O comportamento fonológico das vogais médias em posição pretônica no dialeto de Belo Horizonte Marlúcia Maria Alves Faculdade de Letras Universidade Federal de Minas Gerais (FALE UFMG) marlucia-alves@uol.com.br Abstract. Belo Horizonte dialect shows quite complex behavior of vowels in pre-stressed-syllable position, including the following c[o]brança, pr[ç]jeto and m[u]tivo. The same manifestations are found for the fronted mid-height pre-stressed vowel: s[e]mana, [E]xcesso and [i]scola. For a single lexical item, it is possible to identify variations, such as: p[e]squisa ~ p[i]squisa or c[o]légio ~ c[ç]légio. Thus having identified such possibilities in the dialect of Belo Horizonte, the logical next step is wider and more extensive research in order to understand the behavior of these vowels. Optimality Theory can provide the tools needed to elucidate such variation, as it relies on analysis of linguistic phenomena through actual output. Keywords. mid vowels; linguistic variation; optimality theory Resumo. O dialeto de Belo Horizonte apresenta o comportamento das vogais médias em posição pretônica de forma bem complexa, pois é possível encontrar três realizações: m[o]delo, pr[ç]jeto e g[u]verno. O mesmo ocorre para a realização da vogal média anterior pretônica: r[e]torno, [E]xcesso e [i]scola. Também ocorre variação em p[e]squisa ~ p[i]squisa ou c[o]légio ~ c[ç]légio. Tendo em vista esta possibilidade de casos encontrados no dialeto de Belo Horizonte, é necessário que se faça uma pesquisa mais aprofundada para entender o comportamento destas vogais em posição pretônica. Através da Teoria da Otimalidade, podemos encontrar meios de elucidar os fenômenos relacionados à variação lingüística. Palavras-chave. vogais médias; variação lingüística; teoria da otimalidade 1. Introdução As vogais médias no sistema vocálico do português brasileiro constituem em posição tônica quatro fonemas, /e, o, E, ç/, que se reduzem a dois, /e, o/, em posição pretônica, devido ao processo de neutralização. No dialeto de Belo Horizonte, há a tendência destas vogais serem fechadas. Contudo, é observado que as vogais médias são pronunciadas neste dialeto de três formas diferentes. Ou ocorre a vogal média fechada, r[e]boco, ou ocorre a vogal média aberta, r[e]lógio, ou ainda acontece a vogal alta, m[i]nino. Além disso, são observados dois tipos de variação: a) a variação condicionada por processos fonológicos, como em s[e]mana (neutralização), [E]xc[E]sso (harmonia vocálica) e [i]scola (redução vocálica) e b) a variação livre, como em m[e]rcado ~ m[e]rcado, ou ainda, p[e]squisa ~ p[i]squisa. ESTUDOS LINGÜÍSTICOS, São Paulo, 37 (1): 21-29, jan.-abr. 2008 21
A partir destas informações, julgamos que as vogais médias no dialeto de Belo Horizonte devem ser investigadas mais detalhadamente, a fim de esclarecer melhor que fatores motivam a variação destas vogais em posição pretônica. Além disso, é importante explicar esta variação conforme uma teoria lingüística e a Teoria da Otimalidade (doravante OT) parece ser a melhor opção para descrever e analisar os casos relacionados à variação. Esta teoria postula que a análise dos dados e propriamente do fenômeno lingüístico deve partir do output e permite que as restrições possam ser violadas. Desta forma, os principais objetivos deste estudo são analisar os fatores lingüísticos relacionados à variação das vogais médias em posição pretônica no dialeto de Belo Horizonte e explicar a variação lingüística encontrada segundo a OT, destacando o ranqueamento parcial de restrições, proposto por Anttila e Cho (1998). 