PROPRIEDADES TERMOMECÂNICAS DA CERÂMICA MULITA DOPADA COM ÓXIDO DE LANTÂNIO OU ÓXIDO DE CÉRIO Lauro J.Q.Maia e Dorotéia F. Bozano Departamento de Física CCET Universidade Federal de Mato Grosso do Sul Caixa Postal: 549, CEP:79070-900, Campo Grande-MS, Brasil e-mail: junemaia@zaz.com.br RESUMO Este trabalho tem como objetivo estudar a correlação entre as propriedades termomecânicas (dilatação/retração térmica) e os mecanismos de sinterização e densificação (formação e transformação de fases cristalográficas) em corpos cerâmicos de mulita dopados com diferentes concentrações de La 2 O 3 ou CeO 2. Constata-se que altas concentrações (7, 10 e 20%) são altamente eficazes no processo de densificação da mulita ( 100% da densidade teórica) independentemente do tipo de dopante utilizado. A retração volumétrica para os corpos sinterizados a 1400 o C/5h ficam em torno de 60% e não dependem da concentração e do tipo de óxido utilizado. Para altas concentrações de céria há formação de fase líquida que reduz a resistência mecânica da cerâmica. As amplitudes de histerese obtidas no ciclo de aquecimento/resfriamento, das amostras dopadas com óxido de lantânio ou óxido de cério são inferiores a 1,7%. A concentração de 7% de ambos os dopantes utilizados parece ser a mais indicada para se obter corpos altamente densificados, sem fases cristalinas residuais indesejadas e com características termomecânicas excelentes. Palavras-chave: Mulita, Lantânia, Céria, Densificação, Dilatação-Retração CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 09001
THERMOMECHANICAL PROPERTIES OF THE CERAMIC MULLITE DOPED WITH LANTANIUM OR CERIUM ABSTRACT This work studies the correlation between the properties thermomechanical (thermal expansion/retraction) and the densification and sintering mechanisms (formation and transformation of crystallographic phases) of mullite ceramic bodies doped with different concentrations of La 2 O 3 or CeO 2 (: 1, 2, 3, 5, 7, 10 and 20%, % Mol). It was verified doping 7, 10 and 20% of La 2 O 3 or CeO 2, are effective in the process of densification of the mullite ( 100% t. d.). Volumetric retraction of sintered bodies at 1400 o C/5h is independent of concentration and dopante type. The histereses obtained in the cycle of heating-cooling is very slow, 1,7%, for all oxides. It seems concentration of 7% of lantania or ceria is the best choice to enhance densification without formation of spurious crystallographic phase. Keywords: mullite, lantania, ceria, densification, volumetric retraction, dilation-retraction INTRODUÇÃO Por estar entre os poucos materiais que apresentam excelentes propriedades para aplicações estruturais em altas temperaturas, a cerâmica mulita (3Al 2 O 3. 2SiO 2 ) é uma candidata em potencial para muitas aplicações avançadas. Tais aplicações, requerem uma cerâmica de alta qualidade, alta densidade e de microestrutura refinada, sendo que tais requisitos são fortemente influenciados pelo método de preparação do material (1-3). Segundo os raros estudos presentes na literatura (4-8), os óxidos de terras-raras podem atuar como agentes mineralizantes ou como catalisadores para modificar a microestrutura do refratário, reduzir a temperatura de sinterização, aumentar a densificação em temperaturas inferiores às utilizadas para a matriz pura e aumentar a resistência ao ataque químico por ligas metálicas fundidas (1-4, 7). CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 09002
Objetivando estudar a influência da concentração e do tipo de óxido de terras-raras sobre a densificação, sinterização e as propriedades termomecânicas da matriz de mulita, foi desenvolvida uma pesquisa sobre a adição controlada de diferentes concentrações de óxidos La 2 O 3 e CeO 2 (com concentrações de 1, 2, 3, 5, 7, 10 e 20%, % em mol de mulita pura) na matriz de mulita obtida pelo processo sol-gel. MATERIAIS E MÉTODOS As amostras de mulita dopadas foram preparadas com os dopantes La 2 O 3 e CeO 2 nas concentrações 1%, 2%, 3%, 5%, 7%, 10% e 20%, pelo processo sol-gel. Os géis foram preparados através da mistura em temperatura ambiente da