CICLONES EXTRATROPICAIS E EVENTOS EXTREMOS CHUVOSOS SOBRE A BACIA DO RIO DA PRATA Nadiara Pereira, Tercio Ambrizzi Universidade de São Paulo, Departamento de Ciências Atmosféricas, São Paulo, SP nadipr@gmail.com, ambrizzi@model.iag.usp.br RESUMO: Este estudo analisa ciclones extratropicais que se formam nas proximidades da região da Bacia do Rio Prata e os eventos extremos chuvosos que estes sistemas ocasionam. Ciclones extratropicais são muito estudados por serem sistemas de grande escala, que tem grande influencia nas condições de tempo na região em que se formam e atuam. Na região da Bacia do Rio da Prata, o desenvolvimento, intensidade e frequência destes sistemas estão fortemente associadas com a ocorrência de eventos de precipitação intensos ou dias consecutivos de chuva. Para a identificação de ciclones foi utilizado um esquema automático de detecção de trajetória para dados simulados pelo modelo regional RegCM3 no período de 1989 a 2007. Para a verificação de eventos extremos chuvosos, é realizada a comparação entre as simulações numéricas do RegCM3 e dados observacionais do Centro de Previsão Climática (CPC). Observou-se que o RegCM3 é capaz de simular a precipitação intensa causada por Ciclones Extratropicais e tem certa compatibilidade com os dados observacionais. ABSTRACT: This study examines extratropical cyclones that form near the La Plata Basin region and the extreme rainy events caused by these systems. Extratropical cyclones are much studied because they are large-scale systems which have great influence in the weather on the region they are generated and act. In the La Plate Basin region, the development, intensity and frequency of these systems are strongly associated with the occurrence of intense precipitation events or consecutive days of rain. An automatic scheme was applied for the identification and trajectory of the cyclones using data simulated by the RegCM3 in the period 1989 to 2007. To validate the rainy extreme events simulated by the model the observational data from Climate Prediction Center (CPC) is used. It was observed that the RegCM3 is able to simulate the heavy rainfall caused by extratropical cyclones and it is in good agreement with observational data. INTRODUÇÃO Os ciclones extratropicais têm papel fundamental na climatologia da precipitação sobre a região extratropical na América do Sul, sendo sistemas em grande escala que transportam calor e umidade na atmosfera. Através de trabalhos de Taljaard (1967), Gan e Rao (1991) e Sinclair (1994 e 1995) sabemos atualmente que a costa leste da América do Sul é uma zona ciclogenética.
Os primeiros estudos de detecção de ciclones eram realizados através de análise de cartas de pressão e imagens de satélite. Atualmente alguns estudos já aprimoraram a forma de rastreamento destes sistemas e já é possível fazê-lo por um método automático. Alguns trabalhos, como por exemplo, Murray e Simmonds(1991), Pezza e Ambrizzi (2003), entre outros, utilizaram rastreamento de centros de baixa pressão através da detecção de mínimos de pressão. Outros estudos, (Sinclair 1994; Reboita 2008), utilizaram vorticidade relativa geostrófica. A utilização da pressão apresenta deficiências e pode produzir distorções na localização dos ciclones e tende a favorecer um decréscimo na pressão central de um sistema fazendo com que, muitas vezes, sistemas móveis não sejam localizados, já a vorticidade permite incluir centros móveis e capturar adequadamente atividade ciclônica transiente. Neste trabalho, os objetivos são rastrear ciclones extratropicais através de mínimos de vorticidade relativa e, através da comparação com a climatologia de extremos de chuvosos, avaliar os extremos ocasionado por este evento. Além disso, pretende-se avaliar o desempenho de um modelo regional em simular os eventos extremos ocorridos. A região de estudo é a Bacia do Rio da Prata que é a segunda maior do Brasil e se estende entre Brasil, Uruguai, Bolívia, Paraguai e Argentina. Ela é formada pelos rios Paraguai, Paraná e Uruguai que juntos drenam uma área correspondente a 10,5% do território brasileiro, com 3,2 milhões de km². Ela abrange os Estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. MATERIAIS E MÉTODOS Simulação numérica Foi utilizada um simulação do Modelo regional RegCM3, que é um modelo compressível, em diferenças finitas, hidrostático e em coordenada vertical sigma, com condições iniciais da atmosfera de dados da reanálise do ERA-Interim(ECMWF), para o período de 1989 a 2007. Para comparação com dados observados foi utilizado uma interpolação para transformá-los numa resolução de 1 x1. Dados observacionais CPC A simulação foi comparada com a climatologia de dados observacionais do Centro de Previsão Climática (CPC) para os meses de inverno. Esses dados são diários com 1 de resolução horizontal sobre a América do Sul e foi utilizado o mesmo período da simulação. Rastreamento de Ciclones Os ciclones foram identificados no campo de vorticidade do vento a 10 m de altura para dados simulados pelo RegCM3. Os mínimos de vorticidade são identificados através do método do vizinho mais próximo, que compara a vorticidade em cada ponto de grade com a dos pontos mais próximos. Após a identificação dos mínimos, a trajetória de um ciclone é definida como uma sequência de posições no tempo {x(t), y(t)} e sua duração é contada a partir da