2. As vogais médias e o dialeto de Belo Horizonte As vogais médias em posição pretônica no dialeto de Belo Horizonte foram analisadas conforme três corpora distintos: a) corpus POBH (Magalhães, 2000); b) corpus extraído de Alves (1999) e c) corpus extraído a partir da observação de fala espontânea. Este procedimento é necessário para se verificar um número considerável de ocorrências das vogais médias nesta posição. Em comum, os corpora apresentam informantes nascidos e criados em Belo Horizonte, com 3º grau completo e faixa etária de 20 a 38 anos. A diferença entre os corpora reside no fato de a gravação dos dados não ter sido feita da mesma forma. O corpus POBH apresenta uma entrevista entre o informante e o documentador, o corpus de Alves (1999) mostra uma leitura de frases e o corpus de fala espontânea mostra uma gravação sem o informante perceber que estava sendo gravado. Apesar desta diferença, os dados mostram uma uniformidade com relação aos fatores lingüísticos observados e a variação encontrada. Os resultados obtidos mostram que neste dialeto há três formas fonéticas distintas da vogal média em posição pretônica, como mostra (1) abaixo. (1) Vogais anteriores Vogais posteriores [e]: c[e]rteza [o]: m[o]delo [E]: [E]xc[E]sso [ç]: pr[ç]j[e]to [i]: m[i]n[i]no [u]: m[u]tivo Conforme os três corpora analisados,observou-se que a tendência dos falantes do dialeto de Belo Horizonte é pela realização da vogal média fechada em posição pretônica. A grande maioria dos resultados apresentou a vogal média fechada nesta posição, tanto na série anterior como na série posterior. Com relação à elevação da vogal média, observa-se que os contextos lingüísticos favorecedores mostram-se diferenciados para as vogais anteriores e posteriores. A vogal alta anterior ocorre motivada pelos fatores lingüísticos apresentados em (2). (2) Fatores favorecedores à elevação da vogal média anterior em posição pretônica a) Posição inicial de sílaba associada ao travamento silábico por /S/ [i]scola b) Posição inicial de sílaba associada à nasalidade [i]nsino c) Presença de vogal alta na sílaba tônica ou contígua m[i]nino, [i]strutura d) Presença da consoante nasal precedente gam[i]leira 22 ESTUDOS LINGÜÍSTICOS, São Paulo, 37 (1): 21-29, jan.-abr. 2008
Os dois primeiros fatores, ou seja, a posição inicial de palavra associada ao travamento silábico por /S/ e a posição inicial de palavra formando uma sílaba nasalizada se mostram categóricos para a realização da vogal alta em posição pretônica. Entretanto, o corpus de Alves (1999) mostra itens lexicais contendo estes fatores e podendo ser realizados ora com a vogal alta ora com a vogal média fechada. Neste caso, a realização da vogal média fechada se deve mais à preocupação pela pronúncia correta das palavras no momento da leitura feita em cabine acústica 1. Os dois últimos fatores apresentados em (2) mostram que a presença da vogal alta em posição tônica ou na sílaba imediatamente seguinte e da consoante nasal precedente favorecem a realização da vogal alta em posição pretônica. Estes contextos não são categóricos porque permitem a realização da vogal média fechada também. Com relação às vogais posteriores, observou-se os seguintes fatores. (3) Fatores favorecedores à elevação da vogal média posterior em posição pretônica a) Vogal alta em posição tônica ou contígua m[u]tivo, p[u]licial b) Consoante velar precedente g[u]verno c) Consoante labial precedente b[u]nito Estes fatores favorecem a realização da vogal alta em posição pretônica. Entretanto, o falante pode optar pela realização da vogal média fechada nestes mesmos contextos. Os fatores lingüísticos que favorecem o abaixamento da vogal média anterior e da vogal média posterior são os mesmos, como pode ser visto em (4). (4) Fatores favorecedores ao abaixamento da vogal média em posição pretônica a) Vogal média aberta na sílaba tônica ou contígua [E]xc[E]sso, c[ç]l[e]gas b) Vogal baixa na sílaba tônica ou contígua m[e]rcado, f[ç]rmação Estes contextos são considerados apenas favorecedores porque a vogal média fechada também pode ser realizada nestes ambientes. Sobre os processos fonológicos envolvidos, observou-se que a maioria das palavras que possui a vogal média em posição pretônica é realizada com a vogal média fechada. Este fato