DIAGNÓSTICO RADIOMÉTRICO DE RESÍDUOS DE SERVIÇOS DE SAÚDE DE BELO HORIZONTE QUANTO À PRESENÇA DE REJEITOS RADIOATIVOS NA DESTINAÇÃO FINAL

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Transcrição:

2005 International Nuclear Atlantic Conference - INAC 2005 Santos, SP, Brazil, August 28 to September 2, 2005 Associação Brasileira de Energia Nuclear - ABEN ISBN: 85-99141-01-5 DIAGNÓSTICO RADIOMÉTRICO DE RESÍDUOS DE SERVIÇOS DE SAÚDE DE BELO HORIZONTE QUANTO À PRESENÇA DE REJEITOS RADIOATIVOS NA DESTINAÇÃO FINAL Clédola C. O. de Tello 1, Adirson M. de Castro 2, Noil A. de M. Cussiol 3 Serviço de Gerência de Rejeitos Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear CDTN Comissão Nacional de Energia Nuclear CNEN Av. Prof. Mário Werneck, s/n Campus UFMG Pampulha 30123-970, Belo Horizonte MG. Brasil 1 tellocc@cdtn.br 2 amc@cdtn.br 3 cussiol@cdtn.br RESUMO Os procedimentos médicos de diagnóstico e tratamento que utilizam radiofármacos geram rejeitos radioativos que, após decaírem até o limite de eliminação, podem ser destinados pelas vias convencionais de coleta e disposição final de Resíduos Sólidos Urbanos RSU. O objetivo do trabalho é apresentar os resultados da avaliação radiométrica realizada quanto a presença de rejeitos radioativos nos resíduos de serviços de saúde destinados à disposição final. As medições foram feitas no conteúdo de 25 caminhões da coleta especial de Resíduos de Serviços de Saúde (RSS), no aterro sanitário de Belo Horizonte, utilizando-se um cintilômetro de iodeto de sódio. Em 60% dos casos foram encontrados valores acima do limite de liberação estabelecido pela CNEN. A análise espectral de 6 amostras revelou a presença do radionuclídeo tecnécio-99m ( 99m Tc), em 5 delas, e de iodo-131 ( 131 I), em um caso. Estes elementos, tecnécio-99m ( 99m Tc) e iodo-131 ( 131 I), são os mais utilizados em procedimentos de Medicina Nuclear. Conclui-se que está havendo liberação de rejeito radioativo de serviços de saúde, devido à inobservância do tempo de decaimento até obtenção dos níveis legalmente permitidos para liberação. 1. INTRODUCÃO A utilização das radiações ionizantes na medicina e na área biomédica tem crescido na mesma proporção do desenvolvimento destas áreas, apresentando claramente seus benefícios, no que diz respeito tanto à qualidade dos resultados dos diagnósticos e quanto à eficácia das terapias. A medicina nuclear começou com o uso de radionuclídeos em diagnósticos [1], quando um radiofármaco injetado, ingerido ou inalado pelo paciente é incorporado em funções orgânicas nas quais há atividade celular aumentada, como nos tumores, e a radiação gama emitida é detectada e transformada em imagem, via computador, para análise. O PET (Positron Emission Tomography) atualmente é o mais moderno sistema nesta área. Seu uso permite identificar tumores em fases muito iniciais, mais precocemente do que qualquer outro método [2]. De acordo com Regis [3], nos EUA, em torno de um quarto dos pacientes hospitalizados recebe algum procedimento que envolva energia nuclear. Pode-se esperar um aumento significativo de sua utilização também no Brasil, nos próximos anos, com crescimento aproximado de 10% ao ano. Radiofármacos marcados com 99m Tc são utilizados nas principais indicações da Medicina Nuclear, que são a pesquisa de alterações tumorais, inflamatórias e funcionais dos ossos, cérebro, coração, pulmões e rins. Radiofármacos marcados com iodo, principalmente o 131 I,