identificação do primeiro mínimo de vorticidade relativa até o seu desaparecimento. Os ciclones foram identificados quando um ponto apresentou vorticidade menor do que a dos pontos vizinhos e menor ou igual ao limiar de ζ10-1,5x10-5s-1. Cálculo de eventos extremos Os eventos extremos chuvosos foram calculados através da técnica dos quantis, onde a amostra quantílica Qp pode ser interpretada aproximadamente como aquele valor do dado que excede um membro escolhido aleatoriamente do conjunto de dados, com probabilidade p. Para o calculo dos extremos foi criado uma script em Fortran usando o percentil de 0,85, como limiar, para cálculo de eventos muito chuvosos. RESULTADOS E DISCUSÕES Foram calculados através de dados do RegCM3 e do CPC médias climatológicas de extremos chuvosos de precipitação para o período entre 1989 a 2007. Neste trabalho a análise se restringe aos meses de inverno considerados como Junho, Julho e Agosto(JJA), já que algumas bibliografias (Gan e Rao, 1991), mostram que nesse período a ocorrência de ciclones extratropicais é maior. Os dados observados (figura1b) apresentam valores maiores para eventos extremos chuvosos, ou seja, para a ocorrência de uma extremo é preciso que chova mais, em relação os dados simulados(figura 1a). Figura 1 Climatologia de eventos extremos muito chuvosos para o percentil de 0,85 no período de 1989 a 2007 para os dados diários de precipitação (a)simulados pelo RegCM3 e (b)observados do CPC. Através do rastreamento automático, foram selecionadas trajetórias de ciclones que se formaram próximo a região da Bacia do Rio da Prata. Analisou-se a precipitação para avaliar a intensidade da chuva causada pelos sistemas e foram selecionados alguns eventos associados a extremos chuvosos durante a passagem de um ciclone extratropical. Neste trabalho é apresentado apenas um dos eventos. Este evento ocorreu no dia 10 de julho de 2000. Através do rastreamento (figura 2), observa-se que o ciclone se formou sobre a costa da região Sul do Brasil em uma latitude de 31.75S e longitude de 50.00W, as 06UTC do dia 10. Após sua formação ele teve deslocamento para leste e durou aproximadamente quatro dias (100 horas).
Figura 2 Trajetória do Ciclone Extratropical que se formou as 06:00UTC do dia 10 de julho de 2000 sobre a costa da região Sul do Brasil. Para avaliar os extremos chuvosos, foi feito um cálculo de anomalia, no qual se subtrai a climatologia de extremos da taxa de precipitação diária, para os dados observados e simulados. Desta forma, foi obtido o excedente de chuvas acima do percentil 0.85. No dia 10 e 11 de julho de 2000, figura 3 e figura 4 respectivamente, observa-se que há anomalias de extremos sobre a parte sul da Bacia do Rio da Prata, através dos dados simulados (3a e 4a). As observações do CPC, também apresentam anomalias de extremos, porém em regiões menores e no dia 11, em uma região diferente sobre o Uruguai. No dia 13(figura 5) a precipitação simulada pelo RegCM3 ainda a mostra extremos sobre centro-leste do Sul do Brasil, enquanto as observações não apresentam extremos na região da Bacia do Rio da Prata.. Figura 3 Anomalias de extremos muito chuvosos para o dia 10 de julho de 2000 para dados de Figura 4 Anomalias de eventos extremos muito chuvosos para o dia 11 de julho de 2000 para dados de
Figura 5 Anomalias de eventos extremos muito chuvosos para o dia 10 de julho de 2000 para dados de CONCLUSÕES Através da análise de ciclones extratropicais que atuaram sobre a Bacia do Rio da Prata, observou-se que o RegCM3 consegue representar os eventos extremos na região de atuação do sistema. Porém o modelo superestima os extremos do evento em relação aos dados observacionais, que também apresentam extremos, porém, em uma região menor. A diferença entre os resultados da simulação e os dados observados, não significa erros da simulação, já que inicialmente a resolução do RegCM3(50km horizontal) é mais alta e pode representar melhor os eventos de precipitação. Além disso, os dados observados podem não ter representado bem características de pequena escala e que são bem simuladas pelo modelo. Uma avaliação completa climatológica dos eventos extremos está sendo desenvolvida e deverá ser apresentada em breve. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem aos dados disponibilizados pelo CPC e pelo ECMWF e ao suporte financeiro do CNPq. Agradecem também ao Projeto LPB Claris pelo suporte. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS GAN, M. A. and RAO B. V., 1991: Surface ciclogenesis over South America. Mon. Wea. Rev., 119, 293-302. PEZZA, A. B., and T. AMBRIZZI, 2003: Variability of Southern Hemisphere Cyclone and Anticyclone Behavior: Further Analysis. J. Climate, 16 (7), 1075-1083. REBOITA, M. S., 2008: Cliclones Extratropicais sobre o Atlântico Sul: Simulaçõe Climática e Experimentos de Sensibilidade. Tese de Doutorado, IAG/USP, 359p. SIMMONDS, I., and KEAY, K., 2000: Mean Southern Hemisphere Extratropical Cyclone Behavior in the 40-Year NCEP-NCAR Reanalysis. J. Climate, 13, 873-885. SINCLAIR, M. R., 1994: An Objective Cyclone Climatology for the Southern Hemisphere. Mon. Wea. Rev., 122, 2239-2256. TALJAARD, J. J., 1967: Development, distribution and movement of cyclones and anticyclones in the Southern Hemisphere during IGY. J. Appl. Meteor., 6, 973-987.