reforça o processo de neutralização presente no português brasileiro. Segundo Mattoso Câmara (1970), em posição pretônica, há uma redução do número de fonemas. A oposição entre as vogais médias fechadas e a vogais médias abertas não existe nesta posição, e apenas as vogais médias fechadas ocorrem fonemicamente. Além do processo de neutralização, outros dois processos atuam na realização das vogais médias pretônicas: a harmonia vocálica e a redução vocálica. O processo de harmonia vocálica tem como gatilho a vogal presente em posição tônica. A vogal em posição pretônica assimila os traços característicos da vogal tônica. Assim, pode-se relacionar três tipos de harmonia vocálica encontrados no dialeto de Belo Horizonte: a) a harmonia vocálica pelo traço [-ATR] 2, como em pr[ç]j[e]to ; b) a harmonia vocálica pelo traço [+ATR], como em m[o]d[e]lo, e c) a harmonia vocálica pelo traço [alto], como em m[i]n[i]no. O processo de redução vocálica está mais fortemente relacionado aos casos categóricos da realização da vogal alta em posição pretônica, como a posição inicial de palavra associada ao travamento silábico por /S/ ou formando sílaba nasalizada. ESTUDOS LINGÜÍSTICOS, São Paulo, 37 (1): 21-29, jan.-abr. 2008 23
Entretanto, foi visto que a consoante labial precedente e a consoante velar precedente também favorecem a elevação da vogal média posterior. Especificamente sobre o fenômeno da variação lingüística, observaram-se dois formatos de variação, como pode ser visto em (5). (5) Variação das vogais médias em posição pretônica a) Variação entre a vogal média fechada e a vogal média aberta: c[o]l[e]gio ~ c[ç]l[e]gio b) Variação entre a vogal média fechada e a vogal alta: p[e]squisa ~ p[i]squisa É bom ressaltar que são poucas as palavras que apresentam variação. Além disso, o mesmo falante varia a vogal média de algumas palavras, evidenciando a variação intradialetal. Neste caso específico, os informantes apresentam a variação em posição pretônica de modo diferenciado. Isto é, há falantes que tendem para a variação apenas entre a vogal média fechada e a vogal média aberta, outros já apresentam os dois formatos de variação apresentados acima. Sobre a variação interindividual, notou-se que o falante tende a realizar a vogal média fechada. Caso ocorra um ambiente favorecedor da realização da vogal alta ou da vogal média aberta, o falante também pode optar por estes timbres em posição pretônica. Portanto, observa-se que as vogais médias, apesar de mostrarem um comportamento complexo em posição pretônica no dialeto de Belo Horizonte, em alguns contextos lingüísticos bem definidos, podem ser produzidas de forma diferenciada pelos falantes, que podem optar pela vogal média fechada, pela vogal média aberta ou pela vogal alta. A partir do que foi exposto sobre o dialeto de Belo Horizonte surgem algumas questões: a) Como estudar a variação das vogais médias em posição pretônica neste dialeto? b) É possível a gramática da língua adequar a variação apresentada? É possível tentar responder estas questões conforme a Teoria da Otimalidade. Primeiro porque, nesta teoria, é possível explicar casos específicos de variação como esta encontrada no dialeto de Belo Horizonte. Segundo porque é uma teoria que trata de restrições que podem ser violadas, conforme o fenômeno estudado e seu comportamento na gramática da língua. Por último, é uma teoria que lida com as formas de superfície (output) e da sua relação com a forma subjacente (input). 