69 é de Paulo Henrique Silva http://siaram.azores.gov.pt DIRECÇÃO DE NÚCLEO ILHA DE SÃO MIGUEL JOÃO PAULO ALVÃO SERRA DE MEDEIROS CONSTÂNCIA JOÃO CARLOS CARREIRO NUNES TESOUREIRO PEDRO DIAS FREIRE 86