METODOLOGIA DE ANALISE PARA A IMPLANTACAO DE CISTERNAS X VARIABILIDADE ESPACIAL DA PRECIPITACAO PARA A REGIÃO SEMIÁRIDA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

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Transcrição:

METODOLOGIA DE ANALISE PARA A IMPLANTACAO DE CISTERNAS X VARIABILIDADE ESPACIAL DA PRECIPITACAO PARA A REGIÃO SEMIÁRIDA DO ESTADO DE PERNAMBUCO Margarida Regueira da Costa 1 ; Alexandre Luiz Souza Borba 2 ; José Paulo de Santana Neto 3. RESUMO - A presente pesquisa tem por objetivo avaliar uma das formas de abastecimento de água para comunidades difusas da região semiárida brasileira, com ênfase ao estado de Pernambuco, considerando três visões: a visão técnica, onde se discute o emprego de tecnologia apropriada; a visão antropológica, relacionada à aceitação da população como uma condição essencial ao sucesso do empreendimento; a terceira visão abordará os aspectos de saúde pública, com indicadores de redução de doenças de veiculação hídrica no estudo de caso abordado. Como conclusão tem-se que, uma cisterna de 16 m³ pode ser implementada em todos os domicílios que apresentem um telhado com pelo menos 40 m² de área para o estado de Pernambuco. ABSTRACT - The main objective of the present research is to evaluate the forms of water supply in the northeastern Brazil semi-arid region, with emphasis to the State of Pernambuco, considering three points of view: the technical vision, where discussing potentialities and difficulties of the conventional water supply and the use of appropriate technologies; the anthropological vision, related to the acceptance of the process by the population as an essential condition to the success of the enterprise; the third vision will approach the aspects of public health, with indicators of diseases levels reduction related to water relacioned with the case studies approached; In conclusion it has to be a rural cisterns of 16 m³ can be implemented in all households that have a roof with at least 40 m² in size to the state of Pernambuco. PALAVRAS-CHAVE: Sustentabilidade hídrica, tecnologias apropriadas, recursos hídricos do semiárido. KEYWORDS: Water sustainability, appropriate technology, water resources in semi-arid regions. 1 Pesquisadora em Geociências, Hidróloga, Dra. CPRM, margarida.regueira@cprm.gov.br 2 Pesquisador em Geociências, Geólogo, M.Sc. CPRM alexandre.borba@cprm.gov.br 3 Estagiário da CPRM - Universidade Federal de Pernambuco 1

1. O PROBLEMA DA ÁGUA NO CONTEXTO BRASILEIRO O Brasil, apesar de ter uma situação de disponibilidade hídrica privilegiada (maior disponibilidade hídrica do planeta), correspondendo a mais da metade da água da América do Sul e a 13,8 % do total mundial, somando-se a isto cerca de 2/3 de um manancial subterrâneo que corre por baixo dos países do Mercosul, com extensão superior à Inglaterra, França e Espanha juntos, apresenta problemas relacionados à disponibilidade hídrica intra e inter-regionais, sendo afetado tanto pela escassez quanto pela abundância; assim como também pela degradação causada em decorrência da poluição de origem doméstica e industrial. Enquanto a Região Norte possui água em abundância, concentrando 68 % dos recursos hídricos brasileiros numa área com apenas 7 % da população, a Região Nordeste apresenta como característica a de possuir grande parte do seu território coincidindo em área de clima semiárido, com uma precipitação anual média na casa dos 900 mm, chegando próxima a 400 mm, em algumas regiões (Figura 1). Nesta, além de uma elevada variabilidade na distribuição espacial e temporal das chuvas (sazonalidade inter anual), existem limitações nas possibilidades de extração de águas subterrâneas, devido tanto à existência de rochas cristalinas, quanto ao fato dos solos serem rasos, esparsos e com pouca ou nenhuma vegetação (caatinga e cerrado) o que agrava os picos de cheias devido à incapacidade de reter a água da chuva, fazendo com que a mesma escoe rapidamente para os rios, além de altos índices de evapotranspiração. Como conseqüência, esta região chamada de Polígono das Secas, concentra somente 3 % da disponibilidade hídrica nacional. Figura 1 Isoietas totais anuais da região nordeste do Brasil. Fonte: Atlas pluviométrico do Brasil, (CPRM, 2011). 2