são utilizados no estudo e tratamento de patologias da tireóide [2]. Segundo Siqueira e Lima [Comunicação Pessoal], na maioria das clínicas e hospitais de Belo Horizonte, os radiofármacos de uso predominante são 99m Tc e o 131 I chegando, em algumas clínicas, a mais de 90% a utilização de tecnécio e aproximadamente 5% a do iodo. Os serviços de saúde que utilizam materiais radioativos são considerados instalações radiativas. Para o licenciamento de instalações radiativas é necessário o cumprimento de normas e requisitos que garantam a segurança no uso de materiais radioativos, sem riscos para o ser humano e meio ambiente. Nestes requisitos incluem-se as diretrizes para a proteção radiológica e o gerenciamento de rejeitos radioativos. Segundo estas diretrizes as instalações radiativas são responsáveis pelo gerenciamento de seus rejeitos radioativos (RR) dentro de sua própria área. Portanto, um eventual transporte e posterior descarte de RR no aterro sanitário, acidental ou por negligência, não são objeto de monitoração, podendo trazer riscos de exposição indevida ao público e trabalhadores. Os riscos de contaminação devem também ser considerados. O objetivo deste trabalho é apresentar os resultados de uma avaliação radiométrica feita nos resíduos de serviços de saúde (RSS) que chegam ao aterro sanitário de Belo Horizonte, as possíveis causas e discutir algumas proposições para a resolução do problema. 2. GERÊNCIA DE REJEITOS RADIOATIVOS EM INSTALAÇÕES DE MEDICINA NUCLEAR As normas CNEN-NE-6.02 [4], CNEN-NE-6.05 [5] e CNEN-NE-3.05 [6] são os documentos básicos para os serviços de medicina nuclear, pois nelas são apresentados os procedimentos e dadas as diretrizes para a elaboração do Plano de Proteção Radiológica e Programa de Gerência de Rejeitos Radioativos (PGRR), necessários para a implantação e funcionamento dos referidos serviços. O limite de eliminação para rejeitos radioativos sólidos de meia vida curta (< 60 dias, por exemplo) é de 75 Bq/g, para qualquer radionuclídeo, conforme estabelecido na norma CNEN-NE 6.05 [5]. Os RR devem ser armazenados para decaimento, podendo depois ser liberados pelas vias convencionais, como resíduo comum. Na impossibilidade de comprovarse a obediência a este limite, recomenda-se aguardar o decaimento do radionuclídeo até níveis comparáveis à radiação de fundo (background ou BG). O local de armazenamento de rejeitos radioativos deve ser constituído de compartimentos que possibilitem a segregação dos RR por grupo de radionuclídeos com meias-vidas próximas e por estado físico. Deve, ainda, possuir blindagem adequada, ser sinalizado e localizado em área de acesso controlado. As atividades iniciais e remanescentes e as meias-vidas físicas dos radioisótopos devem ser consideradas para estabelecer o tempo necessário de armazenamento para rejeitos radioativos [6]. Em Belo Horizonte, a Superintendência de Limpeza Urbana SLU executa a coleta, o transporte e a disposição final dos resíduos de serviços de saúde em caráter facultativo, a seu exclusivo critério e cobrando preço público pelos serviços prestados [7]. Em nenhum momento a legislação prevê a possibilidade da SLU coletar e transportar rejeitos radioativos. Além disto, o manuseio dos RR deve ser feito por pessoas treinadas e equipadas com todos os

equipamentos necessários de proteção individual e, para fins de radioproteção, os trabalhadores devem estar cientes dos riscos da exposição às radiações ionizantes. 3. EXPERIMENTAL O experimento foi realizado na Central de Tratamento de Resíduos Sólidos CTRS BR-040, localizada no km 531 da BR-040, região noroeste de Belo Horizonte, ocupando 145 ha de área. A CTRS tem como finalidade receber, tratar e dispor de forma definitiva os resíduos gerados no Município de Belo Horizonte. No aterro, os RSS são depositados na frente de trabalho, cobertos por resíduos urbanos comuns e compactados com trator. Em 2004, foram aterradas 1.324 toneladas de resíduos de serviços de saúde, conforme Relatório de Resíduos Coletados e Aterrados do ano de 2004, da SLU. Os caminhões que fazem a coleta e o transporte são equipados com compactadores e de uso exclusivo para a coleta de RSS. Para o monitoramento radiométrico foram selecionados equipamentos portáteis, precisos e robustos e com sensibilidade suficiente para as medidas de campo. Para as medidas de varredura do conteúdo dos caminhões utilizou-se o cintilômetro SPP-2 da SRAT, otimizado para melhoria da sensibilidade no setor de proteção radiológica do CDTN. O equipamento é robusto e tem 5 faixas de leitura, sendo a leitura máxima de 15.000 cps. Para a determinação do radionuclídeo selecionou-se um cintilômetro acoplado a um analisador multicanal, o nanospec, que é portátil (450g), sensível aos níveis de radiação pesquisados e capaz de fornecer o espectro de radiação diretamente. Possui uma porta serial para ser conectado a computador convencional. Nas Fig. 1 e 2 são apresentados os dois equipamentos usados nas medições. Figura 1. Cintilômetro SPP-2, usado na varredura dos resíduos, na frente de trabalho do aterro sanitário. Figura 2. Cintilômetro NanoSPEC e analisador multicanal, utilizados para a caracterização dos radionuclídeos. Para o estabelecimento dos valores das contagens que equivalem aos 75 Bq/g exigidos pela norma CNEN-NE-6.05 para liberação de resíduos sólidos em vias convencionais, foi elaborado um padrão, denominado fantoma, simulando os RSS, com a altura proposta para as