3. Teoria da Otimalidade e variação lingüística A Teoria da Otimalidade é um modelo de análise gramatical e os principais objetivos desta teoria são estabelecer as propriedades universais da linguagem e caracterizar os limites possíveis de variação lingüística entre as línguas naturais. Este modelo teórico analisa as formas de superfície e permite a presença de restrições que podem ser violadas. Os primeiros estudos que abordam esta teoria datam de 1993, com os trabalhos publicados por Prince e Smolensky e por McCarthy e Prince. Segundo Kager (1999), é nas formas de superfície de uma dada língua que é possível encontrar soluções para os conflitos entre as restrições que competem entre si. Uma forma de superfície é considerada ótima se ela apresenta menos violações graves, considerando-se um conjunto de restrições ranqueadas conforme a hierarquia de uma língua específica. As restrições são universais e diretamente codificadas por critérios de marcação e princípios que reforçam a preservação de contrastes. 24 ESTUDOS LINGÜÍSTICOS, São Paulo, 37 (1): 21-29, jan.-abr. 2008
Os componentes da Gramática OT são o léxico, o gerador e o avaliador. Segundo Archangelli (1997), a relação entre o input e o output é mediada por dois mecanismos formais, o gerador (generator GEN) e o avaliador (evaluator EVAL). O primeiro cria estruturas lingüísticas e verifica suas relações de fidelidade com a estrutura subjacente. O segundo usa a hierarquia de restrições da língua para selecionar o melhor candidato entre todos criados. Além destes dois mecanismos, é necessário considerar também o grupo universal de restrições (CON) no qual o avaliador usa o ranqueamento específico de restrições deste conjunto. Este teoria é adequada para estudar os fenômenos relacionados à variação lingüística, uma vez que considera a forma de superfície, o output. Entretanto, o principal desafio ao estudar a variação nesta teoria é que é necessário interferir em um de seus pilares: a dominação estrita. Quando se trata de variação, temos mais de um candidato escolhido como ótimo. Autores como Anttila e Cho (1998), Boersma (1997), Coetzee (2005) e outros estudam a variação com base na Teoria da Otimalidade, buscando alternativas de explicação deste fenômeno lingüístico, e partem de uma abordagem não-clássica da teoria. Dentre estas alternativas, será analisada a de Anttila e Cho (1998) que trata do ordenamento parcial de restrições. No modelo proposto por Antilla e Cho o ranqueamento parcial de restrições permite exibir os fenômenos de invariância e variáveis na mesma estrutura e derivar as predições estatísticas. Combinando o ordenamento parcial com as restrições universais e as hierarquias de restrições, é possível derivar as tipologias de dialetos com variação dentro da abordagem OT. Segundo os autores, um ordenamento parcial oferece uma nova perspectiva sobre a hipótese de que a variação ocorre graças a gramáticas que competem na comunidade ou no indivíduo. 4. Teoria da Otimalidade e o dialeto de Belo Horizonte O dialeto de Belo Horizonte será considerado, em nossa análise, como uma língua específica, possuindo uma gramática particular que pode fornecer indícios para explicar os casos de variação encontrados nesta língua. Em termos de OT, e pelo comportamento das vogais médias pretônicas neste dialeto, será estabelecida a existência de um único input, representado pela vogal média fechada, sendo mapeado por dois ou mais outputs. Para a análise dos dados do dialeto de Belo Horizonte conforme a OT, julgamos que cinco restrições são necessárias: duas restrições de fidelidade e três de marcação, apresentadas em (6) abaixo. (6) a) IDENT [alto]: O traço [alto] do output deve ser idêntico ao do input. b) IDENT [ATR]: O traço [ATR] do output deve ser idêntico ao do input. c) AGREE [ATR]: O traço [ATR] da posição pretônica é idêntico ao da vogal contígua. d) AGREE [alto]: O traço [alto] da posição pretônica é idêntico ao da vogal contígua. e) *MID: As vogais médias devem ser evitadas. As restrições eleitas para esta análise partem do estudo do processo mais recorrente neste dialeto, a neutralização. Para isto foi seguida a tipologia de contrastes de altura em ESTUDOS LINGÜÍSTICOS, São Paulo, 37 (1): 21-29, jan.-abr. 2008 25