Em virtude de quadros como estes, nos últimos anos, tem-se observado o desenvolvimento ou aprimoramento de tecnologias referentes ao manejo de recursos hídricos, especialmente no aproveitamento da água de chuva. Segundo a ORGANIZATION OF AMERICAN STATES (1997) apud PALMIER (2001), na América do Sul e no Caribe o maior problema enfrentado na gestão das águas de chuva são a ausência de legislação adequada e a incapacidade de avaliar de forma apropriada o impacto da introdução de tecnologias alternativas nas situações existentes. Segundo PALMIER (2001), sistemas alternativos de coleta da água de chuva vêm sendo utilizados em Estados nordestinos do país e em Minas Gerais. No entanto, não há uma sistematização no uso dessas técnicas, aonde muitas dessas aplicações não apresentam seus resultados monitorados, havendo uma necessidade de se realizar pesquisas para avaliar o aproveitamento do potencial hídrico, objeto desse estudo. 2. OBJETIVOS O presente trabalho tem como objetivo avaliar uma das formas de abastecimento de água (cisternas) para comunidades difusas da região semiárida brasileira, com ênfase ao estado de Pernambuco, considerando três visões: a visão técnica, onde se discute o emprego de tecnologia apropriada; a visão antropológica, relacionada à aceitação da população como uma condição essencial ao sucesso do empreendimento;e a visão epidemiológica abordando a distribuição do número de casos de doença diarréica aguda antes e após a construção de cisternas. 3. O CLIMA DO ESTADO DE PERNAMBUCO No estado de Pernambuco, as intensidades das chuvas decrescem à medida que se adentra no continente (Figura 2), sendo possível observar a presença de microclimas de altitude em alguns municípios, onde as temperaturas são baixas em determinadas épocas do ano. Na parte mais próxima do Sertão, região em estudo, a contribuição da ZCIT (zona de convergência intertropical) é mais efetiva do que dos sistemas de leste, com período mais chuvoso de fevereiro a julho, com ocorrência de 67% da precipitação anual média (Figura 3) o que demonstra a necessidade da adoção de uma alternativa de abastecimento de água a ser utilizada nas comunidades difusas do semi-árido nordestino para convivência com a seca. 3

Figura 2 Isoietas totais anuais, período 1977 a 2006, Estado de Pernambuco. Fonte: Atlas pluviométrico do Brasil, (CPRM, 2011). Figura 3 Isoietas totais trimestrais, período 1977 a 2006, Estado de Pernambuco. Fonte: Atlas pluviométrico do Brasil, (CPRM, 2011). 4. ESTUDO DO POTENCIAL DE IMPLANTACAO DE CISTERNAS PARA COLETA DE AGUA DE CHUVAS - METODOLOGIA A condição técnica inicial para a seleção da uma alternativa de abastecimento de água a ser utilizada nas comunidades difusas do semi-árido nordestino é a identificação de uma fonte hídrica e a verificação de sua sustentabilidade. Na análise da Viabilidade Técnica para cisternas, considerando-se a técnica de construção de cisternas como uma forma alternativa para suprimento de água para consumo humano, torna-se necessária a verificação da sua capacidade de suprir as demandas diárias das famílias por vários anos consecutivos, durante todos os dias do ano. 4