medições em campo. Para isso, um saco plástico de 20 litros foi preenchido com materiais similares e na mesma proporção aos encontrados em RSS típicos [8, 9], totalizando o peso de 2 kg. Na Tabela 1 é apresentada a composição do fantoma. Tabela 1. Composição gravimétrica do fantoma elaborado no CDTN Produto Borracha/Látex Papel Alumínio Isopor Filme Pano Papel Papelão Plástico Vidro Peso (g) 446 8,4 377 163 177,3 349,5 140,5 103 234,5 % 22,3 0,5 18,9 8,2 8,9 17,5 7 5,2 11,7 Para a calibração foram utilizados os radionuclídeos 131 I e 99m Tc, que são os utilizados na grande maioria dos procedimentos de medicina nuclear. Frascos contendo radiofármacos destes radionuclídeos com atividade conhecida foram colocados no interior do fantoma e realizaram-se medições seqüenciais considerando a meia-vida de cada radionuclídeo. Sendo assim, foram feitas medições a cada seis horas para o 99m Tc e a cada 8 dias para o 131 I e, usando-se a equação de decaimento, foi estabelecido o momento exato em que os radionuclídeos atingiriam a atividade correspondente ao limite de liberação, igual a 150 kbq (4µCi), considerando que o fantoma pesava 2 kg. Estas medições foram realizadas nas seis faces do fantoma, com o cintilador SPP-2 da SRAT. Foi estabelecido o valor de 540 cps para o limite de RR, pois na calibração foram encontrados os valores de 540 cps e 470 cps, para o 99m Tc e o 131 I, respectivamente, quando ambos atingiram a atividade de 150 kbq, equivalente ao valor da norma de 75 Bq/g. Para as medidas de campo, iniciou-se fazendo a medida da radiação de fundo da frente de aterro, local onde são despejados os resíduos para aterramento. Em seguida o caminhão despejava neste local todo o seu conteúdo, que era em seguida nivelado e quarteado por um trator em porções de aproximadamente 60 cm de altura, comparável a altura do fantoma. Com o cintilômetro mediam-se as contagens advindas do material nivelado pelo trator, com o detector a aproximadamente 30 cm do material monitorado. Onde foram detectadas contagens muito acima do BG, segregou-se e coletou-se, quando possível, o resíduo gerador desta atividade e identificou-se o radionuclídeo com o nanospec. O conteúdo de 25 caminhões, provenientes dos cinco roteiros de coleta, foi monitorado, em todos os dias da semana. 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Em todos os roteiros foi encontrada positividade, com valores acima do limite legal para a liberação de rejeitos radioativos, inclusive valores acima de 15.000 cps. O perfil do radiofármaco foi estabelecido em 6 casos, por análise espectral, e revelou a presença em 5 casos do radiofármaco 99m Tc e, em um caso, de 131 I. Na Tabela 2 são apresentados os resultados reunidos por roteiro de coleta.