relação ao acento, apresentada por McCarthy (1999: 24). É necessária esta tipologia para diferenciar o sistema de 7 vogais em posição tônica e a sua redução para 5 vogais em posição pretônica. Além disso, foi considerado o quadro de traços vocálicos referentes ao português brasileiro, em (7) abaixo. (7) Traços vocálicos [alto] e [ATR] /i, u/ /e, o/ /E, ç/ /a/ [alto] + - - - [ATR] + + - - Estes traços são os mais relevantes porque distinguem as vogais médias fechadas das médias abertas e as vogais médias das vogais altas. As vogais médias fechadas são consideradas [-alto, +ATR], as vogais médias abertas [-alto, -ATR] e as vogais altas [+alto, +ATR]. Especificamente sobre as restrições, as restrições de fidelidade IDENT[alto] e IDENT[ATR] são ranqueadas em uma posição superior na hierarquia para preservar a presença da vogal média fechada em posição pretônica. As restrições de marcação AGREE[ATR] e AGREE[alto] são específicas e se ranqueadas acima das restrições de fidelidade conseguem explicar os casos de harmonia vocálica no dialeto de Belo Horizonte. Com relação à restrição *MID, é possível verificar que posicionando esta hierarquia em uma posição superior acima das restrições de fidelidade, os casos relacionados à redução vocálica ocorrem, mostrando que apenas a vogal alta poderia aparecer em posição pretônica. Sobre a proposta de Anttila e Cho (1998), verifica-se que se trata de casos relacionados à co-fonologia, isto é, cada co-fonologia corresponde a uma hierarquia de restrições que seleciona o candidato ótimo pelo seu próprio ranqueamento estipulado. É possível também afirmar que há variação porque há várias gramáticas que competem na comunidade ou no indivíduo. No caso específico do dialeto de Belo Horizonte, pode-se definir este dialeto como uma única gramática com vários ordenamentos parciais. Conforme a proposta do ordenamento parcial, parte-se da noção de que no input tem-se as formas subjacentes concernentes aos segmentos fonológicos relevantes no português brasileiro. Por isso, as vogais médias fechadas serão consideradas as formas de input. Em (8), são apresentados os tableaux referentes à produção da vogal média em posição pretônica no dialeto de Belo Horizonte. (8) Produção das vogais médias em posição pretônica Tableau 1: Neutralização c/e/rteza IDENT [alto] IDENT[ATR] AGREE[ATR] AGREE [alto] *MID 1. c[e]rteza * 2. c[e]rteza *! * * 3. c[i]rteza *! * Tableau 2: Harmonia vocálica /e/xc/e/sso AGREE[ATR] AGREE[alto] IDENT [alto] IDENT[ATR] *MID 1. [e]xc[e]sso *! * 26 ESTUDOS LINGÜÍSTICOS, São Paulo, 37 (1): 21-29, jan.-abr. 2008
2. [E]xc[E]sso * * 3. [i]xc[e]sso *! * * Tableau 3: Redução vocálica /e/scola *MID IDENT[alto] IDENT[ATR] AGREE[ATR] AGREE[alto] 1. [e]scola *! * 2. [E]scola *! * 3. [i]scola * * * O tableau 1 mostra a hierarquia de restrições para os casos voltados ao processo de neutralização. Para que o candidato que contém a vogal média fechada se torne o candidato ótimo, é necessário que as restrições de fidelidade estejam posicionadas acima das restrições de marcação. Assim, somente o candidato 1, c[e]rteza, é escolhido como o melhor candidato, pois viola apenas a restrição *MID ranqueada na posição mais abaixo nesta hieraquia. Com relação ao tableau 2, as restrições de marcação AGREE estão ranqueadas em uma posição superior na hierarquia. Neste caso específico, haverá um acordo entre as vogais em posição tônica e pretônica, garantindo que o processo de harmonia vocálica ocorra. Desta forma, o candidato 2, [E]xc[E]sso, é selecionado como o candidato ótimo porque viola apenas a restrição de fidelidade e a restrição *MID ranqueadas na posição inferior na hierarquia. No tableau 3, observa-se um caso de redução vocálica. Para que o candidato realizado com a vogal alta seja escolhido como o melhor candidato é necessário que a restrição *MID ocorra acima das restrições de fidelidade. Neste caso, as vogais médias não ocorrem em posição pretônica. Assim, o candidato [i]scola é selecionado como o candidato ótimo porque viola a restrição de fidelidade ranqueada abaixo da restrição *MID. Com