Na análise de pluviometria foram avaliadas as médias anuais históricas de precipitação dos postos pluviométricos (280 postos) implantados pela SUDENE no estado de Pernambuco, com histórico variando entre os anos de 1911 e 1985, estando a maioria dos dados registrados entre os anos de 1963 e 1985. Foi assim selecionado um subconjunto que cobrisse o Estado e com séries mais extensas. Para a ASA (BRASIL, 2003), 500 mm é o valor estabelecido como mínimo necessário para a implantação de cisternas visando o pleno atendimento das finalidades propostas pela tecnologia. Foi então aplicada metodologia de simulação para a verificação da sustentabilidade operacional das cisternas (COSTA, 2009), observando-se as falhas: o número de meses em que as mesmas ficarão vazias para cada município do Estado, considerando um consumo padrão. O passo de tempo da simulação considerou a pluviometria mensal (média mensal). A simulação do volume de água possível de ser coletado seguiu a ordem cronológica dos eventos chuvosos e os dados foram acumulados em totais mensais. Por simplificação, admitiu-se que uma família de 5 indivíduos utilizaria a água da cisterna toda vez que fosse possível e necessário, independentemente da estação chuvosa e o consumo humano fosse de 20 litros/dia. Após à ponderação da influência pelo método de Thiessen dos postos pluviométricos nos municípios do Estado, foi possível estabelecer um mapeamento do potencial no tocante à implantação de cisternas (Figura 4). Para a representação gráfica foram estabelecidos alguns critérios com respeito ao atendimento das necessidades básicas humanas, em termos de captação da precipitação ao longo do ano: captação de pelo menos 8m³ (atendimento de 50% das necessidades no ano); captação de 16m³ (atendimento de 100% das necessidades no ano) em uma cisterna; captação de 16m³ a 32m³ em duas cisternas; captação de 32m³ a 48m³ em três cisternas; e captação superior a 48m³, com a construção de quatro ou mais cisternas. Foram consideradas três situações iniciais partindo-se com a cisterna cheia, vazia e com 50% de sua capacidade. Observou-se que, em função do grande número de dados utilizados, os resultados finais obtidos foram os mesmos, diluindo-se qualquer influência inicial das condições de acumulação das cisternas. Raciocínio análogo pôde ser observado quanto ao período inicial da simulação: início, meio ou fim do ano hidrológico. As tabelas e gráficos mostraram falhas de até 83,9% no tempo (cisterna no município de São Caetano) para retirada de 100 litros diários, o que comprova a incapacidade de manutenção do padrão de consumo recomendado pela ONU. A Figura 4a (Anexo) mostra espacialmente a distribuição dos 5

resultados da simulação considerando o padrão de consumo de 100 litros diários, a partir das seguintes hipóteses: menos de 10% de falhas, entre 10 e 30 % e mais de 30 % de falhas no tempo. Apenas para 6 municípios, possivelmente pelas condições de microclima, seria viável a implantação de 3 ou 4 cisternas por domicílio. Na Figura 4b (Anexo) é feita análise similar para padrão de consumo diário de 50 litros diários. Nesta análise, para os mesmos patamares de falha no tempo, observa-se melhor funcionamento das cisternas. Dos 114 municípios que não apresentam pluviometria para atendimento contínuo de 100 litros/dia, a simulação apresenta os seguintes índices de falha: - para 5 municípios, menos de 10 % de falhas no tempo; - para 75 municípios, falhas entre 10 e 30 % no tempo; - para 34 municípios, falhas em mais de 30 % do tempo, sendo que em 11 municípios, estas falhas se registram entre 40 e 43,2 % (maior índice, registrado em Sertânia). Na análise antropológica, verificou-se que através do contato direto com a população beneficiada, é imprescindível (realização de reuniões e aplicação de questionários adequados à região), pois a simples intenção em solucionar o problema pode acabar em fracassos como a não utilização e a não apropriação da tecnologia pela população ou ainda um manejo inadequado. Por se tratar, em geral, de população não habituada ao uso de tecnologias, pouco conhecidas, até as técnicas mais simples devem ser discutidas, aprovadas e ensinadas quanto à sua utilização e manuseio. Um fator importante a se considerar é que o levantamento das informações foi feito nos diferentes momentos de implementação (antes (t 0 ), durante a realização da ação (t 1 ) e após a sua conclusão (t 2 ). Quatro sub-critérios são utilizados na análise antropológica, conforme descrito a seguir. Na análise de viabilidade a) Análise da aceitabilidade local Esta se refere ao grau de aceitabilidade da implementação da alternativa pela população; b) Avaliação da necessidade de implantação da alternativa de abastecimento de água na localidade. Na avaliação da alternativa a) Análise das transformações ocorridas nas diferentes fases; e b) Análise da satisfação com a alternativa. Na avaliação epidemiológica usou-se uma pesquisa avaliadora do tipo quase-experimental utilizando dados secundários e primários. Como fontes de dados teve-se: Sistema de Informações da Atenção Básica (SIAB): 6