suspensão coloidal de boemita (9-14) preparada pela hidrólise a quente do Al(OC 4 H 9 ) 3 ; solução aquo-alcóolica de Si(OC 2 H 5 ) 4 ; solução de La(NO 3 ) 2 +HNO 3 ou a introdução de Ce(NO 3 ) 3.6H 2 O. Os géis secos foram moídos em moinho centrífugo com jarro de ágata durante 45 minutos. Os corpos cerâmicos foram obtidos a partir do pós calcinados a 500ºC/24h, peneirados em malha 270 MESH e prensados uniaxialmente (254 MPa) em forma de um disco cilíndrico. Os corpos a verde foram submetidos a análises termomecânicas (TMA, Shimadzu, TA-50 WSI, Thermal Analyser) utilizando-se uma carga de 100 kg/m 2, atmosfera de ar comprimento (3,3x10 4 L/s) e razão de aquecimento de 4,7K/s, no intervalo de temperatura de 323 a 1400 o C, com a finalidade de se determinar a taxa de retração dos corpos a verde além de suas respectivas temperaturas e cinéticas de transições cristalinas. As histereses de dilatação-retração dos diferentes corpos cerâmicos sinterizados a 1400 o C /5 horas foram determinadas através de análises termomecânicas durante o ciclo de aquecimento e resfriamento nos intervalos de temperatura de 323 a 1300 o C e 1300 o C a 300 o C, utilizando-se as mesmas condições experimentais citadas acima. A densidade como função da temperatura de tratamento térmico dos corpos (850, 950, 1050, 1150 e 1400 o C /5h) foi obtida pelo método geométrico. RESULTADOS E DISCUSSÃO Evolução Térmica Os respectivos intervalos de transições de fase são avaliados através das curvas de derivada de primeira ordem das respectivas curvas de retração linear percentual (Figuras 1.a e 1.b). CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 09003
(a) (b) Figura 1 Derivadas de primeira ordem das curvas de retração linear para os corpos cerâmicos de mulita dopados com (a) La 2 O 3 e (b) CeO 2, em função da temperatura e da concentração dos dopantes. Com o aumento da concentração de lantânia como de céria há uma maior redução na temperatura de formação da fase ortorrômbica da mulita, que é representada pelos picos presentes em temperaturas superiores a 1150 o C (Figura 1). Embora, para ambos os dopantes esses picos sejam lagos (com exceção do pico que surge para a dopagem com 20% de CeO 2, que é bastante agudo) as formas desses picos são distintas para os diferentes óxidos, indicando que a cinética de formação da fase ortorrômbica da mulita dependente do tipo de dopante. O pico agudo presente na temperatura acima de 1200 o C para o corpo cerâmico dopado com 20% de céria indica a formação de fase líquida, fato que pode ser comprovado com uma simples inspeção visual. A presença de fase líquida durante a sinterização é prejudicial às propriedades mecânicas da mulita. Assim, essa concentração é inadequada para as aplicações desejadas. A literatura indica que quando mais se retarda a formação da fase ortorrômbica da mulita, melhor é a densificação da mesma. Como quase todas as composições apresentam os respectivos picos largos referentes a essa transformação, esses os resultados apresentados na sugerem que esses dopantes são adequados como auxiliares da densificação. CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 09004
Comportamento da Densificação e da Retração Volumétrica (a) (b) As densidades relativas dos corpos cerâmicos para os diferentes dopantes e concentrações, como função da temperatura de tratamento térmico,- são apresentadas nas Figura 2. Nesta análise foi utilizado o valor de 3,1x10 3 kg/m 3 para a densidade teórica da mulita pura. A Figura 3 apresenta o comportamento da retração volumétrica desses mesmos corpos cerâmicos. Figura 2 Comportamento da densidade geométrica dos corpos cerâmicos de mulita dopados com (a) La 2 O 3 e (b) CeO 2, em função da temperatura de tratamento térmico e da concentração do dopante. (a) (b) CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 09005