relação aos casos de variação propriamente dito, verifica-se que são necessários dois tableaux, um para cada candidato selecionado como ótimo. (9) Variação das vogais médias em posição pretônica Tableau 4 pr/o/j/e/to IDENT [alto] IDENT[ATR] AGREE[ATR] AGREE [alto] *MID 1.pr[o]j[E]to * * 2.pr[ç]j[E]to *! * 3.pr[u]j[E]to *! * * Tableau 5 pr/o/j/e/to AGREE[ATR] AGREE[alto] IDENT [alto] IDENT[ATR] *MID 1. pr[o]j[e]to *! * 2. pr[ç]j[e]to * * 3. pr[u]j[e]to *! * * Os tableaux 4 e 5 apresentam um caso de variação entre vogal média fechada e a vogal média aberta. No tableau 4, o candidato selecionado como ótimo é o candidato 1, ESTUDOS LINGÜÍSTICOS, São Paulo, 37 (1): 21-29, jan.-abr. 2008 27
pr[o]j[e]to, pois satisfaz as restrições de fidelidade ranqueadas acima das restrições de marcação. Já no tableau 5, o candidato escolhido como ótimo é o canididato 2, pr[ç]j[e]to, porque viola as restrições IDENT[ATR] e *MID ranqueadas na posição inferior na hierarquia. A alternativa de análise proposta por Anttila e Cho (1998) sobre o ordenamento parcial de restrições é interessante por destacar uma hierarquia para cada caso de produção das vogais médias em posição pretônica no dialeto de Belo Horizonte, além de mostrar os candidatos ótimos nos casos de variação de modo separado. Contudo, esta fragmentação da gramática em vários ordenamentos parciais pode enfraquecer a noção de língua. 5. Considerações finais A variação encontrada no dialeto de Belo Horizonte é bastante complexa. A variação das médias pretônicas ocorre devido a processos fonológicos diferentes, como neutralização, harmonia vocálica e redução vocálica. Além disso, há a variação que ocorre em um mesmo item lexical. A Teoria da Otimalidade fornece alternativas de análise para a explicação da variação lingüística intradialetal. O ordenamento parcial de restrições explica de modo apropriado a variação das vogais pretônicas no dialeto de Belo Horizonte, levando-se em conta os processos fonológicos e os contextos favorecedores à elevação e ao abaixamento da vogal média. Notas 1 O corpus de Alves (1999) foi obtido por meio de uma leitura de frases, para se observar a produção das vogais médias em posição tônica nos nomes no dialeto de Belo Horizonte. 2 [ATR] é um traço articulatório que mostra o avanço da raiz da língua na produção do som. Referências bibliográficas ALVES, Marlúcia Maria. As vogais médias em posição tônica nos nomes do português brasileiro. 1999. 136 f. Dissertação (Mestrado em Lingüística. Área de concentração: Fonologia) Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. ANTILLA, Arto; CHO, Young-mee Yu. Variação e mudança na Teoria da Otimalidade. Lingua, n. 104, p. 31-56, 1998. ARCHANGELLI, Diana. Optimality Theory: an introductory to linguistics in the 1990s. In: ARCHANGELLI, D.; LANGENDOEN, D. T. Optimality Theory: an overview. Oxford: Blackwell Publishers, 1997. Cap. 1, p. 1-32. BOERSMA, Paul. How we learn variation, optionality, and probability. University of Amsterda, 1997. 28 ESTUDOS LINGÜÍSTICOS, São Paulo, 37 (1): 21-29, jan.-abr. 2008
COETZEE, Andries W. Variation as accessing non-optimal candidates a rankordering model of EVAL. Draft, 2005 KAGER, René. Optimality Theory. Cambridge: Cambridge University Press, 1999. McCARTHY, Jonh, J. Introductory OT on CD-ROM. Version 1.0. GLSA. Amherst, 1999. McCARTHY, John; PRINCE, Alan. Generalized alignment. In: BOOIJ, G. E.; MARLE, J. van (eds.). Yearbook of morphology. Dordrecth: Kluwer, 1993. p. 79-153. MAGALHÃES, José Olímpio de. Corpus do POBH (Projeto Português de Belo Horizonte / norma culta). LABFON/FALE/UFMG, 2000. MATTOSO CÂMARA JR, Joaquim. Estrutura da língua portuguesa. Petrópolis: Vozes, 1970. PRINCE, Alan; SMOLENSKY, Paul. Optimality Theory: constraint interaction in generative grammar. Ms., Rutgers University, New Brunswick and University of Colorado, Boulder, 1993. ESTUDOS LINGÜÍSTICOS, São Paulo, 37 (1): 21-29, jan.-abr. 2008 29