- Incidência de episódios de diarréia em crianças de 0 (zero) a 2 (dois) anos; - Taxa de mortalidade infantil; - Taxa de mortalidade de menores de cinco anos; - Taxa de mortalidade por diarréia em menores de um ano e menores de cinco anos. A coleta de dados primários foi realizada mediante aplicação de questionários com variáveis sócio-econômicas e ambientais, nos quais o indicador foi à prevalência de episódios de diarréia em menores de cinco anos (nos últimos 15 dias da análise). 5. ESTUDO DE CASO Para a Avaliação Técnica, os sub-critérios analisados foram o correto dimensionamento e a avaliação da qualidade das águas. No correto dimensionamento se pôde verificar que na região rural a montante do distrito de Mutuca - PE, as cisternas não supriam as necessidades de uma família com 5 pessoas, com um consumo de 20 l/hab.dia e uma área de telhado de 40 m 2 durante todo o ano, conforme previsto em estudo apresentado a seguir. As cisternas localizadas nas áreas rurais mais próximas à cidade de Poção- PE, por outro lado já mostravam capacidade de suprir uma família por um ano. Para a caracterização da qualidade das águas foram selecionadas 08 cisternas, escolhidas aleatoriamente. A freqüência de coleta utilizada foi distribuída nos períodos chuvoso e seco. Após as coletas, as amostras foram encaminhadas a um laboratório (mantidas resfriadas a 4 o C até o momento da análise). Os resultados foram armazenados em um banco de dados e submetidos à análise de consistência. Do total de amostras da água, em torno de 5 % dos resultados foram eliminados por serem considerados inconsistentes, devido a problemas de prazo de validade para análise das amostras Um fato importante observado foi que todas as cisternas monitoradas eram de placa de cimento de forma cilíndrica, coberta e semi-enterrada. O telhado de todas as casas era de material cerâmico (telha canal). Ressalta-se que, segundo estudos existentes, a qualidade microbiológica da água da chuva proveniente de telhados metálicos é, geralmente, melhor que outros tipos de telhados. Todas as calhas das cisternas monitoradas são feitas de zinco e a tubulação que interliga a calha a essas cisternas a base de PVC. Todas essas cisternas são pintadas de branco, o que, segundo GNADLINGER (1999), diminui o aquecimento a fim de dificultar o surgimento de fissuras. 7

Quanto à origem da água armazenada nas cisternas, verificou-se que tinham as mais variadas procedências: chuva, carro-pipa, chafariz público ou uma mistura (carro-pipa, chafariz, chuva e rede pública). Segundo AMORIM & PORTO (2003), essa prática de não armazenar somente água da chuva em cisterna vem sendo comum nas comunidades do semiárido nordestino. Um outro fato observado foi que todos os proprietários retiravam a água da cisterna através de baldes, embora algumas cisternas possuíssem uma bomba manual conhecida como bomba bola de gude, mas se queixavam da baixa vazão. Ao longo das coletas, algumas situações foram presenciadas, tais como: a presença de animais no interior de cisterna, fissuras, tampa da cisterna aberta, deteriorada e/ou inadequada, entre outras. É recomendado que a cisterna seja localizada a pelo menos 30 metros de fossas, galinheiros, pocilgas e similares. Essa recomendação não foi verificada em nenhuma das cisternas monitoradas. Um outro fator também observado foi que nenhuma das cisternas monitoradas estava dotada de peneira na tubulação de entrada, o que previne a passagem de resíduos carreados com a água da chuva. No Município de Pesqueira, 53% das famílias pesquisadas afirmaram realizar o tratamento da água com cloro; porém, a maioria das águas analisadas apresentou-se fora dos padrões de potabilidade para consumo humano. Os resultados apontam para a necessidade de se efetuar o tratamento da água de beber de forma adequada, que pode ser realizado por meio de capacitação dos agentes atuantes e das famílias beneficiadas em cada comunidade. Para a Avaliação Antropológica os critérios foram as transformações ocorridas e a análise da satisfação com a alternativa. Como transformação pode-se observar a melhoria da qualidade de vida da população, em especial das mulheres em função do número de horas que eram desperdiçadas diariamente na coleta de água (com uma qualidade em geral bastante inferior). Em relação à satisfação com a alternativa, o que se pôde verificar é o que já demonstram os números do Programa P1MC, onde a cada dia famílias solicitam a construção de cisternas em toda a região semiárida do Brasil. Para a Avaliação Epidemiológica foi realizado um levantamento da incidência de diarréia infantil nas famílias beneficiadas pelas 8 cisternas monitoradas. Neste verificou-se uma diminuição do número de casos (Figura 5), provavelmente em decorrência de uma maior oferta de água. 8