Figura 3 Comportamento da retração volumétrica dos corpos cerâmicos de mulita dopados com (a) La 2 O 3 e (b) CeO 2, em função da temperatura do tratamento térmico e da concentração de dopantes Comparando-se os comportamentos da densificação da matriz de mulita apresentados na Figura 2.b, verifica-se que a densificação com céria apresenta um comportamento bastante similar para todas as concentrações utilizadas. Enquanto que para a dopagem com lantânia (Figura 2.a), observa-se 4 tipos de comportamentos: um primeiro apresentado pelas amostras a 1 e 2%; um segundo seguido pelas concentrações 3 e 5%; um terceiro seguido pelas concentrações 7 e 10% e um específico mostrado para a amostra 20%. Com relação à retração volumétrica observa-se, novamente, que o comportamento praticamente independente da concentração para a céria para todas as temperaturas estudadas. Para os corpos dopados com lantânia em concentrações inferiores a 20%, o comportamento é também praticamente independente da concentração, sendo que a amostra a 20% exibe um comportamento totalmente diferenciado. As densidades obtidas para as amostras sinterizadas a 1400 o C/5h são praticamente 100% da densidade teórica independente do tipo de dopante para as concentrações de 5, 10 e 20%, indicando que tanto a lantânia como a céria são, nessa concentrações, ótimos agentes densificadores. É necessário lembrar que o corpo cerâmico dopado com 20% de CeO 2 apresenta fase líquida, promovendo a formação de macroporos no corpo cerâmico. As retrações volumétricas são bastante altas, 60%, e na temperatura máxima de sinterização também são independentes da concentração e do tipo de dopante. Comportamento Termofísico no Ciclo de Aquecimento-Resfriamento A Figura 4 apresenta o comportamento das curvas de dilatação-retração para os diferentes corpos sinterizados a 1400 o C/5h. A escolha da temperatura de 1400 o C e do tempo de sinterização de 5 horas, foi baseado em estudos anteriores (4,7,9) de difração de raio-x da matriz pura de mulita preparada pelo processo sol-gel que indicaram que nessas condições ocorre a transformação total para a fase cristalina ortorrômbica, que é a fase cristalina da mulita em temperatura ambiente; e também por essas condições não possibilitaram a formação de fases secundárias indesejáveis. O objetivo desta análise é avaliar o grau de histerese durante um ciclo de aquecimentoresfriamento em função do tipo e da concentração de dopantes (Figuras 5.a e 5.b), visto que corpos cerâmicos que apresentam uma pequena histerese durante esse ciclo são de extrema importância para aplicações estruturais. CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 09006
(a) (b) Figura 4 Curvas de dilatação (---) e retração (o) para corpos cerâmicos de mulita dopados com (a) La 2 O 3 e (b) CeO 2, sinterizadas à 1400ºC/5h em função da temperatura e da concentração de dopante. Em um ciclo completo de aquecimento-resfriamento A amplitude máxima de histerese, é bastante baixa, não ultrapassando 1,7% para qualquer um dos óxidos utilizados. Para uma dada concentração observa-se que o comportamento de dilatação-retração depende do tipo de dopante utilizado. É muito interessante observar que, para o corpo dopado com 1% de lantânia não se observa, praticamente, uma amplitude de histerese no ciclo de aquecimento-resfriamento. Essa característica pode tornar-se muito interessante para usos industriais. CONCLUSÃO A dopagem da mulita com óxido de lantânio ou de cério aumenta a densificação dos corpos cerâmicos, reduz a temperatura da formação da fase cristalina estável da matriz de mulita, e propicia a formação de corpos cerâmicos com baixos graus de histerese, durante ciclos de aquecimentoresfriamento. Concentração de 7, 10 e 20 % de La 2 O 3 ou CeO 2 apresentam densidade geométrica praticamente de 100% da densidade teórica. Como a concentração de 7%, de lantânia ou de céria, não é muito elevada, de forma que não surjam efeitos de fases cristalinas secundárias nos corpos cerâmicos sinterizados, parece ser a mais indicada para a obtenção de corpos cerâmicos altamente densificados e com baixos graus de dilatação-retração para usos como material cerâmico estrutural de alta temperatura. CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA E CIÊNCIA DOS MATERIAIS, 14., 2000, São Pedro - SP. Anais 09007
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