Tabela 2. Síntese das medidas realizadas na Central de Tratamento e Disposição Final de Resíduos Sólidos de Belo Horizonte Roteiro N o de Caminhões Avaliados N o de Ocorrências Positivas Leitura Máxima (cps) A 4 3 ou 4* 11.000 B 7 4 >15.000 C 7 2 >15.000 D 3 1 ou 2* 1.850 E 4 4 >15.000 Total 25 15 *O conteúdo de dois caminhões, um do roteiro A e outro do roteiro D, foram misturados, impossibilitando individualizar a origem do material radioativo. A detecção de radiação nos RSS acima do limite legal de liberação em 60% do conteúdo dos caminhões medidos e a presença inequívoca de 99m Tc e 131 I, evidencia que há serviço de medicina nuclear que não está observando o preconizado na Norma CNEN-NE-6.05 [5]. Enumeram-se a seguir as possíveis falhas na gerência de rejeitos radioativos de SS, que devem ser diagnosticadas e quantificadas para que o poder público e as entidades envolvidas possam resolver o problema: a inobservância do prazo de decaimento deve ser a razão principal, que pode ter causas secundárias como o desconhecimento da atividade do material colocado para decair, cálculo inadequado do prazo necessário para o decaimento, subdimensionamento da área de armazenamento para decaimento e falta de segregação dos radionuclídeos; equipamentos ausentes de monitoramento radiológico ou descalibrados e/ou falta de monitoramento dos resíduos pós-decaimento, ainda na instalação geradora; a falta de capacitação e/ou reciclagem do pessoal envolvido nas diversas fases do gerenciamento, desde o manuseio inicial dos radiofármacos até a liberação dos resíduos para coleta, pode acarretar também liberação inadvertida de RR diretamente com os demais RSS. Os pontos essenciais para a solução deste problema são campanhas de capacitação e ênfase no controle e na fiscalização. A partir da experiência brasileira em São Paulo [Comunicação Pessoal, CAVO SERVIÇOS E MEIO AMBIENTE, em 03 jun. 2003], americana em Boston [10] e européia na Itália [11], é recomendável que sejam instalados detectores de radiação nas entradas de centrais de tratamento e disposição final de resíduos e que todos os RSS sejam monitorados por detectores do tipo cintilômetros, antes de serem liberados para coleta e disposição final. 5. CONCLUSÃO O presente trabalho não teve como escopo estabelecer de modo sistematizado o impacto da radiação para os seres humanos e o meio ambiente. Entretanto, a partir dos resultados, a

conclusão é que há rejeitos radioativos sendo liberados por Serviços de Medicina Nuclear de Belo Horizonte, antes que atingirem o limite de liberação, legalmente exigido pela CNEN. Fazem-se necessárias campanhas de orientação e capacitação dos recursos humanos envolvidos nos serviços de medicina nuclear e que o supervisor de radioproteção responsável pela instalação radiativa passe a cumprir suas obrigações quanto ao descarte radiologicamente correto dos rejeitos gerados na instalação. REFERÊNCIAS 1. R. L. EISENBERG, Radiology: an Illustrated History, Mosby-Year Book, Inc., St. Louis, USA (1992). 2. J. H. THRALL, H. A. ZIESSMAN, Medicina Nuclear, Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, Brasil (2003). 3. R. REGIS, Radiofármaco Reverte Imagem Negativa da Energia Nuclear, Scientific American Brasil, n. 5, out. 2002, http://www2.uol.com.br/sciam/materia_capa_6.htm (2004). 4. COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, Licenciamento de Instalações Radiativas, CNEN NE 6.02, CNEN, Rio de Janeiro, Brasil (1998). 5. COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, Gerência de Rejeitos Radioativos em Instalações Radiativas, CNEN NE - 6.05, CNEN, Rio de Janeiro, RJ (1985). 6. COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, Requisitos de Radioproteção e Segurança para Serviços de Medicina Nuclear, CNEN - NE - 3.05, CNEN, Rio de Janeiro, Brasil (1996). 7. Prefeitura de Belo Horizonte, Manual de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde de Belo Horizonte, COPAGRESS, Belo Horizonte, Brasil (1999). 8. S. R. SOARES et al. Avaliação da Evolução Microbiológica em Resíduos Hospitalares Infecciosos. Anais do 27 Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental, Porto Alegre, 3 a 8 de dezembro, 2000, ABES/AIDIS,1 CD-ROM (2000). 9. J. B. L. ANDRADE,. Determinação da Composição Gravimétrica dos Resíduos de Serviços de Saúde de Diferentes Tipos de Estabelecimentos Geradores. Anais do 20 Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental, Rio de Janeiro, 10 a 14 maio, 1999, pp. 1666-1672 (1999). 10. V. EVDOKIMOFF, C. CASH, K. BUCKLEY, A. CARDENAS, Potential for radioactive patient excreta in hospital trash and medical waste, Health Physics, n.66, v.2, p.209-211, (1994). 11. A. BERETTA, L. CONTE, M. MONCIARDINI, L. BIANCHI, Radiological impact of low level solid radioactive waste disposed of with ordinary hospital refuse, Radiation Protection Dosimetry. v. 7, p. 223-226 (1997).