Número de casos Distribuição do número de casos de doença diarréica aguda, antes e após a instalação de cisternas Número de casos antes Número de casos após 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 janeiro a março de 2006 abril a junho de 2006 julho a setembro de 2006 outubro a dezembro de 2006 janeiro a março de 2007 abril a junho de 2007 julho a setembro de 20007 outubro a dezembro de 2007 Período trimestral janeiro a março de 2008 abril a junho de 2008 julho a setembro de 2008 outubro a dezembro de 2008 Figura 5 Distribuição do número de casos de doença diarréica aguda antes e após a construção de cisternas (COSTA, 2009). 6. ANÁLISE DOS RESULTADOS Do ponto de vista hidrológico, uma cisterna de 16 m³ pode ser implementada em todos os domicílios que apresentem um telhado com pelo menos 40 m² de área, com retirada diária garantida inferior a 50 l/dia, visto que ocorrência de falhas de até 40% no tempo foram observadas nas simulações. Em áreas de microclima até 4 cisternas poderiam ser abastecidas. Ressalte-se, além disso, as dificuldades inerentes ao manejo da cisterna, com contaminação pelos telhados e por água advinda de outras fontes. A análise antropológica mostra aspectos essenciais de aceitação e satisfação das pessoas por serem beneficiadas pelas infraestruturas de abastecimento de água. Registra-se um razoável conhecimento sobre o que é importante fazer (por exemplo, o manejo das cisternas), mas não necessariamente a preocupação em cumprir as recomendações. 7. BIBLIOGRAFIAS AMORIM, M.C.C.; PORTO, E.R. Considerações sobre controle e vigilância da qualidade de água de cisternas e seus tratamentos. In: 4 SIMPÓSIO BRASILEIRO DE CAPTAÇÃO DE ÁGUA DE CHUVA, 2003, Juazeiro. Anais.Juazeiro: ABCMAC, 2003. 1CD-ROM. 9

BRASIL (ASA). Programa de formação e mobilização social para a convivência com o semiárido: um milhão de cisternas. Disponível em http://www.asabrasil.org.br/p1mc.htm. Acesso em: 9 dez. 2003. COSTA, MARGARIDA REGUEIRA DA. Sustentabilidade hídrica e qualidade das águas: Avaliação das estratégicas de convivência com o semiárido. Recife, 2009. CPRM. ATLAS PLUVIOMETRICO DO BRASIL, 2011. GNADLINGER, J. Técnicas de diferentes tipos de cisternas, construídas em comunidades rurais do semiárido brasileiro. Anais do 1º Simpósio sobre Captação de Água de Chuva no Semiárido Brasileiro, Petrolina PE, 1999. PALMIER, L. R., A necessidade das bacias experimentais para avaliação da eficiência de técnicas alternativas de captação de água na região semiárida do Brasil. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE CAPTAÇÃO DE ÁGUA DE CHUVA NO SEMIÁRIDO, Campina Grande, PB, Anais em CD, ABCMAC, 2001. 10

Figura 4a Índice de falhas no atendimento com sistemas para consumo diário de 100 litros. Figura 4b Índice de falhas no atendimento com sistemas para consumo diário de 50 litros. 11