Inês Albuquerque Amaral Instituto Superior Miguel Torga

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As Outras Vítimas 1. Marta Cruz 2 Alejandro Sepúlveda 3 Universade de Fortaleza, Fortaleza, Ceará

Transcrição:

Inês Albuquerque Amaral Instituto Superior Miguel Torga (inesamaral@ismt.pt)

Qual o peso das fontes de informação anónimas no jornalismo de investigação? Análise crítica da relevância das fontes anónimas na produção jornalística de trabalhos de investigação. Estudo de caso: o jornal Expresso.

As fontes anónimas têm um peso significativo no jornalismo de investigação e são reveladas no discurso como forma de validar a informação.

JI não é sinónimo de investigação jornalística. JI não é sinónimo de reportagem. JI assume um carácter excepcional face à dependência de fontes oficiais. JI traduz a teoria do jornalista como o cão de guarda da sociedade.

O processo Casa Pia e o jornal Expresso

A exposição mediática do processo começa com um artigo publicado no Expresso a 23 de Novembro de 2002, sobre um funcionário da instituição. O jornal foi o primeiro a noticiar o caso, facto de que poderá ter acelerado o papel da própria investigação policial. A25deNovembro, CarlosSilvinoépreso. Exactamente dois anos depois da prisão de Silvino, o caso começa a ser julgado. Depois de inúmeros suspeitos e casos, sete arguidos vão a julgamento.

Factores de noticiabilidade: O escândalo O sofrimento das vítimas A notoriedade dos protagonistas A concorrência entre os meios de comunicação

Universo de análise: Novembro de 2002 a Março de 2003 edições1569a1587. Foram analisadas 25 peças, de trabalho notoriamente de JI. Géneros jornalísticos: artigos, notícias e reportagens. Objecto de estudo: o peso e a representação das fontes anónimas no JI do Expresso sobre o assunto.

Categorização de items de análise: Assinatura da peça Citação de fontes Género jornalístico Referência à fonte Número de fontes anónimas Número de fontes identificadas Tipo de fonte anónima (on background / on deep background - Mencher) Tipo de títulos (citação, síntese, interrogativo, sugestivo Martin-Lagardette)

Análise dos resultados Maioria das peças são reportagens registos descritivos, tom de denúncia, declarações de fontes anónimas on background. Os títulos são de síntese ou sugestivos. De citação e interrogativos não se verificam. Os títulos das 25 peças analisadas remetem para a subjectividade presente na investigação: chamar a atenção para protagonistas ou categorizar acontecimentos e não contextualizar a peça.

Análise dos resultados A titulação envolve, de forma geral, juízos de valor. Exemplos: Pedofilia sem castigo (edição 1569) ou Falta de Castigo (1576). A maioria das peças é assinada, mas ainda assim há 11 não assinadas a maior parte destas tem fontes anónimas.

Análise dos resultados Praticamente todas as peças apresentam declarações de fontes. A maioria das fontes são anónimas. As cachas têm como base fontes anónimas bem colocadas a nível judicial, que geralmente não são apresentadas directamente mas antes com a expressão segundo o que o Expresso apurou.

Análise dos resultados A maior parte das fontes anónimas são on background, permitindo inferir que são ex-alunos da Casa Pia e pessoas bem colocadas a nível judicial e da própria instituição. A maioria das fontes é apresentada pelo nome próprio, mas geralmente fictício. A segunda referência mais comum é a expressão o Expresso apurou. As fontes identificadas são apresentadas pelo cargo, na sua maioria.

O universo das fontes anónimas tem um peso significativo no JI sobre o processo Casa Pia praticado pelo Expresso legitima o discurso e valida a informação. O papel das fontes anónimas (em particular on background ) parece legitimar o discurso. Os trabalhos descritivos, comprovados com citações de fontes anónimas são apresentados como prova de um acesso privilegiado do jornal à informação, imprimindo credibilidade ao discurso.